Regional Cimi Norte I realiza Fórum das Equipes em modo presencial e consagra o abraço como principal estímulo para a missão
Espaço de interação e partilha, avaliação e planejamento, formação e fortalecimento da mística missionária militante para a defesa incondicional dos povos indígenas são os objetivos do Fórum
“Alegria no reencontro, abraços e cumprimentos, animadas rodas de conversa, de viola, cantos de luta e resistência, místicas acolhedoras, afetos trocados, boas energias animando e impulsionando, tudo o que caracteriza o jeito Cimi de ser voltou com força, renovando a fé, a esperança e a vitalidade do Espírito Missionário que dá vigor à luta em defesa dos direitos dos Povos Indígenas”. Esse foi o clima que pairou durante o Fórum das Equipes do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Regional Norte I, realizado nos dias 12 a 15 de agosto, no Centro de Formação Xare, em Manaus (AM), e que pela primeira vez após a pandemia pode acontecer no formato presencial.
O Fórum das Equipes é o encontro dos estagiários, missionários, assessores e coordenação que atuam junto aos povos indígenas do Amazonas e Roraima, estados que compõem o Regional Norte I do Cimi. Tem por objetivo ser um espaço de interação e partilha de conhecimentos, avaliação e planejamento da caminhada, formação e fortalecimento da mística missionária militante. É um momento de vivenciar a mística e a espiritualidade para unificar os propósitos e as ações e, assim, todos e todas se fortalecerem na missão da defesa incondicional dos direitos e da vida dos povos indígenas.
“Alegria no reencontro, abraços e cumprimentos, animadas rodas de conversa, de viola, cantos de luta e resistência, místicas acolhedoras, afetos trocados, boas energias animando e impulsionando, tudo o que caracteriza o jeito Cimi”
Para Raimundo Nonato Freitas, mais conhecido como Manu, integrante do colegiado de Coordenação Regional do Cimi Norte I e coordenador da equipe do Cimi na Prelazia de Tefé (AM), o que impulsiona a missão é o estar junto, é o abraço, partilhando as vivências e construindo estratégias e planos de ação para um apoio sólido aos povos indígenas. “Ouvir as partilhas das equipes que trazem relatos de suas bases nos ajuda, enquanto coordenação regional, a direcionar e construir estratégias de ações futuras que venham contribuir de maneira mais sistemática nas lutas que os povos indígenas enfrentam atualmente”.
O afastamento entre as equipes e delas com os povos indígenas por conta da pandemia, para Manu, não enfraqueceu o Cimi. Ao contrário. Quando Manu ouviu os relatos dos estagiários e missionários sentiu a força da missão organizada e da presença solidária do Cimi nas aldeias, nos momentos em que foi permitida a entrada para a entrega de cestas de alimentos e informações sobre a doença.
“Ouvir as partilhas das equipes que trazem relatos de suas bases nos ajuda, enquanto coordenação regional, a direcionar e construir estratégias de ações futuras”
“Após a pandemia, estarmos reunidos presencialmente ouvindo os relatos, percebemos que a presença solidária do Cimi foi de suma importância para que os povos pudessem enfrentar os riscos que a pandemia trouxe para suas aldeias, e que o fortalecimento organizacional, foi sem dúvida um dos elementos fundamentais para que pudessem seguir, resistindo e superando os desafios. As equipes trouxeram presente em seus relatos as diversas experiências vivenciadas em suas regiões nos quais atuam e que o Cimi contribui de forma expressiva e profética”.
A constatação é compartilhada por Raimundo Francisco, missionário do Cimi da Equipe do médio Juruá na Prelazia de Tefé, que diz que a ação missionária não para e, aonde chega, resiste. Durante a pandemia, para Raimundo, o desafio foi grande, mas os aprendizados em realizar mesmo distantes foi mais forte.
“Após a pandemia, estarmos reunidos presencialmente ouvindo os relatos, percebemos que a presença solidária do Cimi foi de suma importância”
“Nossa missão é contínua e de muita resistência nos mais diversos lugares de atuação de cada equipe. Neste período pandêmico em que todos tiveram que estar em seus lugares, limitados aos contatos remotos pelos diversos meios de comunicação, foi muito desafiador, pois o aprendizado é sempre mais forte no contato, no se ver, tocar, sentir. Mas, conseguimos dar o apoio nas aldeias nesse momento difícil”, explicou, animado com o reencontro dos amigos durante o Fórum.
