• 17/10/2016

    Caci e Xondaro, histórias sobre violências e resistência indígena

    A violência contra povos indígenas no Brasil é histórica – e segue em curso. O saque de terras e usurpação da cultura de diferentes povos está longe de ser algo apenas do passado; continua ocorrendo em um processo que é subnoticiado, marcado pela omissão do Estado e por assassinatos. Organizar, sistematizar e visibilizar informações é uma forma de trazer a público alguns dos episódios mais recentes de uma história de massacres que dizimaram os milhões que viviam na terra quando os primeiros exploradores europeus aportaram.

    Foi com o objetivo de reunir informações de maneira clara e direta e, assim, chamar a atenção não só para as violações, mas também para as histórias de resistência dos povos indígenas, que a Fundação Rosa Luxemburgo (FRL), junto com parceiros, organizou dois lançamentos na noite da última terça-feira, 11 de outubro: o do projeto Caci – Cartografia de Ataques Contra Indígenas, primeira plataforma digital da FRL, e o da HQ Xondaro, primeira história em quadrinhos publicada pela organização. As novidades foram apresentadas durante uma roda de conversa que contou com a participação de Gustavo Faleiros, do InfoAmazonia, Marcelo Zelic, do Armazém Memória, e Tiago Santos Karai, liderança guarani mbya e um dos coordenadores da Comissão Guarani Yvyrupa.

    A mediação ficou sob a responsabilidade de Alceu Castilho, do portal De Olho nos Ruralistas, e de Ana Rüsche, da Fundação Rosa Luxemburgo. O evento foi realizado no Ateliê do Gervásio em São Paulo e na plateia estiveram antropólogos, indigenistas e representantes de algumas das principais organizações que trabalham com a defesa de direitos dos povos originários do país.

    Caci e Xondaro

    O projeto Caci – Cartografia de Ataques contra Indígenas – foi organizado em parceria com Armazém Memória e InfoAmazonia. Trata-se de uma plataforma de dados abertos com o georeferenciamento de assassinatos registrados entre 1985 até 2015 pelo CIMI (Conselho Indigenista Missionário) e pela CPT (Comissão Pastoral da Terra), organizações que disponibilizaram seus registros históricos. Navegue abaixo no mapa ou clique aqui para acessar diretamente a plataforma.

    A HQ Xondaro, de Vitor Flynn Paciornik, é uma publicação que retrata a resistência guarani e sua mobilização pela demarcação de seus territórios. Foi publicada em parceria com a Editora Elefante, com apoio da Comissão Guarani Yvyrupa, organização indígena autônoma que congrega povos guarani do Sul e Sudeste do Brasil.

    Em guarani, Caci significa dor e Xondaro, guerreiro guardião.

    Assassinatos

    Questionado por Alceu Castilho sobre o assassinato da liderança João Xucuru Cariri, ocorrido em Alagoas no dia do evento, Marcelo Zelic defendeu logo no começo de sua fala que a plataforma é uma ferramenta de defesa de direitos humanos, pois a tecnologia ajuda na compreensão e na denúncia do quão cotidiana ainda é a violência contra indígenas no país. O editor do InfoAmazonia, Gustavo Faleiros reforçou que o Caci contextualiza estes ataques, geolocalizando os dados no mapa, o que possibilita a sobreposição de informações como áreas desmatadas e hidrelétricas, fornecendo camadas de informações e cruzando os dados para quem pesquisa na plataforma.

    Tiago Santos Karai, professor e liderança guarani de 24 anos, compartilhou informações sobre a resistência em São Paulo, que tem sido referência para outros povos  no país. “Nos organizamos, nos mobilizamos e aprimoramos nossas estratégias. Não somos de guerra, precisamos aprender para garantir nossos direitos. Não conhecemos esse mundo dos brancos, mas estamos prontos para lutar. Lutamos, nos manifestamos, mesmo sabendo que este mundo é difícil de entender, porque a vida vale nada e a do indígena vale menos ainda. Nasci na luta e nela morrerei porque não temos para onde correr”.

    Ele contou ainda sobre as duas vezes em que esteve no Mato Grosso do Sul, e chamou a atenção para impactos sociais relacionados a práticas do agronegócio e ao que classificou de realidade desumana. A gravidade da situação foi reiterada por Marcelo Zelic, autor de um dossiê especial dentro do CACI sobre o genocídio do povo guarani no estado. “A violência é fruto da falta de demarcação das terras indígenas e de um processo de desenvolvimento que não tem respeito. Uma cobiça histórica incapaz de conviver com a diversidade”, disse ele que lembrou também uma outra face desta mesma moeda: a violência  psicológica, que desumaniza e que provoca depressão, alcoolismo e o suicídio. “O que o Caci apresenta é apenas a ponta do iceberg”.

    Gustavo Faleiros, do InfoAmazonia, ressalta que os dados pretendem estimular uma cultura de acompanhamento dos indicadores e despertar a empatia com a causa indígena. “Os dados podem parecer frios, mas sua escala é assustadora e isso comunica de uma forma direta, emocional, porque estamos tratando de um povo”. Ao final, Kampai fez um apelo para que cada pessoa presente multiplicasse o conhecimento e o apoio à causa indígena e, em meio a um debate sobre a importância da demarcação para conter as mortes de indígenas, questionado sobre o significado de terra para os guarani, respondeu:

    “Terra é vida, riqueza, saúde. A gente depende dela para ter nossa identidade e manter nossos costumes e tradições. Para nós a terra é tudo”.

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  • 17/10/2016

    Cartografia dos Ataques Contra Indígenas convida a reflexão sobre dor, tempo e indiferença

    Assassinado: Adenilson Barbosa. Idade: 15 anos. Ano: 2013. Local: Terra Indígena Caarapó. Município: Caarapó (MS). O internauta pode ver no mapa. Clicar, mecanicamente, e observar que, somente ali, mais 26 indígenas foram assassinados.

    Adenilson e dois amigos saíram para pescar no Córrego Mbope’i, que cruza fazendas do entorno da Aldeia Tey Kuê. Foram abordados por pistoleiros ligados a Orlandino Gonçalves, criador de gado na Fazenda Sardinha. Os homens atiraram. Os três fugiram. Mas Adenilson ficou preso a uma cerca. Foi agredido a coronhadas e depois alvejado com um tiro na cabeça. O fazendeiro confessou o crime e responde em liberdade.

    Essas duas formas de ver o mesmo fato convivem na Cartografia dos Ataques Contra Indigenas (Caci), lançada nesta terça-feira (11/10). O projeto desenvolvido pela Fundação Rosa Luxemburgo, em parceria com armazém Memória e InfoAmazonia, baseia-se nos registros de assassinatos de indígenas feitos entre 1985 e 2015 pelo Conselho Indigenista Missionário (Cimi) e pela Comissão Pastoral da Terra (CPT). Isolados, não são inéditos.

