• 19/07/2017

    Indígenas Kadiwéu retomam fazenda incidente em território concedido ao povo no Segundo Reinado, em 1864


    Há uma semana 120 indígenas Kadiwéu retomaram parte do território destinado ao povo em 1900 e homologado em 1984. O espaço reocupado na última quinta-feira (13) faz parte das 23 fazendas reivindicadas pelos indígenas em 2012, localizada em Porto Murtinho, pantanal do Mato Grosso do Sul. Contudo, há cinco anos a Justiça Federal sustenta uma liminar que concedeu aos pecuaristas 12 das 23 propriedades que se estendem sobre a terra historicamente destinada ao povo. A retomada desta semana reocupa uma dessas fazendas em que o detentor de título não retornou desde as primeiras ocupações, em abril de 2012.

    Para liderança indígena presente na retomada, este território, além de ser destinado aos Kadiwéu pelo governo, é de pertença aos indígenas pelas lutas travadas pelos antepassado, devido a relação estabelecida com o espaço há centenas de anos. “Nós queremos essa terra. Ela é herança deixada para nós pelos nossos antepassados. Eles lutaram por esse pedaço de chão. Viveram e foram enterrados aqui. É por isso que estamos retomando. Queremos reconquistar essa terra de volta. A terra é vida do índio e esse pedaço é nossa herança”, comenta o senhor.

    “Não queremos confronto. Mas nos preocupamos porque ficamos sabendo por um viajante que estão mandando segurança. Só queremos nossa herança. Queremos a conclusão da demarcação da  terra. Pedimos ao governo que faça a desintrusão e indenizem os fazendeiros”, comenta a liderança em entrevista por telefone. Na retomada de 2012,um historiador, um advogado e quatro lideranças indígenas foram perseguidos por cerca de 20 homens armados em seis caminhonetes. A perseguição aconteceu durante uma visita do grupo ao território dos indígenas.

    Documentos históricos comprovam que o território dos Kadiwéu foi doado a eles ainda no Segundo Império, por Dom Pedro II, como recompensa pela participação dos indígenas, ao lado do Brasil, na Guerra do Paraguai, em 1864. Com extensão de 538,5 mil hectares, a Terra Indígena Kadiwéu permanece com aproximadamente 160 mil hectares usados na pecuária por fazendeiros. A área retomada encontra-se dentro desta porcentagem, que somam 30% do espaço destinado ao povo. Relatos mencionam invasões decorrentes desde 1950. Segundo anciões do povo, tanto o Serviço de Proteção ao Índio (SPI) quanto a Funai oficializavam a ocupação territorial, arrendando a terra aos pecuaristas.

    Mesmo com as documentações, em 2012 a juíza federal Adriana Delboni Tarrico decidiu em favor dos pecuaristas, justificando que "o entendimento ora adotado não significa, de forma alguma, sinalização de quem esteja com a razão, principalmente porque não será nestes autos que a propriedade será definida, mas, sim, tão-somente a posse". A liminar concedida há cinco anos permanece para o território ocupado.
     
    O processo de demarcação, homologação e registro do território dos Kadiwéu foi finalizado pelo governo federal em 1984. Naquele ano, os pecuaristas, que se encontravam dentro dos limites da TI, ajuizaram ação para discutir a nulidade da demarcação da TI. De um total de 585 mil hectares, entrou em litígio 155 mil – registradas em nome da União, de usufruto exclusivo dos indígenas, mas ocupados por cerca de 120 fazendas de gado. Desde 1987, tramina, então, no STF, uma ação que nunca foi julgada. Também a desintrusão da área não ocorreu.

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  • 18/07/2017

    Indígenas de Rondônia, Mato Grosso e Amazonas repudiam projetos de mineração em territórios tradicionais



    Foto: Todd Southgate / Greenpeace

    Em carta circular divulgada ontem (17), Organização dos povos Indígenas de Rondônia, Noroeste do Mato Grosso e Sul do Amazonas (OPIROMA) repudia iniciativas que cogitam a regulamentação de atividades de mineração em Terras Indígenas no estado de Rondônia. A organização divulgou o documento após tomar conhecimento da audiência de indígenas do estado com o ministro da Justiça e Segurança Pública, Torquato Jardim, e com o presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai), Franklimberg Ribeiro de Freitas. A reunião ocorreu no dia 29 de junho, em Brasília (DF).

    O documento marca postura da OPIROMA, que assume a decisão de não pactuar com projetos de mineração em territórios tradicionais. “Sabemos o tamanho do impacto ambiental, social e cultural que isso oferecerá aos povos indígenas”, esclarece o texto. “[A APIROMA] não apoiará e nem pactuará com a degradação do solo, desaparecimento dos rios, desmatamento das florestas, em geral a extinção da fauna, flora e a soberania alimentar dentro das terras indígenas”.

    Projetos de exploração nas Terras Indígenas são gatilhos para conflitos em territórios tradicionais. A carta circular justifica a postura negativa referente a projetos de mineração por ameaçarem a integridade física dos povos indígenas e da natureza. Atividades mineradoras “causará o impacto de violência para as mulheres, criança, jovens e idoso tradicionais indígenas, que serão obrigados a aceitar uma regulamentação de atividade mineradora sem o consentimento de todos (as) dos membros do povo que residem na terra indígena”.

    O texto aponta também as violações e ameaças introduzidas nas comunidades indígenas por presenças de garimpeiros. Elencam: “bebida alcoólica, drogas, circulação de armas ilegais, assassinatos e prostituição dentro das terras indígenas”.

    Ministro da Justiça e a exploração dos territórios tradicionais

    Em reunião com lideranças indígenas do Mato Grosso do Sul (MS), no mesmo dia em que recebeu o grupo de indígenas de Rondônia para debater sobre os projetos de mineração, Torquato Jardim afirmou a necessidade de buscar “soluções não ortodoxas e tradicionais” para os as demarcações. “Precisamos encontrar uma viabilidade técnica para as terras. Necessitamos tornar a terra útil”, defendeu Torquato, herdeiro de uma das oligarquias mais antigas do estado de Goiás.

