Em carta, Conselho de Caciques Pataxó afirma que ação policial na TI Barra Velha é uma retaliação à luta pela terra
Conselho aponta ações milicianas de corte de energia e ameaças como preparativos para a operação que levou terror e detenções às aldeias, deixando ao menos um ferido a tiro

Ritual Pataxó em retomada na TI Barra Velha do Monte Pascoal. Foto: Maiara Dourado/Cimi
O Conselho de caciques Pataxó da Terra Indígena Barra Velha divulgou na noite desta quinta-feira (20) uma carta onde questiona: por que e a serviço de quem as forças de segurança do Estado da Bahia estão atacando as aldeias Pataxó no município de Prado?
Durante a manhã e tarde desta quinta, 12 mandados de prisão e sete mandados de busca e apreensão foram cumpridos no município de Prado, no extremo-sul da Bahia, pelas polícias civil e militar.
Para os Pataxó, a operação é uma “movimentação além de suspeita, estranha e com cara de retaliação ao movimento das nossas lideranças junto à PGR (Procuradoria Geral da República), em Brasília, pode ser constatada na ação de alguns fazendeiros conhecidos por sua oposição às nossas lutas”.
Conforme apuração atualizada do Conselho, na medida em que a Secretaria de Segurança Pública da Bahia não concedeu informações, 14 indígenas foram detidos e levados para o município de Teixeira de Freitas, sendo que cinco foram soltos no final da tarde de ontem.
No entanto, o número de presos pode chegar a 19: de acordo com a organização Pataxó, 25 indígenas estavam desaparecidos após a primeira parte da operação.
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“Temos o direito de saber oficialmente quantos foram presos, em que local estão. Tem um pessoal nos ajudando a saber, mas a Segurança Pública deveria nos informar”, protesta uma liderança do Conselho de Caciques que não será identificada por razões de segurança.
A operação, programada para três dias, acontece dias depois de mobilizações dos Pataxó em Brasília (DF) e na região pela regularização dos territórios reivindicados.
Leia a carta do Conselho de Caciques na íntegra:
CONSELHO DE CACIQUES DA T.I BARRA VELHA
Por Que e a Serviço de Quem, as Forças de Segurança do Estado da Bahia estão Atacando Nossas Aldeias e Nossos Parentes Pataxó de Monte Pascoal e arredores do litoral de Prado?
Nós, lideranças e caciques associados ao Conselho de Cacique do Território Barra Velha e das aldeias e comunidades da Terra Indígena Comexatiba, vimos pedir urgência urgentíssima para as providências cabíveis à grave situação e fatos que vêm ocorrendo no município de Prado na fronteira entre Porto Seguro, Itabela e Itamarajú. Com severas consequências, envolvendo dezenas de prisões e sérios prejuízos para nossos parentes, lideranças, suas comunidades e Terras Indígenas das aldeias e comunidades do Pé do Monte Pascoal e da fronteira intermunicipal que contorna seu entorno, principalmente, na região de Corumbau/Corumbauzinho, no município de Prado, onde somos mais numerosos.
Uma operação policial envolvendo mais de 20 viaturas, alguns helicópteros e drones das forças de segurança das polícias civil e militar do estado da Bahia, foi deflagrada com pelo menos, duas dezenas de pedidos de prisões assinados pelo juiz da Comarca do Município de Prado, Gustavo Vargas Quinamo, desde as primeiras horas do dia de hoje, 20 de março de 2025. Dentre os quais, alguns mandados de prisão sem identificação ou especificação, com o seguinte registro: Pedido de prisão temporária – acusado desconhecido. Sob ameaças contra crianças e idosos, apontando armas de alto calibre seguem tocando o terror em toda faixa fronteiriça das duas Terras Indígenas: Barra Velha e Comexatiba.
Considerada a urgência para soltura e liberação, relacionamos os nomes dos parentes aprisionados e com mandado de prisão que foram abordados, somente, no dia de hoje. 1) Diones Santos Costa; 2) Inaran Braz Machado; 3) Cacique Wender; 4) Antônio José Ribeiro de Souza; 5) Nilson Berg Fonseca; 6) Jovino Braz Machado; 7) Adriano Tavares de Almeida; 8) José Mateus Silva Oliveira; 6) Jailton Mota dos Santos; 7) Rogério Fonseca Silva; 8) Nauan Braz Fonseca; 9) Irineu Cardoso Borges; 10) Jônata Mota dos Santos; 11) Tawan Braz Fonseca; 12) Pedro Ferreira Braz; 13) Joatan Braz Machado; 14) Ianderson Pires do Couto; 15) Alessandro Santos da Cruz 16) Kaiuâ Gomes Freitas Pataxó; 17) Kauã Gomes Freitas Pataxó; 18) Joatan Pereira da Conceição; 19- Cacique Aricuri Ferreira dos Santos.
Os preparativos para este ataque inexplicado e obscura operação, pudemos sentir, após o assassinato do parente Vítor Braz, no dia 11 de março de 2025, véspera da audiência pública realizada pela PGR em Brasília, com participação de todas as nossas lideranças Pataxó e Tupinambá, em 12/03/2025. A comunidade foi invadida por um grupo fortemente armado, que já chegou no território cortando previamente a energia elétrica da aldeia Terra à Vista e já entrou atirando. Feriram um parente que foi para o hospital e atingiu fatalmente o parente Vítor Braz.
Uma movimentação além de suspeita, estranha e com cara de retaliação ao movimento das nossas lideranças junto ao PGR, em Brasília, pode ser constatada na ação de alguns fazendeiros conhecidos por sua oposição às nossas lutas e direito à terra; alguns vereadores declaradamente adversários da demarcação das terras indígenas; produtores e disseminadores de fakenews de alcance local e regional, contra as comunidades e lideranças Pataxó. Fazendo-nos crer e para espanto da sociedade regional que, uma série de invasões e saques da produção agrícola municipal estavam acontecendo. Se aproveitaram do assassinato do parente ocorrido na ausência de nossas organizações e lideranças que estavam em Brasília, tomando para seus próprios interesses, reiterados pedidos de providências. Não, para que o crime fosse esclarecido e o(s) assassino(s) preso(s), mas, reivindicando proteção para os supostos fazendeiros, potenciais agressores já denunciados em outros documentos protocolados, que diziam nas inúmeras entrevistas e vídeos que criaram para difundir o pânico geral, dizendo que se sentem ameaçados de que suas terras venham ser invadidas e sua produção roubada, subtraída.
Numa matéria jornalista apareceu o número de 81 supostas invasões ocorridas nesta região. Informações, esta e outras não encontram sustentação na realidade e não passam de factoides para normalizar e justificar esse horror sem nome, sob comando das próprias forças de estado. Pior, articulada pela presidente da Câmara Municipal de Prado, a Sra. Luciana Pires. Uma ação que para ser compreendida, torna-se necessário observar que no dia anterior, dia 19, mais uma audiência pública direcionada para atender as exigências dos fazendeiros e políticos locais, em litígio com nossas terras, foi realizada, após convocada explicitamente para este setor e suas finalidades, sob a liderança da citada vereadora que ignorou e vetou totalmente nossos interesses, pontos de vista, versão e participação no referido evento (conforme postagem, em anexo). Que, sem observância da Convenção 169 e da Constituição, sob a citada liderança, contou com os seguintes participantes, co-autore(a)s nesta famigerada ação, sem nossa presença.
A reunião com o secretário de segurança pública e os proprietários rurais de Prado, incluindo fazendeiros e especuladores de terras do litoral, foi realizada no Clube de Diretores Logistas (CDL) de Teixeira de Freitas, na última quarta-feira, 19 de março de 2025. Estiveram presentes, entre outras autoridades, além do Secretário Estadual de Segurança Pública, o Sr. Marcelo Werner Derchum os Deputados Estaduais Leandro de Jesus e Diego Castro (PL); a Vereadora e presidenta da Câmara Municipal de Vereadores de Prado (PSD), a Sra. Luciana Pires; Vereador Max Casa Grande (Solidariedade); o prefeito municipal de Prado Sr. Gilvan da Silva Santos (PSD), o vice-prefeito Carlos Magalhães (PT).
Alguns acontecimentos que demonstram toda a articulação que se formou entre as elites locais para nos excluir da discussão e decisões que dizem respeito aos nossos direitos na última semana.
- Dia 11 apresentação do anteprojeto legislativo ‘Invasão ZERO’ no Município de Prado pelo vereador Dr. Wanderson Rocha Leite; Momento de efusivos discursos anti-indígenas foram proferidos dentre eles do vereador Brenio Pires, o mais agressivo;
- Reunião entre a presidente da Câmara e o Comando das Forças Regionais (neste mesmo dia Vitor Braz foi assassinado. Excelentíssimo senhores e senhoras nossa luta é secular muito antepassado já se foram no caminho, em 1951 aconteceu o grande Massacre na Aldeia Barra Velha (Fogo de 51) tentaram tirar e expulsar nosso povo do Território, agora em 2025, 74 anos depois no Brasil em plena democracia mais outros massacres acontece. Neste novamente com a ajuda do Estado querendo nos calar fazendo nos desisti dos nossos direitos, mas nós não vamos nos calar, não vamos desistir, vamos resistir;
- Dia 13 – Radialista Carlos Brito veicula seu programa “café rural”, diretamente da fazenda do Sr. Djalma Galão, principal oponente que disputa com uso de violência, frações de nosso território.
Com base no exposto acima vimos solicitar a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), Ministério dos Povos Indígenas (MPI), defensoria Pública da União (DPU), Ministério Público Federal (MPF e a Imprensa e Sociedade Brasileira atenção para os fatos e crimes praticado contra nossas comunidades e lideranças. Que seja apurado e responsabilizados os agentes públicos e políticos envolvidos nessa operação; inclusive a inobservância e respeito aos nossos direitos. Bem como as violações contra os direitos das crianças e das pessoas mais vulneráveis e vitimadas da violência que estamos sofrendo.
Que sejam apuradas todas as denúncias difamatórias e caluniosas com o objetivo de criminalizar nossos parentes através dos veículos de comunicação regional.
T.I Barra Velha – BA 20 de março de 2025