    O que muda é a percepção da dor. “Caci”, em Guarani, significa exatamente dor. A cartografia oferece uma concretude espacial e (diante do padrão observado nos assassinatos) uma amplitude. Um fato, uma sequência de fatos, e uma lógica. A história que se segue a cada assassinato é um zoom e um soco no estômago do homem branco. Pois alguém, ali, atirou, ou espancou – em nome de algo. De um modelo.

    É como se fosse a cartografia de um bombardeio.

    Observemos um caso de 1985. O Brasil vivia o período de redemocratização. Adolfo Macaxali morre em Bertópolis (MG), quase na Bahia. (O internauta deve clicar em 1985, na busca, e observar a lista – sim, ainda incompleta – de cinco casos reunidos pelo site.)

    Motivo: “A vítima foi morta de fome por um empregado da cantina da Funai”.

    Mais um caso de 1985. Waldemar Apinajé é assassinado em Tocantinópolis (GO). Descrição: “A vítima foi morta por um delegado policial”.

    E vejamos outro caso daquele ano, quando o Brasil chorava a morte de Tancredo Neves. Oedson Eduardo da Silva, em Cantá (RR). “Encontrado morto na maloca do Moscou, em Serra da Lua”.

    Notem que, nesta narrativa, passamos do tempo passado para o tempo presente. Pois é disso que se trata. De reavivar a memória de uma civilização que, há 500 anos, mata indígenas.

    Essa história nos é lembrada a partir da cartografia. Clicamos em um caso e lá vai o cursor para o local exato. 1990. Oito casos registrados. Damião e Mário Macuxi são mortos em Normandia (RR), na Raposa Serra do Sol. 1995. 54 casos registrados. Ângelo Miguel é assassinado a tiros na Terra Indígena Inhacorá, em São Valério do Sul (RS). Conflito de terras. Os indígenas pediam que os acusados deixassem a área.

    2000. Os casos não aparecem. (O site precisa de atualização. Mas não faltam horrores.)

    2005. O cacique João Guajajara é executado com três tiros na Terra Indígena Bacurizinho, em Grajaú (MA). Milton Careca fazia ameaças, dizia que todos os Guajajara deviam deixar a aldeia. A Funai e a polícia sabiam das ameaças. A Cartografia dos Ataques Contra Indígenas nos conta que o conflito ocorreu pela “pressão dos exploradores irregulares da soja, carvão e eucalipto”. A filha de 16 anos do cacique foi estuprada.

    2010. “Jovem não identificado”. “Adolescente não identificado”. “Homem não identificado”. Mas são 61 casos, ao todo. Muitos são de brigas familiares, ou entre os próprios indígenas – em boa parte potencializadas pelo álcool. Outros, não. Ou não se sabe o motivo. Quem matou a pauladas Raimundo Anilton Alves da Silva, em Paragominas (PA), na Terra Indígena Alto Rio Guamá?

    2015. Semião Vilhalva é assassinado na Terra Indígena Ñande Ru Marangatu, em Antônio João (MS). Ele tinha 24 anos. Seu rosto foi perfurado por uma bala. “O ataque foi premeditado e perpetrado por fazendeiros”, diz o site. Lemos que a morte de Simeão é uma consequência da decisão do governo federal de paralisar os procedimentos de demarcação. A Terra Indígena foi homologada em 2005, mas o Supremo Tribunal Federal (STF) suspendeu a decisão, “submetendo as famílias a uma crise humanitária já apontada por organismos internacionais como uma das mais graves do mundo”. Se o leitor der um zoom verá mais seis casos na mesma TI. Se diminuir o zoom, constará que houve 400 assassinatos de indígenas no Mato Grosso do Sul. E pode voltar ao texto sobre Semião: “Além da situação de vulnerabilidade, os Guarani são alvos, diariamente, de ações e discursos criminosos de incitação ao ódio e à violência proferidos por parlamentares ruralistas com o objetivo de colocar a sociedade sul-mato-grossense contra eles”.

    2020? 2025? 2030?

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  • 14/10/2016

    O Agro é Cídio

    Por Cleber César Buzatto, secretário executivo do Cimi* 

    Grandes corporações estão articuladas e empenhadas na tentativa de embelezar a imagem do agronegócio. Dentre as iniciativas mais recentes está o investimento milionário em campanha publicitária assumida, oficialmente, por uma rede massiva de comunicação. Todos os dias ouvimos e nos perguntamos: O Agro Tech? O Agro é Pop? O Agro é tudo? É evidente que não. No campo, distante das lentes modernas e bem pagas, o Agro é Cídio.

     

    Cídio de Homicídio. A máquina do agronegócio funciona vinte e quatro horas por dia, todos os dias perpetrando e implementando planos de assassinatos de indígenas, camponeses, ambientalistas, daqueles que estão no seu caminho e colocam algum tipo de dificuldades para seus intentos sem limites de exploração fundiária. De acordo com dados da Comissão Pastoral da Terra (CPT), somente nos últimas dez anos, no período de 2006 a 2015, foram 340 assassinatos no campo. E a situação está cada vez pior. Em 2015 foram 50 assassinatos. Em Rondônia está em curso uma verdadeira matança de camponeses que lutam pela reforma agrária ou para manter a posse de suas terras contra o avanço do latifúndio (1). No Maranhão, defensores de direitos humanos, especialmente ligados à questão fundiária, são ameaçados e mortos recorrentemente (2). O Pará lidera o ranking histórico de assassinatos no campo (3).  No Mato Grosso do Sul, são sistemáticos os ataques milicianos paraestatais com assassinatos de indígenas que lutam pela demarcação de suas terras sagradas (4). Em todo o país, multiplicam-se os homicídios provocados, direta ou indiretamente, pelo Agro (5). 

     

    Cídio de Suicídio. Produzidos por grandes corporações do agronegócio, em geral multinacionais (6), os agrotóxicos fazem parte do receituário comercial na produção de commodities agrícolas. Há anos, o Brasil ocupa a posição de maior consumidor mundial de agrotóxicos (7). O Brasil consome mais de um milhão de toneladas de agrotóxicos, o que equivale cerca de 5,2 kg por habitante anualmente. Muitos tipos de veneno proibidos na Europa e Estados Unidos são legalizados e usados livremente no Brasil por força do lobby ruralista e empresarial (8). São fartas as pesquisas que relacionam a alta incidência de depressão e suicídios ao uso de agrotóxicos no Brasil (9). Milhares de pessoas vão a óbito no país, todos os anos, devido a lesões auto-provocadas. Os agrotóxicos também estão diretamente ligados proliferação do câncer entre os cidadãos brasileiros. Diferentes instâncias do Estado brasileiro, como o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea) e o Instituto Nacional do Câncer (INCA),  chamam a atenção para essa realidade (10). 

     

    Cídio de Ecocídio. O agronegócio é um dos maiores responsáveis pela destruição do meio ambiente no Brasil (11) e contribui fortemente para o agravamento do aquecimento do planeta (12). Com incentivos governamentais ou de forma ilegal, nada escapa ao alcance do ‘Agro’. Do Pampa (13) à Amazônia (14), passando pelo Cerrado (15), berço das águas, o avanço das ‘fronteiras agrícolas’ destrói, sem trégua, nossa ‘Casa Comum’. 

     

    Cídio de hidrocídio. Os Rios Araguaia (16), Tocantins (17), Formoso (18) e o São Francisco (19) estão secando. Muitos rios já secaram e tantos outros secarão. Em todos os casos, o agronegócio tem participação especial. Desmatando, assoreando, aterrando e sugando a água que sobra para projetos insustentáveis de irrigação, o agronegócio vai fazendo seus cadáveres horizontais em todas as regiões do Brasil.

     

    Sem maquiagem, o ‘Agro’ não passa no teste de legitimidade social. Com campanhas bem pagas em redes comerciais de comunicação, conivência estatal, impunidade quase absoluta e forte lobby das bancadas ruralistas Brasil afora, o ‘Agro’ vai impondo sua agenda violenta, repressiva e regressiva contra os povos da terra, das águas, das florestas e das cidades sem se incomodar e buscando não ser incomodado.

     

    Aos povos e seus aliados resta a luta contra as cercas, motosserras e espingardas, constantemente recarregadas, do ‘Agro’. Luta altiva dos povos em prol de uma sociedade mais justa, mais plural e mais democrática, onde a vida seja plena para todos. A pesar do contexto difícil, a luta e a esperança continuam. Quanto mais luta, maior a esperança.

     

     

     

    *Cleber Buzatto é Licenciado em Filosofia pela FAFIMC – RS.

    Referências: 
     

    1- 37 assassinatos desde 2015. http://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2016/09/21/com-37-mortes-desde-2015-rondonia-vive-guerra-sangrenta-por-terras.htm

    2- 25 assassinatos desde 2015. http://smdh.org.br/wp-content/uploads/2016/10/Assassinatos-de-Defensores-2015-2016-monitoramento-SMDH.pdf 

    3-  645 assassinatos de 1985 a 2013. http://agenciabrasil.ebc.com.br/direitos-humanos/noticia/2015-02/para-concentra-38-dos-assassinatos-por-conflito-de-terra-no-pais 

    4- https://www.youtube.com/watch?v=slfJXEjQRA4

    5- http://www.cptnacional.org.br/index.php/component/jdownloads/send/41-conflitos-no-campo-brasil-publicacao/14019-conflitos-no-campo-brasil-2015?option=com_jdownloads ehttps://cimi.org.br/pub/relatorio2015/relatoriodados2015.pdf 

    6- file:///C:/Users/Usu%C3%A1rio/Downloads/Larissa_Mies_Bombardi_artigo_agrot%C3%B3xicos-1.pdf 

    7- http://www2.camara.leg.br/camaranoticias/radio/materias/REPORTAGEM-ESPECIAL/476877-BRASIL-E-O-MAIOR-CONSUMIDOR-MUNDIAL-DE-AGROTOXICOS-BLOCO-1.html 

    8- http://brasil.elpais.com/brasil/2015/04/29/politica/1430321822_851653.html 

    9- http://repositorio.caminhosdocuidado.org/bitstream/handle/62/2/rbso.S0303-76572007000200004.pdf ;http://www.scielo.br/pdf/csp/v21n2/27.pdf ; https://www.brasildefato.com.br/2016/10/05/estudos-relacionam-uso-de-agrotoxicos-com-suicidio-de-agricultores/ 

    10- http://www4.planalto.gov.br/consea/comunicacao/noticias/2016/estudos-apontam-relacao-entre-o-consumo-de-agrotoxicos-e-o-cancer ehttp://www1.inca.gov.br/inca/Arquivos/comunicacao/posicionamento_do_inca_sobre_os_agrotoxicos_06_abr_15.pdf 

    11- http://reporterbrasil.org.br/2006/07/desmatamento-e-poluicao-seguem-o-rastro-do-agronegocio/ ehttp://noticias.uol.com.br/meio-ambiente/ultimas-noticias/redacao/2015/09/25/fronteiras-agricolas-sao-maiores-responsaveis-por-desmatamento-diz-ibge.htm 

    12- reporterbrasil.org.br/2013/09/agronegocio-brasileiro-contribui-para-o-aquecimento-global/

    13- http://www.extraclasse.org.br/edicoes/2010/08/a-destruicao-do-pampa-gaucho/ 

    14- http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1414-753X2012000200002

    15- http://brasilescola.uol.com.br/brasil/desmatamento-cerrado.htm

    16- http://www.portaldoservidor.go.gov.br/post/ver/212660/voce-sabia-que-o-rio-araguaia-pode-secar 

    17- http://g1.globo.com/goias/bom-dia-go/videos/v/rio-tocantins-esta-secando-no-trecho-que-passa-por-miracema-bancos-de-areia-se-acumulam/5076400/

    18- http://g1.globo.com/to/tocantins/noticia/2016/07/produtores-descumprem-acordo-para-desligar-bombas-e-rios-secam-no.html

    19- https://www.youtube.com/watch?v=hwADHPXRh9w

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  • 13/10/2016

    VII ASSEMBLEIA DA PEMPXÀ: Povo Apinajé se mobiliza diante da conjuntura de retirada de direitos

    Entre os dias 05 a 09 de outubro de 2016 estivemos reunidos na aldeia Recanto, Terra Indígena Apinajé, no município de Tocantinópolis (TO), na VII Assembleia Ordinária da Associação União das Aldeias Apinajé-Pempxà, que teve expressiva participação de caciques, lideranças, mulheres, professores, estudantes, anciãos, conselheiros e demais lideranças do povo Apinajé. Ao menos 150 pessoas participaram da assembleia.

    Nesta assembleia debatemos especialmente sobre as questões do território Apinajé, que continua invadido e depredado por invasores não-Índios. Ainda manifestamos preocupação com a degradação ambiental das áreas limítrofes do entorno desta T.I. que estão sendo desmatados para plantio de eucaliptos, formação de pastagens e implantação de carvoarias, gerando impactos diretos sobre as nascentes e mananciais de águas da T.I. Apinajé.

     
    Ao analisarmos a conjuntura da política indigenista do país, no governo Michel Temer; novamente apontamos as condições de abandono e sucateamento da FUNAI/sede em Brasília, situação que se estende a todas as CRs e CTLs espalhadas pelo país. Percebemos que essa atitude do governo federal demonstra total falta de compromisso, e omissão diante das responsabilidades e deveres constitucionais da União de demarcar, fiscalizar e proteger as terras indígenas.

    Percebemos que de forma intencional e irresponsável o governo federal vem cortando recursos da FUNAI/sede, deixando as terras indígenas totalmente desprotegidas e as comunidades inseguras. Agindo assim o governo dar “carta branca” e incentivos políticos para madeireiros, grileiros, pescadores, caçadores, arrendatários, garimpeiros e outros continuarem invadindo e roubando nossas terras. Nesse contexto o agravamento de conflitos entre os povos indígenas e esses invasores é inevitável.

    Continuando a mesma política perversa de governos anteriores, o presidente Michel Temer quando discursa em eventos no exterior apresenta falsos relatórios e dados inverídicos sobre a situação dos direitos dos povos indígenas no Brasil. Também descreve dados fantasiosos e românticos sobre a redução das queimadas, e do desmatamento da Amazônia e do Cerrado. Mas, a realidade que vivemos é de conflitos fundiários, desmatamentos, retrocessos políticos, violações de direitos humanos, criminalização de lideranças, prisões e ameaças de morte.

    Nesse momento consideramos o PDA/Matopiba o mais letal e ameaçador plano de intervenção na vida das populações (indígenas, quilombolas, ribeirinhos e quebradeiras de coco) que depende do bioma Cerrado para sobreviver, esse com certeza é parte da proposta (entreguista) do governo de vender, alienar e arrendar as terras brasileiras para as grandes empresas produtoras de grãos. Por outro lado o governo também fala em afrouxar as regras para o Licenciamento Ambiental. Isso significa que a ganância e a fome de lucro das multinacionais do setor elétrico, dos ruralistas e das mineradoras nunca terão limites.


    CONSULTA E PARTICIPAÇÃO: UMA QUESTÃO DE DIREITOS HUMANOS

    Em 20 de junho de 2002, o Congresso Nacional aprovou por meio do Decreto Legislativo nº 143 a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho – OIT, e no dia 19 de abril de 2004 o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva promulgou por meio do Decreto nº 5.051 este importante Acordo Internacional. Dessa forma nosso país ratificou e é signatário da Convenção 169 da OIT, que em seu Art. 6º diz que os governos deverão: “estabelecer meios através dos quais os Povos Indígenas possam participar livremente, pelo menos na mesma medida que outros setores da população em todos os níveis, na adoção de decisões em instituições efetivas ou organismos administrativos e de outra natureza responsáveis pelas políticas e programas que lhes sejam concernentes”.

    Já a Declaração das Nações Unidas Sobre os Direitos dos Povos Indígenas, no Art. 18, recomenda: “Os povos indígenas têm direitos de participar da tomada de decisões sobre questões que afetem seus direitos, por meio de representantes por eles eleitos de acordo com seus próprios procedimentos, assim como de manter e desenvolver suas próprias instituições de tomadas de decisões”. Tanto a Declaração das Nações Unidas, como a Convenção 169 da OIT, também adverte que os governos deverão: “consultar os Povos Indígenas, mediante procedimentos apropriados e, particularmente, através de suas instituições representativas, cada vez que sejam previstas medidas legislativas ou administrativas suscetíveis de afetá-los diretamente”.
      

    De acordo com esses preceitos e normas estabelecidas na Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho – OIT, durante nossa assembleia também debatemos sobre nosso direito de ser ouvidos e consultados, de forma livre prévia e informada, quando os kupẽ (não-índios) desejarem desenvolver qualquer ação ou projeto dentro ou no entorno de nosso território, e ainda sobre pedidos e autorizações para entrada de pesquisadores, religiosos e outros (não-índios) para atuar em nossas aldeias.

    Em razão da total ausência de Fiscalização da T.I. Apinajé, pedimos urgência à FUNAI/CGLIc na conclusão do processo de transição do PBA Timbira, e a imediata assinatura do Termo de Compromisso com o CESTE. Estamos dependendo da conclusão desse processo para iniciar a execução de nosso Plano Permanente de Segurança e Monitoramento Territorial.

    Desta forma destacamos os seguintes encaminhamentos: 1) Realizar uma reunião interna de caciques na aldeia São José, nos dias 15 e 16/10/16, para conclusão do Plano de Trabalho PBA Timbira 2016/17. 2) Elaborar e encaminhar ofício à FUNAI/sede com a decisão dos caciques sobre a regularização fundiária da área Apinajé II; Incluindo a “Caverna do Morcego” 3) Elaborar uma proposta do povo Apinajé para a próxima gestão municipal do Prefeito eleito Paulinho do Bonifácio, período 2017/2020.  4) Ficou decidido também realizar uma próxima reunião de caciques para discutir e elaborar um Protocolo de Consulta interna a ser seguido por todos os caciques. 5) Finalmente ficou acordado que de agora em diante quando se desejar implantar, ou construir qualquer empreendimento, ou implementar projetos, bem como autorizar a entrada de não-índios; religiosos, pesquisadores e outros, devem ser ouvidas e consultadas nossas organizações representativas; caciques, conselhos deliberativo e consultivo. A Funai/local também deverá ser informada.

    Durante os (05) cinco dias da assembleia, além dos assuntos relacionados ao território Apinajé, à política indigenista brasileira, e ao PBA Timbira. Debatemos ainda sobre a questão da saúde, educação e eleições 2016. A VIII Assembleia Ordinária e Eletiva da União das Aldeias Apinajé-Pempxà está prevista para acontecer no período de 18 a 21 de setembro de 2017, na aldeia São José.

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  • 13/10/2016

    Famílias Pataxó são despejadas da Aldeia Aratikum para as margens da BR-367, na Bahia

    Por Renato Santana, da Assessoria de Comunicação – Cimi

    Cerca de 30 famílias Pataxó da Aldeia Aratikum, no extremo sul da Bahia, foram despejadas de suas moradias e jogadas às margens da BR-367 na manhã desta quinta-feira, 13. Desde 2015, uma ação de integração de posse tramitava na Justiça Federal. No início dessa semana, os Pataxó foram notificados do despejo e a Fundação Nacional do Índio (Funai) não recorreu da decisão. 

    Os Pataxó foram surpreendidos por homens das polícias Federal, Civil e Militar logo cedo. Acompanhados por um oficial de justiça, os policiais executaram a reintegração de posse contra a aldeia, cuja terra de 220 hectares está em processo de aquisição pela Funai. A ação da polícia, de acordo com os Pataxó, foi truculenta e arbitrária, sem oferecer tempo para a retirada de pertences – um caminhão removeu o que pôde ser salvo.

    “Não resistimos, mas a polícia parecia que ia entrar numa guerra. Estamos aqui na beira da estrada, mulheres, crianças e idosos”, diz o cacique José Ailton Pataxó. Um trator foi utilizado para destruir moradias, a escola, roças, casas de reza e tudo o mais erguido pelos Pataxó na terra tradicional. Conforme o cacique, a autora do pedido de reintegração chama-se Eva Mendes, mora em Curitiba e esteve no local durante a ação policial.

    Para o presidente da Federação Indígena das Nações Pataxó e Tupinambá do Extremo Sul da Bahia, cacique Aruã Pataxó, presente no local, a reintegração, e as demais que afetam as terras indígenas do povo, é fruto “da fragilidade política que as demarcações têm no país hoje. Seja no Executivo, Legislativo e Judiciário. A Justiça, por sua vez, não faz nada para evitar isso. A Funai está sem cumprir com a sua função, totalmente sucateada”.

    “Era uma terra improdutiva quando retomamos, em 2013. Essa mulher e o marido, um norte-americano, que não vivem aqui, se dizem donos. Fizemos uma escola, casas e nossas roças. O artesanato complementa a renda das famílias. Agora estamos na beira da estrada sem teto, sem terra, sem saber o que vamos dar de comer para as crianças”, lamenta o cacique José Ailton. No último mês de julho, uma delegação Pataxó esteve em Brasília para reivindicar a efetivação da aquisição pela Funai da Aldeia Aratikum.

    A situação é desesperadora paras as famílias Pataxó. “Tá todo mundo na beira da estrada, sem ter para onde ir. Muito dolorido as famílias vendo suas casas sendo colocadas no chão. A escola das crianças, tão importante. Um sofrimento terrível”, se emociona Kairana Pataxó. A Aldeia Aratikum fica no município de Santa Cruz Cabrália. A região é cobiçada por empreendimentos imobiliários voltados ao turismo. Um projeto prevê a construção do que se pretende ser o maior resort da América Latina na área, que ainda abarca as terras indígenas de Coroa Vermelha e Mata Medonha.

    O despejo pode ser considerado o legado da Copa do Mundo de 2014. Depois da seleção da Alemanha ter se hospedado na região, acompanhada por um batalhão de repórteres e turistas estrangeiros, o mercado imobiliário valorizou ainda mais as terras. Proprietários passaram a surgir com títulos de posse e prefeituras locais intensificaram ações políticas alegando que as terras indígenas prejudicam a economia local.

    “Todo ano é o mesmo sofrimento. Expulsaram a gente das aldeias Cari, Boca da Mata, Aroeira, Juerana, Mata Medonha. Dissemos pra polícia que não temos pra onde ir e eles responderam que tínhamos sim, a rodovia. O governo não demarca nossa terra. Até quando vamos sofrer e morrer? Parece que índio no Brasil não é gente, não é nada. Europeu achava a mesma coisa quando invadiu aqui”, ataca Kairana.

    Fotos: Povo Pataxó/Aldeia Aratikum

    Texto atualizado em 17 de outubro, às 16 horas

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  • 12/10/2016

    “Nós somos Kinikinau, moço! Ki-ni-ki-nau!”

    Ruy Sposati, de Dourados (MS) | Fotos: Lídia Farias/Cimi

    Entre os dias 13 e 16 de outubro, será realizada a 3ª Assembleia do Povo Kinikinau, na aldeia Mãe Terra, no município de Miranda (MS). Na programação, dezenas de lideranças, jovens, mulheres, rezadores, professores, profissionais de saúde, indigenistas e apoiadores falarão sobre a conjuntura da luta indígena no país e no estado, terra, medicina tradicional e educação escolar indígena.

    O território onde será realizado o encontro pertence aos Terena, e isto já diz bastante coisa sobre a situação dos Kinikinau: atingidos desde o século dezenove pelas empreitadas civilizatórias na região do Pantanal, os indígenas ficaram sem suas terras tradicionais, chegando a ser considerados extintos pelo indigenismo oficial.

    E no entanto, eles seguem vivos. Os Kinikinau somam ao menos 600 pessoas, dispersas entre territórios Kadiweu e Terena. A maioria das famílias está estabelecida na aldeia São João, dentro da terra indígena Kadiweu, no município de Porto Murtinho.

    O antropólogo Giovani José da Silva conta que, em 1997, foi enviado à região para conversar com os indígenas sobre a questão pedagógica nas aldeias. A primeira aldeia visitada por ele foi justamente a São João. Em seu relato, Giovani recorda: "iniciei minha fala referindo-me à importância de se ter uma educação específica e que no caso daquela aldeia deveria ser uma escola voltada para os interesses dos Kadiweu. Foi quando vi um ar de reprovação nos rostos daqueles homens e mulheres indígenas e percebi que estava diante de uma maioria que não se reconhecia Kadiweu, embora vivessem dentro da Reserva Kadiwéu". Ao que alguém lhe responde:  "Nós somos Kinikinau, moço! Ki-ni-ki-nau!”.

    Mais antigos

    Esta é a terceira assembleia realizada pelos Kinikinau. "Essa luta não é nova", explica a liderança Kinikinau e mestre em Sustentabilidade junto a povos e terras indígenas pela Universidade de Brasília (UnB). "Desde que nós entendemos por gente, vemos os mais velhos falando de ir de volta para o nosso território".

    Leia a carta do povo Kinikinau ao Estado Brasileiro

    "Tem muitos Kinikinau entre os Terena", explica. "O problema é que a maioria se identificava como Terena, porque até a década de 90, nós éramos registrados assim. Eu mesm guardo essa lembrança, porque tenho duas certidões de nascimento indígena". Em função da leitura de antropólogos – notadamente, Roberto Cardoso – e do Serviço de Proteção ao Índio (SPI) e da Fundação Nacional do Índio (Funai), responsáveis pelo registro, todos os pais e mães Kinikinau registravam, até pouco mais de duas décadas atrás, os filhos como Terena.

    Rosaldo relembra as histórias contadas pelos "mais antigos" sobre o processo de dispersão e perda territorial. "O seu Leôncio, um idoso Kinikinau falecido em 2010, dizia que as famílias pegaram uma carreta de boi, colocaram tudo o que tinham dentro e saíram pela estrada. De 1910 até 1940, ficaram perambulando pelo caminho", relata.

    Foi quando o grupo mais numeroso de pessoas Kinikinau chegaram ao território Kadiweu, onde um acordo foi feito. "Os Kadiweu disseram a nós: ‘aqui é uma passagem de pessoas e de boiada. Então vocês ficam aqui na entrada, cuidando pra ninguém fazer moradia aqui’. E assim nós nos assentamos ali, ficando como protetores da região". A eles estava claro, contudo, que a terra não pertencia aos Kinikinau, embora o que fosse ali produzido fosse de uso exclusivo deles mesmos.

    Leia entrevista de Rosaldo a Tânia Pacheco (Racismo Ambiental)

    Rosaldo relata que, na década de 90, frente às pressões da expansão da fronteira agrícola e em decorrência de atritos com algumas novas lideranças Kadiweu, famílias começaram a deixar o território, e a ideia do retorno a seus territórios originários volta com mais força ao desejo coletivo dos Kinikinau, que em 2004 realizam um primeiro seminário no município de Bonito, e em 2014 e em 2015 realizam, respectivamente, a primeira e segunda assembleias do povo.

    "A saída deles de São João e a reivindicação do território tradicional é uma consequência dos erros comentidos pelo Estado", explica a missionária do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) Lídia Farias de Oliveira. "O Estado cometeu o erro de tirar os Kinikinau de seus territórios, obrigá-los a assumir outra identidade para continuarem sendo indígenas… É claro que um dia esta conta chegaria. O problema é o que estado continua negligente, como cem anos atrás, quando os Kinikinau foram expulsos para liberar as terras para a produção agrícola, exatamente como aconteceu no sul do Mato Grosso do Sul com os Kaiowa e Guarani, e finge não ouvir a reivindicação dos Kinikinau", conclui.

    Incidência internacional indígena

    Em agenda internacional, a liderança Kaiowa Elizeu Lopes denunciou também a situação dos Kinikinau a parlamentares e membros da União Europeia, além de membros do governo da Inglaterra, Suiça, Suécia, Áustria e Bélgica. "A Europa precisa saber que ainda há povos sem nenhuma terra no Mato Grosso do Sul", afirmou Elizeu a deputados e ministros, desmentindo os dados do governo brasileiro sobre a demarcação de territórios indígenas.

    O encontro é realizado pelo Conselho do Povo Kinikinau, com o apoio do Aty Guasu Guarani e Kaiowa, Conselho Terena, além do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Funai e Coordenadoria Ecumêmica de Serviço (CESE), e contará com a participação de lideranças indígenas de todo o estado.

    Confira a programação da Assembleia

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  • 11/10/2016

    Liderança histórica dos Xukuru-Kariri é assassinada durante II Seminário Pedagógico do povo


                                               Foto: José hélio Pereira da Silva/Cimi-NE


    Por Renato Santana, da Assessoria de Comunicação – Cimi 

    João Natalício dos Santos Xukuru-Kariri, histórica liderança dos povos indígenas do Nordeste, foi assassinado a facadas na madrugada desta terça-feira, 11, na porta da casa onde vivia, na aldeia Fazenda Canto, Terra Indígena Xukuru-Kariri, a 7 km da cidade de Palmeira dos Índios, Alagoas. Seu João, como era chamado, participou ontem da abertura do II Seminário Pedagógico: A Caminhada dos Guerreiros e Guerreiras Xukuru-Kariri, que trouxe a memória de Maninha Xukuru-Kariri, morta há dez anos. A foto acima, durante a atividade, foi o último registro de Seu João — que está de boné, camisa de botão e bermuda. 

     

    De acordo com o chefe da Coordenação Técnica Local (CTL) da Fundação Nacional do Índio (Funai), Cristóvão Marques da Silva, presente na aldeia Fazenda Canto, até o final da manhã o corpo ainda estava no local no aguardo da perícia da Polícia Civil e do Instituto Médico Legal (IML). “Eu estive na delegacia para agilizar os procedimentos e ao que parece, além das facadas, João foi atingido também por disparos de arma de fogo”, explica Silva. O apelo da morte é tamanho que indígenas de todo o território foram para a casa de Seu João.  

     

    Por volta das 4 horas da madrugada, enquanto Seu João se preparava para ir ao roçado que mantinha, dois indivíduos não identificados chamaram a liderança. O indígena saiu da casa para ver quem era. Com alguma conversa atraíram o Xukuru Kariri e desferiram os golpes de faca; também os disparos de arma de fogo, a serem confirmados pela perícia. Ao que tudo indica, os assassinos conheciam Seu João. 

     

    “A região tem um histórico de violência por conta da luta pela terra. Seu João era uma liderança antiga do povo”, afirma uma liderança Xukuru-Kariri que não identificamos por razões de segurança. O indígena explica que a aldeia Fazenda Canto é composta pelos 72 hectares demarcados em 1952, onde Seu João morava, e pela retomada realizada nos últimos anos e parte da demarcação em curso pela Funai, mas paralisada. 

     

    Integrantes do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) estiveram ontem com Seu João, na abertura do Seminário com a tradicional procissão do povo com a imagem de Nossa Senhora Aparecida. “É uma situação muito triste. Ele estava feliz e falando da luta do povo pela terra, relembrando com muita felicidade de Maninha Xukuru-Kariri”, diz Francisco Bispo, padre e missionário do Cimi. 

     

    Na abertura do II Seminário, Seu João fez uma fala emocionada sobre Maninha Xukuru-Kariri e dançou o Toré. Participou da procissão e de toda a programação do dia. “Cancelamos o II Seminário, que deveria acabar só amanhã. Estamos todos assustados e tristes. Não sabemos quem foram os autores desse crime. Seu João não era envolvido com nada de errado, mas alguém já antigo e respeitado pelo povo”, diz um Xukuru-Kariri.  

     

    Angelo Bueno, também missionário do Cimi, conheceu Seu João em 1992, durante uma reunião da Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo (Apoinme). "Sempre uma  pessoa  discreta e  fiel  guerreiro  do  movimento  indígena,  ajudando  nas  ações  de  planejamento  e  avaliação  da  luta  como  também  sempre  foi  um  animador  do  Ritual, do Toré”, ressalta Bueno. 

     

    Seu João gostava de uma boa prosa. Em entrevista ao Cimi, durante a Assembleia Xukuru-Kariri de 2014, o indígena fez questão de conversar apenas depois de fazer um café, enrolar um cigarro e acomodar a todos na sala de sua casa, em cujo quintal foi morto. Nas paredes caiadas de azul, Seu João mantinha os retratos pintados de seus pais, em molduras antigas e gastas, além de instrumentos rituais do povo: cocar, maracás e arcos e flechas.

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  • 10/10/2016

    Movimentos e organizações do Campo Unitário divulgam nota de indignação e repúdio ao governo federal


    Vários movimentos e organizações do campo, das águas e das florestas integrantes do Campo Unitário divulgaram, nesta segunda (10), uma nota de indignação e repúdio ao governo federal. Os movimentos e organizações criticam a falta de comprometimento do governo federal com os compromissos assumidos em audiência realizada após a Jornada Nacional de Lutas, no início de setembro, que mobilizou milhares de militantes em pelo menos 14 estados do país. Na ocasião, os movimentos chegaram a ocupar o Ministério do Planejamento.

    Entre as pautas ignoradas pelo governo, estão a demarcação das terras indígenas e quilombolas e a manutenção do orçamento para a reforma agrária e a agricultura familiar e camponesa nos anos de 2016 e 2017, além da contratação de projetos de habitação rural e do desbloqueio de cerca de 575 mil famílias assentadas que tiveram seu cadastro suspenso pelo Tribunal de Contas da União (TCU).

    “Toda a nossa indignação com esse cenário de descaso, de instabilidade e desvalorização da política agrária pelo governo federal, será convertida em luta pela defesa e efetivação de nossos direitos”, afirmam no documento.

    Leia a íntegra da nota abaixo ou clique aqui para acessar o documento em pdf:

    Nota de repúdio e indignação do Campo unitário ao Governo Federal

    Nós Movimentos e Organizações do campo, águas e florestas integrantes do Campo Unitário manifestamos nossa insatisfação com a postura do Governo Federal no tratamento à nossa pauta e aos nosso processo de mobilização durante reunião realizada nos dias 05 e 06 de outubro, em Brasília-DF.

    Esse tratamento reafirma o caráter ilegítimo e anti democrático deste governo, e deixa em evidencia que políticas conquistadas com muita luta nos últimos anos sofrem risco de extinção.

    O objetivo desta reunião era obter resposta do governo federal à pauta entregue em audiência realizada no ultimo 05 de setembro, fruto de nossa Jornada Nacional de lutas que mobilizou cerca de 30 mil militantes em 14 estados do país em torno da luta pela terra, que teve como marco a ocupação do ministério do planejamento. Na ocasião a pauta foi apresentada aos ministros Eliseu Padilha da Casa Civil, Dyogo Henrique de Oliveira do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão e Bruno Áraujo da Cidades, e Gedel Viera Lima da Secretaria de Governo da Presidência, além do Presidente do INCRA e o Secretário da SEDA.

    Durante audiência do dia 5 de setembro foram firmados compromissos com a manutenção dos valores orçamentários em igual ou superiores de 2016 para 2017, para reforma agrária e agricultura familiar e camponesa; contratação dos projetos de habitação rural já apresentados e manutenção do programa em 2017; a demarcação de terras indígenas e quilombolas; atuar para o efetivo desbloqueio dos cadastros de assentados atingidos pelo acórdão do Tribunal de Contas da União (TCU) e para resolução das dívidas provenientes da seca.

    No entanto nenhum destes compromissos se efetivaram, foram ignorados em reuniões e nos processos seguintes, como se explicita a baixo:

    Na Proposta de Lei de Orçamento Anual (PLOA) encaminhada ao Congresso houve uma redução drástica dos valores previstos para áreas fundamentais da política agrária, tais como a obtenção de terras, PRONERA, ATES, e programas de agroindústrialização, PAA, PNAE dentre outras.

    O ministro das Cidades, garantiu a efetivação de 35 mil unidades habitacionais rurais em 2016 . No entanto dia seguinte, em reunião afirmou que tal contratação não era possível por falta de recursos.

    O governo comprometeu-se em atuar para desbloquear as 575 mil famílias listadas, em sua maioria, erroneamente como irregulares pelo TCU. No entanto ocorreu o desbloqueio parcial e provisório, sem nenhuma garantia de solução efetiva para tais casos.

    Sobre as dívidas provenientes da seca que atingem as regiões norte e nordeste e os estados de Minas Gerais e Espírito Santo, as medidas adotadas pelo governo federal não solucionam o grave problema do endividamento. O modelo de repactuação ofertado impede que as famílias acessem a novos créditos nos próximos anos, além de que a MP 733/2016, que trata de pagamento de dívidas, não cobre todas as áreas afetadas.

    O governo também afirmou que seriam emitidos decretos para todas as terras indígenas e quilombolas que apenas dependiam disto para sua titulação. Até o momento nenhum decreto foi assinado.

    A reunião realizada em 5 e 6 de outubro onde deveriam ser apresentadas respostas concretas às reivindicações defendidas em setembro, quem indicassem o cumprimento dos compromissos já firmados, mais uma vez não se concretizou. Além disso a ausência do ministro Padilha, demonstra o desinteresse do governo federal com os povos e à pauta agrária.

    Afirmamos que toda a nossa indignação com esse cenário de descaso, de instabilidade e desvalorização da política agrária pelo governo federal, será convertida em luta pela defesa e efetivação de nossos direitos.

    Não permitiremos que políticas públicas que trouxeram dignidade aos povos do campo, das águas e florestas sejam excluídas, diminuídas ou inviabilizadas.

    Por nenhum direito há menos seguiremos mobilizados e resistindo!

    Brasília, 06 de outubro de 2016

    Assinam:

    APIB- Articulação dos Povos Indígenas do Brasil
    CIMI- Conselho Indigenista Missionário
    CPT- Comissão Pastoral da Terra
    CONAQ- Coordenação Nacional dos Quilombolas
    CONTAG- Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura
    CONTRAF BRASIL – Confederação Nacional dos Trabalhadores e Trabalhadoras na
    Agricultura Familiar do Brasil
    FEAB- Federação dos Estudantes de Agronomia do Brasil
    MAB- Movimento dos Atingidos por Barragens
    MAM- Movimento Nacional pela Soberania Popular Frente a Mineração
    MCP- Movimento Camponês Popular
    MMC- Movimento das Mulheres Camponesas
    MPP – Movimento de Pescadores e Pescadoras Artesanais
    MPA- Movimento dos Pequenos Agricultores
    MST- Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra

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  • 10/10/2016

    TJ/MA suspende segunda decisão da Justiça Estadual contra o povo Gamela


                                                        Foto: Cimi Regional Maranhão

    Por Renato Santana, da Assessoria de Comunicação – Cimi

    O desembargador Marcelo Carvalho Silva do Tribunal de Justiça do Maranhão suspendeu, no final da semana passada, um interdito proibitório contra o povo Gamela determinado pela Justiça Estadual da Vara de Matinha. “Reconhecendo a incompetência absoluta da Justiça Comum para processar e julgar o feito”, o desembargador decidiu pela “imediata remessa” da ação original à Justiça Federal.

     
    Esta é a segunda suspensão decidida pelos desembargadores do TJ-MA envolvendo sentenças
    contra o povo Gamela do juiz Celso Serafim Júnior, da Comarca Estadual de Matinha. No último dia 04, o TJ suspendeu a reintegração de posse da aldeia Piraí, localizada entre os municípios de Viana e Matinha. O Interdito proibitório, concedido a favor da família Cutrim, seria para impedir suposta agressão por parte dos Gamela à posse privada de terras tradicionais reivindicada pelo povo.

    A ação foi parar no Tribunal de Justiça do Maranhão por força de um agravo de instrumento dos Gamela, impetrado pelo advogado Antonio Rafael Silva Júnior, da Comissão Pastoral da Terra (CPT), com o apoio da assessoria jurídica do Conselho Indigenista Missionário (Cimi). “O juiz estadual tinha dado duas decisões possessórias (que protegem o direito de propriedade). Uma era a reintegração e a outra o interdito. As duas caíram. O desembargador ainda decide que são ações que cabem à Justiça Federal, o que vínhamos defendendo”, explica o advogado.

    Caso os Gamela retomassem áreas dentro da suposta propriedade da família Cutrim, o juiz estadual determinou uma multa de R$ 100 mil a ser paga “por alguma associação civil a qual eles estejam vinculados".  O desembargador citou os incisos I e XI do artigo 109 da Constituição Federal para argumentar que compete à Justiça Federal processar e julgar as causas em que a União está presente, o que, conforme entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ), envolve controvérsias relacionadas aos direitos indígenas. Citou ainda jurisprudências do Supremo Tribunal Federal (STF).

    Plano para assassinatos


    Os Gamela divulgaram na semana passada uma nota pública (leia aqui) denunciando os planos de fazendeiros para matar lideranças do povo. Os indígenas gravaram as ameaças realizadas pelo fazendeiro José Manoel Penha, incluindo o relato dos planos de assassinatos. Conhecido como Castelo, Penha revelou uma reunião realizada entre fazendeiros, na cidade de Viana, para tratar das “invasões” realizadas pelos Gamela. Segundo Penha, na nota divulgada pelos indígenas, a solução seria matar “uns quatro cabeças”. Outros planos dão conta do assassinato de um padre da Igreja Católica, que apoia os Gamela.

    “Em 15 de fevereiro, estas ameaças foram apresentadas ao Secretário Estadual de Segurança Pública e ao Superintendente de Polícia Civil do Interior, bem como foram entregues as gravações. Também foram registradas na Superintendência da Policia Federal, no Maranhão (SIC)”, diz trecho da nota dos Gamela. Nenhuma investigação foi realizada pelas autoridades públicas competentes. “No dia 21 de agosto, pistoleiros (…) invadiram a nossa aldeia, dispararam tiros de uma pistola .40 e ainda prometeram um banho de sangue”, segue a nota. A aldeia em questão é a Piraí, alvo da reintegração de posse indeferida pelo TJ/MA e com a incidência da propriedade de Tenack Serra Costa Júnior, também conhecido como Júnior da Cerâmica.

    As lideranças ameaçadas e citadas pelos fazendeiros são Antonio de Marcírio, Jaleco, Inaldo, Jaldo, Kaw, Mandioca, Foboca, Zé Oscar, ‘Seu’ Duca e Carrinho. Na invasão de pistoleiros em 21 de agosto, três homens armados e trajando coletes à prova de bala invadiram a retomada realizada pelo povo Gamela. Conforme os indígenas, os homens chegaram numa caminhonete branca, se identificaram como policiais e chamaram pelas lideranças do povo. Procurando pelas lideranças, os indivíduos ameaçaram os indígenas e estavam em uma caminhonete cuja placa está registrada no nome da Ostensiva Segurança Privada LTDA., com sede em São José do Ribamar (MA) – conforme apuração na Secretaria Estadual de Segurança Pública.

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  • 10/10/2016

    MPF/MS denuncia piloto que aplicou agrotóxicos sobre aldeia indígena

    O Ministério Público Federal em Mato Grosso do Sul (MPF/MS) denunciou um piloto de avião agrícola à Justiça pelo crime de aspersão de agrotóxicos sobre a aldeia indígena Guyra Kambi’y, na região de Dourados, sul do estado. Perícia realizada pelo MPF comprovou que o piloto não respeitou os 500 metros de distância mínima para habitações, especificada em lei. O Laudo de Exame Local, produzido pelo setor de antropologia do MPF/MS, constatou que a aplicação ocorreu pelo menos a 12 metros da área habitada pelos índios da etnia guarani-kaiowá. Após a aplicação da substância na plantação (assista aqui), crianças e adultos da comunidade apresentaram dores de cabeça e garganta, diarreia e febre.

    A conduta criminosa é especificada pelo artigo 15 da Lei nº 7802/89: “Aquele que produzir, comercializar, transportar, aplicar, prestar serviço, der destinação a resíduos e embalagens vazias de agrotóxicos, seus componentes e afins, em descumprimento às exigências estabelecidas na legislação pertinente, estará sujeito à pena de reclusão, de dois a quatro anos, além de multa”. O crime foi cometido em 6 de janeiro de 2015. Os índios produziram vídeos pelo celular, onde é possível observar o avião dando voos rasantes, borrifando veneno na plantação de soja e suspendendo a aspersão quando se aproximava das primeiras casas localizadas na estrada limite entre a fazenda e a área indígena.

    De acordo com o artigo 10 da Instrução Normativa n° 02, de 03 de janeiro de 2008, do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, não é permitida a aplicação aérea de agrotóxicos em áreas situadas a uma distância mínima de quinhentos metros de povoações.

    Referência processual na Justiça Federal de Dourados: 0004118-74.2016.4.03.6002

    Audiência Pública

    O Ministério Público Federal é um dos organizadores da Audiência Pública "Pulverização Aérea de Agrotóxicos", que será realizada em 4 de novembro, às 14h, na Assembleia Legislativa de Mato Grosso do Sul.

    Serviço

    Audiência pública: Pulverização aérea de agrotóxicos

    Data: 4/11/2016

    Horário: 14:00 horas

    Local: Assembleia Legislativa de Mato Grosso do Sul

    Realização: MPF, MPT, MPE-MS, Assembleia Legislativa e Comissão de Combate aos Impactos de Agrotóxicos no MS

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