    Uma semana depois, o ministro da Justiça reafirmou seu desejo de tornar as terras indígenas “economicamente produtivas” para o Estado. "Precisamos pensar juntos como explorar economicamente as terras que são de vocês. Para que vocês tenham retorno de saúde, de educação, de cultura. Essa é minha proposta de trabalho", indicou para a delegação de lideranças indígenas Pataxó e Tupinambá, do extremo sul da Bahia.

    Em respostas as propostas de Torquato Jardim, tanto a delegação vinda da Bahia quanto a do Mato Grosso do Sul reafirmaram a autonomia sobre seus territórios tradicionais. "Nós estamos lutando, principalmente na Bahia, pelo primeiro direto, que é direito a terra. Não queremos debater a exploração mineral de nossos territórios. Se não temos nem a terra garantida, como iremos explorar as riquezas? Nossa primeira reivindicação é o direito as terras”, afirmou o cacique Aruã Pataxó, presidente da Federação Indígena das Nações Pataxó e Tupinambá do Extremo Sul da Bahia (Finpat).

    Diante as propostas do ministro da Justiça que correspondem ao capital, os grupos sustentaram o grito milenar dos povos indígenas. “Queremos a nossa própria agricultura tradicional, nossa economia de subsistência. Nem todo mundo vai nessa linha da riqueza e exploração da terra. O que precisamos é que o governo garanta a demarcação de nossas terras. Isso é o mais importante", contrapôs Aruã.

    Leia a Carta Circular na íntegra:

    Carta Circular/007/Coordenador Geral-OPIROMA – Via Correio Eletrônico.

    Vilhena-RO, 17 de Julho de 2017.

    Para: Lideranças, Comunidades e Associações Indígenas.

    Assunto: “Regulamentação de atividades de mineração em Terras Indígenas no estado de Rondônia”

    Prezados (as) Senhores (as),
    Devido os fatos ocorridos e solicitação de esclarecimento sobre o referido tema “Regulamentação de atividades de mineração em Terras Indígenas no estado de Rondônia”, proposta de pauta abaixo anexada. Vimos na qualidade de Coordenador Geral da OPIROMA – Organização dos povos Indígenas de Rondônia, Noroeste do Mato Grosso e Sul do amazonas. Esclarecer que:
    1) A OPIROMA não irá pactuar com projeto de Mineração em terras indígenas no estado de Rondônia, Noroeste do Mato Grosso e Sul do Amazonas. Visto que sabemos o tamanho do impacto ambiental, social e cultural que isso oferecerá para os povos indígenas;

    2) Não apoiará e nem pactuará com a degradação do solo, desaparecimento dos rios, desmatamento das florestas, em geral a extinção da fauna, flora e a soberania alimentar dentro das terras indígenas;

    3) Entendemos que a Mineração em terras indígenas. Promoverá conflitos internos e externos, onde ameaçará a integridade física dos povos indígenas introduzida por garimpeiros como: A bebida alcoólica, drogas, circulação de armas ilegais, assassinatos e prostituição dentro das terras indígenas;

    4) Causará o impacto de violência para as mulheres, criança, jovens e idoso tradicionais indígenas, que serão obrigados a aceitar uma regulamentação de atividade mineradora sem o consentimento de todos (a)s dos membro do povo que residem na terra indígena;

    5) A extração ilegal de madeireira ou mineradora são considerado como crime ambiental, formação de quadrilha, danos ao patrimônio ambiental, seguida de criminalização das lideranças indígena que praticam estas ilegalidades;

    6) Entendemos que os atos das lideranças indígenas que pactuam com a ilegalidade do garimpo e venda de madeiras, é prejuízos para todos e abre discursos para a bancada ruralista em dizer que: “Os povos indígenas não precisam de terras, não produz nada, não tem desenvolvimento, eles mesmos estão se autodestruindo e destruindo as florestas e rios, pela qual eles mesmos dizem que defendem”;

    Esclarecemos ainda que o objetivo da OPIROMA é: Defender a demarcação, saúde, educação, desenvolvimento sustentável, gestão territorial, produção indígena, fortalecimento cultural, defender o direito do homem, mulher, crianças, e idosos indígenas, no contexto geral de que assegurem o respeito à organização social, usos e costumes, línguas, crenças, tradições e de todas as demais formas de manifestações culturais dos povos indígenas.

    Sendo o que temos no momento, desde já agradecemos a compreensão de todos e todas.
    Atenciosamente,

    José Luis Cassupá
    Coordenador Geral – OPIROMA

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  • 18/07/2017

    Mulheres munduruku pautam ocupação do canteiro da hidrelétrica São Manoel


    A coordenadora da mobilização, Ana Poxo, recebe o diretor Antonio Brasiliano em reunião na ocupação. Foto: Caio Mota

    Fórum Teles Pires  —  A ocupação feita por indígenas, após deliberação no encontro de mulheres munduruku realizada em maio, chega ao seu segundo dia e divulga nova carta pública sobre a situação no canteiro de obras na Usina Hidrelétrica São Manoel (EESM), localizada no rio Teles Pires entre os estados de Pará e Mato Grosso. No documento, os ocupantes destacam que permanecerão no local até que suas pautas sejam atendidas.

    Também é apontado pelos indígenas a resistência da empresa ao diálogo aberto visto que os advogados da EESM, ingressaram com pedido de reintegração de posse antes mesmo de qualquer reunião entre as lideranças e os diretores da empresa. Há ainda a acusação de que ameças estão sendo feitas por uma funcionária da hidrelétrica. Confira a íntegra da segunda carta pública Munduruku:


    Até o momento

    Na tarde de ontem, dia 17 de julho, o diretor da ESSM Antonio Brasiliano compareceu ao canteiro de obras e realizou reunião com os indígenas. Ele garantiu que as obras continuarão paradas enquanto a ocupação estiver acontecendo.

    A ocupação da EESM teve início na madrugada do dia 16 de julho quando cerca de 200 indígenas representando 138 aldeias munduruku da bacia do Tapajós chegaram ao canteiro de obras da usina.


    A ocupação pacífica liderada pelas mulheres munduruku conta com a participação de crianças, jovens e idosos. Fotos: Caio Mota


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  • 17/07/2017

    Dom Roque Paloschi: Brasil tenta desfazer as proteções aos povos indígenas


    Por Mary Durran, publicada por Catholic News Service.Tradução de Luísa Flores Somavilla.

