04/06/2013

Em defesa da Constituição Cidadã, em defesa dos direitos dos Povos Indígenas

Nota Pública

 

Nós, abaixo-assinados, vimos manifestar publicamente a profunda preocupação de que os direitos afirmados na Constituição de 1988, com justa razão chamada de “Constituição Cidadã”, sejam destituídos.

Por ocasião da aprovação da Constituição, o capítulo sobre os povos indígenas foi considerado por muitos como o capítulo mais avançado deste texto, por finalmente reconhecer os direitos dos povos indígenas às suas terras ancestrais.

Temos assistido, nos últimos meses, a uma série de medidas tomadas pelo governo, no sentido de impedir que os indígenas defendam seus direitos e conservem suas terras.

Ainda em 2012, o governo editou a Portaria 303, da Advocacia Geral da União (AGU), que permite passar por cima da Constituição e liberar as terras indígenas para a exploração mineral e obras públicas sem precisar ouvir as comunidades indígenas afetadas. Diante dos questionamentos e protestos dos povos indígenas, a portaria foi suspensa.

Em março deste ano o governo federal publicou o decreto 7.957, que dá poderes ao próprio governo federal, através de seus ministros de Estado, para convocar a Força Nacional em qualquer situação que avaliem necessário. Logo em seguida a Força Nacional foi enviada para a região onde se pretende construir o complexo Hidrelétrico do Tapajós e, pouco depois, para Belo Monte, para retirar os cerca de 200 indígenas de oito etnias diferentes, que ocupavam o canteiro de obras da usina.

A ocupação do canteiro pelos indígenas tem como objetivo pressionar o governo para regulamentar e implementar o direito de consulta livre, prévia e informada, previsto na Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), ratificada pelo Congresso Nacional. O governo, entretanto, tentou, por meio de nota da Secretaria Geral da Presidência da República de 6 de maio, desqualificar a manifestação indígena, levantando suspeitas e acirrando o clima de preconceito e criminalização daqueles cujos direitos deveria defender.

Além disso, o governo federal já estuda submeter a definição de áreas indígenas a pareceres da Embrapa, dos ministérios da Agricultura e Pecuária e do Desenvolvimento Agrário e chegou a suspender a demarcação de reservas indígenas no Paraná.


A Ministra Chefe da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, por sua vez, declarou, no dia 8 de maio, na Comissão de Agricultura da Câmara dos Deputados que “não podemos negar que há grupos que usam os nomes dos índios e são apegados a crenças irrealistas, que levam a contestar e tentar impedir obras essenciais ao desenvolvimento do país, como é o caso da hidrelétrica de Belo Monte”.

E acrescentou: “O governo não pode concordar com propostas irrealistas que ameaçam ferir a nossa soberania e comprometer o nosso desenvolvimento”. O governo federal atende, desta forma, os interesses expressos no Congresso Nacional, onde há uma campanha contra os direitos das comunidades tradicionais e indígenas, configurada na PEC (Proposta de Emenda Constitucional) 215, engendrada pela bancada ruralista, para transferir as atribuições constitucionais do poder executivo para o legislativo no que se refere ao reconhecimento dos territórios indígenas e quilombolas; e na proposta de CPI da FUNAI, cujo objetivo é questionar os processos demarcatórios realizados ou em curso.

Tais atitudes e declarações não condizem com o status reconhecido aos povos indígenas pela Constituição Brasileira. Já não é a primeira vez que os povos indígenas são acusados de prejudicar o "progresso" do país e que, sob pressão do agronegócio, das mineradoras ou de megaprojetos – que defendem um tipo de "desenvolvimento", fortemente danoso aos povos da região e ao meio ambiente -, se busca liberar terras indígenas da proteção que hoje a Constituição oferece.

Em 1988, encerraram-se os trabalhos da Constituinte e foi promulgada a Constituição Cidadã que, superando finalmente a legislação do regime autoritário, afirmou solenemente uma série de direitos, entre os quais, os direitos dos povos indígenas. As medidas que vêm sendo tomadas e as propostas de emenda constitucional em discussão significam um retrocesso na luta pelos direitos humanos em nosso país e o regresso a uma etapa que não podemos aceitar.

Exigimos o respeito à Constituição Federal.

Exigimos o respeito aos direitos dos povos indígenas.


Entidades que assinam esta nota:

Abong – organizações em defesa dos direitos e bens comuns

AFES – Ação Franciscana de Ecologia e Solidariedade

Articulação Popular São Francisco Vivo

Capina – Cooperação e Apoio a Projetos de Inspiração Alternativa

CEBI – Centro de Estudos Bíblicos

CENEG-GO – CENTRO DE CIDADANIA NEGRA DO ESTADO DE GOIAS

Cesep Bahia

CIMI – Conselho Indigenista Missionário

Comissão Pastoral da Terra (CPT)

Comissão Pastoral da Terra Amapá (CPT-AP)

Comissão Pastoral da Terra Bahia (CPT-BA)

Comissão Pastoral da Terra do Ceará (CPT-CE)

Comissão Pró-Índio de São Paulo (CPI-SP)

Espaço Comartilharte

FASE Bahia

Fórum Permanente de Cidadania de Colinas

Fundação Centro de Ecologia e Integração Social – Fundação CIS

Iser Assessoria – Rio de Janeiro

Jubileu Sul Brasil

Ong Resgatando o Futuro da Biodiversidade – BIOFUTURO

PACS – Políticas Alternativas Cone Sul

Pastoral da Ecologia da Arquidiocese de São Paulo

Quebradeiras de coco babaçu e o Movimento Interestadual das Quebradeiras de Coco Babaçu – MIQCB

REGEAMA – Rede de Gestão Ambiental do Maranhão

SERPAJ BRASIL

Unicafes Nacional

 

Indivíduos

Adelson Freitas Araújo

Ana Amelia

Ana Cleide Conceição da Silva – Coordenação do FCColinas

Antonio Canuto

Carolina Maria Heliodora de Goes Araujo Feijo Braga

Célia Regina Ody Bernardes – Juíza Federal Substituta, Brasília/DF

Dimas Fonseca Pereira

Dina Pereira da Silva – Conselheira Estadual de Segurança Alimentar e Nutricional do Maranhão

Eliel Freitas Jr

Ermelinda Maria Dias Coelho – Conselheira da Ouvidoria da Defensoria Pública do Estado do Maranhão

Filipe Duarte

José Wasensteiner

Lori Luci Brandt Dalla Porta – Ong Resgatando o Futuro da Biodiversidade – BIOFUTURO

Maria Jalva Costa Braga – Assistente social, Pará

Maria L. de Castro Fisher

Nadja Faraone

Nilton de Almeida

Prof. Pedro de Almeida Costa

Pierina German Castelli

Raimundo Nonato Barroso Oliveira – Conselheiro Estadual de Segurança Alimentar e Nutricional do Maranhão e, Presidente do Conselho Comunitário de Segurança de Colinas, Conselheiro da Ouvidoria da Defensoria Pública do Estado do Maranhão;

Roberto T. Trogiani Filho – Consultor em Gestão Ambiental

Ruben Siqueira – CPT Bahia

Walter Santos

 

Fonte: Abong
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