19/06/2024

Lei do Marco Temporal é tema de discussão em oficina político jurídica para organizações indígenas

A oficina, organizada pelo Cimi Norte I em parceria com a Organização de Lideranças Indígenas do Careiro da Várzea, do povo Mura, busca formar e informar lideranças quanto as leis e direitos indígenas

Lideranças indígenas do povo Mura participam de Oficina Político Jurídica na aldeia Santo Antônio, da Terra Indígena Apipica. Fotos: João Vitor Lisboa/Cimi Ajur Norte I

Ligia Apel, Ascom Cimi Norte I, com colaboração de Hoadson Leonardo Silva, missionário do Cimi Norte I, Equipe Borba

A Lei 14.701, que ficou conhecida como a Lei do Marco Temporal, foi o principal tema de debate da Oficina Político Jurídica que aconteceu na aldeia Santo Antônio, na Terra Indígena Apipica, entre os dias 6 e 8 de junho.

A Oficina faz parte das atividades de apoio jurídico que o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) Norte I oferece às organizações indígenas dos estados do Amazonas e Roraima. O objetivo é informar e formar organizações e lideranças quanto às leis brasileiras e internacionais que asseguram direitos constituídos pelos povos originários.

“A Lei 14.701, que ficou conhecida como a Lei do Marco Temporal, foi o principal tema de debate da Oficina Político Jurídica”

Cerca de 30 lideranças de 15 aldeias do povo Mura, localizadas nos municípios de Careiro da Várzea e Autazes, participaram da Oficina. Dentre elas, as comunidades de Moyray, Murutinga, Lago do Soares, Santo Antônio, Jutaí, Ponciano, Galileia, Gavião, Boa Vista, Pontas das Pedras, Jacaré, Santana, Apipica, Sissoyma e Tucumã. Os participantes estão articulados à Organização de Lideranças Indígenas do Careiro da Várzea (Olimcv).

A oficina, conduzida pela Assessoria Jurídica do Cimi Norte I em parceria com Olimcv, também contou com o apoio do Observatório de Direito Socioambiental e Direitos Humanos na Amazônia, da Universidade Federal do Amazonas (ODSDH/AM-UFAM).

“A Oficina de formação Jurídico-Política, realizada com o Povo Mura, se deu em um momento delicado para a defesa dos direitos dos povos indígenas”

Lideranças indígenas do povo Mura participam de Oficina Político Jurídica na aldeia Santo Antônio, da Terra Indígena Apipica. Fotos: João Vitor Lisboa/Cimi Ajur Norte I

Confira o depoimento de alguns dos participantes:

Felipe Gabriel Mura, tuxaua da aldeia Soares, Terra Indígena Soares, em Autazes (AM)

“Hoje estamos muito mais sabedores não só das leis e da Constituição Federal, mas de todos os direitos que temos. Isso tem feito a gente tomar a iniciativa, contar a nossa própria história. A nossa sobrevivência até hoje foi justamente defendida por aqueles que lutaram sempre. Só que, infelizmente, a história sempre era contada por outros. E hoje não, hoje a gente aprende a lei, discute sobre ela, tem dado nossas opiniões de indígenas. Afinal, só nós sabemos o que realmente é melhor para nós. Agora somos os contadores da nossa própria história”.

“A lei do marco temporal vem justamente para matar, tirar todos os direitos dos povos indígenas. A lei 14.701, pelo que a gente viu estudando um pouco dos artigos [da Constituição], vem para exterminar os povos indígenas que ainda resistem.

“A lei do marco temporal vem justamente para matar, tirar todos os direitos dos povos indígenas”

Lideranças indígenas do povo Mura participam de Oficina Político Jurídica na aldeia Santo Antônio, da Terra Indígena Apipica. Fotos: João Vitor Lisboa/Cimi Ajur Norte I

Lideranças indígenas do povo Mura participam de Oficina Político Jurídica na aldeia Santo Antônio, da Terra Indígena Apipica. Fotos: João Vitor Lisboa/Cimi Ajur Norte I

Ana Mura, vice coordenadora da Olimcv

“Nos artigos 231 e 232, nosso principal direito é o usufruto dos nossos territórios, de plantar, de criar segundo as nossas crenças, a nossa cultura”

Tuniel Mura, aldeia Murutinga Tracajá, da Terra Indígena Murutinga

“Nosso principal direito é o nosso território, nossa identidade, nossa cultura. O mais importante dessa oficina foi o conhecimento que foi passado. Nós tínhamos muitas dúvidas e pudemos perguntar, criar um diálogo firme para a gente aprender. Eu acredito que quando a gente conhece nossos direitos e os reivindicamos, a gente se fortalece dentro do nosso território”.

“Essa lei 14.701, do Marco Temporal, quer realmente exterminar nós como indígenas. Não respeita os nossos direitos, não respeita o nosso território. É uma lei que não precisa nem começar a existir. Porque quem foi que estava aqui desde sempre? Éramos nós indígenas que sempre estivemos aqui. Esse território ainda não é nosso”.

“Nós tínhamos muitas dúvidas e pudemos perguntar, criar um diálogo firme para a gente aprender”

João Lisboa, assessor jurídico do Cimi

“A Oficina de formação Jurídico-Política, realizada com o Povo Mura, se deu em um momento delicado para a defesa dos direitos dos povos indígenas, dado o cenário de insegurança promovido pela entrada da Lei 14.701/2023 em vigor”.

“As previsões constitucionais são claras quanto aos direitos territoriais dos povos indígenas, assim como também são, os critérios relativos ao Direito à Consulta Consentida, Prévia, Livre e de boa-fé, estabelecidos pela Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Nessa toada, já se revelam os debates sobre a inconstitucionalidade da Lei 14.701/2023, os retrocessos à vista do que ela dispõe, e sobre a necessidade de uma mobilização nacional do movimento indígena contra ela”.

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