• 12/09/2016

    Criança Guajajara morre e outra tem 60% do corpo queimado em incêndio na Terra Indígena Bacurizinho

    M.G Tenetehar/Guajajara, de 6 anos, morreu na manhã deste domingo, 11, em decorrência de queimaduras sofridas no incêndio que consome há semanas a Terra Indígena Bacurizinho, município de Grajaú, Maranhão. M.G estava com N.S Tenetehar/Guajajara, uma outra criança de 11 anos que está internada na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) do Hospital São Rafael, em Imperatriz, com 60% do corpo queimado. Na imagem acima, focos de incêndios na região do município de Grajaú captados pelos satélites do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). 

    Os garotos saíram da aldeia Pedra para caçar, conforme o hábito. No interior da mata perceberam a rápida chegada das chamas. Tentaram fugir, mas não houve tempo: as labaredas os tinham cercado. Sem alternativa, N.S teve de correr pelo fogo para pedir socorro na aldeia – M.G permaneceu parado esperando a ajuda. Alguns outros Guajajara ouviram os gritos de N.S e foram ajudá-los. Ambos foram levados de moto ao pronto-socorro de Grajaú, e de lá transferidos para Imperatriz. 

    Na manhã de ontem, por volta das 6 horas, M.G, que teve 95% do corpo queimado, não resistiu e morreu. N.S segue em estado grave, se alimenta por sondas, está entubado e respira com a ajuda de aparelhos – fisioterapia respiratória. Os garotos pertenciam ao mesmo grupo familiar: José Vir de Sousa Tenetehar/Guajajara é pai de N.S e avô de M.G, enterrado na manhã desta segunda-feira, 12, na aldeia Planalto, na Terra Indígena Bacurizinho. "O fogo subiu na mata perto da aldeia semana passada. Tinha até apagado, então no sábado os meninos foram caçar", conta José, que permanece com o filho no hospital.

    Uma equipe de saúde da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) acompanha o tratamento da criança no Hospital São Rafael. N.S está sedado. A parte mais atingida foi o abdômen (distendido), o tórax e a cabeça, mas há queimaduras também nas pernas. Cogitou-se a possibilidade de transferir a criança para a capital São Luís, o que os médicos descartaram temendo que o garoto não resista. Hoje à tarde uma comunicado (leia completo abaixo) foi divulgado pela equipe de saúde da Sesai, com atuação na Casa de Saúde do Índio (Casai) de Imperatriz. As secretarias de Saúde e Direitos Humanos do Maranhão foram acionadas e oferecem apoio. 


    Acordo não cumprido

    Uma fonte da Fundação Nacional do Índio (Funai) consultada, servidora em Imperatriz, diz que a equipe de brigadistas do PrevFogo (Centro Nacional de Prevenção e Combate aos Incêndios Florestais, ligado ao Ibama) da Bacurizinho está na Terra Indígena Arariboia. "Esses brigadistas não tiveram o contrato renovado porque o PrevFogo afirmou não ter recursos para mantê-los. Na condição de colaboradores, foram deslocados para a Arariboia quando o fogo lá chegou nos isolados. Porém, havia um acordo caso um incêndio começasse na Bacurizinho e esse acordo não foi cumprido", destaca.

    A servidora explica que a Funai pactuou com as secretarias estaduais de Defesa Pública e Defesa Civil, Bombeiros e PrevFogo que os Guajajara brigadistas iriam para a Arariboia, mas que estes órgãos dos governos Estadual e Federal atenderiam a Bacurizinho em caso de necessidade. "O PrevFogo extinguiu a brigada na Bacurizinho, mas solicitou a ajuda dos indígenas treinados na Arariboia. Não podiam deixar a Bacurizinho descoberta, houve uma quebra de acordo. Os Bombeiros não foram pra lá", ressalta a servidora.

    Para Gilderlan Rodrigues da Silva, do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) Regional Maranhão, o trágico episódio revela o tamanho do descaso governamental com os incêndios envolvendo as terras indígenas no estado: "Todo o ano nós temos os incêndios e parece não haver um plano de ação e, sobretudo, de prevenção. A cada ano nos deparamos com uma tragédia nova, as mesmas dificuldades, ineficiências e desculpas. Para nós essa morte entra nessa conta, uma conta cujos recursos diminuem para os povos indígenas e aumentam para o agronegócio".

    Prevfogo extinto na T.I Bacurizinho

    José Arão Marizé Lopes Tenetehar/Guajajara explica que o PrevFogo extinguiu a equipe de brigadistas da Terra Indígena Bacurizinho em meados de fevereiro deste ano: "Foram selecionados os indígenas, chegaram a assinar o contrato, mas a brigada terminou extinta com a alegação de falta de recursos por cortes de despesas”, diz Arão Guajajara, que mora na aldeia Bacurizinho.

    No ano passado, o fogo consumiu parte da terra indígena, distante 135 quilômetros de outro território tradicional que desde o último mês de julho sofre com incêndios, a Terra Indígena Arariboia – também Tenetehar/Guajajara e do povo Awá-Guajá em situação de isolamento voluntário. Arão afirma que um documento foi enviado ao Ministério do Meio Ambiente pedindo a volta do PrevFogo.

    “Sofremos com um completo abandono institucional. Funai, Ibama, PrevFogo, Polícia Federal sabem do que tem se passado aqui, mas não tomam nenhuma providência. Não é apenas os incêndios que afetam a terra indígena, mas a presença de madeireiros, caçadores, grileiros”, denuncia Arão. Revoltado, o Guajajara acredita que agora com uma criança morta e outra em estado grave o governo federal tomará alguma medida.

    Arão explica que sem a ajuda do PrevFogo os indígenas apenas não permitem que as chamas queimem as aldeias. “O fogo que chega perto das moradias é apagado, todos os dias, mas ir para o interior da mata enfrentar o incêndio é impossível sem ajuda, equipamentos. Essa situação de morte não podia acontecer. são anos e anos que a gente passa por esses incêndios e o Ibama sabe. Cortou recurso em Brasília, morreu criança na aldeia", protesta Arão. 

    A Funai mantém com o Ibama, desde 2013, um Acordo de Cooperação Técnica para implementação do Programa Brigadas Federais Indígenas. O protocolo firmado estabelece que os brigadistas temporários do programa serão indígenas e poderão atuar tanto em suas próprias comunidades quanto em outras mais distantes, contando com o apoio logístico da Funai no transporte, alojamento e alimentação.

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  • 12/09/2016

    Indígenas recorrem contra reintegração de posse no Amazonas


    O Procurador da Fundação Nacional do Índio (Funai), Matheus Antunes de Oliveira, irá recorrer da decisão judicial de reintegração de posse contra a Terra Indígena Kaninari Itixi, em Beruri (AM), município localizado a 172 quilômetros de Manaus, na região do Rio Solimões. A decisão foi anunciada durante reunião com lideranças das aldeias nesta sexta-feira, na sede da Funai.

    A ação de reintegração de posse foi impetrada por Edilberto Batista Gomes contra os indígenas Francisco Souza Brasil, Francisco Souza Brasil Filho e Deusimar Luis Brasil, todos do povo Apurinã, moradores da aldeia São Raimundo. No dia 22 de junho passado, o juiz da Comarca de Beruri, Mateus Guedes Rios, concedeu liminar em favor do posseiro justificando que “a Funai não manifestou formalmente qualquer interesse de intervir na lide”.

    Na terra Kaninari Itixi vivem 47 famílias majoritariamente do povo Apurinã, nas aldeias São Raimundo, Nossa Senhora do Carmo e Deus é Amor. Em 23 de janeiro de 2001 foi requerida pelas lideranças indígenas a demarcação da área, sem qualquer providência por parte da Funai até a presente data.

    Conforme o cacique da aldeia Deus é Amor, Batista Brasil da Silva, o posseiro que requereu a reintegração de posse é membro de uma família com um longo histórico de conflito com os indígenas. “Os posseiros já fizeram ameaças de morte, estão acostumados a tirar madeira ilegalmente da área e cometer outras atitudes ilegais. Já informamos a Funai de muitas dessas ações ilegais, mas nenhuma medida foi tomada para impedir que eles continuem”, disse o cacique Batista. Na reunião com o procurador da Funai, as lideranças das aldeias disseram temer que algo mais grave possa ocorrer em razão das ameaças que vêm sofrendo.

    Eles disseram que a área reivindicada pelos posseiros, denominada “Monte Áurea”, fica no interior do território habitado pelos indígenas. “Na parte que eles querem não tem ninguém morando, nem da parte deles, nem da parte dos indígenas”, explica Batista Brasil.

    O procurador Matheus Antunes de Oliveira adiantou que vai entrar com recurso para encaminhar o processo à Justiça Federal, que é a instância competente para julgar processos envolvendo disputa de terra com indígenas.

    Texto e foto: J. Rosha – Regional Norte I

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  • 09/09/2016

    Proposta Orçamentária da Funai é a menor em 10 anos


    A proposta orçamentária para o ano de 2017, enviada pelo Governo Temer ao Congresso Nacional há alguns dias, estabelece um teto de 110 milhões de reais para despesas discricionárias[1] para a Fundação Nacional do Índio (Funai). Trata-se do menor valor orçado para a Fundação nos últimos 10 anos.

    Em 2007, o valor aprovado foi de 120,4 milhões de reais. Considerando a inflação acumulada do período, 60,88%, a previsão de perda orçamentária da Funai para o ano 2017, relativamente a 2007, beira os 70%. Essa queda fica ainda mais expressiva na comparação com o orçamento aprovado para o ano 2013, que foi de 194 milhões.

    O orçamento 2017 está sendo analisado pelo Congresso Nacional, que poderá reduzir ainda mais os recursos destinados ao órgão indigenista. A título comparativo, para o ano 2016, o orçamento da Funai sofreu um corte de 38 milhões de reais ao tramitar no Congresso. Na ocasião, a proposta inicial, que era de 150 milhões, foi dilapidada e aprovada com 112 milhões, redução de 37,67% relativamente ao orçamento de 2015. O valor em questão, por óbvio, é insuficiente, e colocará o órgão indigenista em insolvência financeira caso não ocorra uma suplementação nos próximos períodos.

    Nesse contexto, desde 2015, a CPI da Funai/Incra tem sido usada pela bancada ruralista como instrumento para “justificar” as investidas que vêm dilapidando o orçamento indigenista.

    Como fica evidente, colocar a Funai em estado vegetativo e matá-la por estrangulamento orçamentário é parte da estratégia governo-ruralista no ataque aos direitos indígenas em curso no país. Os ruralistas sabem que, com um orçamento extremamente reduzido, mesmo continuando a existir oficialmente, o órgão indigenista do Estado brasileiro perde as condições mínimas necessárias para dar seguimento às suas tarefas institucionais. Criação de Grupos de Trabalhos (GTs) para estudos de identificação e delimitação de terras indígenas, indenização a ocupantes de boa fé de terras demarcadas, proteção das terras indígenas contra invasores, presença de servidores junto a comunidades indígenas atacadas por milícias armadas ou abandonadas à própria sorte em beiras de rodovias, investimento nas terras demarcadas, são algumas das ações inviabilizadas com o estrangulamento orçamentário do órgão indigenista.

    A perspectiva de aprovação da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 241/2016, enviada pelo Governo Temer ao Congresso Nacional, agrava ainda mais a situação. A referida PEC propõe o congelamento do orçamento de todos poderes da União e órgãos federais por um período de 20 anos. Na prática, nas condições que estão postas, com a aprovação da PEC 241/2016, o orçamento da Funai ficará estagnado num patamar extremamente baixo pelos próximos 20 anos, o que acarretará na sua inexorável asfixia.

    Como sabemos, o resultado de tudo isso é o agravamento da situação de demandas represadas, de conflitos e de violências contra os povos indígenas no Brasil.

