08/09/2011

Informe nº 980: MPF trata ataques contra indígenas no MS como genocídio e formação de milícia

Renato Santana

Cimi, de Brasília

 

Os jovens e adultos conseguiram fugir pela mata; crianças, mulheres e idosos não. Com munição contra tumultos calibre 12, usada pelo aparato repressivo do Estado, ou seja, as polícias, indivíduos não identificados atacaram acampamento Guarani-Kaiowá às margens de uma estrada vicinal no município de Iguatemi, sul do Mato Grosso do Sul (MS). O Ministério Público Federal (MPF) pediu abertura de inquérito e trata o caso como genocídio – violência motivada por questões étnicas – e formação de milícia.  

 

As imagens impressionam: uma criança com marcas de degola, idosos marcados pelas balas de borracha, mulheres queimadas, acampamento e alimentos incendiados, roupas rasgadas, chinelos e sapatos deixados pelo desespero da fuga, olhares de medo e desolação. “A 300 metros do local vimos as barracas queimando e muito choro”, disse uma das lideranças Guarani-Kaiowá.

 

Sem ter para onde ir, o grupo, composto por cerca de 50 indivíduos, voltou para o acampamento apesar do receio de novos ataques. Conforme relatos, dois caminhões pararam no acostamento da estrada e homens desceram atirando. Gritavam que tudo deveria ser queimado e que os indígenas deveriam ser amarrados. No momento, todos os Guarani-Kaiowá rezavam. O desespero tomou conta e a covardia dos pistoleiros não permitiu defesa.

 

Choro. Faroletes lançados no rosto dos indígenas. Agressões. Tiros. Destruição. O MPF trabalha com a hipótese de formação de milícia armada. A área reivindicada pelo grupo Guarani-Kaiowá é conhecida como Puelito Kue e já foi estudada pelos antropólogos da Funai. O relatório, cuja publicação é uma das fases da demarcação de terras indígenas, está em fase final de redação.

 

Ataque não é novidade

 

No MS vive a segunda maior população indígena do país, com cerca de 70 mil indígenas de vários povos. Desde 2007, a Fundação Nacional do Índio (Funai) não cumpre Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) que trata da demarcação das terras indígenas. A situação é de completo descaso por parte do Governo Federal – que este ano ainda não homologou sequer uma terra indígena em todo país.

 

A morosidade na demarcação e o desdém das autoridades do governo Dilma Roussef quanto à vida dos indígenas faz com que o recente ataque não seja exceção. Em setembro de 2003, no mesmo acampamento, os indígenas foram desalojados com violência por grupo de pistoleiros e em 2009 novamente foram obrigados a se retirar do local: amarrados, foram abandonados longe do acampamento e o indígena Arcelino Oliveira Teixeira está até hoje desaparecido.

 

Para garantir a segurança, os Guarani-Kaiowá atravessam um rio segurando-se num arame – cerca de 50 metros de uma margem para a outra – para se proteger da suspeita milícia organizada para praticar o genocídio contra a população originária.

 

Em nota, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) se pronunciou dizendo que “a Aty Guassu, a APIB e demais organizações indígenas estão monitorando a situação e exigem providências urgentes da FUNAI, Ministério Público e outras autoridades responsáveis, para que mais uma tragédia não se repita em Mato Grosso do Sul”.

 

Agosto de sangue

 

O último mês foi de muita violência contra as populações indígenas brasileiras.

 

Na madrugada do último 26 de agosto, por volta de 2 horas, a indígena Conceição Krion Canela, do povo Canela Ramkokamekrá, de 51 anos, foi encontrada morta a pauladas. A atrocidade aconteceu no Povoado Escondido, interior de Barra do Corda, Maranhão.

 

A indígena não residia na aldeia Ponto, onde vive seu povo, mas no povoado aonde ocorreu o homicídio. Conceição fora violentada sexualmente, e de acordo com a polícia da região, foi assassinada porque reagiu à violência. O povo Kanela Ramkokamekrá abalou-se com tamanha atrocidade.

 

Um outro indígena foi executado a golpes de terçado, na aldeia Poyanawa, município de Mâncio Lima, Acre (AC), e um jovem indígena de 18 anos foi assassinado a golpes de facão por três não indígenas em Dourados, no Mato Grosso do Sul (MS).

 

Fonte: Cimi
Share this:
Tags: