• 19/05/2017

    Ato Denúncia: “Por direitos e contra a violência no campo”


    Ato Denúncia "Por direitos e contra a violência no campo", dia 23 de maio (terça-feira), às 14h, no Memorial do Ministério Público Federal (MPF), em Brasília

    Diante da intensificação da violência no campo, o Conselho Nacional dos Direitos Humanos (CNDH), em conjunto com organizações da sociedade civil e órgãos públicos de atuação em defesa dos direitos humanos, realiza no próximo dia 23 de maio (terça-feira), às 14h, no Memorial do Ministério Público Federal (MPF), em Brasília, o ATO DENÚNCIA “Por direitos e contra a violência no campo”.

    Por meio de dados que revelam o aumento da violência no último ano e de depoimentos de trabalhadores e trabalhadoras rurais, indígenas, quilombolas, pescadores artesanais e defensores e defensoras de direitos humanos, vítimas ou ameaçadas, o ato vai denunciar a omissão do Estado diante do aumento da violência no campo, bem como sua contribuição para o aumento e manutenção deste quadro, por meio da criminalização dos movimentos sociais, da atuação desproporcional das polícias e da aprovação de medidas que agravam os processos de concentração, privatização e estrangeirização das terras brasileiras.

    De acordo com levantamento da Comissão Pastoral da Terra (CPT), o ano de 2016 teve registro recorde no número de conflitos no campo: foram 61 assassinatos de trabalhadores rurais (o dobro de casos de assassinato em relação à média dos últimos 10 anos) e 1.536 conflitos, envolvendo 909.843 famílias. O ano de 2017 já revela que os conflitos serão intensificados. Nos primeiros cinco meses deste ano foram registrados pela CPT 25 assassinatos em decorrência dos conflitos agrários no Brasil, o dobro dos assassinatos do ano passado para o mesmo período. Outros seis estão sob investigação e ainda não foram inseridos no banco de dados da Pastoral.

    Além de um contexto de impunidade aos responsáveis pelos assassinatos, o aumento significativo de conflitos no campo possui relação direta com o desmonte do Estado brasileiro e da política agrária, como a extinção do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), a desestruturação da Fundação Nacional do Índio (Funai) e a paralisação das ações de reforma agrária e da demarcação e reconhecimento das terras indígenas e quilombolas.

    O modelo de desenvolvimento vigente, que prioriza o agronegócio voltado à monocultura para exportação em detrimento da agricultura familiar e camponesa, real responsável pela alimentação da população brasileira, também contribui para o acirramento e manutenção dos conflitos no campo. Em vez de buscar progresso e bem estar social com inclusão, tal modelo reforça a lógica de concentração da terra, do trabalho escravo, da devastação das florestas e do ataque aos direitos de trabalhadores e trabalhadoras rurais e de comunidades tradicionais, sobretudo o direito à terra e aos territórios.

    Além de manifestar solidariedade às vítimas e seus familiares, o ato buscará construir soluções e apontar compromissos que devem ser assumidos pelas organizações e reunir exigências que devem ser tomadas pelo Estado em caráter de urgência para conter o avanço do quadro. Parlamentares, demais autoridades e ativistas comprometidos com a luta por justiça e paz no campo são convidados a se somarem ao evento, aberto à participação do público em geral.

    ATO DENÚNCIA “Por direitos e contra a violência no campo”
    Data: 23 de maio de 2017 (terça-feira)
    Hora: 14h
    Local: Memorial do MPF – Procuradoria Geral da República
    Endereço: Setor de Administração Federal Sul, Quadra 4, Conjunto C, Brasília
    Mais informações: (61) 2027- 3907

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  • 19/05/2017

    Insegurança nos Rios: Indígenas, missionários e servidores da saúde atacados por piratas no Rio Japurá (AM)

    Por Assessoria de Comunicação Cimi Norte I (AM/RO)

    O indígena José Sales de Oliveira, do povo Mayoruna, juntamente com outros três ocupantes de uma pequena embarcação, foram atacados e espancados por seis homens fortemente armados. Ele é morador da aldeia Marajaí, do município de Alvarães (AM), distante 531 quilômetros de Manaus. O fato aconteceu na última sexta-feira, 12/05, no rio Japurá, na região do Médio Solimões no Estado do Amazonas. Um barco com motor de 15HP foi tomado no assalto.

    No mesmo dia, pela manhã, um grupo de servidores do Distrito Sanitário Especial Indígena (Dsei), havia sido atacado na altura da comunidade Nova Esperança, quando estava em deslocamento para atendimento às comunidades indígenas da região.

    O mesmo bando chegou a perseguir Nelma Catulino de Oliveira e Edvarde Bezerra Júnior, membros do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), após a saída destes da aldeia São Pedro.

    “Vivemos horas de terror”, relatou o enfermeiro Everaldo Almeida dos Santos, do Polo-base Cuiu-cuiu.  Além de Everaldo, a equipe de saúde era formada pelos técnicos de enfermagem Edvaldo Cavalcante Praia, Givanildo Barbosa Rodrigues e pelo motorista fluvial Ludgelson Cavalcante Ribeiro.

    Segundo relato das vítimas, o bando armado se apresentou como agentes da Polícia Federal.  Os servidores do Dsei ficaram durante algum tempo com armas apontadas em suas cabeças. Os bandidos levaram das vítimas uma pequena quantia em dinheiro.

