26/08/2016

Homens armados invadem retomada em carro de empresa de segurança, atiram e ameaçam indígenas Gamela


Três homens armados e trajando coletes à prova de bala invadiram a retomada realizada pelo povo Gamela no último dia 15, na região do município de Viana (MA). Conforme os Gamela, os homens chegaram numa caminhonete branca, se identificaram como policiais e chamaram pelas lideranças do povo.

O veículo usado pelos invasores pertence a uma empresa chamada Ostensiva Segurança Privada LTDA., com sede em São José do Ribamar (MA). A apuração foi realizada pela assessoria jurídica da Comissão Pastoral da Terra (CPT) na Secretaria de Segurança Pública do Estado. Os homens não estavam uniformizados e não apresentaram qualquer identificação. 

Desconfiados, os indígenas pediram para  que os três se retirassem da área. Houve discussão. Um dos indivíduos sacou uma pistola e atirou para o alto. O tumulto aumentou. Se o objetivo era dispersar os Gamela, não houve efeito. Os indígenas bloquearam a rodovia MA-014 em três pontos, nas proximidades da retomada, cercando os homens armados.

Dois pneus da caminhonete terminaram furados, o que não impediu a fuga. A placa do veículo foi fotografada pelos Gamela, bem como os homens que se passavam por policiais. “Vendo que a situação ia ficar ruim para eles, foram embora avisando que não ficaria assim e que haveria derramamento de sangue”, conta um indígena Gamela.

Antes do atentado, ocorrido no último domingo, 21, homens armados em duas motos passaram pela retomada e atiraram contra os Gamela. Durante essa semana, depois do ataque, o fato se repetiu. Os disparos, em mais de uma ocasião, partiram de uma cerâmica vizinha à retomada e que pertence ao prefeito de Matinha, Beto de Pixuta.

Organizações visitam os Gamela
 

Preocupados com a situação, um grupo formado por integrantes do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Comissão Pastoral da Terra (CPT) e a Central Sindical Popular (CSP) Conlutas passaram os dias 23 e 24 junto aos Gamela na área retomada. Durante o dia, veículos passam pela retomada e os ocupantes xingavam os indígenas de bandidos.

“Durante a madrugada, ouvimos disparos de arma de fogo. Os Gamela passam a noite sem dormir e podemos constatar o que estão passando durante esses dias”, diz a missionária indigenista do Cimi, Rosimeire Diniz. Na cidade, fazendeiros e políticos incitam a população contra os Gamela e as redes sociais têm sido um dos mecanismos.

No facebook, moradores de Matinha e Viana compartilham a informação de que os Gamela pretendem invadir as casas nas cidades e incentivam ações violentas contra os indígenas – inclusive propondo uma união entre a polícia, os ditos proprietários e seguranças privados. Há mensagens racistas e pedindo “chumbo nesses vagabundos”.

A comissão que visitou os Gamela constatou ainda que uma outra fazenda próximo ao local onde os indígenas estão serve de base para um bando que vem ameaçando os Gamela de invasão à retomada e expulsão forçada da aldeia. Nas duas últimas madrugadas os disparos de arma de fogo seguiram “como se fosse um aviso”.

“O clima é tenso e os que se dizem proprietários das fazendas retomadas pelos Gamela articulam outros proprietários, inclusive de fazendas que não incidem sobre o território indígena, para incitar a população contra os indígenas. Em pesquisas, é fácil perceber que essa campanha ganha força”, explica a missionária do Cimi.

Histórico  

O território Gamela teve a primeira ‘demarcação’ em 1759, quando 14 mil hectares foram destinados ao povo por doação da Sesmaria, conforme Kum’tum Gamela. Durante o século 19, um outro aldeamento Gamela foi erguido fora da área doada pela Sesmaria. Estas são as duas referências do povo, além do relato dos mais velhos.

“Atualmente o nosso processo de demarcação está paralisado na qualificação de demanda, que já foi feita”, afirma Kum’Tum. Por conta disso, os Gamela passaram a realizar retomadas, a última delas no dia 15 de agosto – semana passada. Entre agosto e dezembro de 2015, os Gamela retomaram outras três porções do território reivindicado.

No total, sete áreas tradicionais foram retomadas pelos Gamela; povo composto por 1.500  indígenas. A área retomada dia 15 pelos Gamela, sob ataque, fica às margens do rio Piraí, sagrado para o povo. No rio vive João Piraí, Encantado protetor dos Gamela e das águas onde se reproduzem os peixes fonte de alimentação aos indígenas.

Fotos: Povo Gamela

Fonte: Assessoria de Comunicação - Cimi
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