Documento Final – 9º Encontro em Memória de Sepé Tiaraju
Foto: Cimi Equipe Florianópolis |
São Gabriel, RS, 07 de fevereiro de 2013.
Nós, representantes e lideranças das comunidades Guarani do Rio Grande do Sul, Paraná, Santa Catarina, Mato Grosso do Sul, juntamente com o Conselho de Articulação do Povo Guarani (CAPG) e com o Conselho Continental do Povo Guarani, reunidas no 9º Encontro em Memória de Sepé Tiaraju, nos dirigimos às autoridades públicas para denunciar os graves problemas que nossas comunidades enfrentam e ao mesmo tempo cobrar das autoridades o cumprimento de nossos direitos constitucionais.
Nossos caciques e lideranças relatam que as comunidades de Irapuá, Arroio Divisa, Petim, Passo Grande, Passo da Estância, Lami, Estiva, Capivari e Capi Ovy vivem em acampamentos na beira das estradas. Há falta de água, saneamento básico, falta de assistência em educação e saúde e principalmente faltam o alimento e as condições para plantar e produzir porque vivem sem terra.
Nossos líderes religiosos estão muito preocupados porque as crianças e os jovens são os que mais sofrem e correm o risco de serem agredidos em sua cultura em função da falta de terra e pelo descaso das autoridades. Não há espaço físico para viver porque habitamos entre as cercas e as rodovias. Nesses lugares, as comunidades convivem com o intenso tráfego de veículos que amedronta e trás muita insegurança.
Foto: Cimi Equipe Florianópolis |
Preocupa-nos o fato de a Funai demorar muitos anos para demarcar uma terra indígena. Enquanto os técnicos e funcionários demoram décadas para demarcar uma terra, as nossas famílias sofrem uma situação desumana nos acampamentos de beira de estrada. Estamos preocupados porque as autoridades prometem que vão resolver os problemas, quando na verdade nada passa de promessas.
Nossas lideranças fazem estas denúncias porque vivem essa realidade todos os dias. As terras que estão sendo demarcadas pela Funai não avançam. Os exemplos que temos são inúmeros. A terra Mato Preto esta em demarcação há mais de 13 anos e até o momento as nossas famílias não conseguiram viver na terra que se encontra
A Funai tem demorado muito nos trabalhos de demarcação das terras de Itapuã, Ponta da Formiga, Morro do Coco, Petim, Passo Grande e Arroio do Conde. No final do ano passado a Funai deu início ao Grupo de Trabalho para a demarcação das terras da Estiva, Capivari, Lami e Lomba do Pinheiro. Nós, lideranças, exigimos que estes estudos sejam feitos com mais rapidez, porque nossas famílias passam por muito sofrimento sem a terra para viver.
As lideranças Guarani que vivem na região oeste e centro-oeste do Paraná, municípios de Guaíra, onde existem nove acampamentos, Terra Rocha, onde existem quatro acampamentos, Santa Helena, um acampamento e Matelândia, um acampamento, denunciam que a Funai iniciou um Grupo de Trabalho para a demarcação das terras, mas este foi paralisado e as informações levantadas pelos antropólogos não foram entregues para o órgão indigenista. As famílias indígenas estão sendo ameaçadas através dos meios de comunicação com discursos anti-indígenas, a exemplo da frase: “Invasões indígenas não combinam com ordem e progresso” – escrita em faixas espalhadas pelos municípios da região, até mesmo nas localidades onde não existem acampamentos, em todos os municípios e há inclusive ordem judicial de despejo de comunidades que vivem nestas regiões. Três acampamentos – Tekoa Porã, Tekoa Y Hovy no município de Guaira, Tekoa Araguaju no município de Terra Roxa já receberam ordem de despejo.
Nós, lideranças presentes no encontro, exigimos que a presidência da Funai tome medidas no sentido de coibir as violências e crie um Grupo de Trabalho para realizar os estudos de demarcação das terras e ao mesmo tempo apresente recursos para derrubar as ordens de despejo.
Quanto à questão da educação escolar indígena, nossas lideranças exigem maior participação nas discussões referentes aos territórios etno-educacionais, afim de garantir um projeto de educação que garanta nossas especificidades, coisa que até o momento não ocorre, pois tudo fica centralizado nas secretarias estadual e municipal de Educação.
Queremos ainda manifestar neste documento o total repúdio de nossas lideranças e comunidades a PEC 215/2006 e a Portaria 303 da Advocacia Geral da União, considerando que estas medidas são um retrocesso histórico para os povos indígenas, inviabilizando o processo de demarcação e acabando com o usufruto exclusivo de nossas terras, sendo este um desrespeito a todas as gerações passadas e seus sacrifícios para conquistar os direitos que hoje se encontram na Constituição, nas resoluções e nas leis brasileiras.
Diante destas realidades de negação dos nossos direitos e das violências que sofremos nas diferentes regiões do Brasil, exigimos que as autoridades responsáveis pela política indigenista (Presidência da República, Ministério da Justiça, Ministério da Saúde, Funai e SESAI) respeitem os nossos direitos cumprindo a Constituição Federal e implemente uma política que assegure assistência digna e a demarcação e usufruto de todas as nossas terras.
Assinam as lideranças presentes no encontro.