    Cerca de uma hora depois do ataque à equipe de saúde, os missionários do Cimi saíram da aldeia São Pedro. Com dez minutos de viagem, eles avistaram o bando armado saindo da ilha e partindo em sua direção.  “Depois de percebermos que eram os bandidos, retornamos à aldeia”, disse Edvarde Bezerra.

    Tanto a equipe do Dsei quanto os missionários registraram ocorrência na Delegacia de Polícia da cidade de Tefé. Na Polícia Federal, os servidores do Dsei foram orientados a relatar minuciosamente o ocorrido para que o fato fosse comunicado à Superintendência da Polícia Federal em Manaus. Os agentes da PF em Tefé disseram que não iriam ao local do ocorrido porque não houve danos a patrimônio da União.  

    “Nós ficamos expostos aos bandidos, pois eles nos conhecem, viram nossos rostos e prometeram estourar nossas cabeças. Solicitamos à Coordenação do Dsei mais segurança. Com risco eminente de vida será impossível permanecermos no mesmo polo base”, reclamou Everaldo Almeida.

    De acordo com registros da Policia Federal da cidade de Tefé, casos desse tipo têm aumentado na região. “Está ficando mais perigoso. Essa região está descoberta, não tem vigilância fluvial na área”, disse o agente Almeida da Policia Federal, coordenador local do posto da PF, onde estão lotados apenas três agentes para prestar assistência a região do Médio Solimões, formada por oito municípios.  
     

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  • 17/05/2017

    Nota Pública do Cimi sobre a Aprovação do Relatório da CPI da Funai/Incra


    O Conselho Indigenista Missionário – Cimi repudia com veemência o relatório da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Funai/Incra aprovado nesta quarta-feira, 17. A CPI da Funai/Incra mostrou-se parcial do início ao fim dos trabalhos. Trata-se de uma CPI criada, conduzida e relatada por ruralistas para atender os interesses ruralistas e atacar os povos originários, seus direitos e aliados junto à sociedade brasileira.

    Descomprometidos com a verdade, os ruralistas tentam criminalizar, por meio de indiciamentos, mais de uma centena de lideranças indígenas, indigenistas, religiosos e cientistas sociais que, cumprindo os preceitos Constitucionais nas suas respectivas esferas de trabalho, defendem os direitos indígenas no Brasil. O relatório originalmente apresentado pelos ruralistas incluía, ainda, a proposição de indiciamento de Procuradores da República, removidos para a lista de encaminhamentos.

    No caso do Cimi, sem jamais convidar a entidade e seus membros para prestar qualquer esclarecimento, os ruralistas da CPI da Funai/Incra requentaram denúncias já devidamente arquivadas por falta de provas que constavam no relatório da ‘CPI do Cimi’ levada a cabo, também por ruralistas, na Assembleia Legislativa do Mato Grosso do Sul. O caso demonstra a total falta de fundamento fático e legal das acusações desferidas contra a instituição e seus membros.

    Num contexto de perseguição política, ataque deliberado contra os marcos constitucionais, tentativa de retorno ao escravagismo no campo e venda do território brasileiro para estrangeiros por parte dos ruralistas, ser acusado e indiciado por eles no âmbito da CPI da Funai/Incra constitui-se num atestado de bons serviços prestados ao Brasil, à Constituição brasileira e à causa indígena em nosso país.

    Preocupa a possibilidade de adoção, pelo Poder Executivo, de medidas administrativas sugeridas pelos ruralistas no relatório da CPI da Funai/Incra, tais como a extinção da Funai, depois chamada pelo relator de “reestruturação”, e mudanças no procedimento de demarcação das terras indígenas.

    Sob a falaciosa justificava de estabelecer “critérios objetivos” para as demarcações, os ruralistas propõem ignorar os critérios já definidos pela Constituição Federal, a fim de aniquilar os direitos territoriais dos povos indígenas, inviabilizar demarcações de terras pelas quais estes povos lutam há muito tempo e permitir a dilapidação das áreas já demarcadas.
    O Cimi está convencido da existência de acordos prévios entre os ruralistas da Câmara dos Deputados e os ruralistas do Governo Temer para a implementação de iniciativas que inviabilizem as demarcações e a proteção das terras indígenas, em benefício dos próprios ruralistas e dos poderosos interesses econômicos que defendem.

    Chama a atenção a forma racista dos ruralistas se referirem a lideranças e povos indígenas ao longo Relatório da CPI. Trata-se de ranço colonialista que acentua o preconceito contra os povos originários de nosso país.

    A agressividade, falta de respeito e de bom senso no relatório ruralista alcança, inclusive, organismos multilaterais como a Organização das Nações Unidas (ONU) e suas relatorias especializadas.

    Outrossim, preocupa a onda de massacres cruéis cometidos por fazendeiros e seus jagunços contra povos indígenas, quilombolas e camponeses Brasil afora. É público e notório que a CPI da Funai/Incra contribui para potencializar e alastrar essa onda de violações e violências no campo, ao perseguir quem defende a luta por direitos e ignorar quem pratica tais massacres. Ao longo do funcionamento da CPI, dentre outros, foram praticados os massacres ‘de Caarapó’, no Mato Grosso do Sul, contra os Guarani Kaiowá, ‘de Colniza’, no Mato Grosso, contra camponeses, e ‘dos Gamela’, no Maranhão.

    O Cimi reitera o compromisso institucional e de seus membros com a defesa da Constituição Brasileira, dos direitos e da Vida dos povos originários de nosso país. Agradece aos poucos, mas aguerridos parlamentares membros da CPI da Funai/Incra, e a suas assessorias, que demonstraram sensibilidade e compromisso com a causa indígena, tanto por meio das manifestações e enfrentamento à maioria ruralista durante o funcionamento da Comissão, quanto pela elaboração e apresentação do Relatório Paralelo da CPI, que faz um contraponto qualificado às grosserias do Relatório oficial. Externa confiança nos órgãos de controle do Estado brasileiro, que hão de enviar para o arquivo o Relatório ruralista. E, por fim, manifesta solidariedade às famílias de todas as vítimas dos massacres cometidos pelos ruralistas em nosso país.

    Brasília, DF, 17 de maio de 2017
    Conselho Indigenista Missionário-Cimi

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  • 17/05/2017

    Em nota, Pastorais do Campo manifestam solidariedade aos missionários do Cimi


    Cerca de 50 indígenas foram impedidos de acompanhar a sessão da CPI da Funai e do Incra, nesta terça (16). Foto: Guilherme Cavalli/Cimi

    Em nota divulgada na última segunda-feira (15), o Serviço Pastoral dos Migrantes (SPM), a Comissão Pastoral da Terra (CPT), o Conselho Pastoral dos Pescadores (CPP), Pastoral da Juventude Rural e a Caritas Brasileira solidarizaram-se com  as missionárias e os missionários do Conselho Indigenista Missionário (Cimi). O texto manifesta o repúdio das Pastorais do Campo às difamações por “determinados setores econômicos, de políticos e de parte da grande mídia nacional”, direcionadas aqueles que trabalham junto ao organismo da CNBB.

    “Não podemos nos calar diante das injustiças, sobre a tendenciosa solicitação de indiciamento de indígenas e de membros do CIMI, de quem, em diferentes funções contribui para a defesa dos direitos dos Povos Indígenas”, declara a nota sobre o indiciamento da instituição na CPI Funai/Incra. O texto denuncia a estratégia da bancada Ruralista do Congresso Nacional de intimidar organizações que atuam na defesa dos povos indígenas. “Percebemos que há uma clara tendência dos parlamentares de, além de intimidar, criminalizar os membros do CIMI”.

    A carta aponta ainda a crescente onda de violências e insegurança no campo, impulsionada por incitações de ódio por parte do Legislativo, que se soma a omissão “das políticas do executivo e a criminalização e parcialidade de grande parte do poder judiciário”. 

    Leia a nota na íntegra:

    Nota das Pastorais do Campo em solidariedade ao Cimi


    “Ai daqueles que fazem decretos iníquos e escrevem apressadamente sentenças de opressão, para negar a justiça ao fraco e fraudar o direito dos povos” (Is 10,1-3ª)

    O Serviço Pastoral dos Migrantes (SPM), a Comissão Pastoral da Terra (CPT), o Conselho Pastoral dos Pescadores (CPP), Pastoral da Juventude Rural e a Caritas Brasileira, vêm a público manifestar seu repúdio às difamações que vêm sofrendo os Missionários e Missionárias comprometidos com a defesa dos direitos fundamentais dos Povos Indígenas por parte de determinados setores econômicos, de políticos e de parte da grande mídia nacional. Estes vêm insinuando de maneira covarde ou afirmando categoricamente que membros do Conselho Indigenista Missionário (CIMI) cometem delitos ao se posicionarem favoravelmente aos direitos constitucionais que possuem os Povos Indígenas.

    O CIMI é um organismo vinculado à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) que, em sua atuação missionária, conferiu um novo sentido ao trabalho da Igreja Católica junto aos Povos Indígenas. Em sua atuação, desde 1972, sempre procurou favorecer a articulação entre aldeias e povos, promovendo as grandes assembleias indígenas, onde se desenharam os primeiros contornos da luta pela garantia do direito à diversidade cultural.

    Para esta nova sociedade, forjada na própria luta, o CIMI acredita que os Povos Indígenas são fontes de inspiração para a revisão dos sentidos, da história, das orientações e práticas sociais, políticas e econômicas construídas até hoje.

    Não podemos nos calar diante das injustiças, sobre a tendenciosa solicitação de indiciamento de indígenas e de membros do CIMI, de quem, em diferentes funções contribui para a defesa dos direitos dos Povos Indígenas. No relatório da CPI, há solicitação de indiciamento de indígenas, de antropólogos/as, de procuradores/as federais e estaduais, de servidores/as públicos da FUNAI, do INCRA e de outras instituições públicas, inclusive destes missionários/as. Percebemos que há uma clara tendência dos parlamentares de, além de intimidar, criminalizar os membros do CIMI. É uma clara estratégia da bancada Ruralista do Congresso Nacional que objetiva intimidar organizações da sociedade civil e agentes públicos afim de que não atuem na causa na defesa e viabilização dos direitos dos Povos Indígenas consagrados na constituição de 1988. Este tipo de ação deliberada do legislativo aliado à omissão e recuo das políticas do executivo e a criminalização e parcialidade de grande parte do poder judiciário tem favorecido um clima de insegurança, crescimento da violência num crescente processo de impunidade causando um clima de terror entre os povos indígenas. Neste sentido, estamos em alerta e acompanhando a reunião da CPI e o seu desenrolar, para denunciarmos essa farsa, que busca imobilizar aqueles e aquelas que no exercício de sua cidadania defendem estes povos tão marginalizados e perseguidos pelo poder do capital.

    Reafirmamos nossa solidariedade e comunhão com o CIMI, fortalecendo o processo de autonomia desses povos na construção de um projeto alternativo, pluriétnico, popular e democrático.

    Brasília,15 de maio de 2017.

    Comissão Pastoral da Terra (CPT)

    Serviço Pastoral dos Migrantes (SPM)

    Conselho Pastoral dos Pescadores (CPP)

    Pastoral da Juventude Rural (PJR)

    Cáritas Brasileira

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  • 16/05/2017

    Mais uma vez, indígenas são barrados na CPI da Funai/Incra

    Por Guilherme Cavalli (vídeo) e Tiago Miotto (texto), da Assessoria de Comunicação

    Cerca de 50 indígenas foram, novamente, impedidos de acompanhar a sessão da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Funai e do Incra, nesta terça (16). Barrados por decisão do presidente da Comissão, o ruralista Alceu Moreira (PMDB-RS), os indígenas permaneceram do lado de fora do Anexo 2 da Câmara dos Deputados, onde ocorria a reunião da CPI.

    A situação já é de praxe: a entrada de indígenas, quilombolas e camponeses foi poucas vezes permitida nos quase 500 dias que já dura a CPI, se contabilizadas as suas duas edições – a primeira encerrou em agosto de 2016 e uma nova, em continuação, foi aberta pelos ruralistas em outubro. Em novembro, indígenas, quilombolas e pescadores artesanais chegaram a ser atacados com spray de pimenta pela Polícia Legislativa, após serem barrados na Câmara e impedidos de acompanhar a sessão da CPI que ocorria naquele momento.

    “Os que se dizem nossos representantes do povo negam a casa do povo para o povo. A gente não aceita essa CPI, porque foi criada pelos deputados ruralistas que tem ódio de nós, povos indígenas”, critica Mario Karai
    Guarani, um dos barrados na Câmara, junto com outros indígenas da região Sul do país, dos povos Guarani Mbya, Guarani Nhandeva, Xokleng e Kaingang, além de lideranças da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB).

    Estava prevista para a sessão desta terça a votação do relatório do ruralista Nilson Leitão (PSDB-MT). Em mais de três mil páginas, o relator da CPI propõe o indiciamento de cerca de cem pessoas, entre indígenas – alguns caracterizados como supostos e falsos índios – antropólogos, servidores públicos, indigenistas e até procuradores da República, e apresenta proposições como a extinção do órgão oficial de assistência aos povos indígenas, a Funai.

    “A extinção da Funai é como se fosse matar a nós, povos indígenas. A Funai é uma instituição fundamental para a nossa permanência, sobrevivência, resistência, e a garantia da demarcação de nossos territórios tradicionais”, afirma Francisco Runja Kaingang. “Nós nunca tivemos participação plena, como comunidade, como lideranças, de discutir e participar [da CPI]. Isso para nós não é legítimo”.


    Barrados, indígenas manifestam-se em frente à Câmara. foto: Tiago Miotto

    A perspectiva é que o relatório ruralista seja aprovado com grande margem de votos, já que os representantes do agro são maioria na Comissão. Os deputados de oposição, entretanto, apresentaram um relatório paralelo, no qual questionam os elementos apresentados por Leitão e analisam os mais de 70 requerimentos sumariamente ignorados pela presidência da CPI. Eram requerimentos que tratavam de situações de violência contra os indígenas, invasões de terras tradicionais e diversas outras violações que os ruralistas preferiram não trazer à pauta.

    “Nós não temos força na quantia de votos, mas temos força moral de dizer que estamos do lado da verdade. Temos vergonha dessa CPI, que a maioria e o relatório tem sangue de índio, sangue de sem-terra, sangue de quilombola assassinados ao longo da história desse país”, afirmou aos indígenas, do lado de fora do Anexo 2, o deputado João Daniel (PT-SE), um dos deputados que assinam o relatório paralelo.

    A sessão acabou sendo suspensa em função da ordem do dia no plenário da Câmara, onde outros projetos de interesse dos ruralistas, como as Medidas Provisórias (MPs) 756/2016 e 758/2016, estavam na pauta. Impossível de ser retomada ainda na terça, nova sessão foi marcada para quarta (17) às 9h30min.

    A semana está sendo movimentada para os representantes do agronegócio em Brasília: em troca dos 220 votos de sua bancada na Reforma da Previdência, que deve entrar em pauta na próxima semana e é largamente rejeitada pela população, Temer aceitou aliviar a dívida bilionária de produtores rurais com o Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural (Funrural).

    Do lado de fora da Câmara, com faixas, cantos e gritos de “Demarcação já!”, indígenas também se manifestaram contra a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 215, projeto que pretende transferir a atribuição da demarcação de terras do Poder Executivo para o Legislativo e, na prática, inviabilizar as demarcações de terras indígenas e a titulação de terras quilombolas.

    “O interesse desses deputados é tirar a demarcação de terras indígenas, e nós queremos a demarcação de nossas terras. Mas esse é um direito constitucional e nós queremos é que se cumpra a Constituição Federal e que esses deputados tenham respeito pelo povo brasileiro”, afirma Brasilio Pripra Xokleng.

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  • 16/05/2017

    Ameaça de desnacionalização


    "PEC 2015 e CPI da Funai/Incra : Armas das multinacionais nas mãos dos ruralistas" Foto: Tiago Miotto/Cimi

    Por Cleber César Buzatto, Secretário Executivo do Cimi, publicado no O Globo

    Planta-se aqui para se colher lá fora. A despeito do discurso nacionalista, é de conhecimento notório que o modelo de produção do agronegócio brasileiro é amplamente benéfico aos interesses econômicos de grandes corporações multinacionais. Essas empresas revertem anualmente bilhões de reais às suas matrizes na forma de lucros e dividendos colhidos de suas atividades no Brasil. Assim fazem a Monsanto, a Cargill e a John Deere para os EUA; a Syngenta para a Suíça; a Bunge para a Holanda; a New Holland para a Itália; a Bayer e a Basf para a Alemanha; a Louis Dreyfus Company (LDC) para a França, entre outras.

    Não satisfeitos, representantes do agronegócio no Congresso Nacional, em conluio com o governo federal, agora se empenham para entregar o próprio território brasileiro aos estrangeiros. O principal instrumento legislativo dos ruralistas é o Projeto de Lei 4.059/12, que autoriza a “aquisição de áreas rurais e suas utilizações por pessoas físicas e jurídicas estrangeiras”. Sabe-se, além disso, que germina no Executivo uma medida provisória ainda mais agressiva a ser enviada ao Congresso Nacional em breve.

    Apesar da gravidade dessas iniciativas, não se trata de ações isoladas. A eficácia delas poderá ser fortificada com um conjunto de outras medidas defendidas pelo setor, como a implantação da Lei 13.178/15, que legaliza a titulação privada de terras públicas em regiões de fronteiras; e da MP 759/15, que prioriza a titulação privada de terras desapropriadas para fins de reforma agrária, o que permitirá a reconcentração destas terras, inclusive por estrangeiros. Já o Projeto de Lei (PL) 827/15, do ruralista Dilceu Sperafico (PP/PR), que “altera a Lei de Proteção de Cultivares e dá outras providências”, desmonta o sistema de proteção às sementes. Sendo aprovado, reforçará ainda mais a homogeneização, a hegemonização e a dependência tecnológica externa — marcadamente dominada pelas transnacionais Monsanto/Bayer e Syngenta.

    A inviabilização das demarcações de Terras Indígenas (TIs) também faz parte deste esforço de desnacionalizar o território brasileiro. Quando demarcadas, as TIs são registradas como Bens da União pela Secretaria de Patrimônio da União. A Constituição brasileira também veda a sua alienação. Isso, evidentemente, constitui-se num poderoso instrumento jurídico que estabelece limites aos interesses de apossamento e apropriação privada do território brasileiro pelo capital internacional.

    A Proposta de Emenda Constitucional 215/00 (que transfere do Executivo para o Legislativo o controle das demarcações), relatada na Comissão Especial da Câmara pelo então deputado federal e hoje ministro da Justiça, o ruralista Osmar Serraglio (PMDB/PR), e a Portaria 80/17 (que prevê a revisão de processos de terras já demarcadas), nitidamente servem a este propósito.

    Estas ações desnudam o caráter antinacional do “agro” e de seus defensores. O medo de serem desmascarados perante a sociedade brasileira faz com que os ruralistas queiram construir uma nuvem de fumaça que encubra suas verdadeiras intenções. Acreditam que formarão esta nuvem indiciando, sem fundamento, cientistas sociais, procuradores da República, lideranças indígenas e dirigentes de organizações da sociedade civil que apoiam os direitos dos povos originários (entre os quais, o Conselho Indigenista Missionário) na CPI da Funai/Incra. Mas assim como não conseguiu esconder a crueldade do ataque aos gamela, no Maranhão, que tiveram suas mãos decepadas, essa nuvem também não encobre o fato de que o agronegócio quer decepar o Brasil.

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  • 15/05/2017

    Vistoria do MPF encontra escola indígena em condições precárias em Aquidauana (MS)


    Cada sala de aula só possui a iluminação de uma lâmpada. Foto: MPF/MS

    O Ministério Público Federal em Mato Grosso do Sul (MPF/MS) realizou vistoria técnica na Escola Municipal Indígena Polo General Cândido Rondon, localizada na Aldeia Bananal, no município de Aquidauana (MS). A diligência ocorreu após reclamação da comunidade sobre as más condições físicas e estruturais do local.

    O prédio, que abriga 350 alunos e 25 professores nos três turnos de funcionamento, não passa por manutenções periódicas. Durante a vistoria, foram encontradas telhas e janelas quebradas, fiação exposta, ventilador e cadeiras deteriorados, banheiros em péssimas condições de uso (alguns, sem água e interditados), sala de informática desativada e até mangueira de gás vencida há 5 anos.

    Nas salas de aula, os alunos indígenas, mesmo os do período noturno, contam apenas com a iluminação de uma lâmpada por cômodo. Além disso, de acordo com relato do cacique da comunidade, é comum a falta de água e de energia no local. Segundo ele, o abastecimento é restrito e já no período vespertino os estudantes enfrentam a ausência de água no colégio.

     


    Infiltração no banheiro da escola. Fotos: MPF/MS

    Do lado externo do prédio, o MPF encontrou precárias condições de higiene e segurança. Não há iluminação externa, lixos estão depositados no pátio da escola e as tubulações de esgoto, além de expostas, estão próximas da cozinha.

    A Vigilância Sanitária já visitou o local e estabeleceu prazo de 60 dias para que a Prefeitura de Aquidauana corrija as falhas de higiene encontradas. O MPF deve acionar os gestores locais para assegurar aos Terena condições dignas de acesso à educação.

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  • 15/05/2017

    Indígenas Krikati são atacados a tiros enquanto pescavam em açude da terra tradicional demarcada



    Os indígenas Otávio Filho Krikati e Daniel Filho Krikati, ambos da aldeia Arraia, ao sul da Terra Indígena Krikati, sudoeste do Maranhão, pescavam no açude de uma das fazendas incidentes na área demarcada, na noite do dia 11 de maio, quando escutaram disparos de arma de fogo na direção em que estavam. Por sorte, não foram atingidos. Temendo novos disparos, os indígenas se deitaram no chão e esperaram.

    Segundo André Krikati, cacique da aldeia Arraia, a fazenda local do atentado já estava desocupada. No entanto, após a decisão da Justiça Federal da 1ª Vara de Imperatriz, proferida em 11 de março de 2016, suspendendo o processo de desintrusão, possibilitou o retorno dos não indígenas, inclusive o fazendeiro apontado como autor dos disparos. O cacique afirma ainda que o fazendeiro está desmatando a área para o plantio de capim.

    Outros caciques estão na aldeia Arraia. O episódio mobilizou o povo. Algumas lideranças Krikati foram até a sede da fazenda e não encontraram o fazendeiro. O clima é de tensão e os Krikati afirmam que não permitirão a presença de fazendeiros no interior da terra indígena, sobretudo ameaçando e atirando contra os indígenas. Para os Krikati a situação é insustentável e se trata de um contexto já denunciado às autoridades.

    A Coordenação Regional da Fundação Nacional do Índio (Funai) em Imperatriz já foi avisada da situação, mas até o momento não compareceu à aldeia. A omissão por parte do órgão responsável pela defesa dos direitos dos povos indígenas causa mais revolta nos indígenas que se sentem desprotegidos.

    O caso da desintrusão da Terra Indígena Krikati está inserido numa conjuntura de conflitos idênticos aos que ocorrem em outras regiões do Maranhão, e do país, e se caso não houver uma intervenção do órgão responsável a situação na região pode se acirrar ainda mais. Os indígenas têm denunciado que os fazendeiros os impedem de fazer roças, de caçar e pescar e que os invasores têm retornado para dentro da área. Esse confronto só acirra a tensão na região. Os indígenas há tempos estão chamando a atenção para a situação; nada foi feito para solucionar o conflito.

    Histórico da demarcação da Terra Indígena Krikati

    Os Krikati tiveram seu território declarado como terra indígena em 08 de julho de 1992, através da portaria ministerial nº 328. Esta portaria designou como posse indígena um total de 146 mil hectares. Os estudos que delimitaram a TI Krikati não foram feitos somente pela Funai, mas por um perito nomeado pelo Juiz Federal da 2ª Vara de São Luís, o qual reconheceu sua validade jurídica ao indeferir o pleito de muitos fazendeiros de Montes Altos, que entraram em juízo em 1981 para tentar o reconhecimento legal de seus títulos de propriedade incidentes na área pleiteada pelos Krikati. O Juiz Federal não reconheceu como válidos os títulos dos 120 fazendeiros que propuseram a ação, julgando-a extinta, sem julgamento de mérito.

    Em 1989, a FUNAI cadastrou 563 ocupações na área delimitada para os índios Krikati, quando se constatou que em 161 delas os ocupantes não moravam no imóvel – o que quer dizer que esses ocupantes não vivem exclusivamente do imóvel ou têm uma outra fonte de renda. Outras 256 ocupações foram estabelecidas entre os anos de 1979 e 1989 (após, portanto, a primeira portaria de delimitação) e, destas, ainda um total de 96 foram efetivadas somente nos anos de 1988 e 1989. Portanto, quase 50% das ocupações foram estabelecidas depois do início da ação judicial – o que caracteriza a má-fé destes ocupantes. Em 1999, a Funai iniciou o processo de desocupação dos não indígenas, com o pagamento das benfeitorias, no entanto a extrusão total dos ocupantes ainda não se efetivou.

    Em 24 de junho de 2014, a juíza federal Diana Wanderlei da Silva suspendeu qualquer ato consignado na notificação vinculada no Edital nº 1/DPT publicado no DOU em 23/05/2014, que tanto a FUNAI quanto a União se abstenham de praticar qualquer outro ato futuro destinado à desocupação da área objeto da demarcação da Terra Indígena Krikati, até ulterior decisão judicial.

    No entanto, em 22 de agosto de 2014, o juiz federal Walisson Gonçalves Cunha fixou o prazo para a retirada dos ocupantes não índios até dezembro do mesmo ano. Em 11 de março de 2016, o juiz federal William Kem Aoki revogou a decisão anterior e convocou a realização de audiência de conciliação entre indígenas e fazendeiros.

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  • 12/05/2017

    Raposa Serra do Sol: vice-governador de Roraima responderá ação penal por tentativa de homicídio contra indígenas


    Feira realizada na Raposa Serra do Sol. Foto: Arquivo Cimi

    O Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) aceitou a denúncia contra o vice-governador de Roraima Paulo César Justo Quartiero por suposta prática do crime de tentativa de homicídio, com uso de armas de fogo e de bombas caseiras contra indígenas da Comunidade Renascer, localizada próximo à ponte Tracajá, a cerca de 200 km de Boa Vista (RR). Ele foi denunciado ainda por porte ilegal de arma de fogo. A invasão aconteceu em maio de 2008, durante o processo de demarcação da Reserva Raposa Serra do Sol, e deixou cerca de onze indígenas feridos.

    De acordo com a denúncia, Quartiero forneceu aos seus subordinados as armas de fogo utilizadas nos disparos contra os indígenas. Já seu filho, Renato de Almeida Quartiero, com o auxílio de empregados da família, teria fabricado e possuía artefato explosivo e incendiário também utilizados no atentado à vida de integrantes da comunidade indígena.

    O atentado foi motivado pela demarcação da Reserva Raposa Serra do Sol, que abrange as fazendas Depósito e Providência, cuja a posse era exercida pelo vice-governador. A Reserva foi demarcada em 1998 pelo Ministério da Justiça. Em 2007, o Supremo Tribunal Federal (STF) determinou a desocupação dos não índios, ou seja, fazendeiros produtores de arroz que ocuparam a terra nos anos de 1970 e 1990, que resistiram à desocupação. Após anos de debates judiciais, em março de 2009, o STF confirmou as decisões anteriores e determinou a desocupação dos não índios.

    Quartiero resistiu a desocupação e apenas saiu das terras após a determinação do STF de 2009, retirando todas as benfeitorias existentes no local, e demolindo o que não pôde ser retirado, como as casas de alvenaria.

    “Os denunciados, sob o comando de Paulo Quartiero, prepararam-se para enfrentar qualquer pessoa que tentasse cumprir a determinação judicial para desocupar as terras, inclusive a Polícia Federal, o que evidencia o total desrespeito em relação aos poderes constituídos, notadamente ao Poder Judiciário”, explica na denúncia o então Procurador-Geral da República Roberto Gurgel.

    Os índios, sabendo da determinação judicial para desocupação das fazendas, ocuparam parte das terras e iniciaram, de forma pacífica, a construção de um polo da comunidade indígena Renascer, entre os igarapés Raposa e Tracajá, local que era ocupado pelos próprios indígenas, mas que foi cercado e anexado à fazenda Depósito.

    Durante o mutirão, os índios foram atacados com tiros e bombas de fabricação caseira, o que ocasionou ferimentos em cerca de onze indígenas. Nas investigações, constatou-se que o mandante do confronto armado para expulsar os índios do local foi o atual vice-governador de Roraima, Paulo Quartiero.

    A 2ª Seção do TRF1, por unanimidade, entendeu haver indícios suficientes de materialidade e autoria para justificar o recebimento da denúncia e instaurar a ação penal contra o vice-governador.

    Também foram denunciados Renato de Almeida Quartiero, Patrick Fernandes Novaes, Anderson Borges Magalhães e Elton Domingos da Silva.

    Andamento do processo

    À época dos delitos, Quartiero ocupava o cargo de deputado federal. Ao renunciar do mandato em dezembro de 2014, o Supremo Tribunal Federal declinou da competência e determinou a remessa dos autos à 1ª Vara Federal da Seção Judiciária de Roraima, devido à perda do foro por prerrogativa de função. Com a eleição dele para vice-governador de Roraima, foi determinada a remessa ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região, conforme prevê o art. 77, X, “a”, da Constituição do Estado de Roraima. A denúncia contra os demais envolvidos foi desmembrada do processo que envolve o vice-governador devido ao foro por prerrogativa de função.

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  • 12/05/2017

    Criança Manchineri de um ano é morta com tiro na cabeça no Acre em onda de violência contra indígenas


    Seus poucos pertences, algumas roupas apenas, desceram à cova em cima do caixãozinho branco. Foto: Arquivo Pessoal

    Por Renato Santana, da Assessoria de Comunicação – Cimi

    Leudo Manchineri, um bebê indígena de um ano de idade, morreu após levar um tiro na cabeça enquanto o barco em que estava com os pais atracava no Porto da Feira, às margens do Rio Iaco, município de Sena Madureira (AC). Leudo dormia no colo da mãe; era por volta das 22 horas do dia 27 de março. Com sua família, o pequeno vinha da Terra Indígena São-paulina, onde agora está enterrado em um território tradicional não demarcado. Seus poucos pertences, algumas roupas apenas, desceram à cova em cima do caixãozinho branco.

    De acordo com as investigações da Polícia Civil, que prendeu quatro envolvidos no assassinato, entre eles o atirador, os criminosos estavam no porto. A embarcação dos Manchineri se aproximou iluminando o caminho com uma lanterna. Um dos envolvidos gritou para os indígenas que se eles apontassem a lanterna novamente, levariam tiros. Sem ter como atracar no escuro, os indígenas usaram a lanterna e os disparos ocorreram acertando na cabeça o pequeno Leudo. Os criminosos tentaram fugir de táxi para Manoel Urbano, município vizinho.

    A criança chegou a ser socorrida e levada para o hospital de Sena Madureira, mas não resistiu ao grave ferimento e morreu. O crime, no entanto, guarda relações com o ódio local disseminado pelos invasores da terra indígena. "Um grupo armado havia ido à aldeia com a intenção de matar o cacique, que se escondeu na mata. Numa segunda-feira, dia 27, quando assassinaram a criança, o cacique resolveu ir até a cidade de Sena justamente para denunciar a invasão da aldeia e a terceira tentativa de assassiná-lo", explica o missionário indigenista Lindomar Padilha, do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) Regional Amazônia Ocidental. Em um outro município do Acre, Santa Rosa do Purus, onde 80% da população é indígena, o cacique Thomas Huni Kui foi espancado a pauladas em fevereiro deste ano. Nas agressões contra o cacique, morador de aldeia na Terra Indígena Alto Rio Purus, estavam envolvidos os mesmos agressores que mataram o professor Carlos Alberto Domingos Huni Kui. Um dos envolvidos na morte, autor das pedradas que levaram o indígena à morte, foi condenado a 22 anos de prisão, em dezembro de 2016.

