10/05/2019

Caciques e professores Mbya Guarani reivindicam melhorias na saúde e na educação

Em documento, indígenas relatam também a preocupação com o desmonte das políticas públicas e dificuldades geradas para suas famílias

Os indígenas presentes no Encontro de Caciques e Professores Mbya Guarani representaram mais de 40 aldeias de todo o Rio Grande do Sul

Os indígenas presentes no Encontro de Caciques e Professores Mbya Guarani representaram mais de 40 aldeias de todo o Rio Grande do Sul

Por Ascom/Cimi

O Encontro de Caciques e Professores Mbya Guarani, realizado entre os dias 7 e 9 deste mês, reuniu lideranças e educadores na Tekoa Porã, em Salto do Jacuí (RS). O principal objetivo do encontro foi promover um diálogo acerca das condições nas comunidades, especialmente com relação às políticas públicas de educação, saúde, habitação, saneamento básico, atividades agrícolas e a demarcação de terras. Ao fim do evento, os indígenas produziram um documento trazendo suas observações e reivindicações.

“Nossos Karaí e nossas Kunhã Karaí nos alertam sobre a importância de nos fortalecermos na nossa cultura, porque ela é a principal fonte de resistência diante das agressões promovidas pelos juruá, os brancos, que foram escolhidos para serem as autoridades em nosso país”, relatam no texto. Afirmam também que estão bastante preocupados com a promoção de um intenso desmonte de tais políticas públicas e, consequentemente, as graves dificuldades geradas para suas famílias.

Leia o documento na íntegra abaixo:

 

DOCUMENTO FINAL DO ENCONTRO DE CACIQUES E PROFESSORES MBYA GUARANI NA TEKOA PORÃ, SALTO DO JACUI-RS

 

Nós, lideranças e professores Mbya Guarani do Rio Grande do Sul, em articulação com o Programa Saberes Indígenas na Escola, reunimo-nos entre os dias 07 a 09 de maio de 2019, na Tekoa Porã, Salto do Jacuí, Rio Grande do Sul, oportunidade em que refletimos sobre a situação de nossas comunidades, especialmente acerca das políticas públicas de educação, saúde, habitação, saneamento básico, atividades agrícolas e a demarcação de terras. Estamos bastante preocupados porque os governos Federal e Estadual estão promovendo um intenso desmonte destas políticas, o que vem gerando graves dificuldades para as nossas famílias.

Refletimos, ao longo desses dias, sobre a necessidade de nos mantermos unidos e articulados para enfrentar os problemas e exigir daqueles que são os responsáveis pelas políticas, que as executem e nos respeitem. Nossos Karaí e nossas Kunhã Karaí nos alertam sobre a importância de nos fortalecermos na nossa cultura, porque ela é a principal fonte de resistência diante das agressões promovidas pelos juruá, os brancos, que foram escolhidos para serem as autoridades em nosso país. Para nossos líderes espirituais precisaremos nos reunir entre as comunidades e intensificar nossos rituais na OPY-Casa de Reza- onde nos encontramos com Nhanderu, aquele que nos orienta e determina nossa luta contra os que nos discriminam, nos perseguem e negam nossos direitos fundamentais a vida, a terra e a nossa cultura.

Diante deste contexto de adversidades e preocupações nossas lideranças pedem que:

Todas as nossas terras – Tekoa – sejam respeitadas, demarcadas e asseguradas para nosso usufruto exclusivo, para que possamos viver de acordo com nossos costumes, cultura, crenças e tradições;

A política de atenção à saúde seja executada pela Secretaria Especial de Saúde Indígena – Sesai – reconhecendo e valorizando nossos modos de pensar, nossas medicinas tradicionais, nossos líderes espirituais e seus conhecimentos;

O estado e seus servidores mantenham permanente diálogo com as nossas lideranças e comunidades quando forem propor as políticas de autossustentabilidade nas terras Mbya Guarani e que esses programas sejam permanentes e vinculados ao nosso modo de plantar, cultivar e colher os produtos da terra;

