Justiça manda prefeitura de Jacareacanga recontratar professores indígenas Munduruku
Após meses de impasse, a Justiça Federal ordenou hoje que a prefeitura de Jacareacanga, sudoeste do Pará, reestabeleça a quantidade necessária de professores nas escolas indígenas do povo Munduruku. No início de 2014, sem aviso, a prefeitura demitiu 70 professores indígenas sob alegação que eles não tinham formação adequada para atuar. Desde então, as escolas estão com sérias dificuldades de funcionamento. “É evidente que suspender ou inviabilizar o acesso à educação não é solução. Alguma educação é sempre melhor do que nenhuma educação”, diz a decisão do juiz Rafael Leite Paulo, da subseção judiciária de Itaituba.
A decisão atende a pedido do Ministério Público Federal. A maioria dos professores demitidos atuavam nas escolas indígenas há anos, já tendo acumulado experiências bem sucedidas e conhecimento sobre o ensino e aprendizagem dentro do processo educacional diferenciado, assim como desenvolvido metodologias de trabalho específicas nas comunidades. Depois das demissões, a prefeitura contratou 35 estudantes do ensino médio sem experiência de magistério para substitui-los.
“Essa simples constatação já deixa clara a existência de fundamentos para a concessão da tutela requerida uma vez que o fato narrado, qual seja, redução do corpo de professores que atende uma determinada comunidade em 50%, já é indicativo de existência de uma grave ofensa ao acesso à educação”, diz a decisão judicial. “É inquestionável o prejuízo à continuidade e a qualidade do ensino indígena realizado, uma vez que o mesmo serviço, passou a ser desempenhado por um número insuficiente de professores, o que gera sobrecarga de trabalho e consequente diminuição na qualidade de ensino”, completa.
A prefeitura tem prazo de cinco dias úteis para fazer as contratações, que começam a contar assim que for notificada oficialmente da decisão. Em caso de descumprimento, foi imposta multa diária de R$ 10 mil para o município.
Entenda o caso – Ao descontinuar os contratos dos professores, que trabalhavam há pelo menos 7 anos na educação escolar Munduruku, a prefeitura desobedeceu legislação internacional e nacional, descumprindo os objetivos da educação escolar indígena. De acordo com a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e com a Constituição Federal brasileira, às crianças indígenas é assegurado o ensino em sua língua materna, além dos processos próprios de aprendizagem.
Desde 1999, a resolução 3 da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação, assegura a organização da educação escolar indígena em territórios etnoeducacionais, considerando a participação da comunidade nas suas formas de produção de conhecimento. A mesma resolução determina que a atividade docente nas escolas indígenas deve ser exercida prioritariamente por professores da própria etnia.
Três normativos jurídicos – A resolução já citada, o decreto 6.861/2009 e o parecer 14 do Conselho Nacional de Educação – garantem ainda a esses professores indígenas que eles tenham direito à formação em serviço, ou seja, podem continuar ministrando aulas enquanto fazem cursos de formação. No caso dos professores Munduruku, a formação está ocorrendo no Curso de Magistério Intercultural, no Projeto Ibaorebu de Formação Integral do Povo Munduruku.
O Projeto Ibaorebu é coordenado pela Fundação Nacional do Índio e ainda não foi concluído por responsabilidade exclusiva de problemas da própria organização do curso. Para o MPF, enquanto o Ibaorebu não for concluído, os professores indígenas que já tem experiência devem continuar trabalhando com as crianças Munduruku.
Processo nº 1541-28.2014.4.01.3908