Povo Xakriabá retoma território e sofre ameaças
Patrícia Bonilha,
de Brasília
Como vários povos indígenas Brasil afora que estão cansados de esperar que o governo federal cumpra as determinações da Constituição Federal em relação às demarcações de seus territórios tradicionais, no dia 1o de setembro, cerca de 300 indígenas Xakriabá retomaram mais uma parte do seu território tradicional. A área retomada é a Fazenda São Judas, que possui 6.000 hectares e está localizada na comunidade denominada Vargem Grande, na região do Vale do Peruaçu no município de Itacarambí, no norte de Minas Gerais.
A Fundação Nacional do Índio (Funai) iniciou os estudos de identificação dessas áreas no ano de 2007. O estudo antropológico de identificação e o levantamento fundiário das áreas reivindicadas já foram concluídos e constataram que a área é indígena. No entanto, os procedimentos de publicação e demarcação ainda não foram efetuados. Esta não publicação tem sido motivo de um acirramento dos conflitos na região. Com o objetivo de garantirem os seus direitos, os indígenas reivindicam a publicação imediata do Relatório de Identificação da TI Xakriabá e a efetiva regularização do território tradicional do seu povo.
Na tarde do dia seguinte à ocupação (2/9), o fazendeiro Pedro Luiz Cezarine, juntamente com seus dois filhos, chegaram de avião particular nas proximidades da fazenda. Neste momento o clima ficou bastante tenso pois, mesmo na presença de policiais militares, os ditos proprietários da fazenda fizeram sérias ameaças aos índios, dizendo que se eles não se retirassem de forma pacífica "a coisa poderia ficar feia".
Segundo o coordenador do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) Leste, Antônio Eduardo Cerqueira de Oliveira, a Confederação Nacional da Agricultura (CNA), que tem um escritório em Itacarambí, tem incitado os fazendeiros a reagir com violência contra os indígenas. "O processo de estudo da área e o levantamento de benfeitorias vinha caminhando com celeridade até o início de 2012 mas, a partir da investida da CNA, o processo parou", afirma ele. Oliveira conta ainda que a CNA contratou uma antropóloga para fazer um laudo contestando o relatório da própria Funai. "Este laudo foi enviado à Funai em abril deste ano. Ele foi feito pela mesma antropóloga fazendeira do Mato Grosso do Sul que fez estudos contra os Guarani Kaiowá, afirmando que as áreas que eles ocupam não é terra indígena", acrescenta.
Devido ao clima tenso, os Xakriabá solicitam a presença da Polícia Federal e da Funai na área e que medidas de segurança e proteção sejam tomadas a fim de evitar danos maiores. Eles também demandam apuração dos casos de violência ocorridos a partir de 2011, quando os conflitos se acirraram, e a melhoria do atendimento de saúde indígena.
(Com informações do Cimi Leste)
Leia abaixo a carta do povo Xakriabá:
Comunicado do Povo Xakriabá às autoridades e pedido de providências
Território Xakriabá, São João das Missões MG, 02 de Setembro 2013.
Nós, Caciques, lideranças e povo Xakriabá viemos através desta comunicar as nossas reivindicações no que se refere ao processo de demarcação das áreas reivindicadas pelo nosso povo.
Neste domingo (01), definimos pela retomada de mais uma parcela do nosso território. A área que retomamos é a Fazenda São Judas Tadeu, composta por 6.000 (seis mil) hectares no Município de Itacarambí, no norte de Minas Gerais
A Fundação Nacional do Índio (Funai) iniciou os estudos de identificação dessas áreas como parte integrante do nosso Território no ano de 2007. Desde então, o acirramento dos conflitos vem aumentando constantemente na região. Fazendeiros têm feito constantes ameaças às nossas lideranças indígenas.
O Estudo Antropológico de Identificação realizado pela Funai, juntamente com o levantamento fundiário das áreas reivindicadas já foi concluído, no entanto os procedimentos de publicação e demarcação ainda não foram efetuados.
Vivemos em constante tensão mas, infelizmente, não dispomos de alternativas a não ser lutar para garantir que os nossos direitos sejam efetivados. A morosidade dos órgãos competentes em resolver o nosso problema territorial tem nos colocado constantemente à mercê da violência e fúria de fazendeiros e do próprio Estado Brasileiro.
Não queremos violência. O que solicitamos é uma intervenção do estado de Minas Gerais e do governo federal no sentido de reparar os danos históricos causados ao nosso povo, agindo em favor dos nossos direitos e cumprindo o seu papel de acordo com o que está estabelecido na Constituição Federal nos artigos 231 e 232 e nos acordos internacionais, a exemplo da Convenção 169, da qual o Brasil é signatário.
Diante do exposto, informamos que estamos correndo riscos de vida e pedimos as seguintes providências para a demarcação de nossa terra tradicional:
Publicação imediata do Relatório de Identificação da TI Xakriabá, no sentido de efetivar o quanto antes a regularização do território Xakriabá;
Celeridade na apuração dos casos de violência ocorridos desde 2011, quando se agravaram os conflitos contra os Xakriabá;
Respeito e melhoria no atendimento e na destinação de recursos para a saúde da população indígena.