    Desde que o presidente do Brasil, Michel Temer, assumiu o cargo em 31 de agosto, ele se cercou de ministros com fortes vínculos com os pecuaristas e agricultores de soja, que se opõem às medidas tomadas pelos governos anteriores para implementar a demarcação de terras indígenas. Em 13 de julho, a organização não governamental Global Witness, com sede nos EUA, divulgou um relatório citando o Brasil como o país com maior número de assassinatos de ambientalistas e defensores da terra em 2016.

    As proteções constitucionais aos povos indígenas estão sendo reduzidas pelo governo brasileiro, disse o presidente da comissão episcopal sobre os povos indígenas ao Catholic News Service, durante uma viagem no Canadá.

    "Na década de 80, ajudamos a redigir os artigos da constituição de 1988 que reconheciam a cultura dos povos indígenas e estabeleciam a proteção de suas terras por demarcação", disse o arcebispo Roque Paloschi, de Porto Velho. "Hoje, estamos lutando para manter essas proteções em vigor". Paloschi é presidente do Conselho Indigenista Missionário (CIMI).

    O CIMI foi formado em 1975 – durante a ditadura militar do Brasil, que terminou em 1985 – para acompanhar os povos indígenas do país, que sofreram uma redução de 500 milhões na época da colonização pelos portugueses para menos de um milhão, pertencentes a 240 grupos étnicos diferentes.

    Paloschi falou em Montreal, um mês depois de especialistas internacionais terem advertido que os povos indígenas brasileiros estão sendo atacados e que eles precisam de proteção reforçada, ao invés da redução das medidas de proteção.

    Três especialistas da ONU e da Comissão Interamericana de Direitos Humanos apontaram em uma declaração, em junho, que nos últimos 15 anos o Brasil teve "o maior número de assassinatos de ambientalistas e defensores da terra do mundo", com uma média de um por semana. Muitos desses defensores são indígenas que vivem da terra.

    Em 13 de julho, a organização não governamental Global Witness, com sede nos EUA, divulgou um relatório citando o Brasil como o país com o maior número de assassinatos de ambientalistas e defensores da terra em 2016; 49 desses ativistas, incluindo indígenas, foram mortos no Brasil.

    "Estamos vivendo como se estivéssemos em uma ditadura militar", disse Paloschi. "Líderes e povos inteiros estão sendo criminalizados."

    Desde que o presidente do Brasil, Michel Temer, assumiu o cargo em 31 de agosto, ele se cercou de ministros com fortes vínculos com os pecuaristas e agricultores de soja, que se opõem às medidas tomadas pelos governos anteriores para implementar a demarcação de terras indígenas.

    Paloschi disse que, apesar dos esforços do CIMI, apenas 50% das terras envolvidas receberam os títulos legais. Ele disse que mesmo as terras atribuídas legalmente aos povos indígenas são muitas vezes invadidas por madeireiros e empresas de mineração.

    O governo Temer criou uma Comissão Parlamentar de Inquérito que pressionou para reduzir proteções ambientais e indígenas e propôs emendas constitucionais que enfraqueceriam a Fundação Nacional do Índio (FUNAI).

    Outro projeto polêmico propõe que a responsabilidade pela demarcação de terras indígenas seja retirada da FUNAI, do Ministério da Justiça e do presidente do congresso brasileiro, cuja maioria está vinculada ao grupo de proprietários de terras e pecuaristas que se opõem aos direitos de propriedade indígena. A proposta obrigaria todas as demarcações de terras já aprovadas a serem ratificadas pelo Congresso.

    Paloschi disse que a retórica da comissão, que acusou a ONU de promover a agenda de grupos de ativistas internacionais, parece ter colocado lenha na fogueira do racismo encoberto de muitos brasileiros não indígenas. Aumentaram os impasses violentos entre agricultores e grupos indígenas na tentativa de reivindicar terras. Em maio, 13 índios Gamela que estavam ocupando territórios tiveram que ser hospitalizados após serem atacados por fazendeiros armados com facões no estado do Maranhão. Uma das vítimas teve as mãos decepadas e os joelhos cortados.

    "Eles são os mais pobres dos pobres, mas são desprezados e sofrem constante preconceito e racismo", disse Paloschi sobre os povos indígenas. "Sem sua terra, eles não são nada".

    O CIMI, cujos 250 missionários trabalham com esses grupos indígenas em todo o Brasil, foi acusado de incentivar as ocupações de terra e causar confusão, acusação negada por Paloschi.

    "O papel do CIMI é acompanhar os povos indígenas, incentivá-los a assumir a própria vida e apoiá-los a crescer. Não podemos fazer isso por eles", afirmou.

    O arcebispo disse que está triste com a colusão histórica da Igreja com os colonizadores portugueses, que tentaram tutelar os povos indígenas e torná-los dependentes.

    Mas ele disse que vê sinais de esperança.

    "Existe um processo contínuo de diálogo e algumas mudanças visíveis no reconhecimento do valor das línguas e culturas indígenas.

    Mas quanto mais avançamos, maior é o caminho a ser percorrido", disse ele.

    Ele diz ser incentivado pelo Papa Francisco, cujos papado e compromisso com os povos das Américas ele considera uma bênção.

    Paloschi disse que o papa confidenciou ao cardeal brasileiro Claudio Hummes que está pensando em realizar um sínodo na Amazônia, lar das terras ancestrais da grande maioria dos povos indígenas do Brasil. Atualmente, o papa está refletindo e rezando pelo discernimento a respeito da organização de tal sínodo, disse o arcebispo.


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  • 17/07/2017

    Munduruku ocupam hidrelétrica no rio Teles Pires

     


    Ocupação iniciou na madrugada de domingo. Foto: Caio Motta

    Fórum Teles Pires

    Passava das 22h, do dia 15, quando barcos transportando quase duas centenas de indígenas munduruku, representando 138 aldeias da bacia do rio Tapajós, chegaram na entrada do canteiro de obras da Hidrelétrica São Manoel. Antes do amanhecer do dia 16 a obra estava sob controle dos manifestantes que reivindicam um encontro com representantes do governo e dos empreendimentos no rio Teles Pires.

    Em carta aberta divulgada no dia de hoje, 16, os manifestantes mostram que o movimento é pacífico e foi planejado desde maio, no encontro de mulheres Munduruku “Aya Cayu Waydip Pe”, na aldeia Santa Cruz. Os principais problemas enfrentados atualmente pelos indígenas da bacia do Tapajós, estão ligados diretamente – segundo eles – às usinas Teles Pires e São Manoel. A primeira, já em funcionamento, e a segunda aguardando a licença de operação.


    Desde o início do processo de construção das usinas no rio Teles Pires, os povos da região denunciam as violações no processo, em especial, a falta de consulta livre, prévia e informada, como descrito na convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho, da qual o Brasil é signatário.

    Em trecho da carta, os indígenas apontam o governo como co-responsável pelos problemas que têm enfrentado: “Depois de ouvirmos as mulheres Munduruku foi decidido que estaríamos aqui pacificamente no canteiro da hidrelétrica São Manoel por motivos e dores. A gente não esta aqui invadindo. O único invasor é o governo e as empresas responsáveis pelas hidrelétricas que estão sendo construídas no rio Teles Pires. Nós, povo Munduruku, estamos aqui em nosso local sagrado”.

    Pauta de reivindicações

    Ao longo do primeiro dia, os ocupantes do canteiro de obras redigiram também um documento com 12 pontos de reivindicação. Dentre os pontos que mais se destacam, estão o desrespeito com a fé e espiritualidade munduruku, expressos na destruição de locais sagrados para os indígenas e a remoção de urnas funerárias – que atualmente encontram-se em poder da UHE Teles Pires.



    A mobilização dos indígenas atingidos pelas barragens no Teles Pires iniciou há cerca de uma semana, quando eles se reuniram na aldeia Teles Pires e o cacique geral do povo Munduruku publicou um vídeo falando sobre as motivações que os levaram a cobrar um posicionamento mais claro do governo e dos empreendimentos. Confira:

    Diagnóstico

    A maior parte das reivindicações do movimento de ocupação da Usina São Manoel já vem sendo denunciada ao Ministério Público Federal e apresentada também aos responsáveis pelo empreendimento. No início de junho, por ocasião do primeiro seminário de avaliação final do Programa Básico Ambiental Indígena (PBAI) da Usina Hidrelétrica (UHE) Teles Pires, os povos Kayabi, Munduruku e Apiaká, integrantes do Fórum Teles Pires (FTP).

    O dossiê produzido pelo FTP foi um dos documentos usados para embasar o MPF no pedido de indeferimento do interdito proibitório ingressado na justiça pela EESM na segunda semana de julho. O documento é resultado de um processo de diagnóstico participativo, junto às comunidades indígenas, sobre impactos das barragens no rio Teles Pires.


    Foto: Caio Motta


    Foto: Juliana Rosa Pesqueira

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  • 13/07/2017

    Cimi e Caritas de Tefé (AM) analisam difícil conjuntura para povos indígenas


    Foto: J. Rosha / Cimi Norte I

    Por Cimi Tefé

    Muito embora o cenário brasileiro seja de descaso, violência e desrespeito aos povos indígenas, há muita força, resistência e esperança na luta em defesa de seus direitos. Em 2016, a análise da conjuntura indígena concluía que a situação não era nada animadora. Mudanças na legislação deixaram os povos desprotegidos e expostos à ação de invasores, que têm como alvo as terras e seus recursos naturais. Desassistidas, as comunidades ficam vulneráveis às violações de seus direitos e ao saqueamento de seus territórios. Na região do médio rio Solimões, as violações apontadas pelos indígenas são a exploração da madeira, caça, pesca, pecuária e mineração, tanto em áreas demarcadas quanto fora delas, e a ausência ou descaso de políticas públicas específicas.

    Passado um ano dessa crítica, a situação se agravou. O enfraquecimento dos órgãos de fiscalização e segurança e a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da FUNAI e INCRA feita pela bancada ruralista, concluída em maio de 2017, vêm permitindo ainda mais ataques e violências. Segundo a Comissão Pastoral da Terra, no primeiro semestre de 2017 foram mais de 40 mortes em conflitos no campo. Para Dom Murilo Krieger, vice-presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), "desde que a CPI começou a funcionar, aqueles que quiseram ocupar mais terras utilizaram mais violência para isso". O religioso comenta que a CPI “só deu voz para quem era contra os indígenas, não sentenciou fazendeiros. Eles querem mostrar que os índios não têm direitos e que suas terras podem virar fazendas".


    Em Japurá (AM) indígenas protestam em frente à Prefeitura e exigem respeito e direitos. Foto: Ed Bezerra

    Essa tendência aparece também no Poder Judiciário. Recentemente, o Tribunal Regional Federal da 4º região anulou três portarias do Ministro da Justiça que havia declarado posse tradicional das terras do povo Guarani, em Santa Catarina. Essa atitude remete a uma das intenções da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215 que, entre outras ameaças, institui o marco temporal para o reconhecimento da ocupação tradicional indígena. Com ele, só poderiam ser consideradas terras tradicionais aquelas que estivessem sob posse dos indígenas na data de 5 de outubro de 1988, data da Constituição Federal, sem considerar a expulsão de grupos indígenas de suas terras tradicionais por conflitos fundiários ou por ações da ditadura militar. Com a aprovação da PEC e a instituição do marco temporal, virão mais ataques ao legítimo direito dos indígenas ao território.

    Leia também:
    Não há nenhum fazendeiro indiciado na CPI. Somente pessoas que lutam pela vida dos povos indígenas”, afirma dom Leonardo Steiner, da CNBB
    Nota Pública do Cimi sobre a Aprovação do Relatório da CPI da Funai/Incra

    Sem terra demarcada, as populações indígenas ficam também sem políticas públicas específicas. Saúde e educação principalmente, pois os poderes públicos e muitos de seus servidores, além de não reconhecer o direito, atendem os indígenas com discriminação e racismo. Contudo, a esperança e a resistência não esmorecem. O documento escrito no Acampamento Terra Livre, realizado em abril em Brasília, traduz o sentimento de luta dos povos indígenas brasileiros, em especial, da região do médio rio Solimões: “Reafirmamos que não admitiremos as violências, retrocessos e ameaças perpetrados pelo Estado brasileiro e pelas oligarquias econômicas contra nossas vidas e nossos direitos. Conclamamos todos a se unirem à luta dos povos originários pela defesa dos territórios tradicionais e da mãe natureza, pelo bem-estar de todas as formas de vida”.