    Em 2013, o Cimi realizou um censo em Sena Madureira e constatou que 36 famílias viviam "permanentemente" na cidade. Desde então, os indígenas começaram a considerar a possibilidade do retorno aos territórios tradicionais deixando a violência que sofrem na cidade, além da fome, alcoolismo, drogas e demais vulnerabilidades, caso da exploração sexual infantil já denunciada pela imprensa acreana. A volta às aldeias se intensificou a partir do final de 2016 e três famílias ainda vivem na cidade. A reocupação de áreas tradicionais (em alguns casos já com regularização), de onde foram expulsos pelo avanço das fronteiras agropecuárias na Amazônia, gerou conflitos com toda a sorte de invasores que enxergam "terra de índio como terra de ninguém". 

    "A volta das famílias às aldeias, e a abertura de novas, intensificou os conflitos, especialmente nas terras São Paolino e Kaiapuká. As duas terras se encontram invadidas por fazendeiros que querem expulsar os índios. No caso da Terra Indígena do Kaiapuká, ainda tem o agravante de o programa Terra Legal ter loteado parte da terra indígena e destinado a moradores não indígenas. Toda semana há caso de ataques contra os indígenas", relata Padilha. Com efeito, em menos de dois meses o pequeno Manchineri foi morto e outros dois indígenas sofreram tentativas de homicídio.

    Na última segunda-feira, dia 08, um caso de tentativa de assassinato. Desta vez foi contra o jovem Adecácio Jaminawa, de 18 anos. O indígena foi alvejado por vários disparos, mas somente duas balas o atingiram nos membros inferiores; uma bala ficou alojada na coxa, outra em uma das nádegas. Conforme a ocorrência policial registrada, o indígena caminhava pela Praça 25 de Setembro quando um carro da cor preta se aproximou. Homens armados saíram do veículo e dispararam na direção do jovem Jaminawa. A vítima foi ferida com dois disparos e encaminhada ao hospital da cidade sem correr risco de morte. Neste caso, os autores do crime não foram detidos e a apreensão é que os indivíduos possam voltar a procurar o jovem.

    Neste caso, assim como o do bebê, a polícia trabalha com a hipótese de que esteja relacionado com um crime comum. Não é o que acredita os Jaminawa. "Ouvindo os indígenas, todos relacionam o crime ao processo de retorno às aldeias, inclusive o rapaz alvejado pelos tiros também foi para Sena Madureira, acompanhando o pai, para denunciar a invasão de uma aldeia da Terra Indígena Kaiapuká, onde a situação está muito tensa", explica o missionário do Cimi.

    No próximo dia 18, uma reunião com representantes da Fundação Nacional do Índio (Funai), Polícia Federal, Ministério Público Federal (MPF), ICMBio, Terra Legal, indígenas e integrantes da sociedade civil ocorrerá como estratégia de solucionar os problemas que levam ao cenário de violência. "Em 2016, indígenas e não indígenas, após uma reunião com esses mesmos órgãos, assinaram um acordo, uma espécie de "termo de convivência", mas que não está sendo cumprido por parte dos não indígenas. O ódio, o preconceito e os ataques aos territórios tradicionais seguem acontecendo", diz Padilha.


    Violência contra indígenas em Sena Madureira (AC), a 143 km da capital Rio Branco, registra o bebê morto e um baleado em menos de dois meses

    Migração para Sena Madureira

    Um grupo de crianças Jaminawa espreita atravessadores de banana, numa tarde chuvosa de fevereiro de 2012, em Sena Madureira (AC). Às margens do Rio Iaco, no Porto da Feira, homens passam de mão em mão dezenas de cachos da fruta, ainda verde, retiradas de barcos atracados para caminhonetes. Lépida, uma das crianças se desgarra do grupo e ataca uma banana que cai antes de chegar ao veículo. O atravessador, que faz contas num bloquinho de papel, também é rápido: chutando pedras contra o pequeno Jaminawa, tenta afastá-lo. O indiozinho enfrenta a chuva de brita e terra, pega a fruta e corre para sumir num beco.

    Tal cena passou a ser comum a partir dos anos 2000, quando indígenas de diversos povos – Madja, Huni-Kui, Manchineri e, sobretudo, Jaminawa – passaram a viver na cidade que conta com quase 40 mil habitantes (IBGE, 2010). Estima-se que cerca de 400 famílias indígenas já chegaram a viver, entre idas e vindas, em Sena Madureira. A pressão sofrida nas áreas indígenas por agentes invasores, além de dinâmicas inerentes a alguns povos, que muitas vezes voltam para suas aldeias depois de um período fora (há casos envolvendo aspectos cosmológicos e religiosos), motivaram a migração para a cidade fundada sob a colonização seringueira – tanto de peruanos quanto de brasileiros.

    No caso dos Jaminawa – uma unificação dos povos Xixinawa, Kununawa, Sharanawa, Yawanawá, Mastanawa, Bashonawa e Sharanawa – a falta de demarcação da Terra Indígena Sãopaolina, invadida por fazendas de gado, é o principal motivador da presença do povo em Sena Madureira. O Grupo de Trabalho da Fundação Nacional do Índio (Funai) para identificação e delimitação do território tradicional foi instalado em agosto de 2013, mas ainda não teve uma conclusão.

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