• 03/10/2017

    Funai precisa solicitar cessão de área ao SPU para delimitar Terra Indígena Kariri-Xocó de Paulo Afonso


    Indígenas Kariri-Xocó em local sagrado: cânion do Rio São Francisco, em Paulo Afonso (BA). Foto: Renato Santana/Cimi


    O Conselho Indigenista Missionário (Cimi) – Regional Nordeste vem por meio desta nota manifestar profunda indignação com a grave situação social a que estão expostos os integrantes do povo indígena Kariri-Xocó de Paulo Afonso, na Bahia, depois da reintegração de posse de uma área pertencente à União, mais precisamente do DNIT, de apenas dois hectares, onde viviam há mais de um ano plantando, pescando, comercializando alimentos, artesanato e recuperando a caatinga.

    A terra que estava sendo ocupada pelas famílias Kariri-Xocó é historicamente local sagrado para os povos Pankararu, Fulni-ô e Kariri-Xocó e estava abandonada há mais de 30 anos. Estas famílias, após terem saído de Kariri Xocó, em Sergipe, viviam há 20 anos nas periferias do município de Paulo Afonso e viram naquele terreno sagrado uma oportunidade de vida mais digna com pleno envolvimento social entre as famílias, além da realização do ponto de vista das práticas espirituais e de produção alimentar autônoma.

    A retirada das 67 famílias desta área da União, no mês de maio deste ano, foi motivada por pedidos de reintegração de posse por parte da empreiteira UZI Construtora Ltda, que se apresentou como proprietária daquela terra. Os indígenas foram realocados provisoriamente em uma escola do município, localizada em frente à terra de onde foram expulsos. Passaram então a viver amontoados e em situação de vulnerabilidade, sem espaço para suas manifestações culturais e religiosas na mata sagrada.

    Estas famílias vêm resistindo e buscando forças para se manterem firmes e organizados, onde mesmo num pequeno espaço, dentro da escola, conseguiram levantar uma roça, embora que insuficiente, e já produzem um pouco de alimentos para a comunidade. A Secretaria de Patrimônio da União (SPU) já constatou que a terra em questão pertence à União, e se manifestou de maneira favorável à cessão destes dois hectares para a FUNAI, que já deveria ter destinado esta terra para o usufruto dos Kariri-Xocó.

    O Cimi Nordeste pede que a FUNAI tome as providências cabíveis para a volta dos Kariri-Xocó ao território de onde foram expulsos.  Que o órgão indigenista peça imediatamente a cessão dos dois hectares para as famílias Kariri-Xocó, e assim faça cumprir a missão da FUNAI que é a defesa dos direitos dos povos indígenas.

    A Constituição Federal de 1988, no seu artigo 6°, GARANTE que é direito de todos os brasileiros o acesso à moradia e à assistência aos desamparados, entre outros direitos fundamentais, e em seus artigos 231 e 232 garante os direitos originários dos povos indígenas às suas terras. Portanto, é dever do Estado garantir que esta comunidade indígena possa viver com segurança e dignidade em suas terras.

    Conselho Indigenista Missionário (Cimi) – Regional Nordeste

    Recife,  03 de outubro de 2017

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  • 02/10/2017

    Empresas se recusam a pedir desculpas a indígenas por danos de usinas no Teles Pires


    Crédito da foto: Ruy Sposati/Cimi


    Cerca de 150 indígenas da etnia Munduruku se reuniram semana passada na aldeia Missão Cururu, no rio Cururu, em Jacareacanga, no Pará, a cerca de 1,7 mil quilômetros da capital, Belém. Mulheres, caciques, guerreiros, pajés, cantores e crianças se dividiram em dezenas de embarcações que partiram de vários pontos do território Munduruku, levando peixe e farinha para garantir a alimentação de todos durante uma audiência pública em que eram aguardados representantes da Fundação Nacional do Índio (Funai), do Ministério Público Federal (MPF) e das empresas donas das usinas Teles Pires e São Manoel, construídas no rio Teles Pires, no Mato Grosso. Ao chegarem na aldeia, entre os dias 28 e 29 de setembro, souberam que a Funai não enviou representantes e as empresas, em vez de comparecerem, enviaram ofícios ao MPF em que recusaram responsabilidade pelos danos aos indígenas. A ausência das empresas e da Funai foi recebida com revolta.

    A audiência foi marcada como parte do acordo assinado em julho deste ano pela Funai, MPF, empresas e indígenas que ocuparam os canteiros de obras da usina de São Manoel, uma das quatro barragens que o governo brasileiro constrói no rio Teles Pires, formador da bacia do Tapajós que nasce no norte do Mato Grosso e deságua no sudoeste do Pará. O acordo tem as assinaturas de um representante da usina de São Manoel, um representante da usina Teles Pires, do presidente da Funai, Franklimberg Freitas, e do representante do MPF, e previa o atendimento a várias reivindicações dos indígenas afetados pelas usinas, incluindo um pedido formal de desculpas das empresas e esclarecimentos sobre os impactos causados.

    Os indígenas atingidos pelo complexo de hidrelétricas acusam as empresas e o governo de impedirem a continuidade dos modos de vida tradicionais e de descumprirem as leis brasileiras que protegem o meio ambiente e os direitos dos povos originários. As empresas alegam que cumprem as exigências do órgão ambiental, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama), mas já respondem a pelo menos 24 ações judiciais iniciadas pelo MPF por irregularidades no licenciamento ambiental. Os principais problemas jurídicos dizem respeito aos artigos 231 e 232 da Constituição brasileira e à Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que protegem direitos indígenas.

    Destruição de locais sagrados

    Os impactos discutidos na reunião na Missão Cururu não são apenas em nível ambiental, mas também em nível espiritual. Os indígenas Munduruku, Apiaká e Kayabi, atingidos pelas usinas no Teles Pires – um total de, até agora, quatro barragens – apontam violentas perturbações espirituais causadas pela destruição de locais sagrados que ficavam onde hoje se localizam as hidrelétricas. A usina Teles Pires destruiu a cachoeira das Sete Quedas, chamada em língua munduruku de Karobixexé, ou mãe dos peixes, e a usina de São Manoel fez desaparecer o morro dos Macacos, chamado em munduruku de Dekuka’a.

    A destruição desses locais sagrados provoca, no entendimento dos indígenas afetados, uma desorganização no mundo dos espíritos que traz consequências trágicas para a vida nas aldeias. A situação foi agravada porque, antes da construção das usinas, urnas funerárias indígenas foram encontradas pela empresa de arqueologia responsável pelos estudos de impacto ambiental e retiradas do local em que estavam, no ano de 2012. Para os Munduruku, a retirada das urnas configurou um roubo. Desde então, os indígenas tentam reaver o patrimônio arqueológico que consideram subtraído.

    As urnas retiradas da floresta só foram descobertas pelos próprios Munduruku em 2013, durante uma visita aos escritórios da empresa de arqueologia Documento, em Alta Floresta, no Mato Grosso, próximo aos canteiros de obras das usinas de São Manoel e Teles Pires. A empresa fazia então os estudos de impacto da usina Teles Pires e, ao encontrar as urnas em área que seria alagada pela usina, resgatou o material arqueológico. Para os Munduruku, o que a usina chama de resgate foi a violação de um local sagrado que trouxe perturbações graves para seu modo de vida. A retirada das urnas gerou reações da Sociedade de Arqueologia Brasileira (SAB). Uma das reivindicações dos indígenas é o estabelecimento de um local reservado para que as urnas fiquem fora das mãos de não-indígenas. Atualmente, as urnas funerárias estão em Alta Floresta, sob a guarda de um museu.

