Comissão de Direitos Humanos realiza Audiência Pública para discutir ameaças contra lideranças Xakriabá
A Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais realizou nesta sexta-feira (8), na aldeia Várzea Grande, território Xakriabá, no município de Itacarambi, norte de Minas Gerais, uma audiência pública para discutir ameaças contra lideranças do povo Xakriabá. Na foto ao lado, comunidade Xakriabá muda placa de fazenda retomada.
Aproximadamente 1.500 índios Xakriabá participaram da audiência que teve como pauta o processo de demarcação das áreas reivindicadas pelos indígenas, ação que vem causando a insatisfação de políticos e do agronegócio, mentores de uma intensa ação de violência, discriminação e preconceito contra os Xakriabá.
Os estudos realizados pela Fundação Nacional do Índio (Funai) identificaram aproximadamente 44 mil hectares como terra tradicional Xakriabá. A área de demarcação se estende às margens do Rio São Francisco. O conflito vem se acirrando desde 2007, quando o povo Xakriabá reiniciou as ações de retomada de áreas pertencente ao seu território.
A última ação aconteceu em 1º de setembro de 2013, quando o povo Xakriabá retomou a fazenda São Judas Tadeu nas aldeias Vargem Grande e Caraíbas. A área retomada é composta por 6 mil hectares, fato que provocou reações de políticos e fazendeiros da região.
Setores contrários ao direito territorial do povo Xakriabá têm se movimentado na região com o intuito de arregimentar forças para fazer enfretamentos anti-indígenas. O alvo destas campanhas é a população mais carente da zona urbana e rural, que não tem acesso as informações e acabam sendo envolvidas no conflito.
Recentemente a Associação dos Fazendeiros, localizada em Itacarambi, distribuiu um panfleto com discriminações, criminalizando os Xakriabá e incitando a violência. O comunicado chega a convocar a população para confrontar com os Xakriabá. Este movimento aconteceu no último dia 21 de setembro, sendo intitulado como ‘FORA FUNAI’ e contou com a presença e apoio de políticos da região.
Outros grupos anti-indígenas tentam mudar o foco do conflito transformando-o em uma disputa da política partidária. Este setor ataca políticos e aliados do povo Xakriabá e tenta esconder da sociedade a dimensão e motivação do conflito. Este grupo tenta intervir junto aos setores de segurança pública e órgãos do governo responsáveis pela defesa dos direitos indígenas. O discurso é de que toda violência é proveniente da ação dos indígenas, que são constantemente expostos como invasores, ladrões, assassinos e preguiçosos.
Na semana que antecedeu a realização da audiência pública, políticos e fazendeiros criaram um clima de terror na região, intimidando as autoridades e forçando a mudança da audiência para o município de São João das Missões (MG), tentando legitimar que o município de Itacarambi não faz parte do território Xakriabá. No entanto, os indígenas mantiveram posição firme e a Comissão de Direitos Humanos não se submeteu às pressões.
Ameaças e violação de direitos
Na presença das autoridades, as lideranças Xakriabá denunciaram várias ameaças direcionadas às lideranças indígenas e entregaram boletins de ocorrências apontando a origem das ameaças e os seus autores.
Para as lideranças indígenas “o direito de acesso às águas do Rio São Francisco é também elemento deste conflito. É uma questão de direito e sobrevivência do nosso povo, este direito já nos foi negado por várias décadas, temos certeza de que essas áreas pertencem ao nosso povo e não vamos aceitar nenhuma manobra política ou pressões que nos afastem deste espaço que para nós é sagrado”. As terras às margens do rio estão sendo exploradas pelo capital causando destruição e morte do Rio São Francisco.
Denunciaram ainda os gestores do município de Itacarambi pela falta de transparência na aplicação dos recursos do Ministério da Saúde, através da Secretaria Especial de Saúde Indígena, destinados ao atendimento dos indígenas. Itacarambi recebe, desde maio de 2012, o montante de R$ 60 mil mensais para atendimento a saúde do povo Xakriabá, que continua precária. A situação já foi denunciada ao Ministério Público Federal (MPF).
Em função das ameaças, os Xakriabá se afastaram de Itacarambi, onde utilizam agências bancárias para recebimento de salários e realizam compras. Este conflito obrigou os indígenas a controlar os limites e vias de acesso ao seu território proibindo a entrada de pessoas estranhas, mantendo vigília constante e monitorando todo o território.
Denúncias
A presença massiva dos indígenas na audiência demonstrou a força e a importância política do povo Xakriabá na região. As denúncias apresentadas pelos Indígenas Xakriabá preocuparam as autoridades.
Representantes das comunidades quilombolas, vazanteiros, ribeirinhos e pescadores, que também estão ameaçados pela expansão do agronegócio, estiveram presentes na audiência e denunciaram o processo violento que sofrem com a violação e negação dos seus direitos, informando que os seus territórios estão invadidos e as suas lideranças e comunidades também estão ameaçadas.
As denúncias chamaram a atenção das autoridades presentes para a gravidade da situação, apontando as estratégias utilizadas pelos fazendeiros para criminalizar a luta e negar o direito territorial do povo Xakriabá. Opositores à demarcação das áreas reivindicadas pelos Xakriabá também estiveram presentes na audiência pública. Os vereadores da Comissão Especial da Câmara de Itacarambi, criada para defender os direitos dos fazendeiros, marcaram presença. A comissão é formada pelos vereadores Alberto Lopes dos Santos ou “Bertão da Telemar” (PDT), José Henrique ou “ Zé de Orácio” (PDT) e Emerson Barbosa ou “Dr. Emerson” (PSC).
Participaram da audiência representantes da Comissão Pastoral da Terra (CPT), Centro de Agricultura Alternativa do Norte de Minas Gerais (CAA/NM), Articulação Rosalino Gomes de Povos e Comunidades Tradicionais, Articulação de Povos e Comunidades Tradicionais e Articulação Vazanteiros em Movimento do Norte de Minas Gerais.
O comando do batalhão da Polícia Militar de Januária (MG) enviou representante, o delegado da Polícia Civil da Comarca de Manga (MG) e delegado regional da Polícia Civil marcaram presença, além de representante da Advocacia-Geral da União (AGU), além do padre Ricardo representando o bispo Dom José e a paróquia de São João das Missões (MG). As lideranças Xakriabá lamentaram a ausência do MPF e da Coordenação Regional da Funai de Governador Valadares (MG).