    Com a análise, conclui-se o primeiro ano do projeto “Garantindo a defesa de direitos e a cidadania dos povos indígenas do médio rio Solimões e afluentes", realizado pela Cáritas de Tefé e Cimi Tefé, e apoiado pela Agência Católica para o Desenvolvimento Internacional, sediada no Reino Unido, e pela União Europeia.

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  • 13/07/2017

    Nota Pública: De volta ao integracionismo?


    Foto: Tiago Miotto / Cimi

    Nos últimos anos a sociedade tem assistido a uma acelerada escalada de violência contra os povos indígenas no Brasil, diretamente relacionada a uma série de iniciativas no âmbito dos poderes legislativo, executivo e judiciário que visam à desconstrução dos direitos assegurados na Constituição Federal de 1988. Trata-se, sem dúvida, do contexto mais adverso enfrentado por estes povos desde o processo de redemocratização do país e a consagração do direito originário dos povos indígenas sobre seus territórios, bem como à sua organização social, costumes, línguas e tradições – gravemente ameaçados nos dias de hoje.

    Se a incompatibilidade entre a Constituição Federal de 1988 e medidas como a PEC 215 e a Portaria 303 da Advocacia Geral da União (para citar duas dentre as dezenas de iniciativas anti-indígenas que têm se proliferado em anos recentes) já era flagrante, dois atos do Poder Executivo relacionados aos povos indígenas e quilombolas nos últimos dias parecem ter sido extraídos diretamente do Diário Oficial da União de décadas atrás, próprios do regime de exceção da ditadura militar no Brasil.

    A criação, em 6 de julho último, de um Grupo de Trabalho “com a finalidade de formular propostas, medidas e estratégias que visem à integração social das comunidades indígenas e quilombolas” guarda notável semelhança com os ideais integracionistas da doutrina de segurança nacional. A simples criação do GT nestes termos já seria assustadora, por remeter à perigosa associação com paradigmas aculturativos, há muito tempo abandonados pela antropologia e pelo indigenismo oficial, e em total desacordo com os princípios instituídos pela Constituição de 1988. .Em função de fortes críticas dos movimentos indígenas e indigenistas e de imediata manifestação do Ministério Público Federal, a referida portaria foi reeditada em 13/07/17 simplesmente substituindo o termo “integração social” por “organização social”. Ou seja, a emenda ficou ainda pior que o soneto, pois formular propostas para a organização social de povos indígenas e quilombolas continua mantendo uma clara perspectiva intervencionista e etnocêntrica do Estado sobre essas populações, que não consegue esconder as reais intenções e objetivos do GT. E todas as objeções colocadas pelo documento do MPF continuam sem resposta na “nova” portaria.

    Reforça ainda mais essa iniciativa totalmente inconveniente e inconsequente o fato do GT ser composto quase exclusivamente por membros de órgãos de segurança e desprovido da presença de qualquer instituição que atua com as comunidades quilombolas, embora estas sejam também objeto do Grupo de Trabalho. O prazo exíguo para a elaboração e apresentação do plano de trabalho (15 dias) e do relatório do GT (30 dias após aprovação do plano de trabalho) também demonstra claramente que não se prevê nenhum tipo de consulta aos povos e comunidades afetados pelas “propostas, medidas e estratégias” advindas do GT, em flagrante desrespeito à Convenção 169 da OIT.

    O segundo ato, publicado seis dias após a criação deste GT, foi a efetivação do general Franklinberg Ribeiro de Freitas na presidência da Fundação Nacional do Índio, cargo que vinha ocupando interinamente desde 9 de maio de 2017, apesar de inúmeros protestos por parte dos povos e organizações indígenas. Qualquer semelhança não é mera coincidência. Em entrevista coletiva por ocasião de sua exoneração, o antecessor do general, Antônio Fernandes Toninho Costa, afirmou que o órgão vive “uma ditadura que não permite o presidente da Funai executar as políticas constitucionais”. Paradoxalmente, o pastor evangélico Toninho Costa havia sido indicado pelo mesmo Partido Social Cristão (PSC) do general Franklinberg. As graves denúncias feitas por ele escancaram a utilização da Funai como moeda de troca pelo governo Temer e a subordinação da política indigenista aos interesses da bancada ruralista no Congresso Nacional. O Conselho Nacional de Política Indigenista (CNPI), criado em 2015 e instalado em abril de 2016, fez apenas duas reuniões e não houve mais nenhuma iniciativa do MJ em convocar novas reuniões do Conselho, num flagrante desrespeito às organizações indígenas. Também é digno de nota o fato do governo federal não ter feito nenhum movimento até o momento para implementar as resoluções aprovadas durante a Conferência Nacional de Política Indigenista, por ele mesmo convocada em 2015.

    O discurso da integração e da assimilação da ditadura militar serviu para legitimar, nos campos jurídico e teórico, a usurpação das terras indígenas sob o pretexto da perda da identidade desses povos. Vale ainda lembrar que foi justamente esse discurso integracionista que justificou a ideia de “emancipação”, defendida pelos militares no final dos anos 1970, o que motivou forte resistência dos povos indígenas e da sociedade civil. Preocupadas com o processo de militarização e enfraquecimento da Funai, e com os contínuos ataques aos direitos indígenas, as organizações abaixo assinadas repudiam publicamente a criação do referido GT e exigem sua imediata revogação.