“Nos reencontrar, por si só já é uma grande energização nas forças de cada um e a troca de experiências das diversas formas que cada um encontrou para superar esses tempos atribulados atuais faz a gente seguir mais revigorado para as ações junto aos povos indígenas”, assegurou.
“Nos reencontrar, por si só já é uma grande energização nas forças de cada um e a troca de experiências das diversas formas que cada um encontrou para superar esses tempos atribulados”
O missionário Fabio Pereira, da equipe de Tefé, também se sente fortalecido com o reencontro e disse que durante a pandemia foi um tempo de sintonias e trocas virtuais que mantiveram as esperanças. “Foi um período sem nos encontrarmos, mas um tempo onde ficamos em sintonia, vivenciando nossas inquietações e partilhando nossa missão, nossa luta virtualmente para nos esperançar”, explicou, e disse que o reencontro presencial foi de intensas partilhas, alegrias, mesmo com a ausência dos que faleceram. “Conseguimos fazer o reencontro, estar juntos novamente, mas infelizmente sem a presença de alguns e algumas que fizeram sua travessia para a outra margem e seguiram suas remadas junto ao Pai. Viver intensamente os momentos, partilhando as alegrias, a esperança que tudo vai ficar bem, e acreditar que vale a pena lutar por uma causa, é necessário nos dias de hoje”, destacou o missionário.
Quézia Martins Chaves, atual estagiária e futura missionária do Cimi, da Equipe Lábrea, diz que foi um longo tempo se vendo só virtualmente, sem poder sentir o calor dos abraços e dos afetos, mas que nesse retorno isso tudo foi possível, e mais: “foi muito bom partilhar e escutar sobre as experiências vividas e novas estratégias que cada equipe precisou adotar para continuar a missão junto aos povos Indígenas. Reanimamos a mística missionária e militante, que são os pilares no nosso fazer, ser, de fazer memória agradecida pela vida daqueles e daquelas que se doaram e que tombaram por consequência da pandemia e das políticas anti-indígenas”, enfatizou emocionada a missionária.
“Foi muito bom partilhar e escutar sobre as experiências vividas e novas estratégias que cada equipe precisou adotar para continuar a missão junto aos povos Indígenas”
A equipe do Regional Norte I que atua no Vale do Javari, região da segunda maior Terra Indígena (TI), também veio ao Fórum das Equipes. O missionário Almério Alves Wadick, mais conhecido como Kell, que atua com os povos indígenas daquela TI e vive no município de Atalaia do Norte (AM), trouxe para compartilhar com os amigos das outras regiões do Regional, sua preocupação com as violências sistematicamente cometidas contra os povos indígenas e que esse é um dos maiores desafios da missão.
“As violências cometidas contra os povos indígenas ainda é um dos principais desafios que temos enfrentado enquanto equipe e missionários do Cimi nas áreas de atuação. Existe um aparato do Estado que vem executando um projeto sistemático de violência, principalmente nas terras indígenas com potencialidade de recursos naturais, como percebemos na região do Vale do Javari”, sentenciou o missionário do Cimi que atua na região onde foram assassinados o indigenista Bruno Araújo Pereira e o jornalista inglês Dom Phillips.
Por outro lado, Kell expressou suas forças para seguir lutando, acreditando no projeto de vida dos povos originários e sua missão de defesa dessas formas de vida enquanto sujeito de transformação social. “As minhas forças para seguir a missão vêm da relação de proximidade, familiaridade com os povos indígenas, porque são pessoas amigas. Na missão é minha contribuição apoia-los enquanto sujeito de transformação que sou”.
“As minhas forças para seguir a missão vêm da relação de proximidade, familiaridade com os povos indígenas, porque são pessoas amigas”
Um feixe de varas: símbolo da força Macuxi
De Roraima, a delegação foi composta pela equipe da Pastoral Indigenista representada pela Irmã Virgilina Lima, Pe Luiz Fernando Barros, Irmã Maria das Graças Rodrigues, Irmão Medino Abraham, Pe James Murimi Njimia, Pe Migerwa Joseph IMC e Pe Claudio Dominguez, e Gilmara Fernandes Ribeiro, missionária do Cimi.