    A responsabilidade do governo brasileiro e do Congresso Nacional, nesse contexto, é direta e intransferível. Aos povos indígenas cabe a tarefa necessária e urgente de incidir politicamente a fim de reverter o quadro tenebroso almejado pelo golpismo ruralista contra suas futuras gerações. Aos aliados, mesmo sendo perseguidos e criminalizados pelos mesmos inimigos, cabe a missão de manterem-se firmes e altivos no apoio à luta dos povos em defesa de seus projetos de vida plena.

    Apesar de tudo, a luta e a esperança continuam. Quanto mais luta, maior a esperança.

    Brasília, DF, 09 de setembro de 2016


    Cleber César Buzatto
    Licenciado em Filosofia
    Secretário Executivo do Cimi – Conselho Indigenista Missionário



    [1] Não considera despesas obrigatórias com pessoal e benefícios

  • 08/09/2016

    Estabelecimento comercial é fechado por participação em fraude milionária contra indígenas e a União em MS

    Um estabelecimento comercial que vendia cestas básicas para indígenas em Amambai (MS) foi fechado na última terça-feira, 6 de setembro, pela Polícia Federal, que cumpriu mandado judicial de interdição e lacração. A ordem judicial foi expedida em requerimento de suspensão do exercício de atividade econômica formulado pelo Ministério Público Federal de Ponta Porã. O proprietário do Comercial Rei das Cestas participava de organização criminosa voltada à prática dos crimes de corrupção passiva, falsidade documental e fraudes previdenciárias. Eles ainda retinham cartões de benefícios sociais e realizavam saques em prejuízo de indígenas residentes na região de fronteira com o Paraguai. O MPF estima prejuízo aos cofres públicos superior a R$ 1 milhão.

    A interdição é desdobramento da Operação Uroboros, deflagrada em junho de 2016, que apurou os crimes praticados sob a liderança e coordenação de servidor público da Funai, lotado em Amambai. O estabelecimento Rei das Cestas era utilizado para reter os cartões de benefícios sociais e vincular os indígenas a dívidas, além de enganá-los para cometer fraudes previdenciárias e documentais.

    O Ministério Público Federal em Ponta Porã (MPF/MS) já denunciou o servidor da Funai e outras 4 pessoas por 23 fatos criminosos. O processo tramita em segredo de Justiça na Vara Federal de Ponta Porã (MS).

    Segundo as investigações, realizadas pelo MPF, Polícia Federal e Ministério do Trabalho e Previdência Social, a organização criminosa registrava falsamente crianças como se fossem filhos de indígenas já falecidos para obter a pensão por morte. Como a prescrição do benefício não corre contra os menores, o grupo conseguia se apropriar de grandes valores, que retroagiam até o óbito do indígena.

    A investigação revelou que havia um esquema logístico bem estruturado de transporte de indígenas para confecção de documentos pessoais e para expedição de registros administrativos de nascimento junto à Funai, ideologicamente falsos, que seriam usados perante os cartórios para dar credibilidade aos registros civis tardios.

    Em 3 de junho deste ano, a Operação Uroboros foi deflagrada nos municípios de Amambai e Iguatemi com a participação de 80 policiais. Foram cumpridos dois mandados de prisão preventiva, 14 mandados de busca e apreensão e 16 mandados de condução coercitiva. O servidor da Funai que liderava o esquema foi cautelarmente afastado de sua função pública e se encontra preso preventivamente.

    Se aceita a denúncia pela Justiça, os cinco acusados responderão pelos crimes de falsidade ideológica, uso de documento público materialmente falso, estelionato contra a previdência social, corrupção passiva e promoção, constituição e integração de organização criminosa, com a participação de servidor público.

    Referência processual na Justiça Federal de Ponta Porã >> Ação penal: 0001784-58.2016.403.6005;
    Suspensão do exercício de atividade econômica: 0001789-80.2016.403.6005

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  • 08/09/2016

    As violências da fome e do desabrigo: talvez as piores crueldades de uma política indigenista insana

    A comunidade Guarani Mbya de Irapuá vive em um acampamento às margens da BR-290, na altura do quilômetro 299, no município de Caçapava do Sul. Teve a terra tradicional delimitada pela Fundação Nacional do Índio (Funai) no início de 2011, e declarada pelo Ministério da Justiça em maio de 2016. Portanto, a terra foi caracterizada como sendo de ocupação tradicional do povo Guarani Mbya.

    Apesar disso, nenhuma providência foi tomada pelo governo no sentido de promover o assentamento das famílias dentro de sua terra, mantendo-as na beira da estrada sob condições absolutamente desumanas. A pergunta que fica: por que manter famílias em condições de profunda vulnerabilidade sendo que sua terra foi reconhecida como sendo de ocupação tradicional?

    Os Guarani Mbya sempre habitaram aquela região. Seu Silvino Werá, cacique da comunidade, convive com a realidade de beira de estrada há décadas. Criou seus filhos e agora os netos sob a violência da estrada e dos fazendeiros que os discriminam e os amedrontam. Não raras as vezes em que os fazendeiros os ameaçaram, impondo que saíssem daquele local. Seguiram firmes, apesar de todo sofrimento.

    A violência é cotidiana e brutal. Os indígenas já tiveram seus barracos queimados, já tiveram seu acampamento destruído por tratores, árvores frutíferas plantadas na beira da estrada foram arrancadas, um poço artesiano perfurado para que tivessem água potável foi destruído, os postes que conduziam energia ao local foram derrubados e uma pequena edificação que servia como escola para as crianças foi demolida. A comunidade chegou a ser removida por funcionários do estado do Rio Grande do Sul para uma área distante 60 km de Irapuá. Mas os Guarani retornaram para o local que fica muito próximo de seu tekoha – o seu lugar de viver, a sua terra tradicional.

    Nesta semana, em visita à comunidade, presenciamos crianças passando fome e frio, como pode ser constatado em vídeo realizado durante a visita.

    Os Guarani, apesar das agressões constantes, se mantêm firmes na esperança de que os órgãos de assistência lhes assegurem o direito fundamental de acesso à terra, já devidamente reconhecida. Até agora, as respostas dos órgãos – Funai e Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) – têm sido a omissão e o abandono.

    Apesar de oficiados pelo Ministério Público Federal (MPF) de Cachoeira do Sul a prestar assistência, nada vem sendo feito no sentido de assegurar às famílias um pouco de dignidade. Estão abandonadas pelo Poder Público. Não foram poucas as reivindicações e apelos para que se garantisse o mínimo para viverem: abrigo, alimentos, água potável, já que tudo o que tinham acabou sendo destruído por fazendeiros. Nada se fez e ao que tudo indica nada farão. Parece uma espécie de conluio entre fazendeiros que não aceitam a presença indígena naquela região, e os que deveriam assegurar à comunidade o mínimo de proteção. Praticam, na verdade, violências que se tornam as mais cruéis de todas: o abandono, a fome e o desabrigo.

    O Conselho Indigenista Missionário (Cimi) – Regional Sul, comprometido com a causa indígena pela demarcação das terras e pelo direito a uma vida com dignidade, denuncia os órgãos de assistência pela prática de crimes contra a comunidade Guarani Mbya de Irapuá, submetida – pela negligência e omissão – à fome e miséria, sendo que constitucionalmente deve ser protegida e assistida pelos agentes do Estado, mas neste momento está relegada a situação de exclusão absoluta.


    Fotos: Roberto Liebgott/Cimi Regional Sul

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  • 08/09/2016

    Nota pública do Movimento por Verdade, Memória, Justiça e Reparação

    O governo Temer anunciou uma intervenção inédita na Comissão de Anistia, órgão do Estado brasileiro responsável pelas políticas de reparação e memória para as vítimas da ditadura civil-militar. Pela primeira vez se efetivou uma descontinuidade de sua composição histórica. Na foto acima, parada militar com desfile de indígena pendurado no pau de arara (instrumento de tortura).


    Desde a sua criação pelo governo FHC, a comissão é composta por conselheiros e conselheiras com grande histórico de atuação na área dos direitos humanos, mantendo-se, ao lon
    go do tempo, a integralidade dos seus membros e as composições integrais advindas dos governos anteriores. Os eventuais desligamentos de conselheiros(as)sempre ocorreram por iniciativas pessoais dos próprios membros, sendo substituídos(as) gradativamente.

    Essa característica sempre assegurou a pluralidade em seu formato que, até pouco tempo atrás, abrigava inclusive membros nomeados para sua primeira composição ainda no governo FHC em 2001. Isto reflete a compreensão da Comissão de Anistia como um órgão de Estado e não de governo.

    Além disso, novas nomeações sempre foram precedidas por um processo de escuta aos movimentos dos familiares de mortos e desaparecidos, de ex-presos políticos e exilados, além de organizações e coletivos de luta por verdade, justiça, memória e reparação.

    Pela primeira vez na história da Comissão de Anistia foram nomeados novos membros sem nenhuma consulta à sociedade civil e pela primeira vez foram exonerados coletivamente membros que não solicitaram desligamento.

    O Diário Oficial da União publicou duas portaria do Ministro Alexandre de Moraes, uma com a nomeação de 20 novos conselheiros e outra com a exoneração de 6 membros atuais que não haviam solicitado desligamento do órgão. Outros 10 atuais conselheiros foram mantidos. Não foram divulgados os critérios desta seletividade.

    Os conselheiros desligados são Ana Guedes, do Grupo Tortura Nunca Mais da Bahia e ex-presidente do Comitê Brasileiro pela Anistia na Bahia; José Carlos Moreira da Silva Filho, vice-presidente e professor do Programa de Pós-Graduação em Ciências Criminais da PUC-RS; Virginius Lianza da Franca, ex-coordenador geral do Comitê Nacional para Refugiados; Manoel Moraes, membro da Comissão Estadual da Verdade de Pernambuco e ex-membro do GAJOP; Carol Melo, professora do núcleo de Direitos Humanos da PUC-Rio; Marcia Elayne Moraes, ex-membro do comitê estadual contra a tortura do RS.

    Ao dispensar esse grupo de Conselheiros, o governo Temer coloca a perder quase uma década de memória e de expertise na interpretação e aplicação da legislação de anistia no Brasil.


    Uma outra portaria nomeou no mesmo dia, de uma só vez, 20 novos conselheiros e conselheiras. Alguns dos nomes anunciados são vinculados doutrinariamente ao polêmico professor de Direito Constitucional da USP Manoel Gonçalves Ferreira Filho, conhecido teórico e apoiador da ditadura civil-militar instaurada no Brasil em 1964, por ele denominada “Revolução de 1964″ e escreveram um livro em sua homenagem.

    O jornal O Globo, por sua vez, trouxe uma outra grave denúncia de que pelo menos um dos novos membros são suspeitos de terem sido colaboradores da ditadura militar. Caso a nova composição da Comissão de Anistia reflita o pensamento de Manoel Gonçalves Ferreira Filho e tenha entre seus membros simpatizantes ou colaboradores com a ditadura trata-se de uma desfuncionalidade e um sério risco à posição oficial do órgão sobre a devida responsabilização penal dos agentes públicos que praticaram crimes de lesa-humanidade na ditadura.

    A Comissão de Anistia tem estimulado, como parte dos compromissos internacionais do Brasil, o debate público nacional sobre o alcance da lei de anistia e possui uma posição clara e oficial pela imprescritibilidade e impossibilidade de lei de anistia para os crimes da ditadura, bem como defende o cumprimento integral da sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos sobre o caso Araguaia, sediada em São José da Costa Rica.


    A atual composição da Comissão de Anistia foi responsável pela redução dos valores das indenizações milionárias concedidas no início da era FHC, ajustando-as a valores de mercado, e acelerou o julgamento dos pedidos de reparação, instituindo o pedido de desculpas às vítimas e as famílias.

    A Comissão de Anistia também é conhecida internacionalmente por ter empreendido de maneira inovadora e sensível políticas públicas de memória e projetos vanguardistas como as Caravanas da Anistia, as Clínicas do Testemunho, o Projeto Marcas da Memória, e por ter iniciado a construção do Memorial da Anistia, realização de eventos e intercâmbios acadêmicos e culturais, e inúmeras publicações que aprofundam o sentido da Justiça de Transição no Brasil e na América Latina. Estes programas e projetos compõem hoje o Programa Brasileiro de Reparação Integral, reconhecido e celebrado internacionalmente, e fazem parte do rol dos direitos de todos aqueles que foram atingidos por atos de exceção durante a ditadura civil-militar e aos seus familiares. Esses direitos devem ser preservados, sob pena de ruptura com o dever integral de reparação.

    Os movimentos de direitos humanos e cidadãos abaixo assinados repudiam a arbitrariedade destas exonerações e nomeações na Comissão de Anistia e denunciam o início da tentativa de desmonte destas políticas que marcam a nossa transição democrática e que são parte de obrigações internacionalmente assumidas pelo Estado brasileiro. Do mesmo modo denuncia o absurdo de ter entre os membros da nova Comissão nomes de pessoas que não possuem posição de oposição enfática de condenação à ditadura e aos crimes militares ou, pior, que possam ter sido colaboradores da Ditadura.

    O governo Temer com esta atitude arbitrária comete um erro histórico que afeta a continuidade da agenda pendente do processo de transição democrática, e com isso aprofunda as suas características de um governo ilegítimo, sem fundamento na soberania popular.

    São iniciativas muito graves e unilaterais que sinalizam o início de um desmonte na Comissão de Anistia, conquista histórica da sociedade democrática brasileira, e uma ofensa aos direitos das vítimas da ditadura e os seus familiares.

    Não aceitaremos retrocesso nas conquistas da Justiça de Transição no Brasil. Nem um direito a menos!

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  • 08/09/2016

    Grito dos/das Excluídos/as mobiliza milhares de pessoas pelo país


    foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

    Tradicionalmente, há 22 anos, o dia 7 de setembro é marcado pelas manifestações do Grito dos Excluídos, que reúne movimentos sociais, sindicais e pastorais do campo e da cidade. Em 2016, o Grito reuniu milhares em mais de 20 estados do país, além do Distrito Federal, e uniu-se a atos com o mote “Fora Temer!” e “Nenhum direito a menos!”.

    Tendo como lema “Este Sistema é Insuportável: Exclui, Degrada, Mata”, as manifestações do Grito dos/das Excluídos(as) de 2016 foram, em grande parte, invisibilizadas pela mídia tradicional e desprezadas pelo governo. Em Brasília, onde o ato reuniu pelo menos 10 mil pessoas, o balanço inicial divulgado por veículos da mídia tradicional contabilizava, conforme contagem da Polícia Militar, apenas “600 pessoas”. O número da PM foi atualizado depois para 2,7 mil pessoas, ainda muito abaixo da realidade.

    O ato na capital federal iniciou sua concentração às 9h da manhã, em frente ao Museu Nacional, mas só pôde partir em marcha pela Esplanada dos Ministérios depois que o desfile oficial do Dia da Independência foi encerrado, por volta das 11h e meia. Os manifestantes marcharam durante cerca de uma hora, até o Congresso Nacional, com gritos e cantos de “Fora Temer!” e exigindo respeito à democracia.


    Grito dos/as Excluídos/as em Brasília (DF). foto: Tiago Miotto/assessoria de comunicação do Cimi

    Os indígenas e, entre eles, os Guarani Kaiowá, vindos do Mato Grosso do Sul, também marcaram presença em meio à multidão que se manifestou em Brasília.

    “Esse novo governo, o Temer, a primeira coisa que ele quer fazer é revogar as terras indígenas. Nós não aceitamos esse governo golpista que está aí, e ele apoia a maior lei que está contra nós, que é a PEC 215”, afirmou ao final do Grito a Guarani Kaiowá Flávia Arino.

    Além da preocupação com o risco do governo Temer revogar demarcações de terras indígenas, Flávia destacou os ataques que representam a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 215 e a tese restritiva do marco temporal, adotada pela segunda turma do Supremo Temporal Federal (STF), que podem inviabilizar o direito constitucional dos povos indígenas a seus territórios tradicionais.

    “Estamos aqui por causa dos golpes que nós, indígenas, recebemos desde 1500. Os índios não vão deixar de sofrer golpes enquanto seus direitos não forem reconhecidos”, afirmou o Guarani Kaiowá Adalto Barbosa, que também participou do Grito dos/das Excluídos/as no Distrito Federal.

    Em diversas capitais, o Grito dos/das Excluídos/as reuniu milhares de pessoas. Em São Paulo (SP), foram 15 mil, segundo os organizadores; em Belo Horizonte (MG), foram pelo menos 10 mil. Em Salvador (BA), o ato também reuniu cerca de 15 mil pessoas. Houve grandes atos em diversas outras capitais e municípios do interior dos estados, embora ainda sem uma divulgação da estimativa de público.


    Grito dos/as Excluídos/as em Brasília (DF). foto: Tiago Miotto

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  • 06/09/2016

    Justiça Estadual ordena despejo de aldeia Gamela, fala em direito de conquista e questiona identidade do povo

    O juiz da Comarca Estadual de Matinha (MA), Celso Serafim Júnior, determinou no final da última semana, 1º de setembro, a reintegração de posse de uma área retomada pelo povo Gamela, na aldeia Piraí (na foto), em 16 de agosto deste ano. A decisão liminar concede prazo de 30 dias para o cumprimento do despejo das famílias indígenas do local conhecido como Sítio Chulanga, entre os municípios de Matinha e Viana. 

     

    Povo Gamela e advogados questionam competência do juiz para decidir sob litígio de terra reivindicada por indígenas e os argumentos usados pelo magistrado – no mínimo insólitos depois da Constituição Federal de 1988 e da Convenção 169 da OIT.

     

    “A rigor todos os 8.515.767.049 km² do território brasileiro pertence aos índios (…) Razão essa, necessária e suficiente para que todos nós outros, não índios deixássemos as terras brasilis (…) Sendo este ou qualquer outro magistrado absolutamente incompetente para decidir à respeito, já que não haveria jurisdição a ser prestada (…) Não obstante, pelo direito de conquista as referidas terras passaram a pertencer ao homem branco (SIC)”, assim começa a sentença do juiz. 

     

    Mais adiante, o magistrado questiona a identidade étnica dos Gamela com base no Estatuto do Índio (Lei nº 6.001/1973), não sendo os Gamela mais silvícolas ou selvagens, mas integrados à sociedade nacional. A palavra povo é sempre colocada entre aspas pelo juiz. “Certamente não estamos a falar de silvícolas ou grupo tribal consoante ao artigo 3º do Estatuto do Índio, ou isolados conforme o artigo 4º do mesmo estatuto (…) Não vislumbro litígio envolvendo índios, mas sim invasores”, disserta o juiz. 

     

    “Todo o texto da decisão é racista e preconceituoso. Entendemos como uma violação de direitos fundamentais, de existência, de sermos quem somos: Gamela. Nosso povo não vai sair da terra. Vamos recorrer dessa decisão, mas não vamos sair”, afirma Kum’Tum Gamela. O pedido de despejo foi feito por Qenack Serra Costa Júnior, detentor do título de propriedade da Chulanga. A Fundação Nacional do Índio (Funai) realiza estudo de qualificado da demanda territorial Gamela – primeiro passo do procedimento de demarcação de acordo com o Decreto 1775.

     

    A terra, antes da retomada, era utilizada para abastecer a fábrica de cerâmica da qual Qenack é dono. No dia 26 de agosto, três homens armados invadiram a retomada e ameaçaram os Gamela. Procurando pelas lideranças, os indivíduos ameaçaram os indígenas e estavam em uma caminhonete cuja placa está registrada no nome da Ostensiva Segurança Privada LTDA., com sede em São José do Ribamar (MA) – conforme apuração na Secretaria de Segurança Pública.

     

    Juiz incompetente

     

    O advogado Rafael Silva, assessor jurídico da Comissão Pastoral da Terra (CPT), afirma que a Justiça Estadual é incompetente para conceder tal decisão. “O juiz não tinha atribuição para decidir algo que cabe à Justiça Federal. A decisão demonstra também uma postura preconceituosa e equivocada com relação a identidade dos indígenas”, afirma Silva. O advogado revela ainda que o juiz não solicitou informações à Funai.  

     

    “No próprio documento, o autor do pedido liminar de reintegração fala sobre a terra estar presente na Sesmaria dos índios (lote de terra dado aos Gamela)”, afirma o advogado. Os Gamela retomaram de 2015 até agora nove áreas reivindicadas como tradicionais pelo povo. Em todas foram impetrados pedidos de reintegrado de posse, mas apenas no caso do Sítio Chulanga houve decisão pelo despejo envolvendo a Justiça Estadual. 

     

    O juiz traçou toda a linha de argumentação baseada no percurso histórico da colonização contra os indígenas e das leis de terras a estes povos advindas em distintas etapas até os dias de hoje. Todavia, conclui de sobressalto que não se trata de conflito envolvendo indígenas, no caso dos Gamela, mas de cidadãos integrados à sociedade. “Fazer parte do país nós fazemos, mas a Constituição nos garante o direito de sermos quem somos”, se indigna Kum’Tum.

     

    Para o advogado da CPT, o que preocupa é que um clima bélico está disseminado entre fazendeiros e proprietários da região contra os Gamela "com racismo difuso, já foram claras as ameaças de morte, grupos de jagunços. Mesmo sem o cumprimento (do despejo) eles podem se utilizar dessa decisão para considerar legítima o uso de força privada pra retirar os Gamela”, afirma Silva.

     

    Todas as liminares de reintegração de posse contra coletividades no Maranhão, desde julho de 2015 por força de lei estadual, são encaminhas para a Comissão de Violência no Campo e na Cidade. O objetivo é garantir uma mediação. “Nesse caso Gamela, a Justiça levou até a Comissão, mas com esse prazo de 30 dias e sob pena de multa de R$ 50 mil ao Governo do Estado para cada dia de decisão não cumprida”, diz o advogado da CPT.



     

    Gamela tem o direito de ser Gamela 

     

    "A Constituição de 1988 reconhece aos índios o direito de ser índio, de manter-se como índio, com sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições. Além disso, reconhece o direito originário sobre as terras que tradicionalmente ocupam. Esta concepção é nova, e juridicamente revolucionária, porque rompe com a repetida visão integracionista. A partir de 5 de outubro de 1988, o índio, no Brasil, tem direito de ser índio”, explica o jurista Carlos Marés em seu livro O Renascer dos Povos Indígenas para o Direito[1].

     

    O assessor jurídico do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), o advogado Adelar Cupsinski, afirma que isso significa que “o Estado brasileiro não tem o dever de reconhecer ou não a identidade étnica de nenhum grupo social”. A partir de 2004, o Brasil tornou-se signatário da Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Portanto, a norma tem efeito de lei no país e considerada assim pelo Supremo Tribunal Federal (STF). 

     

    Logo em seu artigo 1º, a Convenção assim determina: "A consciência de sua identidade indígena ou tribal deverá ser considerada como critério fundamental para determinar os grupos aos que se aplicam as disposições da presente Convenção". Cupsinski afirma que é comum juízes proferirem decisões baseados am argumentos que questionam a identidade enquanto povo dos indígenas para negar o direito à terra. Os indígenas Tupinambá de Olivença passam por situação semelhante.   

     

    "A Funai não pode mais dizer se é ou não indígena, ela tem acolher a demanda. Se o juiz perguntar para a Funai essa deve ser a resposta. No caso da terra, o direito é originário e a demarcação vai dizer qual o tamanho dessa terra indígena Gamela, na situação desse despejo, que tem coletividade, cultura diferenciada e própria. As leis vigentes no país reconhecem esse modo diferente de ser como princípio fundamental”, explica o assessor jurídico do Cimi. Cupsinski lembra ainda do Preâmbulo da Constituição Federal para ressaltar o caráter pluralista que a Carta Magna confere ao Brasil.     

     

    "Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembléia Nacional Constituinte, para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte Constituição da República Federativa do Brasil”.



     

    Estatuto do Índio: pontos não recepcionados

     

    O Estatuto do Índio segue sob vigência desde sua publicação, em 19 de dezembro de 1973 – um dos anos mais sangrentos da ditadura militar (1964-1985). “Ele foi elaborado sob a vigência da Constituição de 1967 e precisa ser analisado com parcimônia, considerando que determinados conceitos não foram acolhidos pela Constituição Federal de 1988”, ressalta Cupsinski. 

     

    Os artigos 3º e 4º do Estatuto do Índio, como exemplos, que não foram recebidos pela Constituição Federal de 1988 e tampouco estão presentes na Convenção 169 da OIT em quaisquer artigos ou interpretações. São exatamente os artigos citados pelo juiz da Comarca Estadual de Matinha, Celso Serafim Júnior, para questionar a coletividade dos Gamela enquanto povo indígena.  

     

    “Ademais, o regime anterior previa a integração gradativa dos indígenas à comunhão nacional, o que não tem mais sentido”, conclui Cupsinski. O assessor jurídico do Cimi entende que “direito de conquista”, termo também usado pelo juiz como categoria, é algo que não estabelece nenhum diálogo envolvendo as legislações pertinentes à demarcação de terras indígenas ou ao direito originário sobre as terras que os povos tradicionalmente ocupam.



     

    Comissão visita os Gamela

     

    No mesmo dia em que saiu a liminar ordenando o despejo dos Gamela, a Defensoria Pública da União (DPU), Defensoria Pública Estadual (DPE), Comissão de Direitos Humanos da ordem dos Advogados do Brasil (OAB), o Cimi, a CPT e o bispo de Viana, Dom Sebastião Lima Duarte, estiveram na aldeia Piraí – área de retomada. 

     

    “A Comissão buscou levar solidariedade e pegar mais informações sobre a situação que envolve violência e racismo contra os Gamela”, explica a missionária indigenista Rosimeire Diniz, do Cimi Regional Maranhão. Rosimeire salienta a reunião produtiva e as impressões dos defensores públicos. “Todos e todas se preocuparam com os Gamela e logo em seguida veio a notícia da reintegração”, destaca.  

     

    Os Gamela cansaram de esperar. As nove áreas retomadas pelos Gamela ficam dentro de uma área de 14 mil hectares reivindicada pelo povo, a qual lhes foi doada pelo Estado brasileiro ainda no período colonial, no ano de 1759. Desde então, o território foi sendo invadido e grilado, e o povo Gamela sendo confinado em um espaço cada vez menor. Desde que decidiram pelas retomadas, Kum’Tum Gamela perdeu as contas de quantos ataques, ameaças e ataques sofreram

     

    Atualmente, mais de 700 famílias do povo Gamela vivem numa área de quase 600 hectares, sem espaço para praticar agricultura e, ainda, sofrendo com a grilagem e a destruição de árvores e plantas importantes para sua sobrevivência, como é o caso dos açaizais, utilizados para alimentação, e dos guarimãs, cuja palha é utilizada para confecção de artesanatos. 

     

    [1] SOUZA FILHO, Carlos Federico Marés de. O Renascer dos Povos Indígenas para o Direito. 1a Ed. (ano 1998, 5ª reimpr. Curitiba: Juruá, 2008.

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  • 06/09/2016

    Luta pela democracia segue na pauta de reivindicação dos movimentos ao governo


    Em audiência com governo federal, os movimentos do campo unitário acampados em Brasília-DF, desde a madrugada desta segunda-feira (5), reivindicaram um conjunto de pautas para retomada e aprofundamento das políticas para o campo, das águas e florestas, com priorização para a destinação de terras para a efetivação da reforma agrária popular e titulação e demarcação de terras para povos indígenas e quilombolas.

    A agenda de reivindicação junto ao governo federal é sequente ao conjunto de mobilizações realizadas em todo o país pelos movimentos populares em defesa da democracia e respeito ao voto popular.

    Mobilizados pela Jornada Nacional das Trabalhadoras e Trabalhadores e Povos do Campo, das Águas e das Florestas, 2 mil militantes de todo o país ocuparam o Ministério do Planejamento na madrugada desta segunda-feira (05). A ação foi uma estratégia política para dar visibilidade às lutas da população campesina e tradicional e pressionar o governo federal para dar resposta imediata às demandas. Além da capital federal, estão sendo realizadas atividades que compõem a Jornada Nacional em 11 estados.

    Orientados pela defesa da reforma agrária ampla, os movimentos se posicionam contrários às propostas anunciadas pelo governo de Michel Temer (PMDB) e sua bancada de apoio para a questão da terra. Na avaliação dos movimentos, a aprovação do Projeto de Lei 4059/2012 que flexibiliza a aquisição de terras por pessoas físicas e jurídicas estrangeiras, a intensificação das titulações de terras, entre outras medidas, significa a privatização da terra.

    A unidade dos movimentos populares para permanecer em luta e pautar suas reivindicações em uma audiência com o governo, ainda que seja uma gestão ascendida ao poder por uma destituição não legitimada da presidenta Dilma Rousseff, vem da realidade cotidiana dos agricultores e agricultoras, povos indígenas e quilombolas, ainda mais precarizada pelas medidas adotadas durante o governo interino golpista de Michel Temer, que levou o contexto para uma situação emergencial.

    “O que nos unificou, acima de tudo neste momento, é a preocupação com a realidade no campo e com as políticas conquistadas a duras penas nos últimos anos, e recentemente ameaçadas”, pontua o presidente da Contag, Alberto Broch.

