• 27/04/2017

    280 mil indígenas Guarani vivem em quatro países da América do Sul, diz pesquisa que será apresentada hoje no ATL


                                           Tekoha Arroio Conde, Guarani Mbya (RS). Foto: Cimi Regional Sul


    Você sabe quantos indígenas Guarani existem no mundo? Segundo o Mapa Guarani Continental, ao menos 280 mil pessoas, ao longo de 1,4 mil comunidades em quatro países diferentes – Argentina, Bolívia, Brasil e Paraguai – compartilham uma língua e cultura comuns: o Guarani. O resultado deste trabalho será apresentado nesta quinta-feira, 27, às 19 horas, no 14º Acampamento Terra Livre (ATL), que termina amanhã, em Brasília.

     

    Em três anos de pesquisa, uma equipe voluntária de mais de duzentos indígenas, indigenistas e acadêmicos realizou o levantamento fundiário e demográfico da maior população indígena das terras baixas da América do Sul.

     

    O resultado da investigação virá à apreciação pública em dois formatos: uma publicação  – impressa do Mapa trilíngue – português, espanhol e guarani -, acompanhado de um livro, e uma versão digital do material em português.

     

    As mais de 280 mil pessoas Guarani estão distribuídas em 1461 comunidades, aldeias, bairros urbanos ou núcleo familiares nos quatro países. A maior parte da população Guarani – 85 mil pessoas – vive no Brasil, seguidos de 83 mil na Bolívia, 61 mil no Paraguai e 54 mil na Argentina. Segundo a pesquisa, nos últimos vinte anos, os Guarani estão em processo de crescimento populacional, envolvendo altos níveis de fecundidade.

     

    Utilizando dados atualizados, os mapas indicam onde vivem, como se denominam os locais onde habitam, quantos são, e quais são os ecossistemas naturais em que vivem as populações Guarani.

     

    Para os organizadores do Mapa, a pesquisa ajuda a compreender a "extraordinária capacidade demonstrada pelos vários povos guarani para seguir sendo Guarani, depois de cinco séculos de intensa pressão colonial". Transitando desde o litoral do Atlântico até a região pré-andina, os Guarani permanecem vivos, "como protagonistas do presente e construtores do futuro", atualizando e desenvolvendo novos modelos de assentamento em seus territórios ancestrais, hoje cortados pelas fronteiras atuais de diferentes Estados nacionais.

     

    Nesse sentido, o Mapa evidencia as condições em que vivem os Guarani em relação aos Estados, tendo como extremos a severa realidade de espoliação e conflito com produtores de soja, cana e gado no Brasil, e as experiências na Bolívia, onde os Guarani conquistaram o reconhecimento legal da maior parte de seus territórios tradicionais.

     

    A pesquisa também servirá como ferramenta para os indígenas Guarani em suas demandas por territórios e políticas públicas que respeitem sua autonomia como povos que vivem em diferentes países, unidos por vínculos de língua, cosmovisão, história e cultura.

     

    Para o antropólogo e editor do livro do Mapa Guarani Continental, Bartolomeu Melià, a pesquisa visa "fortalecer a resistência dos Guarani e reafirmar a sua dignidade perante aqueles que querem os excluir", referindo-se à violência cíclica da sociedade não-indígena aos povos Guarani.

     

    Ainda, Melià defende que "a cultura e a economia Guarani são propostas concretas para outro tipo de sociedade", e que a sociedade colonial pode aprender com os indígenas: "afinal, os não-guarani também podem viver um Ñande Reko – um novo modo de ser, mais justo e igualitário, mais pacífico e livre".


    Realização


    Argentina: Endepa e Unsa

    Bolívia: APG, Cipca, Cerdet e Ilc

    Brasil: Aty Guasu, Yvy Rupa, Cimi

    Cti, Isa, Faind, Unila e Funai

    Paraguai: Conapi

    Continental: Ccnagua

    Apoio: Embaixada da Noruega, Misereor e DKA



     

    SERVIÇO

     

    O quê? Apresentação do Mapa Guarani

     

    Onde? Acampamento Terra Livre, na Praça do Ipê, ao lado do Teatro nacional, em Brasília.

     

    Horário? A partir das 19 horas.

     

    Contato para imprensa: Tiago Miotto (55) 99644-2300

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  • 27/04/2017

    Declaração do 14º Acampamento Terra Livre: Pela garantia dos direitos originários dos nossos povos!

    A plenária da manhã da 14ª edição do Acampamento Terra Livre (ATL) selou a unificação da luta dos povos indígenas em defesa de seus direitos. O documento final da mobilização, aprovado pela plenária, condena os ataques e ameaças aos direitos originários de forma contundente.

    “Denunciamos a mais grave e iminente ofensiva aos direitos dos povos indígenas desde a Constituição Federal de 1988, orquestrada pelos três Poderes da República em conluio com as oligarquias econômicas nacionais e internacionais”, diz o documento (leia a carta na íntegra abaixo).

    O documento final do ATL será protocolado em vários ministérios e no Palácio do Planalto, na tarde de hoje (27/4), durante mais uma marcha dos indígenas na Esplanada dos Ministérios. Também está prevista a visita de uma comitiva de líderes indígenas a ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). À noite, à partir das 19h, segue a programação cultural do acampamento, com uma a apresentação musical e a exibição do filme “Martírio”, de Vincent Carelli.

    Mais de quatro mil indígenas participam do acampamento. A expectativa inicial da organização era que um pouco mais de 1,5 mil pessoas estivessem na mobilização. A 14ª edição do ATL é a maior da história e segue até esta sexta (28/4).

    DECLARAÇÃO DO 14º ACAMPAMENTO TERRA LIVRE

    Nós, povos e organizações indígenas do Brasil, mais de quatro mil lideranças de todas as regiões do país, reunidos por ocasião do XIV Acampamento Terra Livre, realizado em Brasília/DF de 24 a 28 de abril de 2017, diante dos ataques e medidas adotadas pelo Estado brasileiro voltados a suprimir nossos direitos garantidos pela Constituição Federal e pelos Tratados internacionais ratificados pelo Brasil, vimos junto à opinião pública nacional e internacional nos manifestar.

    Denunciamos a mais grave e iminente ofensiva aos direitos dos povos indígenas desde a Constituição Federal de 1988, orquestrada pelos três Poderes da República em conluio com as oligarquias econômicas nacionais e internacionais, com o objetivo de usurpar e explorar nossos territórios tradicionais e destruir os bens naturais, essenciais para a preservação da vida e o bem estar da humanidade, bem como devastar o patrimônio sociocultural que milenarmente preservamos.

    Desde que tomou o poder, o governo Michel Temer tem adotado graves medidas para desmantelar todas as políticas públicas voltadas a atender de forma diferenciada nossos povos, como o subsistema de saúde indígena, a educação escolar indígena e a identificação, demarcação, gestão e proteção das terras indígenas. Além disso, tem promovido o sucateamento dos já fragilizados órgãos públicos, com inaceitáveis cortes orçamentários e de recursos humanos na Fundação Nacional do Índio (Funai) e com nomeações de notórios inimigos dos povos indígenas para cargos de confiança, além de promover o retorno da política assimilacionista e tutelar adotada durante a ditadura militar, responsável pelo etnocídio e genocídio dos nossos povos, em direta afronta à nossa autonomia e dignidade, garantidos expressamente pela Lei Maior.

    No Legislativo, são cada vez mais frontais os ataques aos direitos fundamentais dos povos indígenas, orquestrados por um Congresso Nacional dominado por interesses privados imediatistas e contrários ao interesse público, como o agronegócio, a mineração, as empreiteiras, setores industriais e outros oligopólios nacionais e internacionais. Repudiamos com veemência as propostas de emenda constitucional, projetos de lei e demais proposições legislativas violadoras dos nossos direitos originários e dos direitos das demais populações tradicionais e do campo, que tramitam sem qualquer consulta ou debate junto às nossas instâncias representativas, tais como a PEC 215/2000, a PEC 187/2016, o PL 1610/1996, o PL 3729/2004 e outras iniciativas declaradamente anti-indígenas.

    Igualmente nos opomos de forma enfática a decisões adotadas pelo Poder Judiciário para anular terras indígenas já consolidadas e demarcadas definitivamente, privilegiando interesses ilegítimos de invasores e promovendo violentas reintegrações de posse, tudo sem qualquer respeito aos mais básicos direitos do acesso à justiça. A adoção de teses jurídicas nefastas, como a do marco temporal, serve para aniquilar nosso direito originário às terras tradicionais e validar o grave histórico de perseguição e matança contra nossos povos e a invasão dos nossos territórios, constituindo inaceitável injustiça, a ser denunciada nacional e internacionalmente visando à reparação de todas as violências sofridas até os dias de hoje.

    Soma-se a essa grave onda de ataques aos nossos direitos o aumento exponencial do racismo institucional e a criminalização promovidos em todo o País contra nossas lideranças, organizações, comunidades e entidades parceiras.

    Diante desse drástico cenário, reafirmamos que não admitiremos as violências, retrocessos e ameaças perpetrados pelo Estado brasileiro e pelas oligarquias econômicas contra nossas vidas e nossos direitos, assim como conclamamos toda a sociedade brasileira e a comunidade internacional a se unir à luta dos povos originários pela defesa dos territórios tradicionais e da mãe natureza, pelo bem estar de todas as formas de vida.

    Unificar as lutas em defesa do Brasil Indígena!

    Pela garantia dos direitos originários dos nossos povos!

    ARTICULAÇÃO DOS POVOS INDÍGENAS DO BRASIL – APIB

    MOBILIZAÇÃO NACIONAL INDÍGENA


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  • 27/04/2017

    ATL propõe aliança entre povos indígenas de diversos países


    Crédito da foto: Mídia Ninja/MNI

    Representantes da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e lideranças indígenas internacionais reuniram-se, hoje (26/4), no terceiro dia do Acampamento Terra Livre, para discutir a unificação de forças entre povos indígenas de várias regiões do mundo.

    Na comitiva indígena internacional, estão representantes de povos do Panamá, Costa Rica, Guatemala, Equador, Bolívia e Indonésia.

    “Muitas das coisas que a gente vê em outros países são semelhantes à nossa realidade. Muda o povo, muda a língua, muda a legislação de cada país, mas o propósito da luta é o mesmo”, disse Kléber Karipuna, liderança de base da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasília (Coiab) e da coordenação da Apib.

    “Não há nenhum impedimento para que uma aliança entre os povos indígenas na América Latina seja consolidada”, defendeu Paulo Montejo, assessor da Apib.

    Entre os diversos pontos comuns que motivam a luta de povos indígenas no Brasil e no mundo, quatro foram destacados: o direito à terra, a liberdade de autodeterminação, a criminalização de lideranças e o acesso a fundos de financiamento para as organizações indígenas.

    “Se você sente que isso nos conecta e que isso está errado, vocês são mais do que bem-vindos para se juntar a nós”, destacou Mina Setra, da Indonésia.

    Novas reuniões entre lideranças indígenas estrangeiras e brasileiras vão ocorrer até o fim do ATL, nesta sexta (28/4), para discutir a aliança internacional entre povos indígenas.

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  • 27/04/2017

    ‘Barreiras Humanitárias’ à importação de commodities agrícolas brasileiras pela União Europeia: necessárias e urgentes


             Velório de Clodiodi Aquileu Guarani e Kaiowá, assassinado por pistoleiros no Cone Sul do MS. Foto: Ana Mendes/Cimi



    Por Cleber César Buzatto*, Secretário Executivo do Cimi | De Bruxelas, Bélgica


    As organizações participantes do “Seminário da Sociedade Civil União Europeia-Brasil em Direitos Humanos”, ocorrido neste dia 26 de abril, em Bruxelas, Bélgica, aprovaram recomendação por meio da qual defendem a adoção de ‘Barreiras Humanitárias’ à importação de commodities agrícolas do Brasil por parte da União Europeia. A proposta, por nós apresentada, foi acolhida e consta nas conclusões do Seminário levadas ao corpo diplomático Europeu e Brasileiro, reunidos neste dia 27 de abril, no Diálogo Oficial bilateral União Europeia-Brasil sobre Direitos Humanos.

    A proposição tem por base a realidade de violações de direitos humanos cometidas contra povos indígenas, quilombolas, demais populações tradicionais e camponeses, por parte do agronegócio, no Brasil, além dos tratados internacionais de direitos humanos e as normas vigentes no que tange ao comércio bilateral União Europeia-Brasil.

    Neste sentido, é importante salientar que as importações de commodities agrícolas brasileiras, por parte da União Europeia, seguem normas rígidas no que tange à questão sanitária, as chamadas ‘Barreiras Sanitárias’. Exigência de acordos comerciais firmados entre as partes, todo e qualquer problema dessa ordem que ocorra no Brasil deve ser imediatamente comunicado pelas autoridades brasileiras e tem o condão de provocar medidas restritivas à importação das respectivas commodities por parte dos Estados Membros da União Europeia.

           

    Em consequência disso, observa-se a existência de um cuidado muito grande por parte das autoridades brasileiras, e mesmo de organizações representantes do agronegócio do Brasil, a fim de que não ocorram problemas sanitários em produtos agrícolas destinados à exportação.

    Consideramos que critérios e procedimentos análogos aos adotados em torno das ‘Barreiras Sanitárias’ devem ser criados e adotados pela União Europeia, em casos de violações de direitos humanos por parte do agronegócio e seus representantes no Brasil, o que denominamos de ‘Barreiras Humanitárias’.

    Parece-nos fortemente paradoxal e não razoável o fato de que uma notícia, por exemplo, sobre a ocorrência de eventual caso de febre aftosa em um boi numa determinada região do Brasil provoque restrição, suspensão e até mesmo o fechamento do mercado europeu à importação de carne bovina brasileira, ao mesmo tempo em que notícias como o massacre de Eldorado do Carajás, ocorrido no Pará, em 1997, o Massacre de Caarapó, no Mato Grosso do Sul, em 2016, e o Massacre de Colniza, no Mato Grosso, em 2017, não tenham consequências; restrição, suspensão ou fechamento do mesmo mercado à importação de commodities produzidas pelo agronegócio nessas regiões.

    O assassinato de seres humanos tem muito mais importância do que uma febre aftosa em um boi qualquer no Brasil. Por isso, esses assassinatos, cada vez mais frequentes contra defensores de direitos humanos que atuam no campo brasileiro, devem ser tratados como motivos mais que suficientes para determinar restrições, suspensões e fechamento do mercado europeu à importação de commodities do Brasil.

    Situações como a liberação, por parte da União Europeia, à importação de carne bovina proveniente de dez municípios localizados no Cone Sul do estado do Mato Grosso do Sul, há cerca de um ano, tão logo tenham sido vencidas as restrições sanitárias não são aceitáveis do ponto de vista moral e dos direitos humanos. As violações humanitárias que são cometidas recorrentemente contra os Guarani Kaiowá, exatamente naquela região, precisam ser valorizadas e servir de parâmetro para balizar as decisões da União Europeia neste e noutros casos análogos existentes na realidade Brasileira.

    Diante do caos vivido no Brasil quanto às violações de direitos humanos provadas por representantes dos interesses do agronegócio, bem como, do absoluto controle político das estruturas legislativas e de governo no Estado brasileiro pelo mesmo setor, a adoção de ‘Barreiras Humanitárias’ à importação de commodities agrícolas do Brasil é um imperativo categórico que precisa ser tratado, por parte da União Europeia, seus órgãos deliberativos e Estados Membros, com a devida atenção e cuidado.

    Não temos e, por evidente, não pretendemos apresentar receitas sobre como a União Europeia poderá construir e aplicar essas ‘Barreiras Humanitárias’ à importação de commodities agrícolas do Brasil, mas entendemos que elas são necessárias e urgentes para salvar direitos e vidas no campo brasileiro.

    *Licenciado em Filosofia pela Faculdade de Filosofia Nossa Senhora da Imaculada Conceição (FAFIMC)


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  • 27/04/2017

    Povo Munduruku bloqueia estrada no Pará por demarcações e contra o desmonte da Funai

    Cerca de 100 Munduruku do alto e do médio Tapajós, no oeste do Pará, bloquearam, na tarde desta quarta (26) a rodovia Transamazônica (BR-230), em Itaituba (PA), em manifestação contra o desmonte da Funai e pela demarcação da Terra Indígena Sawre Muybu.

    Os povos indígenas do Tapajós foram duramente atingidos pelo corte de recursos e de cargos feitos na Fundação Nacional do Índio (Funai) pelo governo. A situação vivenciada na região é exemplar do que acontece no resto do Brasil: atualmente, apenas cinco servidores são responsáveis por atender uma população de quase vinte mil indígenas de 13 povos diferentes que vivem ao longo do curso do rio Tapajós.

    Três dos 14 servidores que trabalhavam na Coordenação Regional responsável por atender os povos indígenas do Baixo, Médio e Alto Tapajós foram exonerados. Para piorar a situação, há servidores licenciados nas três Coordenações Técnicas Locais (CTLs) que atendem a região e problemas para garantir a manutenção das sedes da Funai.

    Na CTL de Santarém, no baixo Tapajós, apenas dois servidores precisam dar conta de atender diversos povos e, no momento, estão com a sede fechada, porque a Funai não conseguiu pagar o aluguel do prédio onde funcionava a CTL.

    Em Jacareacanga (PA), no alto Tapajós, uma CTL foi recentemente fechada e outra, também sem sede, tem apenas um servidor que atualmente está afastado por licença médica.

    Em Itaituba (PA), a sede da Coordenação Regional e a CTL que atende ao médio Tapajós, sediada no mesmo local e atualmente sem coordenador, estão com apenas dois servidores na ativa.

    “A Funai praticamente não existe mais. Essa reivindicação é para que a Funai continue tendo autonomia e o ministro da Justiça respeite os povos indígenas. Querem acabar com a Funai para acabar com as terras indígenas, porque este é o órgão que demarca nossas terras”, afirma Alessandra Munduruku.


    Alessandra Korap Munduruku. Foto: Mídia Ninja/MNI


    Há anos, os Munduruku também exigem a publicação da portaria declaratória da Terra Indígena Sawre Muybu, pela qual lutam há muitos anos. A TI Sawre Muybu é uma das cerca de 300 que aguardam, em todo o Brasil, o andamento de alguma das etapas do processo de demarcação.

    Em abril do ano passado, o relatório de identificação e delimitação da TI Sawre Muybu foi publicado pela Funai e aguarda, desde então, a publicação de sua Portaria Declaratória, função do Ministério da Justiça. Sem a conclusão da demarcação, entretanto, os indígenas permanecem vulneráveis à ação de fazendeiros, madeireiros, grileiros e garimpeiros e aos mega empreendimentos governamentais – como estradas e hidrelétricas. A Funai, com um contingente mínimo, é incapaz de exercer sua função de fiscalizar as invasões à terra indígena.

    “Quando o ministro da Justiça falou que terra não enche a barriga, eu pensei: será que o concreto enche a barriga dele? A terra é onde nós plantamos, onde nós colhemos, de onde tiramos nossas frutas para comer, onde caçamos. A terra enche nossa barriga sim, não só dos indígenas, mas também dos ribeirinhos e até das pessoas da cidade, que consomem o peixe e querem peixe saudável”, critica a Munduruku.

    Alessandra participa da delegação de Munduruku e demais indígenas do Tapajós que estão participando do Acampamento Terra Livre (ATL), e acompanha à distância as ações de seus parentes.

    “Esse encontro dos povos indígenas está sendo muito bom. A gente Munduruku não conhece os problemas que os outros parentes têm, as lutas deles, e aqui acaba sendo um momento para trocar experiências e nos fortalecer”, avalia a indígena.

    Contra os “projetos de morte”

    Os Munduruku também manifestam-se contra os projetos de hidrelétricas no Tapajós, chamados por eles de “projetos de morte”, e contra as tentativas do governo de fragilizar a proteção ambiental na região e de abrir as florestas das quais os povos e comunidades tradicionais do Tapajós dependem para sobreviver para a exploração privada. Órgãos ambientais do governo têm apresentado propostas de concessão das Florestas Nacionais (Flonas) de Itaituba I e II, contíguas à TI Sawre Muybu, à exploração de madeireiros. Recentemente, povos indígenas e comunidades tradicionais do Tapajós impediram uma audiência que trataria do leilão destas florestas.

    Também preocupa os Munduruku a Medida Provisória (MP) 756/2016, que propõe a transformação de outra Flona da região, a do Jamanxim, que incide diretamente sobre a TI Sawre Muybu, em uma Área de Preservação Ambiental (APA).

    Ao contrário das Flonas, as APAs permitem a existência de propriedades privadas em seu interior. Como a TI Sawre Muybu ainda não está demarcada, existe a possibilidade de que pessoas reivindiquem títulos sobre a terra indígena, aumentando a destruição da área e impedindo que os indígenas tenham acesso ao seu território. Na prática, a APA não protege a floresta.

    Aprovada em comissão mista do Congresso, a Medida Provisória (MP) 756/2016, ainda tem que passar pelos plenários da Câmara e do Senado.

    Os Munduruku afirmam que permanecerão mobilizados até que obtenham alguma resposta a respeito de suas reivindicações.

    “Se eles não querem que os indígenas tranquem a BR, que nos respeitem. Que o governo demarque a Sawre Muybu e não faça mais hidrelétricas”, afirma Alessandra Munduruku.

    Nesta semana, Juarez Saw Munduruku, cacique da aldeia Sawre Muybu, e Arnaldo Kaba Munduruku, cacique geral dos Munduruku, estão em Nova York denunciando estas mesmas questões em espaços da Organização das Nações Unidas (ONU).


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  • 26/04/2017

    Indígenas são barrados pela Polícia Militar no Senado

    Um grupo de cerca de 80 indígenas, participantes da 14ª da edição no Acampamento Terra Livre, foi impedido pela Polícia Militar de entrar no Senado. Os indígenas estavam a caminho de uma Audiência Pública prevista para a Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa.

    Os indígenas foram escoltados pela Polícia Militar na caminhada do acampamento até o Senado. As lideranças indígenas contaram que o grupo foi abordado de forma truculenta e provocado pelos policiais. Ao chegar no Senado, foi barrado por um grande contingente de policiais militares, incluindo cavalaria. O grupo de manifestantes seguiu seu caminho de forma pacífica e em nenhum momento aceitou as provocações.


    Policiais escoltaram indígenas. Foto: Rogério Assis / MNI


    “Tinham combinado que entrariam 80 indígenas para a Audiência marcada na Comissão de Direitos Humanos, isso foi aprovado por meio de Requerimento, estava tudo certo. No Senado tinha mais uma fileira policial que disse que só podiam entrar 20 indígenas”, afirma Sônia Gujajara, da coordenação da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib).

    Impossibilitados de entrar, os indígenas decidiram voltar para o acampamento. O retorno também foi conturbado, pois a polícia decidiu escoltar novamente o grupo. Depois da chegada dos índios, o acampamento foi cercado por vários carros da polícia.

    Procurado, o secretário de Direitos Humanos do governo do Distrito Federal, Gutemberg Gomes afirmou que não há nenhuma intenção em recolher arcos e flechas dos manifestantes e que esses objetos pertencem a cultura indígena. Ele garantiu que os policiais estão no local para assegurar a segurança e a integridade da mobilização.


    Policiais escoltaram indígenas. Foto: Mídia Ninja / MNI


    “Eu vivi durante a ditadura e sei como eram tratados os movimentos sociais, a repressão que existia. Estão usando os mesmos métodos”, disse a Senadora Regina de Souza (PT-PI) que iria participar da reunião com as lideranças, mas foi para o lado de fora ao saber da repressão.


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  • 26/04/2017

    Operação de guerra é mobilizada no MS, destrói acampamento Guarani Kaiowá e apreende duas armas de brinquedo










    Comunidade do tekoha Tey’i Kue. Crédito da foto: Ana Mendes/Cimi

    Uma operação de guerra eclodiu nesta terça-feira, 26, na demarcação Dourados Amambai-Peguá I, do povo Guarani e Kaiowá, município de Caarapó (MS). Ao menos 200 policiais e soldados do Exército, em caminhonetes, cavalos e helicóptero, entraram na aldeia com o objetivo de recuperar produtos de roubo e furto supostamente realizados durante retomadas indígenas a três fazendas incidentes no tekoha Tey’i Kue, em 2016. O resultado foi constrangedor e trágico: duas armas de brinquedo apreendidas e o acampamento dos indígenas destruído.

    Conforme declarou à imprensa sul-mato-grossense o comandante da chamada Operação Caarapó I, coronel Ary Carlos Barbosa, a ação "visou trazer uma maior sensação de segurança aos moradores". O Ministério Público Federal (MPF) e a Fundação Nacional do Índio (Funai) não foram informadas da busca que apresentou como saldo a apreensão de duas réplicas de arma de fogo, um estojo de munição e um coldre. Não há informações sobre a recuperação de objetos supostamente roubados; ninguém foi preso.  

    Apesar do resultado ter sido desproporcional ao tamanho da operação, os Guarani e Kaiowá denunciam "a completa destruição do acampamento na retomada de Tey’i Kue". De acordo com liderança indígena ouvida e que pediu para não ser identificada por razões de segurança, "os policiais quebraram barracos, reviraram pertences pessoais, destruíram material de reza".

    Na declaração sobre o saldo da operação, os policiais frisaram que viram marcas de tiros, aparentemente de calibre 12, nas portas das casas. "Será que não sabem que pistoleiro ataca o acampamento a mando do fazendeiro? Essa operação tá mais pra uma retaliação pelo fato da gente seguir na nossa terra mesmo depois dos assassinatos, ataques e ameaças", afirma a liderança.

    Em junho de 2016, o agente de saúde Guarani e Kaiowá Clodiodi Aquileu de Souza foi assassinado e outros nove indígenas ficaram feridos com armas de fogo durante ataque de fazendeiros e pistoleiros à Fazenda Yvu – retomada pelos Guarani Kaiowá e onde fica o tekoha Tey’i Kue. Outros episódios de ameaças, racismo e violência se seguiram ao ataque fortemente armado dos fazendeiros – um grupo chegou a ser preso responsabilizado pela violência contra os indígenas.

    O episódio ocorre durante a realização da 14º Acampamento Terra Livre (ATL), em Brasília. Mais de 3 mil indígenas, representando cerca de uma centena de povos, estão desde segunda-feira, 24, na Capital Federal reivindicando o direito à terra, às demarcações, denunciando o desmonte da Funai com o loteamento de cargos pelos ruralistas e contra a retirada de direitos fundamentais – caso das reformas da Previdência e Trabalhista.

    Conversa com Lula: faltou autocrítica

    Para Elizeu Guarani e Kaiowá, porta-voz da Aty Guasu, principal organização política do povo, "a operação é o resultado da falta de demarcação". Integrante do Conselho Nacional de Política Indigenista (CNPI), Elizeu esteve reunido na noite anterior à Operação Caarapó com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, junto com uma comitiva do ATL. A reunião foi uma solicitação do Instituto Lula.

    "Falei para o presidente que o governo dele foi muito ruim para os povos indígenas. O da Dilma também. Não avançou as demarcações. Agora com o Temer é que piorou de vez, mas já vem de anos de desrespeitos aos nossos direitos. Estamos resistindo, e isso nos mantém vivos", relata Elizeu Guarani e Kaiowá. Fome, agrotóxicos lançados nas aldeias, polícia, pistoleiros: "Essa é a realidade no Mato Grosso do Sul".


    De acordo com o indígena, Lula afirmou estar ciente do quadro, mas não se posicionou de maneira autocrítica e foi acompanhando pela senadora Gleisi Hoffmann (PT/PR), que em 2013, quando ministra da Casa Civil, usou um power point da Embrapa para afirmar que no Paraná não havia índios, e se existissem eram paraguaios. Outro fato embaraçoso é a relação de Lula com José Carlos Bumlai, que possui uma usina de cana em terras tradicionais Guarani e Kaiowá na região de Dourados.

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  • 26/04/2017

    Lideranças indígenas buscam diálogo com presidente da Câmara

                             Rodrigo Maia recebeu 20 líderes indígenas. Encontro durou 15 minutos. Foto: Mídia Ninja / MNI


    No início da tarde de hoje (26/4), uma comitiva de 20 líderes indígenas de todo o país, que participam da 14ª edição do Acampamento Terra Livre, em Brasília, encontraram-se rapidamente com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ).

    O objetivo do encontro foi buscar o diálogo com a casa. Os indígenas criticaram projetos contra seus direitos em tramitação. Também cobraram o fim da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Fundação Nacional do Índio (Funai) e do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). O colegiado é dominado por ruralistas e pretende impedir a oficialização de Terras Indígenas e territórios quilombolas, além de criminalizar líderes indígenas, antropólogos, organizações e militantes indigenistas.

    O cacique Raoni Metuktire Kayapó afirmou que tem tido dificuldades para ser ouvido por políticos e autoridades. “Hoje, vim dialogar. Uma coisa que nunca vou aceitar, e que tenho visto nos noticiários, é que os parlamentares querem aprovar projetos que querem prejudicar nossos direitos”, alertou. Raoni cobrou a retomada das demarcações e o fortalecimento da Funai.

    Maia comprometeu-se a não pautar projetos que ameaçam os direitos indígenas sem “dialogar com os indígenas”. Ele afirmou que, no caso de propostas polêmicas, buscaria evitar “afetar direitos históricos”.

    “O debate será sempre democrático e aberto. Temos dialogado. Eu não vejo ambiente e preocupação para que a PEC 215 seja colocada em votação”, afirmou. A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215 pretende transferir do governo federal ao Congresso a última palavra sobre as demarcações indígenas, entre outros pontos. Se for aprovada, as demarcações serão paralisadas definitivamente.

    Maia disse que a CPI foi finalizada e que não haverá uma nova renovação de seu prazo de funcionamento. “A CPI acabou. Não haverá outra”, afirmou. Se o colégio de líderes resolver pautar um requerimento para renovar o prazo da comissão e o plenário aprová-lo, no entanto, o presidente da Câmara não pode impedi-lo. Se não houver nova renovação de prazos, o relatório da comissão tem de ser aprovado até 23/5.

    Na tarde de ontem, indígenas que protestavam foram atacados com bombas de gás lacrimogênio e balas de borracha ao tentar depositar quase 200 caixões no espelho de água do Congresso. Ninguém ficou ferido (saiba mais).

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  • 26/04/2017

    Estado brasileiro justificou no ATL ida aos tribunais internacionais como réu


    Crédito das fotos: Mídia Ninja/MNI

    Por Egon Heck, do Secretariado Nacional do Cimi

    “Vamos fazer a guerra com a nossa sabedoria”, expressou uma das lideranças indígenas presentes no 14º Acampamento Terra Livre  que está se realizando em Brasília. Contra a crueldade de mais de cinco séculos de invasão, extermínio e genocídio, só a sabedoria, forjada na resistência e guerra permanente, possibilitaram a sobrevivência dos 305 povos indígenas nos escombros de Pindorama.

    Ontem o  Estado brasileiro proporcionou mais um desses atos que envergonham o nosso país, levando-o aos tribunais internacionais no banco dos réus. Agiu contra os mais de três mil indígenas que foram manifestar diante do Congresso suas indignações e temores. Foram, de maneira especial dizer às autoridades, ao Brasil e ao mundo,  que não mais suportam tamanhas agressões, crueldades e violências. Foram exigir respeito e o fim das atitudes de colonialismo e repressão contra os povos primeiros dessa terra.

    No seminário sobre os Direitos Originários dos povos indígenas, realizado pela Procuradoria-Geral da República (PGR), o coordenador da 6ª Câmara de Coordenação e Revisão, o Procurador da República Luciano Maia, demonstrou como o Estado brasileiro tem sido o maior violador dos direitos indígenas. Aí reside o maior desafio para os povos indígenas e seus aliados.

    O Brasil plural se insurge – nada a temer

    Enfrentamos uma das piores conjunturas para os povos indígenas, às populações tradicionais, os movimentos sociais e o meio ambiente. Vivemos um dos piores momentos das últimas décadas, particularmente após o processo constituinte de 1988. Uma série de mortíferos PLs e PECs, portarias e decretos estão no gatilho, espreitando o exato momento de disparar a partir dos entapetados e esterilizados ambientes do poder, da corrupção e da opressão. O Estado brasileiro que nunca admitiu e respeitou a pluralidade de povos e nações, vozes e rituais, organizações sociais e formas de Bem Viver,  mostra seus dentes carcomidos pelos séculos de colonialidade e crueldade contra os povos originários.

    Demarcação Já – nenhum direito a menos

    Uma das exigências expressas com unanimidade pelo movimento e comunidades e povos indígenas é o imediato reconhecimento e demarcação das terras/territórios indígenas. Esse processo de paralisação das demarcações já iniciou no governo anterior, e não apenas permanece, como recrudesce em função das prioridades de um projeto desenvolvimentista absolutamente anti indígena. Trata-se de uma cabal afronta à Constituição e legislação internacional, do qual o Brasil é signatário.

    Conforme levantamentos realizados pelo Cimi, ainda existem mais de 352 terras indígenas sem nenhuma providência, 175 a identificar e 398 registradas, de um total de 1.116 terras indígenas. Estamos, portanto, diante de um gravíssimo quadro, pairando sobre esse direito sagrado e primordial ameaçadoras nuvens de incertezas e retrocessos.

    Momentos fortes da luta

    Os duros e longos caminhos da autodeterminação e autonomia dos povos indígenas no Brasil e no continente vão sendo trilhados e forjados, com sabedoria e resistência milenar. Como disse  o antropólogo Meliá: “Os caminhos dos povos indígenas serão os nossos caminhos de futuro”.

    É preciso mudar nossas mentes e nossos espíritos eivado de colonialidade para darmos espaço para os projetos de autodeterminação e Bem Viver dos povos indígenas. Será preciso ousadia e esperança, persistência e coragem revolucionária, sonhos e utopia. Um novo projeto de humanidade é possível, necessário e urgente. Que saibamos, com os povos indígenas, galgar essa montanha de obstáculos, repressão e negação de direitos.

    Que esse Acampamento Terra Livre faça avançar a união na luta dos povos indígenas e a aliança sempre maior entre todos os que lutam pelas mudanças e transformações profundas em nosso país e na Ameríndia.

    Enquanto isso, as vozes e rituais plurais conclamam todos os povos para consolidar a união. Unidade na diversidade, com os encantados, deuses e guerreiros, todos presentes no apoio à luta pela vida, pelos direitos, pelos territórios e pela justiça.

    Muitos olhos arderam, muita respiração ficou dificultada com mais um espetáculo de bombas e sprays covardemente lançados pelo poder opressor contra as raízes profundas do Brasil plural.


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  • 26/04/2017

    Lideranças Munduruku e Yanomami denunciam violações na ONU e se encontram com indígenas de Standing Rock


    Lideranças Munduruku (à esquerda) e Yanomami (à direita) com Todadaho Sid Hill, do povo Onondaga. Foto: Fernanda Moreira/Cimi


    Por Fernanda Moreira, Cimi Regional Norte II – De Nova York (EUA)

    Em mais uma incidência internacional para denunciar violações de direitos cometidas pelo governo brasileiro, povos indígenas participam do Fórum Permanente de Assuntos Indígenas da Organização das Nações Unidas (ONU). O encontro teve início no dia 22, em Nova York (EUA), e segue até o dia 1º de maio. Os povos Munduruku e Yanomami fazem parte da delegação da Rede Eclesial Pan-Amazônica (Repam) do Brasil.

    A delegação da Repam, composta ainda por organizações e povos indígenas de países da Amazônia latino-americana, chegou ao Fórum com o objetivo de "Amazonizar o mundo" e logo cuidou de marcar presença na abertura do encontro, que ocorreu nesta terça-feira, 24. Para Juarez Saw Munduruku foi "muito importante um parente indígena falar em sua língua e trazer a espiritualidade de seu povo" na abertura do Fórum, onde estavam representantes de governos de todo o mundo que vêm destruindo lugares sagrados de vários povos indígenas.

    Para a liderança Yanomami Armindo Góes, chamou a atenção a fala de Lakshmi Puri, membro da Direção Executiva da ONU Mulheres, por lembrar que pensar direitos indígenas exige pensar o direito e a participação das mulheres, já que para os Yanomami "não há divisão ou exclusão de qualquer pessoa. Todos são importantes para a comunidade, como as mulheres mais velhas – sábias muito respeitadas e ouvidas", conforme Góes.

    Na terça-feira, dia 25, as lideranças encontraram-se com indígenas norte-americanos e com representantes do Comitê das ONGs para os povos indígenas das Nações Unidas e partilharam experiências, espiritualidades e perspectivas de lutas. Esteve presente Chase Iron Eyes, importante liderança de Standing Rock, Lakota, que se emocionou com a força dos cantos das lideranças Sul-americanas que abriram o evento.

    "Enquanto vocês cantavam, eu ouvia pássaros por todos os cantos dessa sala. Nós temos a mesma cosmovisão, a mesma conexão com as estrelas, com os lugares sagrados e nós consideramos a água o sangue de nossos espíritos ancestrais. É por isso que colocamos nossa vida em risco para proteger nossos rios", disse Eyes. Os indígenas de Standing Rock lutam contra a construção de um grande empreendimento dentro do território do povo.

    Estiveram presentes diversas lideranças dos Estados Unidos e do Canadá e, assim como os indígenas do Peru e Brasil, reforçaram o imperativo de estabelecerem alianças entre os povos e de conectarem-se para gritar com uma só voz contra a destruição de seus territórios, de suas vidas e de todo o planeta.

    Depois de contar sobre os planos do governo brasileiro para construir 43 hidrelétricas na Bacia do Tapajós, e a violência inerente a estes projetos, militarizando o território Munduruku, cacique Juarez Saw conclui sua fala chamando os indígenas presentes para "lutarem juntos". "Nós viemos aqui para ouvir os parentes dos EUA e para que eles abracem nossa causa também e assim fazermos da luta uma só".

    Muitos dos presentes concordaram e aclamaram a fala de Armindo Góes Yanomami, que confronta a identificação de mudanças climáticas por parte da ciência dos brancos e o que os Yanomami sabem ser a reação da Terra: "É a Terra que está sentindo dor e que está reagindo, não são mudanças climáticas, é a reação da natureza que está querendo se defender".

    Na sexta-feira, dia 28, os representantes Munduruku e Yanomami terão um encontro com a Relatora Especial das Nações Unidas (ONU) para os Direitos dos Povos Indígena, Victoria Tauli-Corpuz. Durante o ano passado, no mês de março, a Relatora esteve no Brasil, onde visitou aldeias no Mato Grosso do Sul, Bahia e Pará. Em setembro, publicou um relatório com recomendações ao governo brasileiro. No mesmo período, recomendou o protocolo de consulta feito pelo povo Munduruku aos demais povos com territórios na rota de grandes empreendimentos.

    Os Munduruku levaram à ONU e entregarão à Victoria uma carta redigida pelo povo por intermédio da Associação Indígena Pariri e do Movimento Ipereg Ayu.

    Leia a carta na íntegra:




    Carta do povo Munduruku

    Nós, o povo Munduruku, queremos fazer chegar até vocês, das terras distantes, o nosso pensamento e nossas palavras. E fazer ecoar o grito de socorro (Odaxijom!) da floresta, nossa mãe, e de todos os povos indígenas que vivem no Brasil.

    Evocamos nosso deus Karosakaybu, Karodaybi, nosso guerreiro maior,  a força dos nossos guerreiros, guerreiras, pajés, cantores, cantoras, caciques, cacicas e dos mais de treze mil de nós que desenham as linhas da Mundurukânia. Essa é a terra de onde viemos e a que pertencemos – todo o rio Tapajós, o nosso Idixidi, que corre ameaçado junto às águas do Jamanxim, Teles Pires e Juruena.

    Somos lideranças homens e mulheres, guerreiros e guerreiras.

    Nós, mulheres Munduruku, estamos nos fortalecendo a cada dia.

    Onde o governo planta as sementes da destruição, nós mulheres geramos e cultivamos a vida. Nós somos as guardiãs de nosso território e sustentamos nossa luta.

    Realizamos grandes reuniões onde nossas cacicas, parteiras, professoras e outras mulheres discutem, ao lado dos homens, nossos planos de vida.

    Para sermos ouvidos, nós, homens e mulheres, sempre saímos de nossas aldeias e viajamos longos dias e horas. Já estivemos em muitas cidades e muitos países. Quando viajamos, deixamos nossas roças, nosso peixe, nosso povo, para mostrar para o governo brasileiro e para o mundo todo que nós somos os resistentes.

    Nesse fim de abril, estamos indo a Brasília, no Acampamento Terra Livre, onde estarão muitos povos indígenas. Dois grandes caciques estão indo para Nova Iorque, no fórum da ONU, para reunir com outros parentes dos vários continentes, ouvir eles e mostrar o que se passa aqui.

    Agora também mandamos nossa mensagem para esse jornal.

    Vemos uma grande fumaça de Djurupari (espírito ruim) que chega às nossas terras e vai acabar com tudo e também com os pariwat (brancos) que a estão provocando.

    Acordamos todos os dias com novos alertas de morte. Todos os dias nascem nossas crianças e não sabemos onde e como vão viver, porque já não cabem nos mapas que os governos e os donos do dinheiro querem desenhar e nem mais nas leis que querem reescrever.

    Enquanto dormimos, prepara novas leis para paralisar de vez a demarcação de terras indígenas e reduz áreas protegidas, entregando tudo na mão dos empresários e dos saqueadores – garimpeiros, madeireiros, palmiteiros, grileiros – que nos intimidam e ameaçam dentro de nossas próprias casas. Ao mesmo tempo, o governo ataca também os nossos parceiros que nos ajudam a lutar pelos nossos direitos.

    O governo Brasileiro está desmontando de vez a FUNAI (Fundação Nacional do Índio) e SESAI (Secretaria Especial de Saúde Indígena). Corta os recursos, demite funcionários e ainda nomeia para FUNAI um presidente que quer converter nossas terras em fontes de dinheiro, plantação grãos, criação de gado, tirando madeira e minério. Ainda coloca no Ministério da Justiça, que decide sobre as demarcações de terras indígenas, um político ligado aos ruralistas, que faz lei contra nós e diz que “terra não enche barriga”.

    Esse governo, que deveria proteger nossas terras e nossa vida para construir outro futuro, diz que Sawre Muybu não é terra tradicional do povo Munduruku. Isso coloca em risco a nossa vida, os nossos antepassados, os nossos lugares sagrados, as nossas aldeias e a nossa alimentação.

    Os pariwat querem apagar a nossa história, que é muito mais antiga que a história dos brancos aqui. Ele nega que fomos nós que construímos a floresta e não entende que fomos nós que fizemos a terra preta (katõ).

    As cachoeiras do rio Tapajós nos protegeram dos pariwat por muito tempo. Mas o governo brasileiro quer construir mais 40 hidrelétricas na bacia do Tapajós, uma hidrovia e outros grandes projetos. Isso vai destruir as cachoeiras.

    Elas são também as nossas bibliotecas, guardam a nossa história. Se construírem as hidrelétricas de São Luiz, Jatobá e Chacorão, as cachoeiras, ilhas e pedrais não vão mais existir e não teremos mais memória e nem proteção.

    Esse desastre já aconteceu uma vez em Teles Pires, onde o governo e as empresas explodiram a nossa cachoeira, Sete Quedas. Isso deixou os espíritos de nossos mortos sem rumo, matou a mãe dos peixes e provocou muitos acidentes e doenças entre nós. O que vocês diriam se explodíssemos os seus cemitérios, o Vaticano ou Jerusalém?

    O governo e as empresas dizem que essas hidrelétricas são energia limpa. Mas limpa elas nunca serão, porque só podem ser construídas se forem misturadas com o sangue do povo Munduruku e de nossos vizinhos e amigos ribeirinhos.   

    Sabemos também que sob nossos pés há grande riqueza para o pariwat: ouro, minerais e diamantes – estes, especialmente, levam o sofrimento do nosso povo para terras distantes. Empresas australianas e brasileiras, como Vale S/A, farão qualquer coisa para extrair esses minerais de nossas terras. Eles só pensam em seus lucros e contam com políticos que estão prestes a aprovar uma lei para autorizar a mineração em Terras Indígenas.

    A extração de diamantes em Sawre Muybu já está ameaçando outro dos nossos mais importantes locais sagrados, Os Fechos (Dajekapap). Esse lugar não deveria ser frequentado. Ele conta sobre nossa origem e guarda a pegada do nosso deus Karosakaybu.

    Os projetos de extração de madeira estão acontecendo e estão destruindo os lugares que os pariwat chamam de Florestas Nacionais, mas que são as nossas terras, onde nós já vivíamos muito antes de inventarem essas Florestas Nacionais. Estão cheios das nossas agũkabuk, as aldeias abandonadas que são os sítios arqueológicos. Foi por isso que nossos guerreiros do Médio Tapajós, junto com os ribeirinhos, impediram o governo de fazer audiência pública para discutir essa exploração que não aceitamos, no início do mês de abril.   

    Temos o nosso governo, a nossa forma de ensinar e aprender e, principalmente, de cuidar da floresta. Fazemos isso tudo há mais de 500 anos. Mas temos que lembrar os brancos sobre as leis deles também. Existe um capítulo para os povos indígenas na Constituição Federal de 1988, o Brasil assinou a Convenção 169 da OIT e a Declaração da ONU para o Direito dos Povos Indígenas.

    Essas são somente palavras mortas?

    Nós queremos que essas leis sejam cumpridas. Nunca fomos consultados sobre as hidrelétricas que o governo brasileiro construiu e está construindo no rio Teles Pires com ajuda de empresa chinesa. Nunca nos perguntaram sobre os portos que Cargill, Bunge e outras empresas levantaram bem em frente às nossas aldeias, que vêm acabando com nosso sossego, empurrando nosso peixe para longe e servindo para exportar a soja que devasta o Mato Grosso e seus povos indígenas e comunidades tradicionais.

    Tivemos que fazer a autodemarcação do nosso território quando cansamos de esperar o governo cumprir com seu dever. Temos também o nosso Protocolo de Consulta, para explicar para os brancos como conversar com os Munduruku com respeito. Exigimos que isso seja cumprido.

    Contamos com o apoio de pessoas e entidades que constroem dia a dia outros mundos possíveis.

    Clamamos à sociedade civil internacional que deixe de consumir produtos agropecuários, madeira, diamante, ouro e tudo que vem do Brasil e derrama sangue indígena, saqueia nossas terras e viola os nossos direitos. Que a China, os países da Europa, a Austrália, o Canadá e outros países não coloquem mais seu dinheiro e suas máquinas para ajudar o governo brasileiro e as empresas do Brasil a triturarem nossos corpos, espíritos e todas as formas de vida que existem na Amazônia.

    Denunciamos o governo brasileiro, que é um governo da morte.

    Mesmo com todo o esforço para nos exterminar, nós, povos indígenas, estamos mais fortes e seguimos juntos nossos diversos caminhos.

    Desviamos do único caminho para que tentam nos empurrar os colonizadores desde que invadiram nossas terras. Estamos aqui para dizer que não deixaremos que acabem com as nossas vidas e que nos matem também por dentro.

    Nós somos o povo Munduruku. Estamos prontos para impedir que o governo acabe com nosso pen okabapap iat (nosso modo de ser, nosso corpo, nosso estômago). Nós somos conhecidos e temidos como cortadores de cabeça.

    O sangue dos nossos antepassados corre em nossas veias. Em sua memória e por nossos filhos NÃO ADMITIREMOS QUE OS PARIWAT CONTINUEM EXTERMINANDO INDÍGENAS. NÃO SEREMOS CALADOS E ATROPELADOS DIANTE DE TANTA VIOLAÇÃO DE NOSSOS DIREITOS!

    Há muitas gerações nos preparamos para defender nossas terras e nosso povo e declaramos de novo: RESISTIREMOS ATÉ O ÚLTIMO MUNDURUKU!

    Desde o rio Tapajós, Pará, Amazônia.

    Sawe,

    Associação Indígena Pariri

    Movimento Ipereg Ayu

    http://www.aipariri.org/

    aiparirip@gmail.com

    iperegayu@gmail.com

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