A Funai –Fundação Nacional do Índio – deve planejar e executar a política de habitação nas nossas comunidades, assegurando a nossa autonomia e o nosso modo de se construir as moradias, bem como que haja o aproveitamento da matéria prima existente nas áreas onde vivemos;

O estado deve promover a política de educação escolar indígena respeitando nossa cultura, costumes e nossos currículos e calendários, bem como os hábitos alimentares, por isso a merenda deve ser feita atendendo as formas de preparo alimentar Mbya Guarani;

O estado deve contratar merendeiras Mbya Guarani para executar os serviços de preparo e cozimento da alimentação nas escolas, porque somente assim se garantirá as práticas alimentares de nossas comunidades, da mesma forma os cardápios da alimentação escolar Mbya Guarani precisam ser individualizados para cada escola;

O estado deve, Igualmente, contratar funcionárias e funcionários Mbya Guarani para as atividades de zeladoria e limpeza nas escolas, e que esta contratação siga as regras estabelecidas pelas comunidades e não pela administração estadual;

O estado deve realizar concursos específicos e diferenciados para a nomeação de professores e professoras Mbya Guarani, atendendo os preceitos do respeito à diversidade étnica e cultural;

O estado deverá contratar professores e funcionários por tempo indeterminado até que as vagas sejam preenchidas por aqueles Mbya Guarani que realizaram os concursos específicos e diferenciados;

O estado deverá prever a contratação de secretários e secretárias, supervisores e supervisoras e coordenadores e coordenadoras pedagógicas Mbya Guarani com critérios próprios de escolaridade;

O estado e a união devem promover e financiar a produção de materiais didáticos na língua Mbya Guarani;

O Conselho Estadual de Educação e a Secretaria Estadual de Educação deve utilizar a Resolução 383/2002 para autorização de funcionamento das escolas que ainda não estão autorizadas para o ensino, priorizando criação de escolas e a construção de prédios escolares em Rio Grande- Pará Rokê -, Camaquã – Água Grande, Bonito e Três Bicos -, Maquine, Retomada Kaaguy Porã e Guyra Nhendu -, Terra de Areia –Yy Rupa-, Santo Ângelo – Tekoa Pyau-, Canguçu –Guajayvi Poty -, Palmares do Sul -Yryapu;

O estado deve realizar obras de reforma,  construção e término das escolas em Erebango -Mato Preto, Planalto – Kaaguy Porã e Vila II-, Torres – Campo Bonito-, Barra do Ribeiro – Yvy Poty, Guapoy, Tekoa Porã e Nhuü Poty, Mariana Pimentel – Tekoa Mirim-, Guaíba –Tapé Porã-, Cachoeira do Sul – Araxaty e Piquiri-, Osório –Sol Nascente-, Cristal –Tavaí-, Estrela Velha- Kaaguy Porã-, Camaquã –Água Grande-, São Miguel das Missões – Koenju-, Salto do Jacuí – Tekoa Porã-, Caraá – Kaaguy Pa’ü, Charqueadas – Guajayvi-, Maquine – Campo Molhado,  Eldorado do Sul- Pekurity-, Capivari do Sul – Araxaty-, Riozinho –Itá Poty-, Santa Maria –Guavyraty Porã – e Porto Alegre – Kaaguy Mirim e Pindó Poty;

O estado deverá retomar as obras paralisadas das escolas nas comunidades Cantagalo- Karaí Arandu-, Estiva- Karaí Nhe’e katu;

O estado deve promover cursos de formação ao magistério de forma qualificada, onde se atendam as especificidades étnicas e culturais Mbya Guarani;

O estado deverá respeitar a Resolução da Segunda Conferência Nacional de Educação Escolar Indígena, 2 CONEEI, de Número 05/2012, que prevê a contratação de anciões para comporem as direções escolares;

O Ministério da Educação deverá tornar a ação dos Saberes Indígenas na Escola uma política pública permanente, através de convênio com a Universidade Federal do Rio Grande do Sul/MEC ou Secretaria Estadual de Educação do Rio Grande do Sul/MEC.

Atenciosamente

 

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