    “O que nos traz aqui são as 120 mil famílias acampadas, as 579 mil famílias com acesso bloqueado às políticas agrárias pelo Tribunal de Contas da União (TCU), produtores com acesso dificultado à assistência técnica. Precisamos extrair uma resposta do governo para dar ao povo sobre um orçamento que pertence ao povo”, destaca o integrante da coordenação nacional do MST, Alexandre Conceição.

    Retorno do MDA

    Uma das pautas prioritárias defendida pelos movimentos populares é o retorno do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA). Numa das primeiras ações do governo interino, pelo Decreto 8780, publicado no dia 30/05 no Diário Oficial da União (DOI), Temer extinguiu o MDA e transferiu para a Casa Civil a administração das cinco pastas ligadas à Reforma Agrária. A Casa Civil, sob administração de Eliseu Padilha (PMDB), também passa a responder pelo Incra.

    Entendido como central para a operacionalização da política pública para a reforma agrária e agricultura familiar, o MDA foi fruto da pressão dos movimentos populares após a criação do Massacre de Eldorado de Carajás. “O MDA não é um órgão do governo e nem dos movimentos sociais. É um patrimônio da agricultura familiar e camponesa”, defende Alberto.

    Participantes da audiência

    As organizações e movimentos populares que participaram da audiência pública foi o MST, Movimento Camponês Popular (MCP), Movimento das Mulheres Camponesas (MCP), Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA) e as organizações Confederação Nacional dos Trabalhadores da Agricultura (Contag), Conselho Missionário Indígena (CIMI), Federação Nacional dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura Familiar (Fetraf).

    Diante de responsáveis pelas pastas da política agrária, planejamento e cidades. Participaram da audiência o chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha; presidente do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária  (Incra) Leonardo Góes, o chefe de gabinete da Casa Civil, Roberto Severo, o ministro do estado chefe da secretaria  de governo, Geddel Vieira, o secretário especial da agricultura familiar e  reforma agrária, José Ricardo Roseno, o secretário executivo da Casa Civil, Daniel Sigelmann, o ministro de estado interior do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão, Dyogo Oliveira e o assessor especial da Casa Civil, Renato Vieira. Ao fim, por reivindicação dos movimentos populares para garantia da moradia popular para o campo, com o retorno do Programa Minha Casa Minha Vida Rural, se somou o ministro das Cidades, Bruno Araújo (PSDB).

    Novas agendas

    Como encaminhamento da audiência, o governo federal se comprometeu a escutar os movimentos populares e organizações do campo unitário nesta terça-feira (06). Os movimentos devem apresentar neste dia sua pauta de reivindicação para Incra, Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) e Ministérios das Cidades e do Desenvolvimento Social.

    Neste momento devem pautar, com prioridade, a permanência do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), políticas de assistência técnica e extensão rural e a faixa rural para o Programa Minha Casa, Minha Vida.

    Jornada Nacional

    A Jornada segue até dia 07 de setembro, culminando na participação dos movimentos populares na Grito dos Excluídos, realizado em contraposição ao Dia da Pátria. Além de Brasília, alguns estados sinalizam permanecer mobilizados até sexta-feira (09).

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  • 06/09/2016

    Movimentos sociais e pastorais convocam população para o Grito dos/as Excluídos/as neste dia 7

    Em sua 22ª edição, o Grito dos e das Excluídos(as) de 2016 traz o lema “Este Sistema é Insuportável: Exclui, Degrada, Mata” e será realizado em 24 estados do Brasil. Tradicionalmente, o evento é realizado no dia 7 de setembro e organizado por diversos movimentos sociais, organizações e pastorais.

    O lema do Grito dos e das Excluídos(as) baseia-se em afirmação do Papa Francisco a movimentos sociais durante encontro em Santa Cruz de La Sierra, em 2015, quando o pontífice declarou: “O futuro da humanidade não está unicamente nas mãos dos grandes dirigentes, das grandes potências e das elites. Está fundamentalmente nas mãos dos povos; na sua capacidade de se organizarem e também nas suas mãos que regem, com humildade e convicção, este processo de mudança”.

    O evento, que teve sua primeira edição no ano de 1995, é organizado de forma descentralizada e autônoma pelos movimentos e pastorais que o realizam em cada cidade. Em levantamento preliminar divulgado na segunda-feira (5), o Grito está previsto para ocorrer em pelo menos 110 municípios em todo o país.

    Acompanhe a página do Grito dos Excluídos no facebook e veja a programação em cada estado.

    No Distrito Federal, cerca de 80 movimentos e pastorais convocam a população a população a participar do Grito dos/as Excluídos/as, cuja concentração para o ato nesta quarta (7) será em frente ao Museu Nacional da República, a partir das 8h30.

    Em Brasília, os movimentos populares, sindicais e pastorais que participam da Jornada de Lutas Unitária dos Trabalhadores e Trabalhadoras e Povos do Campo, das Águas e das Florestas e ocuparam o Ministério do Planejamento na segunda-feira (5) também participarão do ato.

    Leia a convocatória:

    Convocatória para o Grito dos Excluídos 2016 – Distrito Federal, 07 de setembro

    Concentração em frente à Catedral de Brasília, a partir das 8h30

    Temer subiu ao poder de forma ilegítima e governa apenas para os ricos e poderosos. Ele quer acabar com os direitos das trabalhadoras e dos trabalhadores do campo e da cidade, das florestas e das águas; das mulheres, das negras e dos negros, dos indígenas, das/os LGBTs, da juventude e das moradoras e dos moradores das periferias.

    O povo brasileiro sofre cada vez mais com a crise. Só em agosto mais de 100 mil pessoas ficaram desempregadas. O salário já não dá mais para as compras do mês. E se Temer continuar realizando suas medidas, isso só tende a piorar. Não podemos esperar nada de bom de um governo que não foi escolhido pelo povo.

    Por isso, os movimentos sociais do campo e da cidade realizam mais um Grito dos/as Excluídos/as. Chamamos aquelas e aqueles que não aceitam os ataques deste governo para participarem.

    Com luta popular, é possível mudar essa situação.

    Fora Temer! Nenhum direito a menos!

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