Depois de protesto, indígenas conseguem entrar na Rio+20 para entregar reivindicações
Renato Santana,
do Rio de Janeiro
Apesar de estar ao lado da entrada do Riocentro, local escolhido para sediar a Rio+20, na zona oeste do Rio de Janeiro, a direção da manifestação organizada pela Cúpula dos Povos na Vila Autódromo, com o objetivo de protestar contra a remoção do bairro, decidiu que as cerca de 2 mil pessoas ficariam apenas nela, rodeando quarteirões sob discursos que tomavam vielas, residências e nem de perto chegavam às delegações estrangeiras do encontro de chefes de Estado na Rio+20 – em ônibus e carros de luxo amparados pelos zelosos fuzis do Exército.
O protesto parecia ser simbólico: do sambódromo, onde os grupos e organizações estão alojados, 20 ônibus seguiram escoltados por batedores da Polícia do Exército até a Vila Autódromo. Trajeto e quantidade de pessoas estavam previamente acordados. Ações mais radicais não passavam do abuso de exclamações pontuando os discursos. Os indígenas do Acampamento Terra Livre, porém, decidiram por fim ao falatório e partir para o Riocentro. A partir disso, tudo mudou.
À frente do grupo composto por cerca de 200 indígenas, o povo Kayapó era liderado pelo cacique Raoni. De borduna na mão, bradava contra quem se pusesse no caminho da marcha. Com gritos contra a construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, os indígenas pisaram forte e a correria foi grande: assessores do governo federal, integrantes da direção da manifestação “acordada” e da Cúpula tentavam dissuadir as lideranças indígenas. Em vão.
“Não tem acordo para nosso povo, que está morrendo, tendo as terras invadidas e a natureza destruída. Nós vamos seguir. Se não quiserem ir, que fiquem”, disse uma das lideranças indígenas a dirigente da manifestação que tenta os fazer mudar de opinião.
Enquanto os indígenas marchavam, helicópteros do Exército passaram a dar rasantes e bem ao fundo se via o vulto da grande quantidade de soldados das Forças Armadas, tropa de choque e tanque de guerra. Aos poucos outros grupos passaram a cerrar fileiras com os indígenas: movimentos por moradia, de juventude, trabalhadores e toda uma gama de organizações que representam os mais prejudicados pelas ideias de sustentabilidade dos chefes de Estado da Rio+20.
De todas as formas tentavam barrar os indígenas. Faltando pouco para a manifestação chegar onde o aparato militar estava, bandeirões e faixas tentaram ser postas na frente da marcha. Cacique Raoni, à bordunadas, tirou de seu caminho os materiais e passou a correr, sob os gritos Kayapó e dos demais povos presentes. A tensão tomou conta e o risco iminente de enfrentamento entre manifestantes e Exército cessou com a parada do grupo, às margens do cercado de ferro que separava o protesto da repressão estatal.
O grupo ficou por ali até a chegada do ministro da Secretaria Geral da Presidência da República, Gilberto Carvalho. Pressionado, o ministro cedeu e garantiu a entrada de uma comissão nesta quinta-feira, 21, à Rio+20 com carta de reivindicações a ser encaminhada aos chefes de Estado. Com a garantia, os indígenas decidiram abortar o enfrentamento e retornaram para a Cúpula.