Irmã Virgilina Lima, da Congregação das Filhas da Caridade, missionária na Região Serra da Lua em Roraima, conta que uma grande preocupação é a vulnerabilidade à assédios e cooptações que as lideranças indígenas se encontram. “Na conjuntura que estamos, um dos desafios que nos deparamos é o risco de cooptação que as lideranças indígenas estão sujeitas. As comunidades estão sendo influenciadas por grandes projetos que fascinam, e acabam aderindo a um discurso propagado pelo sistema, de um progresso que desconsidera a vida do povo e suas realidades”.
“Na conjuntura que estamos, um dos desafios que nos deparamos é o risco de cooptação que as lideranças indígenas estão sujeitas”
Sobre as forças para seguir na missionariedade, Virgilina compara a união, a perseverança e a resistência na luta com um feixe de varas, símbolo da força do Povo Macuxi. “Para simbolizar nossas forças, eu trago presente o grande exemplo do feixe de vara que representa a unidade, a força e resistência do Povo Macuxi, e que com esse exemplo precisamos nos unir neste momento com as congregações, organizações indígenas, indigenista, aliados e parceiros que lutam pela defesa dos direitos e da vida dos povos indígenas.
Com todas essas preocupações apresentadas e colocadas em comum para os debates e dimensionando a importância do reencontro, Gilmara Fernandes, Missionária do Cimi em Roraima, destaca que os encontros formativos fortalecem a coletividade e se configuram como celebrações da fé, especialmente após o período da pandemia. “Estarmos juntos novamente é celebrar o reencontro depois de dois anos e meio de pandemia. Mas, agora, presencialmente, podemos partilhar nossas experiências de como nos adaptamos a essa realidade no trabalho com os povos indígenas, como podemos enfrentar essas realidades de vulnerabilidade e ameaças aos povos indígenas e, mais que isso, de como podemos ficar firmes e vivermos nossa fé, alegria e paz”, concluiu.
“Estarmos juntos novamente é celebrar o reencontro depois de dois anos e meio de pandemia, agora presencialmente, podemos partilhar nossas experiências de como nos adaptamos a essa realidade no trabalho com os povos indígenas”
Estudos que constroem aprendizados
A programação do Fórum foi intensa, exigiu dos missionários muita atenção e concentração. Começou com a partilha das atividades realizadas desde o último Fórum, que aconteceu no modo virtual em fevereiro desse ano.
Depois, foi dedicado um dia para estudos dos textos do Plano Nacional de Formação (PNF) proposto pelo Coletivo Nacional de Formação do Cimi Nacional. As equipes receberam o material antecipadamente e cada equipe organizou suas apresentações, oportunizando os debates com as demais equipes. Como indicativos para novas estratégias de luta e planejamento das ações, contribuindo com a reflexão sobre atuação profética e missionária do Cimi, os textos estudados foram “Pedras e Horizontes: Apontamentos de um Retiro do Cimi; A Pedagogia da Retomada: uma Contribuição das Lutas Emancipatórias dos Povos Indígenas do Brasil e o Documento de Santarém 50 Anos: Gratidão e Profecia.
“A programação do Fórum foi intensa, exigiu dos missionários muita atenção e concentração. Começou com a partilha das atividades “
Como espaço de formação, o Fórum das Equipes trouxe para essa edição presencial, a oficina sobre “Elaboração de Projetos de Sustentabilidade”, com a assessoria em gestão de projetos de Lucie Maupilier, que atualmente contribui com essa temática no Cimi Regional Norte I, com o objetivo de orientar e potencializar as formas de captação de recursos para as ações.
Por último, foram partilhados os informes sobre as atividades previstas, organização das agendas da assessoria jurídica, orientações para o preenchimento das Fichas de Violência presenciadas e/ou relatadas pelas equipes e atualização da agenda do Regional.
“Depois de quatro dias de encontros e reencontros, de partilhas e vivências das lutas, das missões, de reacender e alimentar a chama da missionariedade, todos foram impulsionados na missão”
Depois de quatro dias de encontros e reencontros, de partilhas e vivências das lutas, das missões, de reacender e alimentar a chama da missionariedade, todos foram impulsionados na missão de uma Igreja que reafirma a opção pelos povos indígenas, sobretudo àqueles que tem suas vidas ameaçadas pelo sistema que oprime e mata.
Tendo em seu horizonte a Mística Missionária Militante, que é o motor, a água e a força que move os integrantes do Cimi para continuar lutando, seguindo e acompanhando os povos indígenas, as equipes retornaram aos seus locais de missão.