11/04/2025

Caucus Indígena se dirige ao Fórum Regional da ONU sobre Empresas e Direitos Humanos com preocupações e propostas

Encontro ocorreu na PUC-SP e reuniu lideranças indígenas e organizações indigenistas da América Latina e do Caribe. Leia a carta do Caucus Indígenas para o Fórum Regional

Indígenas da América Latina e do Caribe participam do Fórum Regional com suas vivências e casos concretos de violações de direitos humanos praticadas por empresas. Foto: Maria Rosária Ribeiro/Cimi

Por Assessoria de Comunicação – Cimi

Durante esta semana, na Pontifícia Universidade Católica (PUC) de São Paulo, entre o último dia 9 e esta sexta-feira, 11, aconteceu o IX Fórum Regional das Nações Unidas sobre Empresas e Direitos Humanos. É a primeira intercessão regional do Fórum da ONU que acontece no Brasil, abrangendo a América Latina e o Caribe.

O encontro faz parte do mandato da ONU sobre o tema, e encabeça a discussão sobre a criação de um tratado internacional vinculante para responsabilizar empresas transnacionais por violações de direitos humanos. Em três dias, o Fórum sediou quase 50 sessões, diálogos interativos, eventos paralelos e outros espaços de debate entre múltiplos atores envolvidos na agenda de direitos humanos e empresas.

Após as intercessões regionais, em novembro acontecerá a etapa global do fórum. Na ocasião, o tratado vinculante será definido a partir das discussões regionais. Estados, empresas e a sociedade civil participam do Fórum Regional. O diálogo é aberto. Em encontros multilaterais, os Estados discutem uma proposta de texto para o tratado vinculante.

Povos indígenas e organizações indigenistas da América Latina e do Caribe, caso do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), estiveram em São Paulo para a partir de experiências concretas terem voz e participação na construção do tratado.

Empresas nacionais e transnacionais são constantemente denunciadas como violadoras de direitos humanos dos povos indígenas

Conglomerados dos setores de mineração, agronegócio, exploração de recursos hídricos e energia, entre outros, estão constantemente associados a deslocamentos internos, esbulho possessório, expulsões territoriais, depredação ambiental, contaminação de comunidades por metais pesados e agrotóxicos, o que tem mantido nas terras indígenas um padrão de violações e violências.

Povos indígenas e tradicionais: os mais afetados

Os povos indígenas têm ganhado mais representatividade e espaço de discussão no contexto do reconhecimento internacional de que são, ao lado de outras populações tradicionais, as principais vítimas de empresas violadoras de direitos humanos.

“As empresas, especialmente quando são multinacionais, são difíceis de se colocar em juízo. O Estado é conivente e moroso ao tratar das responsabilidades delas por violações de direitos humanos”, analisa Christian Crevels, assessor internacional do Cimi.

O Cimi pretende influir no texto do tratado vinculante. “Entendemos que o texto precisa ter centralidade nas vítimas. Um texto que seja endereçado diretamente aos povos indígenas e populações tradicionais, seus territórios, em busca do respeito completo aos direitos de autodeterminação, de consulta prévia e consentimento”, explica.

Crevels entende que a discussão precisa ser baseada na realidade dos casos, para além de uma discussão teórica. “Então estamos no Fórum regional com indígenas que materializam esses casos como forma de denúncia, mas também como esclarecimento da realidade desigual entre empresas e povos indígenas”, diz.

A responsabilização legal de empresas e a prevenção às violações de direitos humanos vêm cada vez mais recebendo atenção por parte do movimento indigenista no Brasil

Um dos painéis de abertura do IX Fórum Regional da ONU sobre Empresas e Direitos Humanos, em São Paulo. Foto: Maria Rosária Ribeiro/Cimi

Caucus indígena

Durante o Fórum Regional, acontece o Caucus Indígena. Trata-se de um grupo informal de representantes de povos indígenas que se reúnem em fóruns intergovernamentais. O objetivo é discutir e aproximar posições e conceitos.

O Caucus Indígena é um mecanismo de consulta que consolida o protagonismo indígena nos fóruns internacionais da ONU, além de momentos como a Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, a COP, que terá a 30a edição entre os dias 10 e 21 de novembro em Belém, no Pará.

Do ponto de vista da discussão internacional, a mediação por intermédio de um tratado vinculante da relação entre empresas e povos indígenas é recente. No entanto, é uma relação bastante antiga com uma lista de casos de violação praticados por empresas – seja antes ou depois da Constituição de 1988, no caso do Brasil.

“Conhecemos os predecessores coloniais e capitalistas das atividades econômicas e suas repercussões diretas para os povos indígenas. Mas é uma discussão que vem ganhando repercussão internacional nos últimos anos. A União Europeia adotou uma política de devidas diligências, mas que no último momento foi desmantelada por alguns países”, explica Crevels.

Cimi se preocupa com o risco de que o tratado vinculante deixe de fora das devidas diligências atividades de financiamento às empresas

Um dos objetivos da intervenção dos povos indígenas no Fórum sobre Empresas e Direitos Humanos da ONU, bem como em outras esferas internacionais, é impedir que esse desmantelamento aconteça também no nível do tratado vinculante das Nações Unidas.

“Uma das coisas que aconteceu nesse caso das devidas diligências da União Europeia é que atividades de financiamento que deveriam seguir as devidas diligências foram deixadas de fora. Entendemos que é um total retrocesso. Deixam de fora aqueles que obterão os maiores lucros com a destruição da vida dos povos”, diz Crevels.

Leia abaixo a declaração final do Caucus Indígena em manifestação ao Fórum Regional:

 

Declaración del Caucus de los Pueblos Indígenas ante el IX Foro Regional de la ONU sobre Empresas y Derechos Humanos

Nosotros, los representantes de los pueblos indígenas, organizaciones y comunidades reunidos en São Paulo en el marco del IX Foro Regional sobre Empresas y Derechos Humanos, manifestamos nuestra profunda preocupación por los impactos negativos que las actividades empresariales han generado en nuestros territorios, culturas, formas de vida y derechos fundamentales.

Reconocemos que la protección de nuestros derechos debe ser una prioridad absoluta, tanto para los Estados como para las empresas, en cumplimiento de los estándares internacionales, incluidos los Principios Rectores de las Naciones Unidas sobre Empresas y Derechos Humanos, el Convenio 169 de la OIT y la Declaración de la ONU sobre los Derechos de los Pueblos Indígenas.

En este contexto, hacemos un llamado urgente a los Estados, empresas y organismos internacionales para que asuman sus responsabilidades y garantías en la protección de nuestros derechos colectivos e individuales.

1. Impactos de las Actividades Empresariales en los Pueblos Indígenas

Las actividades empresariales, especialmente en sectores como la minería, el agronegocio, la energía y las infraestructuras, han tenido graves consecuencias para nuestros pueblos, entre ellas:

– Despojo territorial: La falta de reconocimiento legal y demarcación de nuestros territorios ha permitido la invasión y explotación de nuestros recursos naturales sin nuestro consentimiento.

– Violencia y criminalización: Líderes, defensores y defensoras de derechos humanos y territorios han sido objeto de amenazas, persecución, criminalización y asesinato.

– Contaminación ambiental: La degradación de ríos, suelos y ecosistemas ha afectado nuestra seguridad alimentaria, salud integral (física, mental y espiritual) y modos de vida.

– Erosión cultural: El racismo, la desinformación y la imposición de modelos económicos externos han debilitado nuestras identidades y sistemas de gobierno propio.

– División comunitaria: Las estrategias de cooptación de líderes y la promoción de conflictos internos han fragmentado nuestras comunidades. Por ejemplo, el uso indebido de la consulta previa como herramienta de manipulación y cooptación.

Estos impactos no solo violan nuestros derechos, sino que también socavan nuestra capacidad de ejercer nuestra autonomía y autodeterminación.

2. Obligaciones de los Estados

Reiteramos que los Estados tienen la obligación primordial de proteger nuestros derechos frente a las actividades empresariales. En este sentido, exigimos lo siguiente:

Cumplimiento efectivo de la consulta y el consentimiento libre, previo e informado (CLPI):

– Garantizar que la consulta sea un proceso contextualizado, obligatorio y vinculante, respetando nuestros protocolos y formas de organización.

– Establecer mecanismos claros para la implementación y seguimiento de las consultas.

Demarcación y titulación de territorios:

– Acelerar los procesos de demarcación y titulación de nuestros territorios ancestrales, reconociendo su carácter sagrado y vital para nuestra existencia.

Protección de defensores y defensoras indígenas:

– Implementar programas integrales de protección para líderes, lideresas y comunidades que enfrentan amenazas debido a su labor en defensa de los derechos humanos y territorios.

Regulación y sanción a empresas:

– Crear marcos legales que regulen las actividades empresariales y sancionen a aquellas que violen derechos humanos o actúen en complicidad con prácticas corruptas.

