01/12/2009

Carta aberta sobre os acontecimentos no rio Arapiuns

“Os povos indígenas têm o direito de determinar sua própria identidade ou pertencimento étnico, conforme seus costumes e tradições, isso não impossibilita o direito das pessoas indígenas em obter a cidadania dos Estados em que vivem”. – Declaração da ONU sobre os Direitos dos Povos Indígenas – Nações Unidas, 13 de Setembro de 2007, artigo 33.

 

Nós, membros do Conselho Diocesano de Pastoral da Diocese de Santarém, reunidos nos dias 20 e 21 de novembro no Centro de Formação Emaús, Santarém, depois de uma reflexão sobre os últimos acontecimentos ocorridos no Rio Arapiuns, vimos, por este meio, manifestar nosso total apoio à luta das comunidades do Rio Arapiuns pela preservação de sua biodiversidade e identidade cultural e manifestamos nosso repúdio à forma como o Estado do Pará trata a população local e ao modo como alguns meios de comunicação mostraram os acontecimentos.

 

Diante da gravidade da situação declaramos:

 

1. Reconhecemos que as comunidades do rio Arapiuns são compostas de comunidades indígenas e povos tradicionais e, como tal, devem ser reconhecidos como “grupos culturalmente diferenciados e que se reconhecem como tais, que possuem formas próprias de organização social, que ocupam e usam territórios e recursos naturais como condição para sua reprodução cultural, social, religiosa, ancestral e econômica, utilizando conhecimentos, inovações e práticas gerados e transmitidos pela tradição”.

 

2. Reconhecemos que o desmatamento, a exploração madeireira, o cultivo da soja e a pecuária extensiva representam alguns dos grandes problemas que desestabilizam este mundo cultural.

 

3. Temos a convicção de que estas populações utilizam os recursos provenientes da cobertura florestal e usam os recursos no presente sem comprometer o futuro e que esta relação de dependência entre os comunitários e a floresta torna as populações tradicionais mais vulneráveis à ação externa, transformando-as nas principais vítimas da destruição do meio ambiente, ocasionada pela cultura exploratória que impera na Amazônia.

 

4. Apesar de o governo brasileiro ter manifestado o compromisso de avançar na proteção dos direitos dos povos indígenas e tradicionais, de acordo com parâmetros internacionais e com base no apoio do País à Convenção da Organização Internacional do Trabalho (OIT) para esses povos e à Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas sentimos que ainda faltam  esforços e ações públicas que garantam a autodeterminação dessas populações, no sentido de permitir-lhes o controle de suas próprias vidas, de suas comunidades e de suas terras.

 

5. Repudiamos a ação do Governo do Estado do Pará que até agora permitiu que os direitos dessas comunidades sobre a terra e sobre os recursos naturais disponíveis nela sejam frequentemente ameaçados de invasões e ocupações indevidas. A ocupação das terras dos povos tradicionais do Arapiuns em busca da extração de recursos naturais tem causado diversos problemas às comunidades, incluindo insegurança e violência.

 

6. Repudiamos a cobertura dos acontecimentos feita por alguns meios de comunicação que usaram de parcialidade e nunca deram os meios de resposta à população do Arapiuns, tratando inclusive os manifestantes de vândalos e criminosos.

 

7. Repudiamos a tentativa de difamação contra membros da Igreja que são apresentados como responsáveis pelo processo de “inventar a existência de índios na região”. Lembramos que Frei Florêncio OFM é filho da região e doutor em Antropologia e sociologia e, portanto, tem mais elementos para fazer uma análise antropológica dos povos da região do que alguns “investigadores” de plantão.

 

 Finalmente recomendamos vivamente:

 

1. O respeito às questões indígenas e a necessidade de respeito total à diversidade cultural.

 

2. Que o governo do Estado do Pará garanta que as comunidades do Rio Arapiuns tenham pleno controle sobre as terras e os recursos naturais que fazem parte dela. Para isso a Convenção 169 da OIT, assinada pelo governo brasileiro em 2004, deve ser observada e respeitada.

 

Conselho Diocesano de Pastoral da Diocese de Santarém

PSACOM/DIOCESE DE SANTARÉM

Fonte: Conselho Diocesano de Pastoral da Diocese de Santarém
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