    Articulação dos Povos Indígenas do Brasil – APIB
    Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo (APOINME)
    Articulação dos Povos Indígenas do Sudeste (ARPINSUDESTE)
    Articulação dos Povos Indígenas do Sul (ARPINSUL)
    Conselho Terena
    Comissão Guarani Yvyrupá
    Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira  (COIAB)
    Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais – CONAQ
    Grande Assembleia do Povo Guarani (ATY GUASSU)
    União das Mulheres Indígenas da Amazônia Brasileira (UMIAB)

    Associação Brasileira de Antropologia – ABA
    Associação do Movimento dos Agentes Agroflorestais Indígenas do Acre (AMAAIC)
    Associação Terra Indígena Xingu (ATIX)
    Associação Wyty-Catë dos Povos Timbira do Maranhão e Tocantins (Wyty-Catë)   
    Conselho Indígena de Roraima (CIR)   
    Conselho das Aldeias Wajãpi (Apina)
    Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (Foirn)
    Hutukara Associação Yanomami (HAY)
    Organização dos Professores Indígenas do Acre (Opiac)
    Organização Geral Mayuruna (OGM)
    Operação Amazônia Nativa (OPAN)

    Associação Nacional de Ação Indigenista – ANAÍ
    Centro de Trabalho Indigenista – CTI
    Comissão Pró-Índio de São Paulo – CPI-SP
    Comissão Pró-Índio do Acre – CPI/AC
    Conselho Indigenista Missionário – CIMI
    Coletivo de Profissionais de Antropologia- aPROA
    Instituto Catitu
    Instituto Socioambiental – ISA
    Instituto de Pesquisa e Formação Indígena – IEPÉ
    Instituto Internacional de Educação do Brasil – IEB
    RCA – Rede de Cooperação Amazônica
    Relatoria da Plataforma DHESCA

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  • 13/07/2017

    Jornalista é condenado por dano moral coletivo após ofensa aos Guarani-Kaiowá


    Foto: Tiago Miotto/Cimi

    Em Mato Grosso do Sul, o Ministério Público Federal (MPF) conseguiu a condenação do jornalista Walter Navarro por dano moral coletivo em R$ 50 mil. A Justiça Federal considerou que o comunicador extrapolou a liberdade de expressão ao veicular conteúdo ofensivo e pejorativo contra os índios Guarani-Kaiowá em artigo publicado no webjornal O Tempo, de Minas Gerais, em 2012.

    Para o Judiciário, o texto, intitulado “Guarani-Kaiowá é o c… Meu nome agora é Enéas p…”, foi escrito em tom “evidentemente discriminatório”, o que gerou prejuízo à imagem e à moral dos indígenas. Na publicação, Navarro, ao contestar o movimento Somos Todos Guarani-Kaiowá, se reportou aos índios como “insuportáveis”, “incestuosos” e “flatulentos”. O autor defendeu que “índio bom é índio morto” e classificou as mulheres indígenas como “libidinosas”.

    Na época de sua veiculação, o conteúdo gerou polêmica entre os leitores, resultando na demissão do jornalista e na retratação pública do jornal. O MPF chegou a pedir explicações a Navarro, que alegou “caráter humorístico” do texto. Contudo, na visão da Justiça, o artigo ultrapassou a esfera da mera crítica e/ou humor.

    “A liberdade de expressão não pode ser aplicada para amparar expressões capazes de denegrir e incitar o ódio contra minorias e grupos populacionais que, em pleno 2017, lutam para ver garantidos seus direitos mínimos, como é o caso dos índios”, afirmou o Judiciário.

    Para o MPF, a liberdade de expressão é um direito constitucional fundamental, mas é “injustificável permitir que, a pretexto de exercício da liberdade de expressão, sejam veiculadas publicações que se traduzem em incentivo à discriminação”.

    Walter Navarro deve pagar indenização de R$ 50 mil pelo dano moral coletivo causado. O valor, inferior ao pedido do MPF, de R$ 100 mil, foi reduzido para se enquadrar à capacidade econômica do réu. O montante será revertido em programas de saúde e de educação na Reserva Indígena de Dourados/MS.

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  • 13/07/2017

    Organizações pedem que Governo Federal rejeite inclusão de florestas brasileiras no mercado de carbono


    Lideranças comunitárias de Xapuri, no Acre, durante encontro que debateu políticas de offset florestais. Foto: Fotos: Daniel Santini

    Por Guilherme Cavalli, da assessoria de comunicação

    Organizações e movimentos sociais, ONGs, representantes de povos indígenas, povos e comunidades tradicionais no Brasil protocolaram no Ministério do Meio Ambiente e das Relações Exteriores um documento que repudia a inclusão das florestas em mecanismos de compensação de carbono. O argumento aponta a preocupação e denuncia a falsa solução à crise do clima. As entidades defendem a posicionamento histórico do país contra os offsets florestais (mecanismos de compensação de carbono).

    As propostas de compensação de carbono, que surgem em um contexto de negociações internacionais e em uma conjuntura nacional de crise, trazem restrições a comunidades ribeirinhas, indígenas, pequenos agricultores, extrativistas que são proibidos de cultivar seus espaços, de uso tradicional da mata. Violações culturais e sociais são impostas a esses grupos que se relacionam com a natureza de forma saudável e autônoma. Os mecanismos implantados pelos offsets florestais preveem restrições às comunidades tradicionais, como limitações para práticas de agricultura, pesca, caça e uso de bens florestais.

    No Brasil, o Acre é considerado um laboratório para implementação de políticas baseadas na ideia de que é possível compensar poluição gerada em determinadas regiões com a manutenção de florestas em outras regiões. Encontro realizado em maio deste ano na cidade de Xapuri, povos da floresta criticaram políticas de economia verde e demonstraram preocupação com novos acordos discutidos entre o governo e a indústria de aviação. O encontro reuniu indígenas Apurinã, Huni Kui, Jaminawa, Manchineri e Shawadawa, e representantes de comunidades tradicionais do interior do Acre, além de seringueiros e seringueiras de Xapuri. Leia a notícia do encontro.

    Colonialismo Climático

    Projetos, como o Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação Evitados (REDD), propõem que empresas que poluem em outros continentes possam “compensar” os danos causados a natureza financiando iniciativas que, de maneira autoritária e sem consulta prévia das comunidades, instalam normas de relação com a terra.  Além dos governos de países desenvolvidos, indústrias poluidoras são as principais financiadoras das iniciativas de offsets florestais. Não se pensa outro modelo de desenvolvimento, mais sustentável e auto gestor. As empresas continuam poluindo e desmatando. Com a “compra de créditos de carbono” são autorizadas a seguir sua lógica de mercado.

    “[Os offsets florestais] aprofundam e geram novas formas de desigualdades, já que quem tem dinheiro e poder pode pagar e continuar emitindo sem fazer a sua parte”, afirmam as organizações no texto. “O conceito de poluidor-pagador, criado inicialmente para pressionar os países e setores a reduzir sua poluição, é capturado por quem pode continuar poluindo desde que pague por isso”, argumenta a carta.

    O documento assinado por 52 instituições afirma que as iniciativas de “comprar e vender” créditos de carbono “transferem a responsabilidade que deveria ser de setores que vêm contribuindo para a crise climática para quem sempre protegeu as florestas: povos indígenas, populações tradicionais, agricultores familiares e camponeses”.

    As entidades, em análise da conjuntura nacional, criticam no documento os retrocessos nas leis que garantem a proteção dos direitos territoriais e do meio ambiente.  Afirmam que, ao aderir as negociações internacionais, “tiram o foco do enfrentamento aos reais problemas florestais nacionais promovidos por grupos de interesse que querem enfraquecer as políticas de proteção florestal no país, e ainda alimentam o discurso de quem quer solapar a legislação ambiental brasileira”. As organizações signatárias do texto apontam que “qualquer mudança nesse sentido colocaria em risco a integridade ambiental do país e do planeta”.

    Em momento em que o mundo se volta para o debate sobre aquecimento global e crise ambiental, o presidente Michel Temer sancionou na última terça-feira (11) a Medida Provisória (MP) 759/2016 que prevê a regularização fundiária de áreas urbanas e rurais e também altera a legislação da reforma agrária.

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  • 12/07/2017

    História da resistência indígena: 500 anos de luta – livro de Benetido Prézia

    Será lançado em agosto o livro História da resistência indígena: 500 anos de luta, de Benedito Prezia. O trabalho reúne episódios das lutas indígenas escritos para o jornal Porantim, do Conselho Indigenista Missionário (Cimi). Benedito Prézia trabalhou no Cimi de 1983 a 1991, é mestre em Linguística Geral (USP) e doutor em Ciências Sociais (PUC-SP). Em 2001 participou da fundação do Programa Pindorama para indígenas na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC SP), sendo seu atual coordenador.

    “Este livro traz a visão guerreira de nossas comunidades que enfrentaram um genocídio não só físico como também cultural, pois muitos grandes lutadores tiveram seus nomes escondidos pela história oficial”, escrevem no prefácio do livro os indígenas Alexsandro e Amaro Cosmo de Mesquita, do povo Potiguara.

    A obra será lançada pela Expressão Popular no dia 5 de agosto, às 16 horas, na livraria da própria editora, em São Paulo.

    Sinopse do livro

    “A conquista da América foi palco de um grande genocídio, talvez o maior da História da humanidade, quando cerca de 70 milhões de pessoas foram exterminadas. Não sem razão Tzvetan Todorov escreveu que “nenhum dos grandes massacres do século XX pode comparar-se a essa hecatombe”.

    Se começamos a ter consciência dessa destruição ocorrida em nosso continente, ainda pouco se sabe sobre os 500 anos de luta dos povos indígenas no Brasil. Apenas um ou outro episódio se destaca na história oficial. De outro lado as informações são poucas e esparsas, geralmente obtidas através de textos escritos muitas vezes na perspectiva do vencedor, isto é, da sociedade dominante.

    A história real de resistência e luta desses povos continua de certa forma desconhecida. Os personagens, os locais, as datas dessas lutas são geralmente ignoradas pelos brasileiros. Recentemente, começou-se a fazer um resgate deste passado e este livro quer ser uma contribuição para essa retomada histórica. Ele começou a ser gestado em 2005 quando o autor voltou a escrever episódios das lutas indígenas para o jornal indigenista Porantim, do Cimi, em Brasília.

    Foram, portanto, 12 anos de pesquisa e garimpagem em textos históricos, nem sempre de fácil acesso. Este livro foi escrito de forma simples, visando, sobretudo, as lideranças e os professores indígenas para que tivessem um instrumental a mais na luta de resistência. Foi uma forma de devolver às comunidades indígenas parte do seu passado resistente.

    O livro destina-se também aos militantes das causas sociais, para que recuperem a luta desses povos e que vejam, que apesar de vários tropeços, sempre buscaram defender sua terra e suas culturas. Por isso fica aqui gravada a frase que ecoou muito forte na época das comemorações dos 500 anos do Brasil: Reduzidos sim, vencidos nunca!”

    Sobre o autor
    Benedito Antônio G. Prezia, formado em filosofia, atua na questão indígena desde 1983, tendo trabalhado no Conselho Indigenista Missionário (Cimi), em Brasília, de 1983 a 1991. A partir de 1992 passou a ministrar a História da Resistência Indígena no Brasil no Curso de Formação Básica do Cimi. Em 1997, tornou-se mestre em Linguística Geral (USP), com o tema Os indígenas do planalto paulista, nas crônicas quinhentistas e seiscentistas, publicado pela Editora Humanitas (USP, 2ª. ed. 2010). Em 2008, doutorou-se em Ciências Sociais (PUC-SP), com a tese Os Tupi de Piratininga, acolhida, resistência e colaboração. Em 2001, participou da fundação do Programa Pindorama para indígenas na PUC-SP, sendo seu atual coordenador. É autor de vários paradidáticos sobre a temática indígena, como Terra à vista, descobrimento ou invasão (Moderna, 3ª. ed. e 30a reimpr., 2015); Marçal Guarani, a voz que não pode ser esquecida (Expressão Popular, 2ª reimpr., 2009) e Virando gente grande (4ª reimpr., 2014). É co-autor dos livros Esta terra tinha dono (FTD, 6ª ed. 2000), Brasil indígena, 500 anos de resistência (FTD, 2ª. ed. 2004), Povos Indígenas, terra é vida (Atual/Saraiva, 7ª ed., 2013) e A criação do mundo e outras belas histórias.

    Apresentação do livro – por Alexsandro e Amaro Cosmo de Mesquita, do povo Potiguara

    Estamos felizes com a publicação deste importante livro sobre nossa história. É uma obra que vem fortalecer as lutas indígenas atuais, pois não é um livro simplesmente do passado, mas ele mostra uma história da nossa resistência que dá força para enfrentar as lutas de hoje. Esse livro revela os 500 anos de dominação portuguesa e como os povos indígenas a enfrentaram, o que os livros tradicionais não trazem. Ele foi escrito a partir do olhar de alguém que sempre se preocupou em devolver o papel dos povos originários na construção do nosso país, pois esse autor é uma pessoa que há muitos anos vem lutando conosco.

