08/11/2024

Grilagem em território Akroá-Gamella do Uruçuí e Guegue de Sangue desafia Justiça e pressiona o Cerrado

Prefeitura busca se distanciar da ação grileira, mas na Justiça age para retirar indígenas do território em processo de identificação

 

Grilagem em território reivindicado pelos Akroá-Gamella de Uruçuí e Guegue de Sangue tem distribuição de placas com nomes e telefones dos beneficiados. Foto: Comunidade Akroá-Gamella

Por Assessoria de Comunicação – Cimi Regional Nordeste

Nas últimas semanas, a grilagem em território reivindicado pelos povos Akroá-Gamella do Uruçuí e Guegue de Sangue, no Piauí, aumentou. A preocupação das autoridades públicas, no entanto, segue controversa. Interessada nos desdobramentos das atividades ilegais contrárias à presença indígena em uma terra cobiçada, a Prefeitura do município se dirigiu à população no último dia 5 para informar que ingressou com uma ação de reintegração de posse contra a retomada Vão Seco, dividida entre os povos Akroá-Gamella e Guegue de Sangue. 

Em tal contexto de expansão imobiliária desordenada, predatória ao meio ambiente e mobilizada por interesses políticos e privados, os indígenas ocupam terras alvo de intermitente ação grileira, com loteamentos negociados via WhatsApp, cuja área de Cerrado, o bioma mais desmatado durante o ano passado, a administração pública pretende urbanizar.

A Prefeitura de Uruçuí, em seu pronunciamento, afirma que o objetivo era iniciar o loteamento em julho deste ano, três meses antes das eleições, mas que foi impedida pela “invasão sobre a área, inicialmente por pessoas que se autodeclaram indígenas, e mais recentemente por pessoas que estão em processo de identificação”.          

Em processo de identificação e delimitação pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) desde 2018, as denúncias de grilagem do território reivindicado pelos Akroá-Gamella e Guegue de Sangue se intensificaram neste ano, sobretudo, não por coincidência, durante o período eleitoral. Fotos e vídeos da grilagem, e até a presença da Polícia Militar, foram registrados.

 

Flagrande de desmatamento do Cerrado e o início da construção de casas em área grilada do território em processo de identificação e delimitação pela Funai desde 2018. Foto: Comunidade Akroá-Gamella do Uruçuí

“Neste último final de semana, aproveitaram que estávamos em reunião e começaram a invadir e dividir os lotes. A Prefeitura diz que não tem nada a ver, mas é mentira. Na área do lixão, foi tudo loteado. Promessa de campanha. Tão prometendo carrada de tijolo para começar a construir entre hoje (dia 8), amanhã (dia 9)”, diz Akroá-Gamella que não identificamos por razões de segurança. 

Associação responde

A Associação do Povo Indígena Akroá-Gamella do Uruçuí, em resposta à Prefeitura, lembra que no âmbito da ação de reintegração de posse, a Justiça determinou que o loteamento da área está proibido, sujeito à multa, em face da própria ação judicial em curso e de haver o procedimento de identificação e delimitação da Funai em curso. 

“(Expressa) repúdio aos ataques discriminatórios que os povos indígenas em processo de retomada estão enfrentando. Não somos invasores tampouco farsantes”, destaca a nota. A Associação entende que qualquer tentativa de deslegitimar a luta dos povos indígenas é uma afronta à Constituição Federal e aos direitos que a Carta confere a estes povos. 

Os indígenas registraram ao menos dez placas com nomes e telefones de pessoas ligadas ao loteamento ilegal do território. Foto: Comunidade Akroá-Gamella do Uruçuí

Os Akroá-Gamella e Guegue de Sangue seguem denunciando as invasões grileiras, ressaltando que a Justiça proibiu quaisquer atividades grileiras ou de loteamento por parte de terceiros ou pela própria Prefeitura

“A luta pela demarcação das terras tradicionalmente ocupadas é um direito legítimo e essencial para a preservação da cultura e modo de vida dos povos indígenas”, diz trecho da nota. A ação judicial a que se refere a Prefeitura de Uruçuí e a Associação Akroá-Gamella é a 0801250-83.2024.8.18.0077. em trânsito desde o final do último mês de outubro. 

“Desmataram cerca de 300 hectares, usam máquinas, promovem fogo. Estão abrindo terreno para construir casas. Agora mesmo a gente sabe que três casas serão erguidas. Precisamos urgentemente da presença dos órgãos estaduais, da Cemar (Secretaria de Meio Ambiente e Recursos Hídricos do Estado do Piauí), aqui”, diz indígena Akroá-Gamella.

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