Políticas públicas inclusivas:

– Desarrollar políticas públicas que fortalezcan nuestras economías comunitarias, sistemas de salud tradicionales y formas de gobernanza propia.

3. Responsabilidades de las Empresas

Las empresas deben asumir plenamente su responsabilidad de respetar los derechos humanos, particularmente los derechos de los pueblos indígenas. Demandamos:

Respeto a la autodeterminación:

– Reconocer y respetar nuestros sistemas de gobierno propio, formas de vida y cosmovisiones.

– Implementar mecanismos de monitoreo comunitario que permitan la participación activa de nuestras comunidades en todas las etapas de los proyectos.

Reparaciones justas y equitativas:

– Asegurar que las reparaciones por daños causados sean colectivas, contextuales y acordes con nuestros modos de vida.

Debida diligencia:

– Realizar evaluaciones de impacto social, ambiental y cultural con participación activa y consentimiento de las comunidades afectadas antes de iniciar cualquier proyecto, asegurando que se tomen en cuenta nuestras perspectivas y necesidades específicas.

– Evitar prácticas de mitigación que sustituyan la responsabilidad de reparar los daños causados.

4. Mecanismos de Reparación y Acceso a la Justicia

Destacamos la necesidad de establecer mecanismos de reparación y acceso a la justicia que sean culturalmente apropiados y accesibles para nuestros pueblos. Para ello, proponemos:

Respeto a los derechos consuetudinarios:

– Reconocer y aplicar nuestros sistemas jurídicos tradicionales en la resolución de conflictos y la restitución de derechos.

Eliminación de barreras:

– Combatir el racismo, la discriminación y las barreras geográficas, económicas y legales que impiden el acceso a la justicia.

Cumplimiento de fallos judiciales:

– Garantizar que los Estados y las empresas cumplan con las decisiones judiciales incluyendo decisiones de tribunales internacionales y mecanismos regionales como la CIDH que ordenan la restitución de derechos y la reparación de daños.

5. Conclusión

Hacemos un llamado urgente a los Estados, empresas y organismos internacionales para que adopten medidas concretas que garanticen la protección de nuestros derechos colectivos e individuales.

Reiteramos que nuestros territorios no son meros recursos económicos, sino territorios de vida, espiritualidad y cultura.

Reafirmamos nuestro compromiso con la resistencia pacífica y la defensa de nuestros derechos, y exhortamos a todos los actores involucrados a trabajar conjuntamente hacia un modelo de desarrollo que respete la dignidad humana, la diversidad cultural y la armonía con la naturaleza.

¡Por la vida, los territorios y los derechos de los pueblos indígenas!

São Paulo, abril 9 de 2025.

Delegação do Cimi e lideranças indígenas com a relatora Especial da ONU para Mudanças Climáticas, Elisa Morgera (ao centro, de vestido), a assessora em Direitos Humanos do ACNUDH, Angela Pires (a primeira à esquerda), e o assessor do ACNUDH para Povos Indígenas e Quilombolas, Rodrigo Deodato (primeiro à direita, de gravata). Foto: Divulgação/Cimi

Fórum sobre Empresas e Direitos Humanos da ONU

O Fórum sobre Empresas e Direitos Humanos das Nações Unidas é a maior reunião anual sobre negócios e direitos humanos, com mais de 2.000 participantes de governos, empresas, grupos comunitários e sociedade civil, escritórios de advocacia, organizações de investidores, órgãos da ONU, instituições nacionais de direitos humanos, sindicatos, academia e mídia.

Os participantes discutem tópicos relacionados aos Princípios Orientadores sobre Empresas e Direitos Humanos (o Quadro “Proteção, Respeito e Remédio” das Nações Unidas), bem como questões atuais de direitos humanos relacionadas a negócios.

O Conselho de Direitos Humanos da ONU estabeleceu o Fórum em 2011 para servir como uma plataforma global para “discutir tendências e desafios na implementação dos Princípios Orientadores e promover o diálogo e a cooperação em questões ligadas às empresas e aos direitos humanos, incluindo os desafios enfrentados em setores específicos, ambientes operacionais ou em relação a direitos ou grupos específicos, bem como identificar boas práticas”.

É guiado e presidido pelo Grupo de Trabalho sobre Empresas e Direitos Humanos, de acordo com as resoluções 17/4 e 53/3 do Conselho de Direitos Humanos.

 

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