Mordendo na língua
Retirada decidida. Procuradores da república, atuando no júri dos acusados pelo assassinato do líder indígena Marcos Verón, deixam o recinto do julgamento. Entendem que a negativa da juíza Paula Mantovani Avelino, dos Guarani se expressarem em guarani fere a Constituição e normas internacionais do qual o Brasil é signatário: “A decisão da juíza de não ouvir os indígenas em sua língua materna fere os artigos 231 e 210 da Constituição Federal, bem como diversas convenções internacionais, como o artigo 2º da Declaração Universal dos Direitos Humanos e a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), entre outros.
O artigo 27, parte II, do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, determina que ‘nos estados em que haja minorias étnicas, religiosas ou linguísticas, as pessoas pertencentes a essas minorias não poderão ser privadas do direito de ter, conjuntamente com outros membros de seu grupo, sua própria vida cultural, de professar e praticar sua própria religião e usar sua própria língua’.
O artigo 12 da Convenção 169 da OIT é expresso neste sentido: ‘Os povos interessados deverão ter proteção contra a violação de seus direitos e poder iniciar procedimentos legais, seja pessoalmente, seja mediante os seus organismos representativos, para assegurar o respeito efetivo desses direitos. Deverão ser adotadas medidas para garantir que os membros desses povos possam compreender e se fazer compreender em procedimentos legais, facilitando para eles, se for necessário, intérpretes ou outros meios eficazes".
Língua Guarani
O Guarani é uma das três línguas oficiais do Mercosul, juntamente com o espanhol e o português. Hoje a língua guarani é falada por mais de 300 mil Guarani, espalhados em cinco países da América do Sul. Além disso é língua oficial no Paraguai, onde talvez seja mais falada do que o espanhol. Para os Guarani, divididos em vários povos com suas variações lingüísticas, esse é um dos patrimônios culturais que mais prezam e preservam.
Porque não poderiam os Guarani se expressar em guarani, onde são testemunhas de acusação? Porque falam português? Quem conhece os Guarani sabe o quanto eles prezam as palavras, as falas e como expressam com precisão seus sentimentos, observações, fatos, acontecimentos. Porque então lhes negar a possibilidade de se manifestarem em sua própria língua?. Deveríamos nos orgulhar em proceder de tal forma, vencendo preconceitos históricos e começando por aí a fazer justiça aos que sempre tiveram seus direitos fundamentais negados. Porém os culpados tem medo. Medo de que a verdade venha a tona com mais clareza e precisão. Talvez temam que os atos de violência praticados contra a comunidade Kaiowá Guarani de Takuara, imirjam com mais força.
Quem sabe em breve possa ser reiniciado o julgamento com as testemunhas de acusação, indígenas Kaiowá Guarani, se expressando legalmente em guarani.
Egon Heck – Movimento Povo Guarani Grande Povo, 5 de maio de 2010
Leia também: