• 01/07/2016

    Em nota, Apib se manifesta contra possível nomeação de militar à presidência da Funai

    Diante da consolidação, no decorrer desta semana, da indicação do general reformado Roberto Sebastião Peternelli, membro do Partido Social Cristão (PSC), à presidência da Fundação Nacional do Índio (Funai), a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) se manifestou publicamente nesta sexta-feira, 1º de julho, contra a efetivação do militar ao cargo do órgão indigenista estatal.


    Sabe-se que o indicado, que foi candidato a deputado federal pelo PSC em São Paulo em 2014, e não conseguiu se eleger, é a favor da PEC 2015, portanto contra a demarcação das terras indígenas, além de enaltecedor o golpe militar de 1964 e os feitos da ditadura”, diz trecho da nota.


    O PSC já vinha sendo a agremiação partidária mais envolvida em nomes à presidência da Funai, mesmo que ainda num momento de especulações. Ventilava-se até mesmo os nomes de Jair e Eduardo Bolsonaro, pai e filho deputados federais que acumulam processos juidiciais e internos na Câmara Federal acusados de racismo, homofobia e exaltação à tortura praticada pelo regime ditatorial instalado no país entre os anos de 1964 e 1985.


    Jair Bolsonaro é pré-candidato à Presidência da República e no Mato Grosso do Sul, estado que visita com certa frequência, faz questão de desfilar ao lado de fazendeiros e ruralistas a falar contra a demarcação de terras indígenas. Com discurso de cunho militarista, trata a questão indígena como um problema para a segurança nacional e defendeu inúmeras vezes a integração dos povos à sociedade brasileira – tese rechaçada pelo movimento indígena e indigenista ainda durante o regime militar, posteriormente derrotada pela Constituição Federal e tratados internacionais.


    A este mesmo partido pertence o Pastor Everaldo, candidato à presidência nas últimas eleições, e o Pastor Marco Feliciano, deputado federal ligado a projetos parlamentares de cunho homofóbico. O PSC, inclusive, foi um dos principais fiadores do processo de impeachment em curso da presidente Dilma Rousseff. Com a consolidação da indicação do general Petterneli, o movimento indígena tem como certo que o presidente interino Michel Temer loteou a Funai para este grupo político.


    Certamente ele virá, se efetivamente nomeado, a militarizar a política indigenista, com todas suas imprevisíveis consequências, fortalecendo a perspectiva do Estado policial que está sendo instalado no país, com a criminalização dos movimentos sociais”, diz a nota.


    Leia a nota na íntegra:


    Não aos retrocessos! Não para a indicação de militar à presidência da Funai


    A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil – APIB, entidade nacional que congrega organizações indígenas das distintas regiões do país, vem de público manifestar seu veemente repúdio às articulações fechadas entre o líder do governo na Câmara dos Deputados, deputado André Moura, do Partido Social Cristão (PSC) e o deposto ministro do Planejamento e réu da Operação Lavajato, senador Romero Jucá (PMDB), de longa trajetória anti-indígena, que culminaram, nesta semana, com a indicação, ainda não consumada, do general Roberto Sebastião Peternelli ao cargo de Presidente da Fundação Nacional do Índio – FUNAI.


    Só cogitação do general para a presidência do órgão indigenista gerou revolta e indignação entre os povos e organizações indígenas e suas redes de aliados no Parlamento e em amplos setores da sociedade. Nada por acaso. Sabe-se que o indicado, que foi candidato a deputado federal pelo PSC em São Paulo em 2014, e não conseguiu se eleger, é a favor da PEC 2015, portanto contra a demarcação das terras indígenas, além de enaltecedor o golpe militar de 1964 e os feitos da ditadura. Certamente ele virá, se efetivamente nomeado, a militarizar a política indigenista, com todas suas imprevisíveis consequências, fortalecendo a perspectiva do Estado policial que está sendo instalado no país, com a criminalização dos movimentos sociais.


    Essa absurda indicação, que segue à invisibilidade dada à FUNAI na estrutura do Ministério da Justiça, ao corte orçamentário da instituição, à inviabilização do Conselho Nacional de Política Indigenista – CNPI, ao aniquilamento de outros órgãos de governo que tratavam de políticas voltadas aos povos indígenas, como o Ministério de Desenvolvimento Agrário – MDA, a Secretaria de Direitos Humanos, a Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão – SECADI no Ministério da Educação, entre outros, certamente reflete a determinação do atual governo interino de Michel Temer de travar de vez quaisquer tipos de avanços e regredir ou suprimir as conquistas alcançadas nos últimos 28 anos na Constituição Federal e nos tratados internacionais assinados pelo Brasil a respeito do reconhecimento da diversidade étnica e cultural dos povos indígenas e de seu direito originário a suas terras tradicionais. A perspectiva, não tem outro nome, é nada mais do que a de uma política etnocida e genocida, que quer o fim dos povos indígenas, hoje mais do que nunca considerados pela elite de plantão empecilhos ao chamado desenvolvimento e progresso, o vil capital.


    A APIB, acolhendo o clamor de suas bases, reitera que os povos e organizações indígenas de todo o país estão em estado de alerta e dispostos a não admitir retrocessos de nenhum tipo, a começar pela indicação de um militar que impossibilitará quaisquer condições de diálogo na construção das políticas públicas que a esses povos interessa como, mesmo com dificuldades, vinha acontecendo no governo afastado de Dilma Rousseff.


    PELO NOSSO DIREITO DE VIVER


    Brasília – DF, 30 de junho de 2016

    Articulação dos Povos Indígenas do Brasil – APIB

    Mobilização Nacional Indígena

    Read More
  • 30/06/2016

    “Uma verdadeira situação pandêmica de suicídios de jovens indígenas”, diz estudo da Flacso Brasil



    O suicídio entre crianças e jovens indígenas no Brasil foi classificado como pandemia por pesquisa do Programa de Estudos sobre Violência da Faculdade Latino Americana de Ciências Sociais (Flacso). Divulgado nesta quinta-feira, 30, o relatório ‘Violência Letal Contra as Crianças e Adolescentes do Brasil’ aponta que em ao menos um município, 100% do total de suicídios entre indígenas ocorreu na faixa dos 10 e 19 anos. Dos 17 municípios com número igual ou superior a 10 mil crianças e jovens – critério para o levantamento – , com alta densidade populacional indígena, 327 indígenas acima dos 20 anos se suicidaram entre 2009 e 2013. Desse total, 163 crianças e adolescentes tiraram a própria vida – quase a metade do número final e a maioria em relação às demais faixas etárias reunidas.


    O foco do relatório não era a população indígena. No entanto, quando os dados apareceram causaram espanto entre os pesquisadores que decidiram fazer uma amostragem específica. “Vemos nos municípios arrolados que os suicídios na faixa de 10 a 19 anos representam entre 33,3%, em São Gabriel da Cachoeira (AM), e 100%, em Tacuru (MS), do total de suicídios indígenas, verdadeira situação pandêmica de suicídios de jovens indígenas”, destaca trecho do relatório. No Mato Grosso do Sul, a pesquisa aponta 5,2% suicídios de crianças e jovens por 100 mil habitantes. No Amazonas, a taxa é de 4,0%. A mortandade suicida nestes estados é puxada de forma trágica pelas crianças e jovens indígenas, conforme constataram os pesquisadores. AM e MS são os que mais possuem municípios envolvidos no suicídio entre a faixa etária do estudo.


    A pesquisa se debruçou sobre oito municípios do Amazonas e nove do Mato Grosso do Sul, onde os critérios do estudo coadunaram com a alta densidade de populações indígenas. “Os municípios que aparecem nos primeiros lugares nas listas de mortalidade suicida são locais de amplo assentamento de comunidades indígenas, como São Gabriel da Cachoeira, Benjamin Constant e Tabatinga (AM); Amambai e Dourados (MS)”, diz trecho do estudo. Dos 74,1% de indígenas que cometeram suicídio em Tabatinga, no Amazonas, entre 2009 e 2013, 50% era de crianças e jovens. Diante do total de suicídios do município, o de crianças e jovens indígenas corresponde a 37%. Nestes municípios amazonenses, a gama de povos é bastante diversa afetando várias destas nações.


    No município sul-mato-grossense de Caarapó, onde ocorreu no último dia 14 um massacre de fazendeiros contra o tekoha – lugar onde se é – Tey’i Jusu, 75% dos suicídios, entre 2009 e 2013, ocorreu entre indígenas. Destes 75%, crianças e jovens entre 10 e 19 anos compõem 55,6%. Diante do total do município, jovens e crianças correspondem a 41,7%. Ainda no MS, em Japorã dos 87% de indígenas que cometeram suicídio, 70% foram de crianças e adolescentes – em relação aos dados gerais de suicídio do município, 60,9% ; Ponta Porã teve 71,4% nesta faixa etária, ante 20,6% do total de indígenas e correpondendo a 14,7% de suicídios gerais da cidade. Já a cidade de Paranhos crianças e jovens responderam por 60% dos suicídios de indígenas, equivalendo a 30% de toda a população que tirou a vida entre 2009 e 2013 no município. As cidades sul-mato-grossenses do estudo abarcam quase completamente o povo Guarani e Kaiowá.


    Um estudo das Nações Unidas (ONU) de 2009 coloca o suicídio dos jovens indígenas em um contexto de discriminação, marginalização, colonização traumática e perda das formas tradicionais de vida, mas adverte sobre a complexidade dos fatores que intervêm na transmissão desses traumas entre gerações na forma de comportamento suicida. “A marginalização desses jovens tanto em suas próprias comunidades, ao não encontrar nelas um lugar adequado às suas necessidades, quanto nas sociedades envolventes, pela profunda discriminação, forja um sentimento de isolamento social que pode conduzir a reações autodestrutivas do ponto de vista ocidental”, diz trecho do estudo.


    Para Elizeu Guarani e Kaiowá, integrante da Aty Guasu (Grande Assembleia Guarani e Kaiowá) e que em maio esteve na ONU denunciando violações aos direitos de seu povo, o suicídio não é algo da ‘cultura’ dos Guarani. “Muito gente fica dizendo isso, que o suicídio no meu povo sempre foi assim, faz parte da cultura da gente. Não é verdade. Isso começou forte depois que passamos a ser expulsos das nossas terras, vivendo confinados em reservas, sem perspectiva, na beira de estradas”, declarou Elizeu na ocasião do encontro da Relatoria Especial para os Direitos dos Povos Indígenas das Nações Unidas, em Nova York.




    Suicídio: um abismo labiríntico


    Suicídios acontecem no mundo inteiro – mas, quando, em um mesmo lugar, ao mesmo tempo, muita gente está se matando, é porque tem algo muito esquisito, muito grave acontecendo aí. Estamos falando de uma população de menos de 50 mil pessoas (povo Guarani e Kaiowá), sendo que já aconteceram mais de 1.100 casos nos últimos 35 anos”. A intervenção é do antropólogo Spensy Pimentel. Professor da Universidade Federal do Sul da Bahia, Pimentel pesquisada há pelo menos uma década o povo Guarani e Kaiowá, em Mato Grosso do Sul.


    Para o estudioso, é preciso considerar “que os indígenas no país passam por um período de recuperação demográfica, em função de diversos fatores. Se você analisar as tabelas oficiais do sistema de saúde e do IBGE que mostram a idade dos indígenas, vai ver que as crianças e jovens são absoluta maioria: os povos indígenas, de modo geral, são assim, hoje”, afirma. Para o antropólogo, isso é pouco para tratar de um tema tão complexo quanto o suicídio, que envolve diversos outros fatores, mas pode ser um importante indicativo para explicar as razões que envolvem crianças e jovens – vitimados ainda pela utilização de drogas e homicídios – em altos índices de mortalidade entre os indígenas.

    Da mesma forma que nós, nas cidades, temos problema hoje com essa juventude que fica submetida a um estímulo consumista muito forte, muitas vezes apelando até ao crime para ter acesso a bens de consumo, isso está acontecendo nas aldeias. O consumismo está relacionado a conflitos familiares, à delinquência, e até a frustrações tão graves que alguns associam aos suicídios (que, em geral, são um fenômeno bem complexo, não podemos reduzir a isso)”, diz Pimentel.


    Essa sociabilidade relativamente nova das aldeias próximas às cidades, sobretudo, combinada ao ambiente de pobreza e falta de recursos e de perspectivas de vida, conforme destaca o antropólogo, também tem outros aspectos, como um colapso do modo tradicional de lidar com a gestão dos casamentos. “Gera-se, aí, uma instabilidade que também está relacionada aos suicídios. Mas, vale observar, o pano de fundo do problema é sempre o confinamento, não é possível separar as coisas. As tragédias acontecem também porque o ambiente é muito deteriorado”, afirma.




    Confinamento e falta de terras


    Para o antropólogo, suicídios, assassinatos banais, agressões, roubos, abuso de álcool e drogas foram potencializados, ou até mesmo iniciados, no ambiente das reservas – pequenas áreas de terras onde os indígenas foram confinados no Mato Grosso do Sul ao serem expulsos de seus territórios. Pimentel explica que o que se pode constatar em depoimentos dos indígenas e também a partir dos registros históricos. “Não é que essas coisas não existissem – a questão é que elas passaram a acontecer de forma descontrolada, epidêmica mesmo. Os suicídios, por exemplo: os mais velhos se lembram de ter visto um ou outro caso ao longo da infância e da juventude. De repente, a partir do início dos anos 80, são dezenas de casos! Ou seja, há alguma coisa errada com o ambiente das reservas”, conclui o antropólogo.


    Tomando por base os municípios analisados pelo relatório da Flacso no estado, em todos há incidência de reservas indígenas criadas que geram confinamento. Não só isso: a falta de demarcação territorial está diretamente ligada a essa situação endêmica. “A existência física dos índios de MS, e especialmente dos Guarani e Kaiowá, já está em risco. A relação entre a violação do direito territorial e as violações de direitos humanos é direta. As reservas são, sim, um ambiente que está propiciando aos indígenas uma condição de existência capaz de levar a sua destruição e ameaçando sua integridade física e mental”, afirma Pimentel.


    Para o especialista, o Estado brasileiro é um dos principais promotores de tal contexto quando, na verdade, deveria presar pelo cuidado a estes modos plurais e diferenciados de vida. “O que o Estado brasileiro faz com esses indígenas é um atentado, porque está forçando-os a deixarem de ser indígenas para que possam ser aceitos como cidadãos. O Estado coloca-os numa situação tal que é inevitável, para muitos, abandonar os elementos mais caros a esses povos, em termos de seus valores tradicionais”, explica Pimentel. Com isso, as dissociações tornam-se inevitáveis e o combustível para o processo corrente de genocídio, assim nomeado por organismos internacionais.


    Os Guarani formam um povo que, segundo os relatos dos cronistas, abasteceu de uma forma generosa os europeus que aqui chegaram no século XVI. Dominavam técnicas de agricultura que lhes garantiam uma vida saudável e farta. Hoje, muitos não têm terra para plantar meia dúzia de pés de mandioca. Passam fome, dependem de doações do governo… isso impacta suas vidas de forma direta”, encerra o antropólogo.


    Exploração sexual infanto-juvenil no AM

    Tomando o contexto que envolve a pandemia de suicídios de crianças e jovens indígenas no país, conforme o estudo da Flacso, o Tribunal Regional Federal (TRF) da 1ª. Região, em Brasília, determinou no último dia 22 de junho o bloqueio de bens no valor total de R$ 5 milhões de dez acusados pelos crimes de estupro de vulnerável e abuso sexual de crianças e adolescentes indígenas do município de São Gabriel da Cachoeira (a 860 quilômetros de Manaus), norte do Amazonas. A informação é do site Amazônia Real.

    Os dez réus foram presos em 2013 pela Polícia Federal. Conforme a denúncia do Ministério Público Federal (MPF), eles são acusados de crimes como corrupção de menores, satisfação de lascívia mediante presença de criança ou adolescente, favorecimento da prostituição de vulnerável e rufianismo (tirar proveito da prostituição alheia). No grupo há comerciantes, políticos e servidores públicos do município. Duas mulheres são acusadas de aliciarem garotas indígenas para o bando criminoso.

    Em São Gabriel da Cachoeira, entre 2009 e 2013, conforme o relatório da Flacso, do total de suicídios registrados 91,7% são de indígenas, sendo deste número o extrato de 33,3% de crianças e jovens indígenas. De acordo com o número total de suicídios no município, 30,6% foram de crianças e jovens indígenas que não tiveram alternativa a não ser tirar a própria vida.



    Os suicídios no Relatório de Violências do Cimi

    De acordo com a última edição do Relatório de Violências Contra os Povos Indígenas do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) 135 indígenas cometeram suicídio em 2014. Este número configura-se como o maior em 29 anos. O Mato Grosso do Sul continua sendo o estado que apresenta a maior quantidade de ocorrências, com o registro de 48 suicídios, totalizando 707 casos registrados de suicídio no estado entre 2000 e 2014.

    O relatório destacou ainda o preocupante o alto número de casos registrados no Distrito Sanitário Especial Indígena (Dsei) Alto Rio Solimões, localizado no Amazonas, onde são atendidos os povos Tikuna, Kokama e Caixana. Somente neste Dsei foram registrados 37 casos de suicídio em 2014. Nesta quarta-feira, dia 29, o presidente o presidente do Cimi e arcebispo de Porto Velho, dom Roque Paloschi, foi recebido pelo Papa Francisco, no Vaticano. Dom Roque entregou ao Papa o Relatório de Violência contra os Povos Indígenas.

    Read More
  • 30/06/2016

    Presidente do Cimi denuncia violações contra povos indígenas ao Papa

    Nesta quarta-feira (29), o presidente do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) e arcebispo de Porto Velho, dom Roque Paloschi, foi recebido pelo Papa Francisco, no Vaticano. Dom Roque entregou ao Papa o Relatório de Violência contra os Povos Indígenas de 2014 e uma carta, na qual agradece a atenção que o pontífice tem dedicado à questão indígena e comunica as dificuldades enfrentadas pelos povos indígenas no Brasil.


    “Vivemos no Brasil uma situação desesperadora diante do sofrimento dos nossos primeiros habitantes”, afirma dom Roque em sua carta. “A indiferença, o avanço dos grandes projetos do agronegócio, a construção da grandes hidrelétricas, a mineração, e a devastação do meio ambiente em general. Isso tudo traz consequências desastrosas aos povos indígenas”.

    O presidente do Cimi também citou a situação de extrema vulnerabilidade vivenciada pelos Guarani e Kaiowá no Mato Grosso do Sul, vítimas de um recente ataque paramilitar em Caarapó, que resultou no assassinato do indígena Clodiodi Aquileu Rodrigues de Souza. Os Guarani Kaiowá tem visto o direito às suas terras ser negado, além de sofrerem repetidas violências de grupos paramilitares e o continuado descaso do próprio Estado”, afirma dom Roque na carta endereçada ao Papa.

    Em diversas ocasiões, o Papa Francisco se pronunciou em relação à importância do respeito aos povos indígenas e sobre a necessidade de se “procurar outras maneiras de entender a economia e o progresso, o valor próprio de cada criatura, o sentido humano da ecologia, a necessidade de debates sinceros e honestos”, como escreveu na Encíclica Laudato Si (Louvado Sejas), divulgada em junho de 2015 com o tema “Sobre o Cuidado da Casa Comum”.

    O pontífice tem manifestado sua preocupação com as crises social e ambiental que o mundo contemporâneo enfrenta e reconhecido as importantes contribuições dos povos originários. Em encontros com indígenas na Bolívia e no México, em 2015, o Papa Francisco pediu perdão aos povos indígenas, em nome da Igreja, “pelos crimes cometidos contra os povos nativos durante a chamada conquista da América”.

    “Somos profundamente agradecidos pela sua ternura e proximidade com os povos originários do mundo”, afirma dom Roque Paloschi na carta entregue ao Papa durante cerimônia na Basílica de São Pedro. “Contamos com a sua oração e bênção aos povos originários do Brasil”, conclui, assinalando que Francisco será bem-vindo quando visitar o país.


    Leia, abaixo, a íntegra da carta do presidente do Cimi, dom Roque Paloschi, ao Papa Francisco:


    Roma, 29 de junho de 2016.

    Santo Padre,

    Em primeiro lugar, desejo agradecer a confiança pela minha nomeação como arcebispo de Porto Velho-Rondônia na Amazônia brasileira.

    Peço a sua bênção e a sua oração para que eu possa viver a missão nos caminhos da simplicidade e humildade, sendo um irmão entre os irmãos e irmãs.

    Mas hoje também quero suplicar uma bênção muito especial para uma outra missão que a Igreja do Brasil me confiou: animar e acompanhar missionários e missionárias do Brasil que trabalham junto aos povos indígenas, como presidente do Conselho Indigenista Missionário – CIMI.

    Somos profundamente agradecidos pela sua ternura e proximidade com os povos originários do mundo, como sentimos na sua Encíclica Laudato Si, nos encontros na Bolívia, México e em outros pronunciamentos.

    Vivemos no Brasil uma situação desesperadora diante do sofrimento dos nossos primeiros habitantes; a indiferença, o avanço dos grandes projetos do agronegócio, a construção da grandes hidrelétricas, a mineração, e a devastação do meio ambiente em general. Isso tudo traz consequências desastrosas aos povos indígenas. A ONU tem denunciado em particular a violência contra os Guarani Kaiowá no Mato Grosso do Sul. Os Guarani Kaiowá tem visto o direito às suas terras ser negado, além de sofrerem repetidas violências de grupos paramilitares e o continuado descaso do próprio Estado. Estudiosos chegam a afirmar haver um genocídio do povo Guarani Kaiowá.

    Queremos agradecer o seu apoio ao trabalho da Comissão Episcopal para a Amazônia coordenado pelo seu amigo particular Cardeal Claudio Hummes. Alegra-nos muito o seu carinho para com a REPAM – Rede Eclesial Pan-Amazônica e também sua atenção e estima pelo trabalho do CIMI.

    Trago aqui o relatório de violência contra os povos indígenas, produzido pelo Conselho Indigenista Missionário. Santo Padre, isso só nos entristece e nos envergonha como brasileiros e cristãos. Mas posso lhe assegurar que há um grande número de missionários e missionárias que vivem martirialmente junto aos povos indígenas, na defesa da vida e da criação. Contamos com a sua oração e bênção aos povos originários do Brasil.

    Estamos nos preparando para sua visita ao Brasil em comemoração aos trezentos anos de Nossa Senhora Aparecida. Povos indígenas já sonham e aguardam uma visita sua, em qualquer lugar do Brasil onde estejam, como sinal de seu amor paternal aos primeiros habitantes de nossas terras ameríndias.

    Obrigado e conte sempre com minha estima e prece.

    Roque Paloschi
    Arcebispo de Porto Velho e Presidente do Cimi


    Fotos: serviço fotográfico do Vaticano

    Read More
  • 29/06/2016

    Povo Tupinambá faz apelo às autoridades pedindo o fim da violência contra indígenas



    Caciques e lideranças Tupinambá reunidos em Olivença, sul da Bahia, divulgaram na manhã desta quarta-feira, 29, um comunicado pedindo o fim da violência e do preconceito contra os povos indígenas. A manifestação é dirigida às autoridades brasileiras e organismos internacionais diante das repetidas violações de direitos humanos dos povos indígenas no Brasil.


    O Massacre de Caarapó, perpetrado por fazendeiros contra a aldeia Tey’i Jusu e que terminou com o assassinato do Guarani e Kaiowá Clodiodi Aquileu Rodrigues de Souza, no último dia 14 de junho, além de outros seis baleados por tiros de arma de fogo, gerou revolta entre os Tupinambá.


    Nós, povos indígenas, sofremos quase que diariamente com ataques, criminalização e perseguições. Se não bastasse o sangue que nossos antepassados derramaram por essa Terra com o genocídio sofrido pelo povo indígena brasileiro”, destaca trecho do comunicado. Os Tupinambá lembram que essa política de genocídio nasce no próprio Estado brasileiro, que com medidas Executivas e Legislativas tentam descontruir os direitos indígenas.


    Os Tupinambá lembram ainda das declarações de ódio feitas pelos ruralistas. “Assim como acontece com os parentes Guarani Kaiowá, nós também sofremos ataques de milícias armadas, e de muitos interesses políticos da região. Aproveitamos para repudiar todas as declarações caluniosas que são feitas aos nossos povos e pedimos providências da Justiça brasileira e dos órgãos internacionais de Direitos Humanos contra estas declarações”, diz trecho do comunicado.


    Leia o comunicado na íntegra:


    CHEGA DE VIOLÊNCIA E PRECONCEITO CONTRA OS POVOS INDÍGENAS.


    Nós, povo Tupinambá da região sul da Bahia queremos mostrar o nosso apoio e solidariedade ao povo Guarani e Kaiowá, e nossa total comoção, revolta e indignação com os recentes e constantes ataques contra nossos parentes. Nós povo indígena sofremos quase que diariamente com ataques, criminalização, e perseguições. Se não bastasse o sangue que nossos antepassados derramaram por essa Terra com o genocídio sofrido pelo povo indígena do Brasil. Nos tempos de hoje continuam a nos atacar, perseguir, criminalizar. Em fim não se contentaram com os ataques aos povos com a criação da PEC 215, PLP 227, portaria 303 da AGU. Resolveram voltar ao tempo dos coronéis e a ordem agora é matar e extinguir os povos indígenas no Brasil; o que já começou com os parentes Guarani Kaiowá. Queremos chamar a atenção da população brasileira e internacional para o que esta prestes a acontecer com nosso país. Ruralistas difamam e acusam que nós povos indígenas somos um empecilho para o progresso, mas não percebem que nós estamos aqui para ajudar a manter e proteger nosso maior tesouro, que é a mãe natureza – sem falar que são eles que são “donos” de quase todo território nacional, representando 1% da população brasileira. A outra parte das terras fica para ser dividida com o restante dos brasileiros. A população precisa abrir os olhos, porque eles querem acabar com nosso Brasil.


    Com nós, povo Tupinambá de Olivença situado nos municípios de Ilhéus, Una e Buerarema, Bahia, não é diferente e também estamos sofrendo com os ataques políticos e a tiros. Na região já são cerca de 30 assassinatos de indígenas por conta dos conflitos relacionados ao processo de demarcação de terra, que vem rolando há cerca de 16 anos sem resposta concreta do governo federal. Agora recentemente o interesse sobre o nosso território vem através dos mineradores que visam tirar de nossa terra toda areia e minérios que ainda não conseguiram nos roubar, mais os grandes empreendimentos que vem cada vez mais ocupando espaços em nossa região. Enquanto isso, mais uma vez sofremos: sem nossa Terra sagrada que o sangue de nossos antepassados foi derramou não temos como viver, porque a Terra é nossa Mãe e Mãe não se negocia.


    Assim como acontece com os parentes Guarani Kaiowá, nós também sofremos ataques de milícias armadas e de muitos interesses políticos da região. Aproveitamos para repudiar todas as declarações caluniosas que são feitas aos nossos povos e pedimos providências da Justiça brasileira e dos órgãos internacionais de Direitos Humanos contra estas declarações que só incentivam e aumentam o preconceito e ódio contra o nosso povo, a exemplo das diversas declarações do deputado federal Luís Carlos Heinze (PP/RS) – assista aqui; e o último vídeo, onde ele faz acusações e diz mentiras sobre o processo de demarcação de nossa Terra no sul da Bahia – assista aqui.


    Querem nos exterminar, mas cada vez que morre um índio serve como semente e brotam novos guerreiros, pois enquanto houver índio haverá luta pelo que é nosso por direito, que é a Terra!! É preciso resistir para existir.


    Olivença, 20 de junho de 2016.


    Caciques e lideranças Tupinambá.

    Read More
  • 28/06/2016

    Comissão Interamericana de Direitos Humanos condena assassinato de Guarani e Kaiowá


    Washington, D.C. – A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) condena o assassinato de Clodiodi Aquileu Rodrigues de Souza, um líder indígena Guarani-Kaiowá de 26 anos, da comunidade de Dourados-Amambai Pegua I, em Mato Grosso do Sul, Brasil. A CIDH manifesta sua preocupação com os altos índices de atos de violência contra as comunidades indígenas Guarani-Kaiowá, especialmente no estado de Mato Grosso do Sul, e urge o Estado brasileiro a que investigue esse assassinato de maneira imediata e com a devida diligência para julgar e punir os responsáveis e evitar sua repetição.

    Segundo informações recebidas pela CIDH em 14 de junho de 2016, vários integrantes da comunidade Dourados-Amambai Pegua I se encontravam na Fazenda Yvu ocupando uma área pertencente às terras ancestrais que estão reivindicando. Os fatos indicam que foram cercados por um grupo de pessoas armadas que atiraram contra eles, resultando na morte de Clodiodi Aquileu Rodrigues de Souza e ferindo outros seis integrantes da comunidade, inclusive uma criança de 12 anos.

    A Comissão observa que existem indícios de que esse assassinato tenha sido perpetrado em represália à reivindicação territorial dos integrantes da comunidade de Dourados-Amambai Pegua I, e que tenha sido supostamente resultado da atuação de grupos paramilitares contratados por fazendeiros. É importante destacar que os fatos são parte de um conflito territorial caracterizado pela falta de demarcação e titulação de terras ancestrais indígenas por parte dos órgãos pertinentes do Governo.

    A CIDH destaca com preocupação que o estado de Mato Grosso do Sul tem o mais alto número de assassinatos de líderes indígenas do país e que, apesar dos apelos por atenção e das recomendações emitidas pela Relatora Especial das Nações Unidas para os Direitos dos Povos Indígenas, Victoria Tauli-Corpuz, o Estado brasileiro continua sem adotar as medidas urgentes e necessárias para prevenir e punir a violência contra as comunidades indígenas Guarani-Kaiowá.

    A Comissão insta, portanto, o Estado brasileiro a que investigue sem demora e com a devida diligência esses ataques violentos e a que julgue e puna as pessoas responsáveis prontamente. A CIDH também solicita que as autoridades estaduais e federais adotem mediadas imediatas para proteger a vida e a integridade dos membros do povo Guarani-Kaiowá na região.

    A CIDH recorda que os Estados são obrigados a adotar os passos necessários para assegurar o controle efetivo dos povos indígenas sobre seus territórios e a proteger os povos indígenas de atos de violência ou hostilidade por parte de terceiros. Além disso, a Comissão reitera que os povos indígenas e tribais têm direito à prevenção da ocorrência de conflitos com terceiros por causa da propriedade de terras, especialmente nos casos em que o atraso da demarcação, ou a falta dela, tem o potencial de gerar conflitos.

    A CIDH é um órgão principal e autônomo da Organização dos Estados Americanos (OEA), cujo mandato surge a partir da Carta da OEA e da Convenção Americana sobre Direitos Humanos. A Comissão Interamericana tem como mandato promover a observância dos direitos humanos na região e atua como órgão consultivo da OEA na temática. A CIDH é composta por sete membros independentes, que são eleitos pela Assembleia Geral da OEA a título pessoal, sem representarem seus países de origem ou de residência.

    Read More
  • 28/06/2016

    Sobrevivente do Massacre de Caarapó escapa de emboscada dias depois de deixar hospital

    Menos de 48 horas depois de deixar o Hospital da Vida, em Dourados (MS), Simão Guarani e Kaiowá, sobrevivente do Massacre de Caarapó, sofreu emboscada durante a noite de domingo, 26, na casa que divide com a esposa e uma filha na Reserva Tey’i Kue, inserida nos limites de demarcação da Terra Indígena (TI) Dourados Amambai Peguá, município de Caarapó. Antevendo as intenções dos indivíduos não identificados que se aproximavam da moradia, Simão mandou que a mulher fugisse com a filha e ele danou-se pela plantação de mandioca da família em busca de um esconderijo.


    O indígena não conseguiu fugir para mais longe porque ainda se recupera dos tiros que o alvejaram no abdômen e no tórax durante a invasão de fazendeiros no último dia 14 à retomada Yvu, tekoha – lugar onde se é – Tey’i Jusu, TI Dourados Amambai Peguá. A ação criminosa, cujos indícios apontam para o envolvimento de empresa de segurança, terminou com o assassinato do agente de saúde indígena Clodiodi Aquileu Rodrigues de Souza e outros seis Guarani e Kaiowá feridos com gravidade por disparos de arma de fogo, entre eles Simão e uma criança de 12 anos.


    Com lanternas e encapuzados, ao menos três indivíduos, conforme visualização e relato de Simão, vasculharam a moradia. Todavia, não procuraram pelo Guarani e Kaiowá nas imediações da casa, onde está o roçado de mandioca no qual Simão se embrenhou para escapar da emboscada. Na fuga, a filha de Simão caiu e bateu a cabeça, mas sem gravidade – o indígena, a mulher e a criança passam bem. A Força Nacional, enviada ao município de Caarapó depois do massacre, se retirou da aldeia horas antes da emboscada – o contingente policial não tem ficado à noite na terra indígena.


    O caso confirma o temor apresentado pelos parlamentares da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara Federal (CDHM) que no relatório da diligência realizada em Mato Grosso do Sul, entre os dias 15 e 16 de junho, pede à Secretaria de Direitos Humanos, vinculada ao Ministério da Justiça e Cidadania, a inserção dos sobreviventes do Massacre de Caarapó no Programa de Defensores de Direitos Humanos. A CDHM entende que como “testemunhas oculares” do ataque violento, esses Guarani e Kaiowá precisam de proteção.


    O pai dele (Clodiodi) está ameaçado, outro filho em risco de morte no hospital. Não pode ir pra cidade atrás de comida que é ameaçado. E na mídia os fazendeiros ainda dizem que Clodiodi foi atropelado por um caminhão”, diz um Guarani e Kaiowá da TI Dourados Amambai Peguá.


    A banalização do mal


    Em entrevista ao jornal El País, no último dia 16, José Armando Cerqueira Amado, irmão da proprietária da fazenda incidente na retomada Yvu, declarou que os fazendeiros não estavam com armas de fogo ou de bala de borracha, apenas com fogos de artifício. “Essa mentira contam do mesmo jeito que falaram que o Semião Vilhalva (assassinado na Terra Indígena Ñanderú Marangatú em agosto de 2015) foi morto pelos próprios índios. Eles nos matam e ainda dizem que nós é que somos responsáveis pelas mortes”, declarou outro indígena Guarani e Kaiowá da mesma terra indígena.


    Ao programa Notícias Agrícolas, o presidente do Sindicato Rural de Caarapó, Carlos Eduardo M. Marquez, declarou que os “produtores da região” se reuniram para retirar os Guarani e Kaiowá da retomada Yvu, mas que “não houve conflito. Os indíos voltaram para a aldeia, ficaram revoltados e trancaram a estrada. Tinha uma carreta carregada com uma colhedeira. O motorista ficou com medo e atropelou o índio (Clodiodi)”.


    O superintendente do Hospital da Vida, em Dourados, para onde foram encaminhados os Guarani e Kaiowá baleados, declarou ter “certeza absoluta” de que os indígenas foram atingidos por arma de fogo. No caso de Clodiodi, a morte foi causada por dois disparos que o atingiram no tórax, sem nenhum sinal de atropelamento por um veículo de grande porte. Conforme imagens feitas pelos próprios indígenas, o corpo de Clodiodi foi recolhido por seus parentes no interior da fazenda Yvu e ainda com a presença dos fazendeiros na área.


    Os disparos que atingiram de forma fatal Clodiodi, de acordo com o relatório da Comissão de Direitos Humanos da Câmara Federal, teriam sido efetuados por um fazendeiro chamado Virgílio Mata Fogo. “Tio do indígena assassinado, Zenildo Isnarde presenciou o momento dos tiros fatais e socorreu o sobrinho. Ele viu Virgílio atirando no rapaz, tiros que se seguiram mesmo depois de o tio já estar carregando o sobrinho no ombro. “Eles vieram atacando, empurrando. O menino já morreu dentro da aldeia”, conforme trecho do relatório.


    Leia mais: Comissão Interamericana de Direitos Humanos condena assassinato de Guarani e Kaiowá

    Read More
  • 27/06/2016

    Matopiba: mata o Cerrado e seus povos

    Realizada entre os dias 20 e 23 de junho, em Palmas (TO), a III Assembleia dos Povos Indígenas de Goiás e Tocantins reuniu mais de seiscentos indígenas e teve como tema “Na defesa dos Direitos Constitucionais dos Povos Indígenas, resistimos e denunciamos os impactos do Matopiba nos territórios tradicionais”. Marcado pela forte presença de jovens lideranças, o evento proporcionou espaço e tempo para que os nove povos presentes dos dois estados Apinajé, Krahô, Xerente, Karajá de Xambioá, Krahô-Kanela, Kanela do Tocantins, Avá-Canoeiro e Javaé, de Tocantins; e Tapuia, de Goiás – debatessem seus principais desafios locais e as questões mais emblemáticas da difícil conjuntura nacional.


    Os direitos constitucionais dos povos indígenas, os impactos e as implicações do Matopiba nas mudanças climáticas, a desterritorialização dos povos indígenas e das comunidades tradicionais, a educação escolar e a saúde indígena foram os principais temas debatidos. Além da presença de indígenas dos povos Kayapó, do Pará, Guarani e Kaiowá, do Mato Grosso do Sul, e Pataxó Hã-Hã-Hãe, da Bahia, também participaram da Assembleia representantes de comunidades tradicionais, como quebradeiras de coco, quilombolas, ribeirinhos e camponeses, e organizações aliadas como o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) e a Comissão Pastoral da Terra (CPT).

    Membros de instituições do Estado, como o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Não Renováveis (Ibama), o Naturantins, a Fundação Nacional do Índio (Funai) e a Secretaria Estadual de Educação do Tocantins, dentre outros, foram duramente questionados pelos indígenas sobre a implementação das políticas públicas específicas e, especialmente, pela ausência delas. A coordenadora do Distrito Especial de Saúde Indígena (Dsei) de Tocantins, Ivanezilha Noleto, foi repudiada pelos indígenas por não ter comparecido ao debate.

    De modo geral, o eixo central da Assembleia foi a resistência ao Plano de Desenvolvimento Agrário (PDA) Matopiba – a última fronteira agrícola do Brasil, sendo implantada nos estados de Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia – e a todos os outros projetos de infraestrutura e os que tramitam no Congresso Nacional, que violam os direitos constitucionais indígenas.


    Na tarde do dia 22 foi realizada uma caminhada pelas avenidas centrais de Palmas em que os indígenas e seus aliados explicavam à população como o Matopiba irá agravar ainda mais a destruição do Cerrado, expulsando os povos indígenas e as comunidades tradicionais de seus territórios. Os participantes foram até a Assembleia Legislativa do estado, onde entregaram um documento aos deputados manifestando o seu repúdio a este projeto do agronegócio brasileiro e internacional. Diversos rituais foram realizados na Assembleia, onde através de seus rituais, cantos e danças os povos expressaram a importância de defender os diversos modos de vida presentes no Brasil.

    “As pessoas não enxergam que somos as sementes da nossa MãeTerra, que somos as flores dos nossos rios, o nosso Pai, que somos os brotos dos tempos que virão. O governo não nos respeita. Estão acabando com toda a vida por causa de dinheiro. Os hospitais estão cheios de gente que come veneno todo dia. Estão acabando com as nossas terras, com nossa saúde. Mas mesmo assim não vamos nos calar”, afirmou Gercília Krahô, evidenciando a força e determinação dos povos indígenas em defenderem seus direitos e a própria vida.

    Leia aqui o documento final da III Assembleia dos Povos Indígenas de Goiás e Tocantins na íntegra. 

    fotos: Helen Lopes

    Read More
  • 24/06/2016

    Indígenas do Acre e do sudoeste do Amazonas reivindicam direitos constitucionais em Brasília


    Nesta semana, indígenas do Acre e do sudoeste do Amazonas estiveram em Brasília cobrando o cumprimento de seus direitos constitucionais a órgãos públicos e pressionando parlamentares para que não apoiem projetos de lei danosos para os povos indígenas. Eles também entregaram uma carta aberta a parlamentares, órgãos do Executivo e ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), na qual reivindicam o fortalecimento da Fundação Nacional do Índio (Funai) e a participação dos povos indígenas na elaboração e execução das políticas públicas indigenistas.

    Os quinze representantes dos povos Huni Kui, Yawana, Ashaninka, Manchineli, Madja, Apurinã, Jaminawa e Nawa participaram de reuniões na Funai, na Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), na Sexta Câmara do Ministério Público Federal (MPF) e com parlamentares, nas quais posicionaram-se contra propostas como a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 215 – que pretende submeter a demarcação de terras indígenas aos desígnios do Congresso Nacional e inclui uma série de dispositivos que, na prática, inviabilizariam as demarcações – e o Projeto de Lei (PL) 1610, de autoria do senador e ministro afastado Romero Jucá (PMDB-RR), que pretende liberar a mineração em terras indígenas.

    Em sua visita ao Congresso Nacional, prestaram também solidariedade aos parentes Guarani e Kaiowá, vítimas do massacre que deixou um indígena morto e pelo menos seis feridos em Caarapó (MS), e exigiram que os parlamentares se manifestassem sobre o ocorrido. Em visita ao STF, os indígenas acompanharam sessão do plenário e entregaram aos ministros documentos contra o marco temporal.


    Conflitos e omissão do Estado

    A delegação de lideranças indígenas do Acre e do sudoeste do Amazonas também tratou de problemas locais das comunidades indígenas da região. Apesar de muito diversos, a grande maioria dos casos envolve demora na demarcação de seus territórios tradicionais e a pressão de madeireiros, fazendeiros e de outros empreendimentos sobre suas terras.

    “A maioria das lideranças que estão aqui são de terras que não estão demarcadas, e os representantes das únicas duas terras demarcadas enfrentam outros tipos de ameaças, como invasões e ameaças”, afirma Ninawa Huni Kui, liderança da Terra Indígena (TI) Curralinho, no Acre, e presidente da Federação do Povo Huni Kui.

    Segundo Ninawa, os indígenas cobraram providências e acompanhamento da Funai e do MPF em relação a várias questões urgentes, como a invasão das terras indígenas por madeireiros, fazendeiros e grileiros e inclusive a ocorrência de ameaças de morte, como tem ocorrido com lideranças da TI São Paulino, do povo Jaminawa. Dois anos atrás, o MPF determinou a retirada de invasores da área, que ainda encontra-se em fase de estudo pela Funai. Segundo os indígenas, tal ação não foi concluída e os indígenas seguem sendo pressionados e ameaçados.

    Um problema grave que ocorre em pelo menos dois territórios da região – as TIs Curralinho, dos Huni Kui, e Kayapuka, dos Jaminawa – é a distribuição de títulos de terras dentro das áreas de ocupação tradicional indígenas pelo Estado, por meio do programa Terra Legal.

    “O governo do estado está distribuindo títulos para não indígenas, loteando a terra em estudo pela Funai e isso está gerando grandes conflitos, porque as pessoas recebem títulos e agora querem proibir os indígenas de andarem por onde eles já viviam sua vida tradicional. Essas pessoas são influenciadas por políticos do estado, a gente tem denunciado isso mas não tem obtido resultado”, afirma Ninawa.

    No caso da Terra Indígena Nawa, no Acre, o conflito se dá com o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), vinculado ao Ministério do Meio Ambiente. O órgão é responsável pela administração do Parque Nacional da Serra do Divisor, unidade de conservação sobreposta ao território tradicional dos Nawa.

    Em caso semelhante ao enfrentado pelos Pataxó no sul da Bahia, os indígenas denunciam recorrentes casos de pressão e inclusive de violência por parte de funcionários do órgão governamental, que, segundo os indígenas, afirmam que os Nawa ‘não são índios’, que vão expulsá-los da área. Os indígenas são impedidos de praticar sua agricultura de subsistência e são onerados com pesadas multas do órgão ambiental – há famílias multadas em até 180 mil reais.

    A biopirataria e a extração de gás de xisto por meio de fracking na região do Vale do Juruá, suspensa em liminar após ação do MPF, são outros exemplos da ampla gama de preocupações expressas pelos indígenas.


    Cobranças à Sesai

    As lideranças dos povos do Acre e do sudoeste do Amazonas também cobraram da Sesai um melhor atendimento nos Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEIs) de Juruá e Purus, que atendem a região. “Estamos no sexto mês do ano de 2016 e já temos 15 óbitos de crianças”, critica a Organização das Mulheres Indígenas do Acre, Sul do Amazonas e noroeste de Rondônia (Sitoakore) em carta entregue à Sesai.

    A organização das mulheres indígenas da região também afirma que o saneamento básico é precário. “Tem aldeia que os indígenas compram e pegam água da cidade para beber e levar água nos seus próprios barcos para abastecer as casas da comunidade”.

    Em reunião com a Sesai, as lideranças que estiveram presentes em Brasília cobraram a qualificação das equipes multidisciplinares que atuam na região, maior presença nas aldeias e a maior abertura para a participação indígenas nas instâncias de decisão do órgão.

    Clique aqui para ler a “Carta aberta da delegação do Acre e Sudoeste do Amazonas”.

     

    Read More
  • 24/06/2016

    CDHM relata presença de policiais e fazendeiros em Tey’i Jusu um dia antes do Massacre de Caarapó



    O relatório entregue nesta quinta-feira, 23, pelos parlamentares da Comissão de Direitos Humanos e Minorias (CDHM) da Câmara Federal sobre diligência realizada no Mato Grosso do Sul, nos últimos dias 15 e 16, revela que policias do Departamento de Operações de Fronteira (DOF) e as polícias Militar e Federal estiveram na retomada Yvu, tekoha – lugar onde se é – Tey’i Jusu, município de Caarapó, um dia antes do ataque aos Guarani e Kaiowá que culminou no assassinato do indígena e agente de saúde Clodiodi Aquileu Rodrigues de Souza, de 23 anos (velório acima, na foto de Ana Mendes/Cimi). Os policiais estavam com os fazendeiros que no dia seguinte invadiram a retomada de forma violenta – o que deixa a entender que as autoridades policiais no estado sabiam do risco de um ataque contra a comunidade Guarani e Kaiowá.


    Assista: Massacre de Caarapó – Ataque contra o tekoha Tey’i Jusu 


    A comitiva confirmou ainda que o indígena Valdir Gonçalvez, de 14 anos, segue desaparecido, sem nenhuma notícia de paradeiro por parte dos indígenas, e verificou um sem fim de cartuchos espalhados pela retomada Yvu. De acordo com o relatório apresentado pelos parlamentares, o fazendeiro conhecido como Virgílio Mata Fogo afirmou aos Guarani e Kaiowá, na presença dos policiais, que caso a comunidade não saísse da área retomada ele iria “resolver do meu jeito (SIC)”. No dia seguinte, conforme o documento da CDHM, Virgílio coordenou o ataque que terminou no Massacre de Caarapó junto com outros dois fazendeiros chamados de Camacho e Japonês.


    No dia seguinte (14/06) cerca de 200 caminhonetes retornaram, com “pistoleiros, fazendeiros e mais o sindicato rural Famasul”, e já chegaram atirando. Segundo os indígenas, os ataques foram “sem piedade”, “não para assustar, mas para matar”, desferidos principalmente pelo fazendeiro conhecido como Virgílio. O ataque durou entre nove e 13 noras, aproximadamente”, diz trecho do relatório. Clodiodi foi assassinado e outros seis indígenas foram hospitalizados com tiros na cabeça, tórax e abdômen, entre eles uma criança de 12 anos.


    Os disparos que atingiram de forma fatal Clodiodi, de acordo com o relatório, foram efetuados por Virgílio Mata Fogo. “Tio do indígena assassinado, Zenildo Isnarde presenciou o momento dos tiros fatais e socorreu o sobrinho. Ele viu Virgílio atirando no rapaz, tiros que se seguiram mesmo depois de o tio já estar carregando o sobrinho no ombro. “Eles vieram atacando, empurrando. O menino já morreu dentro da aldeia”, conforme trecho do relatório.


    De acordo com as vítimas adultas que falaram os parlamentares ainda internadas no Hospital da Vida, em Dourados, foi Virgílio também quem desferiu os tiros nelas. A imprensa sul-mato-grossense e os vídeos feitos pelos indígenas revelaram ainda a presença de indivíduos de uma empresa de segurança ainda não identificada. Os parlamentares da CDHM entraram com pedido junto à Secretaria Nacional de Direitos Humanos, agora parte do Ministério da Justiça, para que as vítimas que sobreviveram ao Massacre de Caarapó sejam inseridas no Programa de Proteção de Defensores de Direitos Humanos, pois “são testemunhas oculares” do ataque.


    Os fazendeiros queimaram ainda uma maloca, motos, todos os poucos pertences dos indígenas e depois enterraram tudo numa vala aberta por um trator. Em um dos vídeos captados pelos celulares dos Guarani e Kaiowá, o mesmo trator tenta recolher um amontoado de pertences dos indígenas para enterrar. Os Guarani e Kaiowá não permitiram: ali estava o corpo de Clodiodi, que também seria atirado na vala. As últimas informações apuradas dão conta de que a Polícia Federal e o Ministério Público Federal (MPF) investigam os mandantes e presentes no ataque, além dos autores dos disparos que mataram Clodiodi e atingiram outros seis Guarani e Kaiowá.


    Os parlamentares afirmam no relatório da CDHM que solicitaram audiências com o ministro da Justiça Alexandre Moraes, para quem pediram ainda a permanência da Força Nacional na região, com o Procurador-Geral da República Rodrigo Janot e com o Diretor-Geral da Polícia Federal, mas em nenhum dos três casos datas para o encontro foram agendadas pelos órgãos. Na diligência, que percorreu outras terras indígenas fora a Dourados Amambai Peguá, estiveram presentes o presidente da CDHM, deputado Padre João (PT/MG) e o 1º Vice-presidente, deputado Paulo Pimenta (PT/RS). Além deles, os deputados federais sul-mato-grossenses Vander Loubet (PT/MS) e Zeca do PT (PT/MS).


    Terra indígena declarada pelo Estado


    A retomada Yvu, do tekoha Tey’i Jusu, faz parte da Terra Indígena Dourados Amambai Peguá e fica a 20 km de Caarapó. Em 12 de maio deste ano, a terra indígena foi declarada e delimitada pela Fundação Nacional do Índio (Funai), vinculada ao Ministério da Justiça, no Diário Oficial da União. Outros tekoha fazem parte da terra, que ainda abrange a Reserva Indígena Tey’i Kue – criada na década de 1930 para confinar os Guarani e Kaiowá expulsos de seus territórios tradicionais contra a vontade. Essas terras passavam a ser consideradas devolutas e entregues às frentes de colonização sulistas.

    Read More
  • 23/06/2016

    Matopiba é morte, queremos a vida

    Um forte vento se uniu às vozes, aos gritos e clamores contra o projeto de morte denominado Plano de Desenvolvimento Agrícola (PDA) Matopiba no segundo dia da III Assembleia dos Povos Indígenas de Goiás e Tocantins. A capital tocantinense Palmas está sendo o palco desse histórico evento onde os povos originários se unem aos quilombolas, camponeses, outras comunidades tradicionais e acadêmicos para, juntos, traçarem estratégias para o enfrentamento desse modelo de desenvolvimento extremamente predador, destruidor, criminoso e genocida que está sendo implantado com euforia e aval do governo e apoiado com recursos públicos.


    “Nós não vamos deixar o Matopiba passar”, exclamou a liderança Krahô, Gercília (na foto acim, ao lado do procurador da 6ª Câmara do Ministério Público Federal (MPF), Felício Pontes). “O Rio Vermelho está morrendo. Eu protejo o rio sagrado. Não vamos deixar roubarem nossas terras e matarem os rios e as matas. Falo do que está dentro do meu coração, não sei falar bonito em português, mas quero dizer a vocês que o Matopiba não vai vingar”, garantiu ela.

    Clique aqui para acessar o folder sobre o Matopiba produzido para a III Assembleia dos Povos Indígenas de Goiás e Tocantins.

    Em sua fala, Antônio Apinajé destacou a gravidade do momento de sérias ameaças à vida e ao futuro das comunidades e aldeias “A gente fica atordoado, perturbado com esses projetos como o Matopiba. Estamos construindo união com os quilombolas e camponeses na defesa da Mãe Terra. Precisamos lutar juntos, fortalecer a cultura, nossas raízes, para ter mais força no enfrentamento com esses poderosos”.

    O secretário executivo do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Cleber Buzatto, chamou atenção para a agressividade com que os setores anti-indígenas estão desconstruindo direitos e conquistas dos povos indígenas nas últimas décadas. “É preciso dar continuidade à mobilização permanente dos povos indígenas, ampliando suas alianças com as populações do campo”.

    Rituais de vida e resistência

    Ivo Poletto, assessor do Fórum de Mudanças Climáticas e Justiça Social (FMCJS), que há décadas vem acompanhando e denunciando a destruição do Cerrado, lembrou que, na verdade, o Matopiba é a reedição de projetos como o Prodecer, implantado pelo ditador Geisel, em 1978, com a entrega de grande parte do Cerrado a multinacionais japonesas. Agora, a mesma lógica se repete. “É uma loucura o que está sendo feito”, enfatizou, conclamando os indígenas a serem: “profetas da Vida… Tenham amor e respeito sagrado pela Terra. O Cerrado também diz um ‘não’ desesperado a esse desastre total. Dêem a vossa mensagem do Bem Viver”.

    Para o procurador da 6ª Câmara do Ministério Público Federal (MPF) Felício Pontes “o Matopiba é o projeto final de destruição do Cerrado”. Ele destacou que a voracidade com que o atual modelo capitalista suga os recursos naturais está baseada em quatro pilares: madeira, pecuária, monocultura e mineração”. Esse modelo caminha celeremente para o esgotamento, deixando em seu caminho rastros de morte e destruição. Alertou para as gravíssimas consequências de semelhantes projetos, não apenas para o Cerrado, com fortes impactos sobre praticamente todos os biomas, em especial a Amazônia, que tem os berços de seus mananciais de água no Cerrado.

    Felício destacou o fato de ser uma obrigação constitucional do Ministério Público a defesa das populações atingidas por esses projetos e sugeriu ações e debates que dêem visibilidade a essa grave situação. Nesse sentido, ele propôs a realização de uma audiência pública sobre o Matopiba, a ser realizada em Brasília no segundo semestre deste ano. Apresentando dados e números, Felício explicitou como os governos vêm destinando recursos públicos para promover a destruição. “É contra esses monstros que temos que lutar”, concluiu.


    Já o procurador Álvaro Manzano, de Palmas, afirmou que a continuidade do modelo desenvolvimentista gera grave desagregação social nas populações do Cerrado.

    Alfredo Wagner Berno de Almeida, professor da Universidade Federal do Amazonas (UFAm), mostrou o descalabro do momento atual, onde sequer existe uma definição clara sobre o “lugar institucional” dentro do Estado brasileiro para resolver a questão da demarcação das terras indígenas e titulação dos territórios quilombolas. E neste quadro caótico de desconstrução de direitos, o agronegócio avança incontrolavelmente.

    A partir de dados, ele evidenciou a importância dos espaços das terras coletivas, demarcadas ou reivindicadas, e que poderiam configurar uma esperançosa garantia de vida das populações e da natureza. No entanto, infelizmente, apesar das garantias legais e constitucionais, elas não estão seguras diante da voracidade do atual modelo de desenvolvimento, que pretende explorar os bens comuns presentes nos territórios tradicionais. Todos os direitos estão ameaçados.

    “Estamos numa encruzilhada. Temos que admitir nossas fraquezas, contradições e esfacelamentos. É preciso unir as forças e escolher um novo caminho. Estivemos imobilizados por muito tempo. É hora de fazer os enfrentamentos locais, somar as resistências locais e ir somando forças”, considerou Wagner.

    Luta comum

    Os debates realizados nestes dois dias de Assembleia explicitaram que é urgente avançar na unificação das lutas. É preciso enfrentar as estratégias do agronegócio e de suas corporações genocidas sem medo.

    Na tarde de ontem (22), os mais de seiscentos indígenas dos dez povos presentes no evento, juntamente com diversos representantes dos quilombolas, sem terra e de comunidades tradicionais, como as quebradeiras de coco, além de pesquisadores e integrantes de organizações da sociedade civil, realizaram uma caminhada pelo centro de Palmas.

    Durante o trajeto, explicaram os graves impactos que o Matopiba irá causar a todos e conclamaram a população para se unir aos lutadores pela Vida para “defender nossos rios, nossa água, o Cerrado e a nossa Casa Comum”.


    Cerca de 500 cruzes de madeira, simbolizando o longo processo de extermínio e destruição do capitalismo já realizado e denunciando os severos impactos futuros deste de aprofundamento deste sistema, foram fincadas em uma das praças centrais da cidade. Um folheto distribuído à população trazia relevantes informações sobre as graves consequências da destruição da vida pelo atual modelo de desenvolvimento:

    “Vocês estão percebendo que o Rio Tocantins está morrendo? Ele está cada dia mais estreito, e está pedindo socorro. É pelo desmatamento que, em média, desaparecem dez pequenos rios no Cerrado, por ano… Territórios livres, florestas sagradas, fontes de águas puras! Vamos somar, unir forças na defesa da nossa Mãe Terra. Se a Casa é Comum, a luta também é Comum”.

    O final da manifestação foi na Assembleia Legislativa do estado, onde foi entregue um documento com vários questionamentos sobre projetos aprovados pelos deputados:

    “Queremos também dizer o nosso ‘NÃO’ ao projeto Matopiba que, com os correntões da morte, ameaça destruir o Cerrado, no qual apenas restam menos de30% da vegetação nativa. Caso esse projeto seja implementado, em poucos anos, não restará mais nada do Cerrado. Estaremos sujeitos a uma catastrófica falta de água. E a água que restar estará cada vez mais contaminada e escassa, pois as nascentes secarão e nossos rios serão mortos.”

    texto e fotos: Egon Heck
    Cimi GOTO
    Palmas, 23 de junho de 2016

    Read More
Page 389 of 1208