17/04/2018

ONU

Por Ascom/Cimi com informações de ONU News

 

 

Leila Guarani e Kaiowá. Foto: Guilherme Cavalli/Cimi

Pronunciamento de Leila Rocha Guarani e Kaiowá

Ao Fórum Permanente da ONU sobre Questões Indígenas

Senhora presidente,

Meu nome é Leila Rocha, sou do povo Guarani Nhadeva e resido no estado do Mato Grosso do Sul, região Centro Oeste do Brasil. Aqui represento a comunidade onde vivo Yvy Katu, a Aty Gussu (Grande Assembleia do povo Guarani Kayowá), a Aty Cunhã (Assembleia das Mulheres Guarani Kayowá) e a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), da qual a Aty Guassu faz parte.

Milhares de Guarani Kaiowá foram expulsos de suas terras. Hoje vivem em beiras de estradas e estão passando fome todos os dias no Mato Grosso do Sul. Passando necessidades numa região que é mundialmente conhecida como grande exportadora de carnes, soja, milho e açúcar. Nossas crianças passam fome por que suas famílias não tem um lugar sequer para produzir seus alimentos.

Muitas de nossas comunidades sofrem intimidações, ameaças e agressões de fazendeiros sem que os mesmos sejam punidos. A impunidade dos nossos agressores serve de incentivo para eles nos agredirem ainda mais.

Juízes Federais do município de Dourados tomam decisões frequentes que provocam o terror em nossas comunidades por meio de ordens de despejo judiciais e de anulação de processos de demarcação de nossas terras fazendo uso do Marco Temporal.

O Governo brasileiro paralisou as demarcações de nossas terras. Com o Parecer 001 da Advocacia Geral da União, aprovado pelo presidente Temer e publicado em julho de 2017, pode haver retrocessos a qualquer momento em relação às terras que já estão em demarcação, como é o caso da terra Yvy Katu onde eu resido com minha família e minha comunidade.

Já pedimos muito ao governo brasileiro para que demarque nossas terras. Mas até agora o governo não demarcou nossas terras. Por isso, senhora presidente, peço a este Fórum Permanente da ONU, ao Mecanismos de Expertos e à Relatora Especial da ONU para Povos Indígenas que: 1) Encaminhem recomendação para que o governo brasileiro envie, forma emergencial, alimentos para comunidades onde os Guarani Kaiowá estão passando fome; 2) Encaminhem recomendação para que o governo brasileiro dê seguimento e finalize os processos de demarcação, homologação e registro de nossas terras; 3) Recomende à Ministra da Advocacia Geral da União, Grace Maria Fernandes Mendonça, a imediata revogação do Parecer 001/17.

Nova York, 17 de abril de 2018

Leila Rocha

Aty Guassu Guarani Kaiwá

 

 

 

 

Adriano Karipuna. Foto: Tiago Miotto/Cimi

Pronunciamento de Adriano Karipuna

Ao Fórum Permanente da ONU sobre Questões Indígenas

Senhora Presidente,

Meu nome é Adriano Karipuna. Sou liderança do povo Karipuna do estado de Rondônia, no Brasil. Venho, em nome do povo a que pertenço, trazer informações a este Fórum Permanente da ONU e pedir providências.

Meu povo foi contactado na década de 1970 e sofreu uma forte redução populacional em decorrência da violência sofrida e doenças. A maior parte de nossa terra foi tirada de nós à força. Chegamos a ser apenas 05 pessoas membro do nosso povo. Na década de 1990, conseguimos a demarcação de parte do nosso território. Hoje somos 58 pessoas.

A partir de 2015, não-indígenas passaram a invadir a nossa terra e essa invasão agravou-se muito nos últimos dois anos já durante o mandato do Presidente Temer. Nossa terra está sendo invadida, loteada e vendida para pessoas que estão se apossando ilegalmente e derrubando a nossa floresta para plantação de pastagens para criação de gado.

A situação é muito grave. Além dos amplos danos ambientais, existem fortes e iminentes riscos de sermos atacados dentro de nossa terra pelos invasores. A possibilidade de haver um massacre e um genocídio contra meu povo é real. O desmatamento já chega há poucos metros da nossa aldeia.

Já apresentamos muitas denúncias a autoridades do Estado brasileiro sobre esse caso.  Há cerca de um mês, inclusive, nos reunimos e denunciamos a situação ao presidente da Funai, ao Instituto Brasileiro de Meio Ambiente (IBAMA) e ao Ministro da Justiça, sr. Torquato Jardim. Até o momento, no entanto, não foram tomadas providências para que os invasores de nossa terra sejam retirados dela.

Diante disso, senhora presidente, recorro e faço um apelo a este Fórum Permanente da ONU, ao Mecanismo de Expertos e à Relatora Especial da ONU para Povos Indígenas que enviem documentos e contatem urgentemente representantes do Governo brasileiro para que o mesmo promova ações estruturantes e urgentes para retirar os invasores de nossa terra. Pedimos também que ao governo brasileiro seja recomendado a adoção de medidas que garantam a efetiva proteção de nosso território, do nosso povo e de nossas lideranças. E ainda que o governo brasileiro recomponha o orçamento do órgão indigenista para que o mesmo possa cumprir com suas responsabilidades institucionais e constitucionais.

Senhora presidente, não podemos aceitar sermos vítimas de um genocídio. A retirada dos invasores de nossa terra e a proteção dela é elemento fundamental para que possamos continuar existindo enquanto povo. Contamos com o urgente e efetivo apoio deste Fórum da ONU.

Adriano Karipuna

Liderança do Povo Karipuna

 

 

 

Cleber Buzatto, do Cimi. Foto: Guilherme Cavalli/Cimi

Pronunciamento de Cleber Buzatto, secretário executivo do Cimi

Ao Fórum Permanente da ONU sobre as Questões Indígenas

Senhora presidente,

O ano 2018 apresenta-se como extremamente perigoso e desafiador para os povos indígenas no Brasil.

Muitos são os fatos concretos de nossa realidade que, infelizmente, nos levam a esta conclusão. Quatro deles são emblemáticos: o assassinato do professor Marcondes Namblá Xokleng, a pauladas, no estado de Santa Catarina; o assassinato, a pedradas, do também professor Daniel Kabinxana Tapirapé, no estado do Mato Grosso, ocorrido durante o mês de janeiro; a queima de uma base de proteção pertencente ao Estado brasileiro localizada na terra indígena Karipuna, em Rondônia, em fevereiro; e o despejo extrajudicial com práticas de tortura contra famílias do povo Kaingang, pela polícia militar do Rio Grande do Sul, também em fevereiro.

Poderes do Estado brasileiro, de modo especial o Executivo e o Legislativo, por sua vez, mostram-se dominados pelos interesses de grandes corporações privadas e seus representantes no Congresso Nacional, a bancada ruralista, e atuam no sentido de agravar ainda mais as violações acima referidas. São muitas as iniciativas que causam sérios prejuízos e ameaçam fortemente a Vida e o futuro dos povos originários do Brasil. Neste sentido, destacamos:

Do poder Executivo: o Parecer Anti-demarcação 001/17 da Advocacia Geral da União aprovado pelo Presidente Temer; a paralisação dos procedimentos de demarcação das terras indígenas e o estrangulamento orçamentário da Fundação Nacional do Índio (Funai);

Do Legislativo: a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 215/00; o Projeto de Lei 3729/04 que estabelece mudanças na lei ambiental;

Do Judiciário: a negativa do acesso à justiça aos povos por parte de alguns Ministros da Suprema Corte; a sombra do Marco Temporal e as recorrentes decisões de reintegrações de posse e de anulação de procedimentos de demarcação, estas últimas tomadas, principalmente, nas primeiras instâncias.

Diante dessa grave situação, apresentamos a este Fórum Permanente da ONU, ao Mecanismos de Expertos e à Relatora Especial da ONU sobre Povos Indígenas as seguintes recomendações: 1) Que o Estado brasileiro dê seguimento regular aos procedimentos administrativos de demarcação de terras indígenas; 2) Recomendar à Advocacia Geral da União e ao Governo Temer que revoguem o Parecer 001/17; 3) Instar o Governo brasileiro que tome medidas emergenciais e estruturantes para pôr fim à nova fase de esbulho possessório em curso no país contra os povos indígenas;  4) Recomendar que o governo brasileiro realize efetiva investigação e punição dos responsáveis pelas violências contra os povos indígenas; 5) Recomendar ao Supremo Tribunal Federal e a seus Ministros que seja garantido o direito dos povos indígenas participarem de todos os processos judiciais que impactam seus direitos.

Nova York, 17 de abril de 2018

Cleber César Buzatto

Secretário Executivo do Cimi

 

 

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