“Bem Viver, alternativa ao modelo desenvolvimentista”
“Ser rico, não é ter mais, mas necessitar menos”.
Com mentes e corações militantes, estivemos reunidos/as nos dias
O processo colonizatório da Amazônia, iniciado na década de 60, foi marcado pelo avanço das frentes econômicas caracterizado pela construção de rodovias, hidrelétricas e do avanço do agronegócio sobre territórios dos povos indígenas e comunidades tradicionais, afetando toda a biodiversidade e estes povos que dela dependem para sua sobrevivência.
Na década de 70, as investidas mais sérias foram a abertura de estradas, rodovias e projetos de mineração. Nos anos 80, surge a tragédia decorrente da construção das hidrelétricas de Balbina, Samuel e Tucuruí.
Na década de 90 entre outros empreendimentos, a rota de saída para o Pacífico concretiza a estratégia de exportação de soja, madeira e minério.
Atualmente, se Belo Monte se constitui como “questão de honra” para o governo, numerosas PCHs se enfileiram ao longo dos rios Juruena, Madeira, Teles Pires, Tapajós, além das hidrovias do Araguaia, do Madeira e do gasoduto de Manaus, todos estes empreendimentos visando a exploração da natureza para a acumulação e reprodução do capital.
Na época da ditadura militar o imperativo era “limpar o território”, e em consequência, aconteceram os maiores genocídios da história praticados contra povos indígenas. Estas mesmas práticas se repetem hoje, por responsabilidade do próprio governo brasileiro que, através da FUNAI, sistematicamente nega a identidade de povos que aqui vivem há milênios e entrava os processos demarcatórios dos territórios tradicionais.
Os Povos Indígenas não se cansam de elencar uma série de denúncias contra a violação de seus direitos garantidos pela Constituição Federal assim como pela Convenção 169 da OIT. As denúncias se referem à invasão de seus territórios que afetam diretamente a manutenção do modo de vida de cada povo. É gritante o descaso na atenção à saúde indígena, constatando-se uma série de óbitos que ocorrem cotidianamente na região amazônica, e nas demais regiões do Brasil, a exemplo do que ocorre no Vale do Javari, por omissão do Estado.
Em toda a Amazônia, o risco de vida que atinge as diferentes etnias vem afetando com maior intensidade os mais de 90 povos isolados, que continuam sendo alvo de inúmeras invasões e frequentes massacres.
A luta pela integridade do território constitui-se como o eixo que desencadeia os processos de criminalização, cooptação e violência contra os povos e suas lideranças. Nesta perspectiva, a ausência de uma política em relação às fronteiras, provoca uma série de problemas para as comunidades que vivem nestas regiões.
Este conjunto de ameaças à integridade física, cultural e territorial atenta contra os projetos de vida de cada povo, incidindo diretamente nas condições imprescindíveis ao seu Bem Viver.
Para os povos indígenas é fundamental a garantia de seus territórios demarcados como condição imprescindível para o fortalecimento de seu projeto de Bem Viver, entendido como um relacionamento harmonioso consigo mesmo, com os outros e com a natureza, valorizando os saberes e fazeres ancestrais, construindo coletivamente a utopia da Terra Sem Males, a partir de suas próprias cosmovisões.
De forma cada vez mais intensa os povos compreendem o valor da organização e da unificação de suas lutas nas diferentes regiões e além fronteiras. São importantes as alianças com outros setores, que a partir de suas experiências e reflexões, proporcionam outro mundo possível, mais sóbrio, sem desperdícios e mais solidário, para que todos e todas compartilhem o Bem Viver.
Questionados/as por esta realidade e inspirados/as pela proposta do Bem Viver, que está emergindo também entre outros povos do mundo, nos comprometemos a rever nossas próprias atitudes de vida e, no cotidiano de nossa convivência com os povos indígenas, contribuir no processo de construção do Bem Viver como alternativa ao modelo desenvolvimentista, pois o Bem Viver nasce de profundas raízes, estando aquém e além dos modelos preconizados pelos sistemas capitalista e socialista.
Este seminário reacendeu em nós sonhos de mística e militância que queremos partilhar, em consonância com a experiência dos povos indígenas que, apesar da secular violência, celebram a VIDA.
Porto Velho, 15 de junho de 2.011.