    Para nós, que somos indígenas da etnia Potiguara, é uma grande oportunidade para aprender sobre nosso passado, sobre as lutas ocorridas na Paraíba durante a colônia e nas lutas de outras regiões e que duraram até hoje. É também uma oportunidade para oferecer à população não indígena outra visão desse nosso passado, que foi por muito tempo escondido. Não podemos mais aceitar esse apagamento da nossa história, feito pelos historiadores contratados pela elite dominante, colocando nos livros didáticos apenas o que interessa a ela. Temos que mudar essa cultura que nos chamou durante muito tempo de “bárbaros” e “selvagens” e que nos classificou como povos sem cultura e sem história.
    Este livro traz a visão guerreira de nossas comunidades que enfrentaram um genocídio não só físico como também cultural, pois muitos grandes lutadores tiveram seus nomes escondidos pela história oficial. Acreditamos que todo esse passado de luta vai ajudar a gente a recuperar essa memória, que durante muito tempo foi vista como perigosa. Com ela vamos conhecer muitas formas de resistência e de luta de nossos parentes que deram a vida para defender sua terra e seu povo. Conhecendo essa história muitos de nós poderão ter mais força para fazer com que essa história de morte não se repita.

    Infelizmente estamos vivendo um momento difícil em nosso país, mas a lembrança desse passado mostra que já enfrentamos situações bem piores e que continuamos vivos. O conhecimento dessa história vai nos ajudar a resistir e a encontrar novos caminhos e novos parceiros. Se estamos vivos, é porque somos povos resistentes e acreditamos na força de nossos antepassados e de nossas tradições.

    Esperamos que outros parentes se animem a escrever e a registrar as lutas de suas comunidades para que elas não sejam esquecidas pela pressão do poder dominante. Que este livro seja uma ajuda para buscar no passado uma força para enfrentar as investidas do presente e assim evitar o apagamento cultural que tanto nos prejudicou. Queremos dizer que ainda existimos e resistimos.

    Capítulo do Livro – Parte III: Do período Pombalino à Independência
    Os Xavante libertam negros nas minas de Goiás

    “A animosidade entre indígenas e negros, no início da colônia, foi estimulada pelos portugueses no Leste e Nordeste do Brasil − quanto mais divididos o inimigo, mais fácil é a dominação. Mas, a partir do século XVIII, surgem, em algumas partes do Brasil, uma surpreendente colaboração entre esses dois grupos excluídos.

    Após a descoberta de ouro, em 1725 em Vila Boa de Goiás, o Centro-Oeste foi devassado por muitos aventureiros. Em toda a província, não apenas o solo pedregoso à beira dos rios era rasgado à procura de ouro, como também eram invadidas muitas áreas, territórios tradicionais dos Kayapó, Akroá, Xakriabá e Xavante. Isso acontecia com o apoio do governador, que queria descobrir sempre mais garimpos.

    E a resposta indígena se mostrava à altura, com muitas ações guerreiras. É o que se lê nas diversas cartas do governador João Manoel de Mello a dom José I, relatando que, a partir de 1762, a situação se mostrava muito difícil nos povoados de Crixás, Tesouras e Morrinhos, situados no Norte de Goiás, hoje Estado do Tocantins.

    Crixás era um importante garimpo com mais de 300 escravos africanos, tendo sido alvo dos Xavante por duas vezes. Na primeira investida os moradores conseguiram enfrentar o ataque, mas, na segunda vez, tiveram de fugir, pois grande era o número de indígenas que traziam até armas de fogo. Temendo perder seus escravos africanos, os portugueses fugiram com eles, abandonando o arraial, que foi saqueado e incendiado.

    Para evitar novos confrontos, o governador autorizou uma bandeira formada por 500 homens, que destruiu as aldeias da região, matando e escravizando indígenas, com a abertura de novos garimpos. Apesar da violência, a pressão nativa continuava. Dois anos mais tarde, outra bandeira, formada por 200 homens, partiu de Pilar para enfrentar os Xavante que resistiam.

    Atacados, recuavam, retornando para novos confrontos. Um fato inusitado ocorreu em 1765. Em nova expedição guerreira, perto de Pilar, os indígenas se defrontaram com um grupo de africanos que trabalhavam nas roças. Em vez de matá-los, como costumavam fazer com os portugueses, foram levados para a aldeia, onde, no dizer do governador, os indígenas “lhes fizeram muitos afagos e os casaram com as gentias [mulheres indígenas], garantindo que todo preto que quisesse passar para eles acharia nas suas Aldeias o mesmo bom tratamento”.

    Esse fato assustou as autoridades, pois os negros podiam agora fugir tanto para os quilombos, que surgiam na região, como para as aldeias indígenas, “seguros de perigo, senhores de sua liberdade e com mulheres próprias”.

    Para enfrentar essa nova ousadia, outra bandeira se formou naquele ano com moradores da região. O ataque da aldeia aconteceu de madrugada. Pegos de surpresa e ainda dormindo, muitos Xavante foram mortos, embora alguns tenham conseguido fugir. Pela descrição do relato, não devia se tratar da mesma aldeia onde viviam os negros resgatados, sendo uma pura represália. Quatro anos mais tarde, o governador ainda se queixava ao rei de que o arraial de Tesouras estava quase despovoado pelos constantes assaltos indígenas. No final de 1769, foi autorizada outra expedição, dessa vez organizada pelo padre Pôsso, da vila de Pilar.

    Mais negociante do que sacerdote, vendeu o que possuía, e, com esse capital, reuniu homens para uma nova expedição, esperando capturar muitos escravos e abrir novos garimpos. Após atacar algumas aldeias Xavante, esse grupo alcançou a Ilha do Bananal, entrando no território dos Araés. Atingido por febres, o padre morreu à beira do Araguaia. Seus comandados retornaram, trazendo cada um “algum fruto”, isto é, alguns escravos, mas aquém do esperado, como relatou um cronista da época.

    Esse fracasso fez o governador abandonar essa guerra de extermínio e buscar uma política de aproximação com os Xavante. Isso ocorreu em 1788. Acreditando nas promessas do governador, um grupo de 2.200 indígenas aceitou ser levado para o aldeamento Pedro III, que, na realidade, era um quartel. Sem liberdade e sem o que lhes fora prometido, alguns anos depois fugiram, indo para as cabeceiras do rio das Mortes, no Mato Grosso, onde resistiram até 1946.

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