    As empresas afirmam, nos ofícios enviados para justificar a ausência, que estão seguindo todos os regulamentos legais para a devolução das urnas, mas não mencionam a destruição dos locais sagrados. Em resposta, os Munduruku prepararam uma carta em que explicam a profundidade dos desgastes sofridos pela destruição dos lugares sagrados.

    Carta dos Munduruku

    Resposta da usina São Manoel

    Resposta da usina Teles Pires


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  • 29/09/2017

    Pelo 3º ano seguido, incêndio na TI Arariboia pode provocar remoção de Awá isolados e destruição de aldeias Guajajara


    Por Renato Santana, da Assessoria de Comunicação – Cimi

     

    A Terra Indígena Arariboia voltou a arder em chamas dez anos depois do primeiro incêndio de grandes proporções, neste século. No sudoeste do Maranhão, pelo terceiro ano consecutivo, o fogo destrói a floresta, mata animais, transforma em cinzas árvores e coloca em risco a vida do povo Guajajara e dos grupos Awá-Guajá, que vivem em situação de isolamento voluntário. Neste momento, estes indígenas correm o risco de serem contatados para assim transferidos de suas áreas tradicionais de perambulação.

     

    Conforme Frederico Guajajara, integrante da Comissão de Caciques e Lideranças da TI Arariboia, desde 2015, ocasião em que mais da metade da terra indígena de 413.288 hectares queimou, a Fundação Nacional do Índio (Funai) tem a intenção de transferir os Awá isolados para a Terra Indígena Karu, município de Bom Jardim, noroeste do Maranhão. Fontes consultadas na Funai afirmam que a iniciativa é de fato considerada pelo órgão. Para os Guajajara, o órgão indigenista do Estado prefere retirar um povo de seu local de vida, e que representa uma das garantias de preservação da floresta, ao invés de ajudar os Guajajara a fiscalizar o território, mobilizando o Ibama e a Polícia Federal para coibir os invasores, reconhecidamente indutores dos incêndios na terra indígena.   

     

    "Somos contra ter contato com eles. A Funai usa os Awá de recente contato pra ter contato com quem não tem. Pra botar na cabeça deles de que é melhor sair de onde eles estão por conta das queimadas. Botar tudo isso na cabeça deles pra transferir da Arariboia pra Karu. Tá errado, porque eles não conhecem esse outro lugar. Sou contra isso. O que eu quero é proteger, fiscalizar e monitorar com fiscalização permanente, capacitar os guardiões, os agentes", diz a liderança que mora na aldeia Jussaral, um dos pontos de concentração de brigadistas que combatem as chamas.

     

    A TI Karu possui 118 mil hectares e tal como a Arariboia é habitada pelo povo Guajajara, além dos Awá-Guajá de recente contato e grupos sem contato algum com a sociedade branca que os envolvem. Na Karu ocorreu o contato com duas indígenas Awá, Jakarewyj e Amakaria, em 2015, que doentes foram buscar ajuda de seus parentes de recente contato. Ambas inicialmente se recuperaram e voltaram para o seu grupo, mas Jakarewyj acabou morrendo. Justamente pelas semelhanças entre as terras, a ideia de transferência dos Awa isolados da Arariboia para a Karu levanta preocupações.  

     

    Invasões de madeireiros, caçadores e incêndios compõem também a vida na TI Karu. No ano passado, as chamas destruíram áreas próximas aos isolados Awá desta terra indígena. O que, de nenhum modo, os Awá deixariam de conviver com tal realidade. Para o coordenador do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) Regional Maranhão, Gilderlan Rodrigues da Silva, "a Funai não está preparada para uma ação destas. Um exemplo é o caso das duas Awa. Por outro lado, uma vez tendo contato com os Awá da Arariboia, e a transferência para a Karu, pode significar o fim deste grupo na Terra Indígena Arariboia. Não estão preparados, não é possível controlar os desdobramentos da ação para os isolados e isso nos preocupa muito".



    Crédito da foto: Frederico Guajajara

     

    Início do incêndio

      

    Este ano, as primeiras chamas começaram a queimar na Terra Indígena Arariboia no final do mês de junho na porção que faz divisa com o município de Arame. No dia 13 de agosto, o fogo chegou perto das aldeias. Duas brigadas, reunindo 26 indígenas Guajajara treinados, trabalham em turnos para combater o incêndio. Representantes do Centro Nacional de Prevenção e Combate aos Incêndios Florestais (Prevfogo), órgão do Ibama, realizaram um sobrevoo de reconhecimento com os Guajajara e instalaram duas bases nas aldeias Jussaral e Zutiua.

    "O incêndio começou em áreas onde os invasores entram. Isso é sabido por todo mundo. A gente até já apontou pro Ibama, pra Funai. Porque madeireiro não entra só pra tirar madeira: monta acampamento, faz comida. Caçador também. Então eles fazem fogo e não apagam direito quando vão embora. E eles sabem que nessa época do ano o fogo pega rápido", aponta Zezico Guajajara, da aldeia Zutiua. Os Guajajara, e possivelmente os Awá isolados, ainda se recuperavam dos incêndios de 2015 e 2016.

    Frederico Guajajara afirma que roças foram perdidas, caças voltaram a sumir, a coleta na mata não é mais possível e fontes de água secam a cada incêndio. "Hoje corremos o risco de não fazer as nossas festas tradicionais. Daqui uns anos, se continuar assim, não tem mais floresta, a natureza pra os nossos filhos conhecer o caititu, a cotia, os animais todos, as árvores, essa beleza toda. Isso não é genocídio? Porque se a gente não tem isso, acabamos", enfatiza a liderança Guajajara.   

    O Instituto de Pesquisas Espaciais (Inpe) registrou até esta sexta-feira, 29, 2500 focos de incêndio em Grajaú, uma das cinco cidades que ladeiam a Arariboia – a cidade está no ranking dos dez municípios brasileiros com mais focos de incêndios acumulados nos últimos cinco anos, e em 2017. Foram 60 dias de combate ao incêndio até o seu controle definitivo, em 2015, com brigadas vindas de outros estados. Este ano, os Guajajara já combatem o fogo há 90 dias – sozinhos. "Precisamos de fiscalização permanente e para isso acontecer o Estado precisa ajudar", diz o Guajajara.

     

    Conforme os Guajajara, o fogo começa a entrar na mata virgem. Até o momento, queimou sobretudo locais castigados pelo incêndio de 2015. "Precisamos de reforço pra chegar em áreas de difícil acesso. Por terra é complicado. Queremos uma aeronave pra transportar os brigadistas pra cabeça do fogo dentro da mata. A cabeça é o principal. Se combater ali, conseguimos controlar. Hoje nem mandioca mais tem pra fazer farinha. Fica difícil de fazer o trabalho, mas vamos seguir na luta", encerra Frederico Guajajara.  

     

     


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  • 29/09/2017

    Garimpeiros armados ameaçam assentados no Tapajós


    Do Xingu Vivo

    Um grupo de garimpeiros armados ameaçou nesta quinta, 28, ribeirinhos e assentados do Projeto de Assentamento Agroextrativista (PAE) Montanha e Mangabal, localizado no município de Itaituba, no Pará. As comunidades do PAE, localizado às margens do rio Tapajós, foram uma das forças de oposição à construção da hidrelétrica de São Luis do Tapajós e têm sido sistematicamente acuados por garimpeiros, madeireiros e outros invasores que exploram ilegalmente recursos naturais na região. “Os garimpeiros estão revoltados. Ameaçaram todo mundo, armados”, denuncia um ribeirinho.

    Descumprindo veto judicial a “quaisquer ato possessório na área de ocupação da população tradicional de Mangabal e Montanha”, de acordo com os ribeirinhos um grupo numeroso de garimpeiros chegou na beira de um igarapé, dentro dessa área, e ameaçou com violência os moradores. Eles “levaram bala, levaram tudo”, denunciaram.

    Montanha e Mangabal passou recentemente por um processo de autodemarcação por parte de seus moradores, iniciativa que buscou proteger a área da exploração predatória e da violência. Procurado duas vezes por representantes das comunidades para tratar da situação das invasões, o superintendente do Incra em Santarém, Mário Costa, deu apenas respostas evasivas, não se comprometendo a tomar uma atitude efetiva em relação à escalada da tensão no local.

    Tendo as suas casas separadas umas das outras em sua maioria por cerca de 20 minutos de navegação, e contando apenas com dois ou três rádios em mais de 70 quilômetros de margens do Tapajós, os ribeirinhos de Montanha e Mangabal encontram-se em uma situação alarmante. Ainda nesta quinta, acionaram o Ministério Público Federal pedindo medidas urgentes de proteção.

    Escalada das tensões e descaso do Incra

    Montanha e Mangabal é ocupada por ribeirinhos há mais de 140 anos, mas só foi reconhecida como território tradicional pelo Incra em 2013 – em meio à iminência de se construir na região uma das usinas hidrelétricas (UHEs) do Complexo do Tapajós. As tensões relativas à construção da UHE é mais um dos diversos focos de pressão sobre o território e a vida dos ribeirinhos, somando-se à histórica exploração predatória e intimidação de grileiros, garimpeiros, madeireiros e outros.

    Buscando construir vias de proteger a área e as famílias do assentamento, os ribeirinhos realizaram, na primeira quinzena de setembro, a autodemarcação e sinalização dos limites de Montanha e Mangabal. Para isso, contaram com o trabalho de 26 indígenas, dos povos Munduruku e Sateré Mawé, entre outros apoiadores. “Nós fazemos a autodemarcação para eles [invasores]  saberem o local, onde é a parte deles e a parte nossa. Porque sempre tem aquele modo de a pessoa alegar ‘não, eu não sei onde é minha parte, meu terreno’”, afirmou um morador do assentamento durante as atividades demarcatórias.

    Apenas dois dias depois do início das atividades, os ribeirinhos e indígenas se depararam com invasores que exploravam palmito e madeira no interior do território de Mangabal (ver foto). Tratava-se de um grupo de pessoas conhecidas na região como “os baianos”, que há extraem palmito e madeira da reunião há muito tempo, e saiam, naquele momento, de um ramal com um caminhão. Esses logo perguntaram o que estavam fazendo em “suas terras, sem avisá-los”, tentando claramente intimidar os indígenas e ribeirinhos. Buscando evitar conflitos, os ribeirinhos foram até a casa dos “baianos” para explicar que estavam fazendo a autodemarcação, seguindo o seu direito ao uso do seu território, seguindo a base cartográfica do Incra. Na conversa, registrada em vídeo pela produtora Pindorama e em áudio pelos apoiadores, em que havia um clima de tensão explícito, os “Baianos” afirmam não aceitarem os limites do assentamento e desconfiaram que a base cartográfica usada na demarcação está errada. Alguns dias após o episódio, os ribeirinhos sofreram novas ameaças, relatadas acima, dessa vez partindo de garimpeiros que tentam avançar com a exploração ilegal de ouro em áreas ocupadas pela comunidade.

    Lideranças de Montanha e Mangabal procuraram Mário Costa, superintendente do Incra em Santarém, para falar das crescentes ameaças e entregar documentos relativos ao trabalho de autodemarcação. Apesar dos apelos sobre a gravidade da situação, Costa mostrou-se pouco preocupado, sem oferecer qualquer solução aos ribeirinhos. O superintendente chamou recentemente a atenção da imprensa por ter sido colocado no cargo por seu irmão, o deputado Wladimir Costa (SD-PA), famoso por seu apoio a Temer e recentemente acusado pelo Ministério Público do Estado do Pará de desviar R$ 230 mil dos cofres públicos.

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  • 28/09/2017

    CNDH divulga nota em repúdio ao parecer anti-indígena da AGU sobre o marco temporal



    O Conselho Nacional dos Direitos Humanos (CNDH) aprovou, nesta quarta-feira (27), uma nota pública de repúdio ao Parecer 01 da Advocacia-Geral da União (AGU), que obriga a administração pública federal a aplicar, a todas as #TerrasIndígenas do país, condicionantes que o Supremo Tribunal Federal estabeleceu, em 2009, para a Terra Indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima.

     

    O posicionamento, aprovado na 30ª Reunião Ordinária do colegiado, realizada nestes 27 e 28 de setembro, foi entregue  em mãos à procuradora-geral da República, Raquel Dodge, que participou da sessão nesta quinta (28) na parte da manhã.

     

    “A manifestação deste Conselho se dá por solicitação reiterada dos povos indígenas do Brasil que vivem sob permanente ameaça e violência, ainda mais agravada com a insegurança causada pela ação do agronegócio e sua bancada ruralista, pela paralisação e retrocessos nos processos de demarcações das terras indígenas pelo Governo Federal que descumpre e ignora direitos garantidos na Constituição Federal”, diz a nota.

     

    Para o #CNDH, todas essas violações encontram respaldo no Parecer da AGU, que inclusive foi utilizado para anular, por meio da Portaria MJ 683/17, a Portaria MJ 581/15, que reconhece a posse permanente do povo Guarani na Terra Indígena Jaraguá.

     

    Leia a nota na íntegra:

     

    NOTA PÚBLICA DE REPÚDIO AO PARECER 01/2017 DA AGU QUE VIOLA O DIREITO DOS POVOS INDÍGENAS AOS SEUS TERRITÓRIOS

     

    O Conselho Nacional dos Direitos Humanos – CNDH, órgão autônomo criado pela Lei nº 12.986/2014, vem a público repudiar o Parecer 01 da Advocacia Geral da União (AGU) que obriga a administração pública federal a aplicar, a todas as terras indígenas do país, condicionantes que o Supremo Tribunal Federal (STF) estabeleceu, em 2009, especificamente para a Terra Indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima.

     

    A manifestação deste Conselho se dá por solicitação reiterada dos povos indígenas do Brasil que vivem sob permanente ameaça e violência, ainda mais agravada com a insegurança causada pela ação do agronegócio e sua bancada ruralista, pela paralisação e retrocessos nos processos de demarcações das terras indígenas pelo Governo Federal que descumpre e ignora direitos garantidos na Constituição Federal. Todas essas violações encontram respaldo no parecer da AGU, que inclusive foi utilizado para anular, por meio da Portaria MJ 683/17, a Portaria MJ 581/15, que reconhece a posse permanente do povo Guarani na Terra Indígena Jaraguá.

     

    A Advocacia Geral da União emitiu Parecer, o qual foi aprovado pelo Presidente da República, tendo como finalidade a regulamentação de procedimento de demarcação de terras indígenas. A fundamentação contida no estudo é essencialmente retirada da Pet. 3388/RR e de dois julgados da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal.

     

    Ocorre que, as decisões da Segunda Turma do STF se dobraram diante da posição do Pleno da Corte no julgado das ACOs 366 e 362, de origem do Mato Grosso, onde parte da discussão se deu em torno da tradicionalidade da ocupação indígena.

     

    Na contramão da vontade do constituinte originário e do que está previsto na Carta de 1988, o Parecer retira pequenos trechos do caso Raposa Serra do Sol (Pet. 388/RR), mas que são excertos nocivos e selecionados minuciosamente com o intuito de impedir a continuidade dos processos de demarcação das terras indígenas. O direito constitucional indígena, contudo, é muito mais que apenas duas teses mal interpretadas e inconstitucionais.

     

    As teses do marco temporal e de impedimento de revisão de limites de terras indígenas, contidas no Parecer, são passagem isoladas do julgado na Pet. 3388/RR e destoam do Art. 231 da CF/88 e da vontade do constituinte originário.

     

    O impacto do parecer da AGU é a retirada da tradicionalidade da posse indígena, diminuindo o alcance do direito constitucional indígena para apenas posse física. Acima de tudo, posse física datada da promulgação da Constituição de 1988, o que é um escárnio com o texto constitucional, com o processo de violência e expulsões de seus territórios sofridos pelos povos indígenas, e com os recentes julgados da Suprema Corte, especificamente aquele relativo aos Embargos de Declaração na Pet. 3388, onde se afirmou que as condicionantes estabelecidas eram pertinentes exclusivamente à Terra Indígena Raposa Serra do Sol. Viola ainda os tratados internacionais ratificados pelo Brasil, em especial a Convenção 169 da OIT, o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, e o Pacto de San José, bem como a jurisprudência internacional.

     

    Portanto, o Parecer nº 01 da AGU afronta a Constituição Federal 1988, viola o princípio do não retrocesso e os direitos dos povos indígenas do Brasil, o que não se pode admitir. Por tais motivos, o CNDH se manifesta pela revogação do Parecer 01/17 da AGU e da Portaria nº 683/17 e pela retomada imediata da demarcação das terras indígenas.

     

    Brasília, 27 de setembro de 2017.

     

    CONSELHO NACIONAL DOS DIREITOS HUMANOS – CNDH


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  • 28/09/2017

    Presidente da Funai dá poucas explicações sobre as investigações do massacre de isolados no Javari


    Maloca de povo indígena em situação de isolamento no Vale do Javari (AM). Crédito: Funai/CGIRC


    Por Francisco Loebens, Equipe de apoio do Cimi aos Povos Indígenas Isolados

     

    O presidente da Funai, Franklimberg Ribeiro de Freitas, passou nesta quarta-feira, 27, por Manaus e em reunião com parlamentares na Assembleia Legislativa do Amazonas foi inquirido sobre o andamento das investigações sobre o possível massacre, com características de genocídio, de indígenas isolados ocorrido no mês de agosto, no rio Jandiatuba, no interior da terra indígena do Vale do Javari. Suas explicações, sobre um sobrevoo realizado pela Funai com apoio da Polícia Federal de do Exército, onde os indígenas isolados teriam sido avistadas numa aldeia em clima de normalidade, sem dar outros detalhes da investigação, trazem enormes preocupações e interrogações sobre o futuro dos povos indígenas isolados no vale do Javari.

     

    Tudo indica que o presidente da Funai estava se referindo ao sobrevoo realizado no alto rio Jutai, onde existem informações sobre um massacre que teria ocorrido em 2014. Transcorridos três anos, não é de estranhar que num sobrevoo se constatasse aparente normalidade na aldeia dos indígenas isolados dessa região.

     

    É impensável que as investigações no rio Jandiatuba sobre o massacre de agosto/2017 se limitem a sobrevoos e que até esse momento nenhuma investigação tenha sido feita pelo rio e por terra, sobretudo quando se sabe que a operação de combate ao garimpo ilegal, no final do mês agosto, só se deu no baixo curso deste rio, distante da área habitada pelos indígenas isolados da terra indígena do Vale do Javari.

     

    “A gente conseguiu chegar em cinco dragas, saindo do Solimões. Fechamos a foz do Jandiatuba com embarcação do Exército, ninguém entrava e ninguém saia. E fomos subindo. Andamos dois dias de viagens. O rio Jandiatuba tem muita curva, não conseguimos chegar nas outras dragas, que estavam muito para dentro do rio”, disse Loss, que também é chefe da Divisão Técnica da Superintendência do Ibama no Amazonas em entrevista ao portal Amazônia Real.

     

    A operação identificou 16 dragas de extração de ouro no rio Jandiatuba. Significa que nove não foram alcançadas, justamente aquelas que se localizam no alto Jandiatuba, nas proximidades da ocorrência de povos indígenas isolados. Por isso permanecem todas as condições para que novos massacres possam ocorrer.

     

    Já passou da hora das autoridades virem a público explicar o que efetivamente está sendo feito para apurar a denúncia sobre o massacre do mês de agosto e que medidas de proteção aos povos indígenas isolados do Vale do Javari estão sendo tomadas, particularmente no rio Jandiatuba e no rio Jutaí, que são as vias de acesso para a região onde existe o maior número destes povos.


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  • 28/09/2017

    Apib repudia o novo golpe da bancada ruralista: encontro sobre produção agrícola indígena

    A perseguição protagonizada pela bancada ruralista contra os povos indígenas chega ao ponto do poderoso grupo de parlamentares organizar na Câmara Federal uma audiência pública para tratar da produção agrícola indígena. Em nota, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) desmascara a iniciativa e repudia a citação da entidade, além de outras, no requerimento sem consulta anterior.

     

    "A Frente Parlamentar Agropecuária jamais irá desistir de seus propósitos de tomar conta das terras e territórios indígenas, seja para a expansão do agronegócio, da pecuária e exploração dos bens naturais, ou para a implantação de grandes empreendimentos, incluindo o extrativismo mineral industrial", diz trecho da nota.

     

    Leia a nota na íntegra:

     

     

    NOTA DE REPÚDIO CONTRA OS GOLPES DA BANCADA RURALISTA Não ao suposto “Encontro nacional da agricultura indígena”

     

    A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) repudia veementemente a truculenta decisão da Frente Parlamentar Agropecuária – bancada ruralista – de realizar, no dia 10 de outubro próximo, no âmbito da Comissão de Agricultura, Abastecimento e Pecuária da Câmara dos Deputados, uma audiência pública para supostamente “debater a produção agrícola indígena”. Mesmo sem ter sido citada no requerimento e sem ter respondido ao convite, nem mesmo para confirmar participação, os ruralistas incluíram de forma desrespeitosa a Apib e outras organizações sociais na lista de expositores da programação.

     

    A má fé não para por aí. O requerimento, de número 478/2017, assinado por parlamentares declaradamente inimigos dos povos indígenas (Nilson Leitão, Valdir Colatto, Alceu Moreira e Tereza Cristina) contém uma justificativa recheada de informações pirateadas na internet relacionadas com experiências de produção e manejo territorial e ambiental de povos indígenas dos Estados do Acre e Amapá, com o apoio de organizações governamentais e não governamentais.

     

    Só no final o requerente afirma: “Para buscar vencer os desafios enfrentados, e proporcionar uma maior qualidade de vida alimentar e financeira dos indígenas, rogo aos ilustres pares o apoio para aprovação do presente requerimento”. É Importante ressaltar, no entanto, que em momento nenhum ele fala dos reais objetivos da audiência. Mas Nilson Leitão em depoimento revela: “Nós aprovamos na Comissão de Agricultura um requerimento de Audiência Pública, foi por unanimidade, para fazermos o 1º. Encontro nacional da agricultura indígena. Nós vamos debater, vamos trazer as lideranças indígenas a Brasília, para debater a produção nas áreas indígenas pelos índios, o direito deles de explorarem as suas terras, mas também muitas aldeias indígenas estão em cima de jazidas de minério, da esmeralda, do ouro e da prata. Muita gente enriquecendo com isso, menos o índio. Então, esse encontro nacional da agricultura indígena que ocorrerá no mês de outubro, pela Comissão de Agricultura desta Casa, pela Frente Parlamentar Agropecuária, debatendo com todas as lideranças indígenas do Brasil, com as Universidades, com a Embrapa, com as organizações sociais e com os deputados de todos os partidos…”. As artimanhas dos ruralistas visam assim enganar e confundir a opinião pública e aos povos indígenas.

     

    A Apib, porém, sabe bem que uma “Audiência Pública para debater a produção agrícola indígena” não é o mesmo que um “Encontro nacional da agricultura indígena”, nem muito menos uma “ Conferência Nacional de Agricultura Indígena”, como alguns indígenas vinculados aos ruralistas acreditam. Sabe também que a Frente Parlamentar Agropecuária jamais irá desistir de seus propósitos de tomar conta das terras e territórios indígenas, seja para a expansão do agronegócio, da pecuária e exploração dos bens naturais, ou para a implantação de grandes empreendimentos, incluindo o extrativismo mineral industrial. Tais propósitos já foram

    exaustivamente explicitados na Portaria 303 da AGU, na PEC 215, nas tentativas de alterar os procedimentos de demarcação das terras indígenas, na CPI da Funai/Incra, na tese do marco temporal e no Parecer 01/17 da AGU.

     

    Por tudo isso, a APIB alerta e chama as suas bases: povos, organizações e lideranças indígenas a não comparecerem a iniciativas como esta, a fim de não legitimar mais um golpe que a bancada ruralista, suporte do governo ilegítimo de Michel Temer, tenta acertar contra os direitos indígenas.

    Brasília – DF, 28 de setembro de 2017.

    Articulação dos Povos Indígenas do Brasil – APIB


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  • 28/09/2017

    XVII Caminhada dos Mártires: o povo Tupinambá por “Nenhum Direito a Menos!”


    Crédito da foto: Haroldo Heleno/Cimi Regional Leste


    Manhã de domingo, 24 de setembro de 2017. Debaixo de muita chuva mesclada com um sol ardente, a rodovia entre Ilhéus e Una, no sul da Bahia, é tomada por uma multidão: o povo Tupinambá de Olivença realiza a XVII Caminhada dos Mártires. Em caminhada de aproximadamente sete quilômetros, da Vila de Olivença até a Praia do Cururupe, em Ilhéus, cerca de 2.200 pessoas participaram da edição, que faz memória à Batalha dos Nadadores, chacina comandada pelo governador-geral Mem de Sá, em 1559, contra os Tupinambá.

     

    Segundo relato de Sá, quando dispostos ao longo da praia, “tomavam os corpos [dos indígenas assassinados] perto de uma légua” (apud João da Silva Campos. 2006 [1947]. Crônica da capitania de São Jorge dos Ilhéus. 3 ed. Ilhéus, Editus, p. 186). A caminhada também faz memória da saga do caboclo Marcellino José Alves e de seus companheiros, que, nas décadas de 1920 e 1930, lutaram contra a penetração dos não-índios no território Tupinambá; em especial resistindo contra a construção da ponte do Cururupe, que possibilitaria o livre trânsito dos indígenas no local.

     

    Este ano a caminhada foi precedida por dois eventos importantes para os povos indígenas do sul da Bahia: o 1º Acampamento Terra Livre (ATL) Sul da Bahia, nos dias 21 e 22, realizado ao lado da Catedral São Sebastião, no Centro de Ilhéus, e a Assembleia dos Povos, no dia 23, na Aldeia Acuípe de Baixo, divisa dos municípios de Una e Ilhéus.

     

    Somaram-se ao povo Tupinambá lideranças de outros povos presentes nas atividades e uma grande diversidade de representantes de movimentos sociais, estudantes, pastorais e organismos da Igreja Católica, sindicatos, estudantes, entidades da sociedade civil, representantes governamentais e não governamentais. Não só da região, mas de todo o Brasil e até do exterior.

     

    A caminhada dos Mártires Tupinambá é realizada desde o ano de 2000, quando a Diocese de Ilhéus propôs um gesto concreto da Campanha da Fraternidade daquele ano, que tinha como tema: “Dignidade Humana e Paz, Novo Milênio sem exclusão!” e tinha entre seus objetivos gerar uma proposta de um modelo de vida em que valores morais e éticos exaltasse a dignidade da pessoa humana, evitassem as exclusões que marginalizavam, criar condições de paz, promover a solidariedade e a partilha.

     

    Também tinha como objetivo a promoção do diálogo, o respeito à liberdade de consciência e de religião, a defesa do meio ambiente, a busca da verdade que liberta e de soluções não violentas para os conflitos sociais, a fim de que se criem condições de sobrevivência, inclusive para as futuras gerações.

     

    Passados 17 anos, percebemos que a Caminhada mantém os mesmos propósitos e desafios daquela Campanha da Fraternidade. Na fala e manifestações de todas as lideranças e dos aliados e parceiros presentes, os objetivos estabelecidos na CF 2000 ainda se fazem necessários e urgentes.

     

    Já caminhamos há 17 anos neste novo Milênio, mas as perseguições, o preconceito, a exclusão, a violência, as agressões ambientais, continuam atingindo as comunidades indígenas no sul da Bahia. Ainda continuamos buscando a Dignidade e a Paz e luta pela não exclusão dos Tupinambá.

     

    Ao final do percurso, na praia do Cururupe, após intenso ritual, houve a fala dos anciãos, caciques e aliados. Em todas elas, se abordou a necessidade da urgência na demarcação do território Tupinambá. A morosidade do procedimento, por parte do governo federal e suas instituições, tem acarretado um intenso e orquestrado processo de criminalização das lideranças e uma série de violência e violações de direitos contra este povo. Por isso foi muito forte as palavras de ordem ao final do Porancim: DEMARCAÇÃO JÁ! DEMRACAÇÃO JÁ! E FORA TEMER!

     

    Contra a tese do Marco Temporal, e rebatendo todos os argumentos fajutos dos inimigos dos povos indígenas, a faixa de abertura da Caminhada, que também foi elemento de reflexão do ATL e da Assembleia, resumia o pensamento e a determinação dos povos ali presentes: “A Nossa História não começa em 1988 – Não ao Marco Temporal”.  E o tema da Caminhada: “Nenhum Direitos a menos!”.

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  • 27/09/2017

    Povo Karipuna vive iminência de genocídio em Rondônia



    Por Ana Aranda, Especial para o Cimi Regional Rondônia  

    A Terra Indígena (TI) Karipuna, localizada nos municípios de Porto Velho e Nova Mamoré, com 153 mil hectares, homologada em 1998, fica no centro de uma região onde é grande e crescente a pressão sobre a floresta. Mal comparando, poderia se dizer que a TI estaria no olho de um furacão, devido à pressão de madeireiros, pescadores e grileiros que estão adentrando na mesma em  todos os seus quadrantes. Ultimamente, a ocorrência de loteamentos aumentou a preocupação dos indígenas.


    O procurador do Ministério Público Daniel Azevedo Lobo, que desde o início deste ano passou a acompanhar a difícil situação da etnia, considera a situação dos karipuna como de extrema vulnerabilidade. “Eu acho que se pode falar em uma pretensão de genocídio do povo karipuna, com o objetivo de invadir a TI, tirar os índios e ocupar a área. Para mim pode não ser um genocídio propriamente pela Lei Penal, mas é uma forma de genocídio do ponto de vista de direitos humanos. E também não afastamos a possibilidade de um genocídio do ponto de vista da lei penal, porque estas pessoas madeireiros e grileiros têm armas e muitas vezes são violentas. Então, pode haver genocídio, morte, violência”.

    Além do medo de serem atacados e mortos dentro da TI pelos invasores, os indígenas também enfrentam grandes dificuldades para a sua subsistência. A coleta da castanha, importante fonte de renda para os Karipuna, foi interrompida pelo temor de ameaças feitas pelos invasores. O medo impede que eles transitem livremente pelas suas terras.  Eles também encontram dificuldades para escoar a produção agrícola, porque a estrada de acesso está em precárias condições e fica intransitável durante o período das chuvas, situação que se agrava com o trânsito das dezenas dos pesados caminhões carregados de toras de madeiras nobres que deixam sulcos profundos no frágil leito de terra da via.


     


    Área derrubada no interior da TI Karipuna para loteamento com acesso pela Linha 15 de Novembro. Foto: Cimi Regional Rondônia

    Em maio deste ano, a Fundação Nacional do Índio (Funai) desocupou um posto de fiscalização localizado na entrada da TI. A estrutura financiada com recursos de compensação ambiental da obra da Usina Hidrelétrica de Santo Antônio virou um elefante branco no meio da floresta. O gerador de energia elétrica do posto de fiscalização foi roubado e até mesmo os marcos da TI foram arrancados.

    O procurador Daniel Azevedo Lôbo  estranha “a coincidência” da desativação do posto da Funai com o início do chamado verão amazônico, caracterizado pela estiagem, que facilita as ações de retirada de madeira e desmatamentos.

    Fotos de satélite enviadas à Funai comprovam invasões

    Segundo dados do Projeto de Monitoramento do Desflorestamento na Amazônia Legal (Prodes), até o ano 2000, a área de desmatamento da TI era de 342 hectares. Até 2014, somava um acumulado de 1.279 hectares. Neste ano, a grande cheia do rio Madeira, cuja bacia inclui o Jaci-Paraná, na divisa da TI Karipuna, cessou a extração de madeira na região, mas em 2015 foram desmatados 123 hectares, de acordo com dados coletados a partir de fotografias de satélites pelo Serviço de proteção da Amazônia (Sipam). Boletins com estes dados são enviados sistematicamente para a Funai e outros órgãos de fiscalização. Em 2016, o desmatamento disparou, com um acumulado de 586,26 hectares, e  1.045,76  hectares de floresta foram derrubadas  no período de 1º de janeiro a 13 de agosto de 2017.



                     Parte da floresta completamente destruída a apenas uma hora da aldeia. Foto: Cimi Regional Rondônia


    As imagens também mostram uma linha bem definida que caracteriza uma estrada, crescendo da divisa para o interior da TI, nas linhas 15 de Novembro e 1º de Maio, na região de União Bandeirante. Em uma investigação feita juntamente com lideranças Karipuna, o Conselho Indigenista Missionário (CIMI) percorreu uma trilha feita na floresta a cerca de 7 horas de caminhada da aldeia Panorama. A entidade também localizou e fotografou “uma imensa clareira/derrubada em uma área de barreiro, importante ponto de caça dos indígenas, localizado à uma hora de caminhada da aldeia”.

    Moradores da Reserva Extrativista (Resex) Jaci-Paraná – localizada na margem oposta à TI Karipuna,  alertam que está aumentando a retirada de madeira na terra dos karipuna. “De madrugada a gente ouve a zoada dos caminhões saindo, carregados de madeira”, diz um morador. Ele fala de forma anônima, com medo de represálias, obedecendo a ordem de silêncio imposta na região.

    Equipe do Regional Rondônia do CIMI também identificou loteamentos na região do rio Formoso e rio Jaci-Paraná e nas Linhas 1º de Maio e  15 de Novembro. Fundos de fazendas localizadas na divisa da TI estariam sendo usadas para acesso a mesma.  Moradores denunciam que uma serraria clandestina estaria trabalhando na região.

    Recomendação do MPF exige ação da FUNAI

    Uma Recomendação do Ministério Público Federal assinada no dia 4 de setembro determina que a FUNAI elabore um plano emergencial de ação e autorize a liberação de recursos “para assegurar a proteção do povo Karipuna e a integridade de sua área demarcada” em um prazo de 10 dias úteis a partir da emissão do documento. O MPF também requer a elaboração e execução de um plano continuado de proteção à TI e seu povo. Os planos devem integrar as equipes da FUNAI com agentes do Batalhão da Polícia Ambiental do Estado de Rondônia e, como se trata de uma área federal, com reforço da Força Nacional de Segurança, do Exército Brasileiro e do IBAMA.



        Estrada aberta por madeireiros no interior da TI Karipuna com acesso pela Linha 1 de Maio. Foto: Cimi Regional Rondônia

    A Recomendação cita a ocorrência de oitenta e oito áreas da TI com retirada da cobertura vegetal (corte raso) captadas com imagens de satélite LANDSAT-8, de acordo com informações do SIPAM no âmbito do Programa de Monitoramento de Áreas Especiais (ProAE).  

    Segundo a Recomendação, “o processo de ocupação da TI Karipuna tem ocorrido por meio de loteamento, por não índios, principalmente em sua porção ocidental, inclusive com desmate e corte raso, abertura de linha e carreadores, fixação de marcos e plantio inicial de pasto e outras culturas, objetivando a ocupação paulatina da terra pública, processo que vem se aprofundando, desde 2016, conforme demonstram dados obtidos a partir de imagens de satélite e relatos de servidores da FUNAI e do Batalhão de Polícia Ambiental – BPA”.

    A TI Karipuna é citada no Boletim de Desmatamento da Amazônia Legal produzido pelo IMAZON em julho de 2017, a partir de imagens de satélite do sistema MODIS, como a segunda terra indígena mais desmatada na Amazônia Legal.

    O acesso à Terra Indígena Karipuna a partir da BR-364, no trecho da estrada que liga  Rondônia ao Acre é feito pela RO-101, no distrito de Jaci-Paraná. Esta estrada dá acesso ao distrito de União Bandeirantes, na Capital, e segue até a RO-421, onde está localizado o município de Buritis e o distrito de Jacinópolis de Nova Mamoré, que estão localizados no entorno da TI Karipuna e desenvolvem uma intensa atividade madeireira.



                                    Picada aberta por madeireiros no interior da TI Karipuna. Foto: Cimi Regional Rondônia

    Neste mês de setembro, grandes nuvens de fumaça encobrem a região e comprovam o uso intensivo do fogo para abertura de novas áreas e a preparação da terra para a lavoura e a pecuária. A maior parte das propriedades é coberta de pasto. Pequenas propriedades cultivam café, mandioca, cacau, cupuaçu, abacaxi e banana, entre outros produtos. Caracterizadas pelo uso de maquinário pesado, áreas preparadas para a produção de soja e milho são cada vez mais freqüentes e já começam a substituir a criação de gado.

    Madeira é retirada de Terras Indígenas e outras áreas protegidas  

    A madeira que transita livremente pelas estradas, localidades e cidades estaria sendo “esquentada” por concessões de planos de manejo emitidos pela Secretaria Estadual de Desenvolvimento Ambiental (Sedam). Moradores da região denunciam que a madeira vem sendo retirada das TIs e áreas de preservação ambiental da região (TIs Karipuna e Karitiana, Floresta Nacional do Bom Futuro, Resex Jaci-Paraná e Parque Estadual de Guajará-Mirim).

    O procurador Daniel Azevedo Lôbo ratifica esta informação “União Bandeirantes é uma área federal, da União e pela Lei Complementar 140 qualquer retirada de madeira em área federal é de atribuição do Ibama e não da Sedam. Muitas vezes, o pessoal apresenta um contrato de posse, de compra e venda entre particulares, não apresenta o domínio da terra e simplesmente a Sedam vem autorizando estes planos de manejo. Então é uma vertente que a gente pretende trabalhar, juntamente com o colega de Guajará-Mirim. Isto acontece no Estado todo e até em outros Estados do Brasil, esta criação de  Planos de Manejo nas proximidades de Terras Indígenas”.



         Placa indica a operação de um Plano de Manejo não-indígena no interior da TI Karipuna. Foto: Cimi Regional Rondônia

    O coordenador do Departamento de Desenvolvimento Florestal da Secretaria Estadual de Desenvolvimento Ambiental (Sedam), Huérique Charles Lopes Pereira, informa que a Sedam aprovou três Planos de Manejo no entorno da TI Karipuna, localizados a 20,6430, 21.0100 e 13,4170 quilômetros da divisa da mesma.

    O coordenador se comprometeu em tomar providências com relação à denúncia do povo Karipuna e do CIMI.  “Em todos os projetos aprovados no entorno (da TI Karipuna)  será feito um monitoramento via imagem de satélite e o acompanhamento da movimentação de saldo.  Constatado  a incongruência ou divergência no movimento, ou indício ou não indício de exploração, já é designada  uma equipe  para ir In loco, é feito um bloqueio do projeto  e o sistema DOC e é feita vistoria in loco. Constatado [o ilícito] são tomadas todas as medidas, auto de infração, embargo, incremento para os órgãos de controle. E também pode ser  feita através de denúncia. Feita uma denúncia de um objeto específico em um local específico também é mandada diligência [ao local]”.

    Daniel Lobo alerta que “o estado de Rondônia passou e continua passando por um processo de avanço muito agressivo da exploração madeireira, acompanhada pela grilagem de terras públicas. Ocupar a terra pública em si é uma atividade ilegal, mas como isso tem sido feito com tanta freqüência  no Estado de Rondônia é aceito como se fosse normal, as pessoas não olham como se fosse uma situação ilícita”, considera ele.

    No caso das Terras Indígenas, ele diz que existem dois tipos de processos, aquele em que o objetivo é de exploração da madeira, minérios e outros produtos da floresta, com [a participação de] pessoas que têm interesse no valor comercial da madeira. E outro processo com interesse de ocupar terras públicas a fim de pleitear a regularização, posteriormente. Para o procurador, este último caso, que caracteriza a invasão (esbulho possessório) propriamente, ocorre atualmente nas Terras indígenas Uru-Eu-Wau-Wau e Karipuna.


     

                                Posto de fiscalização da Funai na TI Karipuna: desativado. Foto: Cimi Regional Rondônia


    O procurador participou da Operação Jurerei, desencadeada pela Polícia Federal em 2 de agosto deste ano, quando foi desarticulada uma organização criminosa que loteava terras dentro da TI Uru-Eu-Wau-Wau e afirma que organizações criminosas agem de forma análoga para a invasão das duas TIs. Para ele, fazendeiros com propriedades lindeiras de áreas protegidas que querem expandir suas terras juntamente com madeireiros agem em conjunto com “aventureiros” que pleiteiam a posse e posterior legalização de terras públicas.

    “Os processos dialogam, muitas vezes estas associações que reivindicam terras  já trabalham junto com os fazendeiros. Alguns ficam na área e isto ficou bem caracterizado na Operação Jurerei, feita recentemente na TI Uru-Eu-Wau”, afirma Daniel Lobo.

    A coordenadora do Cimi Regional Rondônia, Laura Vicuña, avalia que “a invasão, o desmatamento e o esbulho possessório verificado contra os Karipuna têm uma relação estreita com a política indigenista e ambiental do governo brasileiro e com as diversas iniciativas da bancada ruralista no Congresso Nacional que visam a desconstrução da Constituição Federal.

    A tramitação da PEC 215/00, a tese do Marco Temporal e o Parecer 001/2017 da AGU aprovado pelo presidente Temer em julho são exemplos de iniciativas que tem sido usadas como instrumentos para ‘justificar’ as ações ilegais em questão e, por isso, servem como estímulo às mesmas”.

    Organização criminosa comanda invasões

    A liberdade com que os madeireiros e grileiros agem no local está baseada em uma logística montada pelo que o procurador Daniel Lôbo define como “uma perigosa organização criminosa”.  

    Olheiros permanecem em locais estratégicos e avisam sobre qualquer movimento estranho à rotina do lugar e principalmente sobre a presença de representantes de órgãos de fiscalização. Eles usam uma eficiente rede de comunicação com  aparelhos de rádio-amador, que  cobrem toda a região.



    Cena é comum por toda a TI Karipuna: árvores marcadas, estacas para definir lotes e toras, muitas toras. Foto: Cimi Regional Rondônia

    Um levantamento feito pelo CIMI baseado em depoimentos de moradores, que só falam de forma anônima, listou pontos de observação dos olheiros em restaurantes, bares, casas particulares e até mesmo em igrejas.

    Ameaças impedem trânsito dos indígenas dentro do território

    O medo de um ataque tem impedido a extração de castanha e as dificuldades de escoamento da produção desestimulam a agricultura na TI Karipuna. Uma das lideranças da etnia, André Karipuna afirma que tem medo de um ataque para o extermínio do seu povo,  “que vive uma situação extrema de risco de vida”, segundo o MPF. A presença de estranhos dentro da TI intimida os indígenas e impede que eles transitem livremente no local. O acesso à aldeia pelo rio Jaci-Paraná até o distrito homônimo requer de quatro a seis horas de barco, dependendo do tipo de embarcação e das condições do rio. Já a estrada é precária e fica intransitável durante o período das chuvas.

    Adriano Karipuna, outra liderança da etnia, diz que a principal reivindicação do seu povo é a fiscalização e retirada dos invasores. “Já fizemos muitas denúncias, mas até agora não foi tomada nenhuma medida”, lamenta. Ele também cita a necessidade de um projeto agrícola para melhorar a renda e a segurança alimentar. Outra necessidade é o fornecimento de energia elétrica. Os indígenas utilizam um motor para o fornecimento de energia durante poucas horas da noite. Em setembro, o motor utilizado no poço artesiano queimou e o abastecimento passou a ser feito com a água bruta do rio. A aldeia Panorama tem uma escola com as quatro primeiras séries. A ampliação do ensino na aldeia impediria que crianças e adolescentes tivessem que ir para a cidade, onde vivem em situação de vulnerabilidade, afirma Adriano.


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  • 27/09/2017

    Sesai demitirá 10 mil servidores não concursados até dezembro; Lei da Terceirização força mudança, diz secretaria

    Por Renato Santana, da Assessoria de Comunicação – Cimi

    A saúde indígena está em vias de sofrer transformações como consequência da Lei da Terceirização, sancionada pelo Palácio do Planalto em março deste ano. Para se adaptar à nova legislação, a Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) cancelará até o dia 31 de dezembro os contratos vigentes com as três entidades que prestam o serviço nas aldeias dos 34 Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEI’s) do país. Cerca de 10 mil servidores não concursados, entre indígenas e não-indígenas, serão demitidos até o final do ano.


    Durante o encontro da Comissão Intersetorial de Saúde Indígena (Cisi), ocorrida em Brasília entre 30 de agosto e 1 de setembro, ocasião em que a agenda de mudanças foi apresentada, o governo prometeu que os 10 mil demitidos devem ser re-contratados pelas novas entidades terceirizadas celebradas pelos chamamentos públicos – estimados para a partir de outubro. O movimento indígena, ao contrário, reivindica a "constituição de grupo de trabalho, com a nossa participação, para traçar uma proposta de um modelo de atenção à saúde indígena" (Apib, 2016).   

    Na prática, a execução da política pública já é terceirizada para os indígenas, e continuará da mesma forma. No entanto, hoje o monopólio está com a Missão Caiuá, administradora de 19 DSEI’s, e com o Instituto Materno Infantil de Pernambuco (IMIP) e a Sociedade Paulista para o Desenvolvimento da Medicina (SPDM), que cuidam dos demais distritos. O desejo da Sesai, organismo vinculado ao Ministério da Saúde, é que mais entidades façam parte do quadro de terceirizadas ampliando também o espectro da iniciativa de terceirização nos novos contratos. Pelos corredores do Ministério da Saúde, porém, há quem acredite que nada desta agenda ocorrerá terminando com a prorrogação dos atuais contratos para o fim de 2018. Em face da conjuntura desfavorável às populações que mais necessitam das políticas públicas, servidores concursados da Sesai torcem para que mudanças mais profundas sejam tratadas apenas com o próximo governo.

    O fato é que a saúde indígena vem sofrendo sucessivas tentativas de rearranjos, desde a transição da Funasa e passando pelo governo Dilma Rousseff, para não enfrentar uma alternativa rechaçada pelo Executivo. "Na verdade estão fazendo uma engenharia para burlar aquela recomendação do MPF (Ministério Público Federal) sobre a necessidade de concursos públicos para todos os servidores, prestadores de serviços e funcionários. O concurso atenderia especificidades indígenas locais para não gerar desvantagens aos indígenas. Como o governo não vai fazer, a Lei da Terceirização se tornou o caminho mais viável para esta operação", analisa o coordenador do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) Regional Sul e integrante da Cisi, Roberto Liebgott.

    Fontes consultadas pela reportagem entendem ainda a medida como uma estratégia para ampliar o acesso aos recursos do governo para a saúde indígena, atendendo assim interesses políticos limitados pelo atual monopólio – o que o governo de Dilma Rousseff também tentou. Em 2017, o orçamento da Sesai atingiu R$ 1,6 bilhão. A intenção, conforme estas fontes, seria se apoderar da forma mais direta possível do orçamento da saúde indígena. O contexto, de acordo com a análise, é de que o ministro da Saúde, Ricardo Barros, está sem musculatura política, enquanto o governo de Michel Temer não tem limites em adotar medidas que atendam a interesses nada republicanos pela falta de certeza se consegue chegar ao fim; a saída seria aproveitar ao máximo o tempo que lhes resta.  

    Primeira experiência: DSEI Amapá/Norte do Pará

    O primeiro a ter um chamamento público aberto sob os novos moldes foi o DSEI Amapá/Norte do Pará, processo que ainda está em curso. O planejamento da Sesai, exposto na reunião da Comissão, prevê que nesta semana, a última do mês, os outros 33 editais ficarão prontos e abertos com o intuito de atrair, prioritariamente, Organizações da Sociedade Civil com Interesse Público (Oscip) para a saúde indígena. Aprovadas, assumem em 1 de janeiro de 2018. O objetivo é que até o final do ano novos contratos estejam celebrados em consonância à Lei da Terceirização – antes dela havia súmulas da Justiça Federal que, por exemplo, permitiam apenas terceirização para atividades-meio; Michel Temer liberou para qualquer atividade.

    No caso do DSEI Amapá/Norte do Pará, o MPF, em junho do ano passado, cobrou a Sesai sobre a contratação imediata de profissionais para composição de vagas em atendimentos médicos nas aldeias – o déficit, à época, era de 400 profissionais. O fato é que os contratados dos prestadores de serviços se encerrava em dezembro daquele ano e por lei não podiam ser renovados. Em julho deste ano a situação seguia na Justiça Federal com a determinação de prorrogação dos antigos contratos. Nesse meio tempo, Temer sancionou a Lei da Terceirização. Dessa forma, o DSEI se tornou o primeiro a entrar nesta nova modalidade.  

    Apesar do MPF atuar no caso para garantir a efetivação da política pública terceirizada, o DSEI Amapá/Norte do Pará atende mais de 12 mil indígenas que estavam sem o serviço, o entendimento dos procuradores é de que a melhor maneira do governo federal atender a acentuada demanda é pelo concurso público. A terceirização teve início em 12 de agosto de 2011, após terminada a transição que decretou o fim da Funasa, quando foi publicado pela Sesai o edital de chamamento público nº 01/2011 visando a seleção de entidades privadas sem fins lucrativos para execução, por meio de convênios, das ações complementares na atenção à saúde dos povos indígenas.

    Para os procuradores 6ª Câmara do MPF, responsável pela questão indígena, o chamamento regularizou a terceirização. Em 2012 ações foram impetradas pelos procuradores em todo o Brasil. Se questionava que, neste primeiro chamamento, apenas uma entidade foi aprovada para cuidar de todo o país. Aos poucos a Sesai foi se adequando às recomendações, mas sempre convicta no caminho da terceirização e buscando maneiras de fugir do concurso público.

    Em recente tentativa, entre os anos de 2014 e 2015, a Sesai realizou um amplo trabalho de convencimento nas aldeias para a ideia da criação do Instituto Nacional de Saúde Indígena (Insi). A tensão prevaleceu: na compreensão de lideranças indígenas, MPF e organizações indigenistas a proposta ia além da terceirização completa, mas propunha uma espécie de privatização da saúde indígena, pois o Insi passaria a ser contratado pela Sesai para prestar o serviço da política pública; o Instituto, por sua vez, seria gerido por Oscip’s.    

    O Insi não seria obrigado a cumprir as exigências dos processos públicos de licitação, contratação de profissionais via concurso público e não estaria sob a jurisdição da Justiça Federal. A Procuradoria da República apontou à época que era proibido pela Constituição Federal esse tipo de serviço complementar porque ele não poderia ser realizado com recursos públicos. A Advocacia-Geral da União (AGU) pensava diferente. A proposta do Insi acabou enviada ao Congresso no formato de Projeto de Lei, que nunca chegou a ser votado.

    #OcupeSesai

    Em fevereiro deste ano, a Articulação Nacional dos Povos Indígenas (Apib) organizou o movimento #OcupeSesai contra a terceirização da política pública. Numa quarta-feira, dia 22, o prédio do Ministério da Saúde, em Brasília, foi ocupado por quase 500 indígenas. Na ocasião, as lideranças defenderam o Subsistema de Saúde Indígena, criticaram as mudanças propostas ventiladas pelo governo federal e afirmaram que a postura só serviria para alocar nos quadros da Sesai indicações político-partidárias. Os indígenas se opunham à municipalização ou privatização, propondo discutir um sistema nacional para a execução da política pública.

    Os protestos vinham ocorrendo desde o final de 2016. Em novembro, a Apib e o Fórum de Presidentes dos Conselhos Distritais de Saúde Indígena (FCondisi) emitiram nota contra a retirada da autonomia dos DSEI’s. Em determinado momento, as entidades se expressaram: "Está claro é a tentativa desenfreada e desrespeitosa desse governo de impor como novo modelo de gestão da atenção à saúde indígena a celebração de convênios junto a Organizações Sociais – O.S, proposta que rechaçamos de forma veemente". E seguiu pedindo pela "continuidade dos serviços de saúde, por meio da prorrogação dos convênios até dezembro de 2017".     

    Conforme destacou a indígena Sônia Guajajara, durante o #OcupeSesai deste ano, "a criação da SESAI foi o nosso principal instrumento para a gestão da Política de Atenção à Saúde Indígena. É notório que muitos desafios ainda precisam ser superados, dentre estes desafios destacamos a necessidade de estruturação de uma política de valorização e incentivo da mão de obra qualificada na saúde indígena junto às nossas comunidades".

     


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