26/03/2025

Comissão Guarani da Verdade se manifesta sobre a compra de terras aos Avá-Guarani com recursos da Itaipu

“Que seja apenas o começo das reparações”, afirma a Comissão em Carta Manifesto divulgada no último domingo (23)

Assembleia geral da Comissão Guarani Yvyrupa. Foto: Cimi Regional Sul.

Por Assessoria de Comunicação do Cimi

A Comissão Guarani da Verdade (CGD) tornou pública uma carta, no último domingo (23), onde manifesta sua posição sobre a destinação de recursos da Itaipu Binacional para a compra de 3 mil hectares de terra para o povo Guarani na região Oeste do Paraná. “Que seja apenas o começo das reparações”, afirmam a Comissão criada em 2015 com objetivos promover a reparação pelas graves violações registradas contra os indígenas ao longo de décadas na região.

“Foram muitos anos de espera, de manifestações e documentos pedindo que as reparações ocorressem. Tivemos que pedir ao Ministério Público Federal para ingressar com uma Ação Civil Originária na Suprema Corte [ACO 3555], porque havíamos perdido as esperanças da Binacional reconhecer a dívida histórica”, listam o documento.

Criada com o objetivo de responsabilizar a União, Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e a Itaipu Binacional pelos danos irreversíveis causados às comunidades indígenas, a Ação Cível Originária (ACO) 3555 foi ajuizada no Supremo Tribunal Federal (STF) pela Procuradoria-Geral da República (PGR), em 2021. Em março deste ano, foi homologado um acordo de conciliação que estabelece a aquisição de terras pelo Itaipu e outras medidas para garantir os direitos dos Avá-Guarani no Oeste do Paraná.

“Hoje estamos colhendo os resultados desse trabalho”, mas diante do contexto atual em que os povos indígenas vivem no país, a Comissão Guarani da Verdade manifesta sua posição em relação ao tema elencando dez pontos, entre eles: “Esperamos que essa compra não se transforme novamente em um provisório/permanente, como ocorreu com o Ocoy”. Também cobram que a ACO 3555 não seja extinta, “ela precisa seguir” para que os Avá-Guarani não mais “tratados com violência e preconceito”.

A Comissão Guarani da Verdade cobra ainda “que sejam criadas medidas especiais de reparação às pessoas e famílias que foram violentamente removidas pelos atos da Funai, Incra e Itaipu, com fundos reparadores permanentes”.

Confira a carta manifesto na íntegra:

 

“QUE SEJA APENAS O COMEÇO DAS REPARAÇÕES”:
Manifestação da Comissão Guarani da Verdade sobre a compra de 3 mil hectares com verbas da Itaipu

A Comissão Guarani da Verdade (CGD) criada em 2015, após a publicação do relatório final da Comissão Nacional da Verdade (10/12/2014) vem a público manifestar sua posição sobre a destinação de verba para a compra de 3 mil hectares de terra para o povo Guarani na região Oeste do Paraná.

Foram muitos anos de espera, de manifestações e documentos pedindo que as reparações ocorressem. Tivemos que pedir ao Ministério Público Federal para ingressar com uma Ação Civil Originária na Suprema Corte, porque havíamos perdido as esperanças da Binacional reconhecer a dívida histórica. Hoje estamos colhendo os resultados desse trabalho.

Diante do contexto atual manifestamos a seguinte posição:

1 – Ficamos felizes com a decisão tomada no âmbito da ACO 3555, porque ela demonstra que de fato nosso povo teve seus direitos desrespeitados;

2 – Essa iniciativa pode ajudar a reduzir a violência que ocorre contra nosso povo, em especial no que tange a demarcação de terras, mas também diminuir os venenos que nosso povo absorve cotidianamente com as lavouras do agronegócio que chegam nos nossos pátios;

3 – Em que pese a importância do ato, entendemos que é um paliativo, semelhante ao que ocorreu em 1982, meses antes da formação do lago, quando a Itaipu assentou a comunidade do Ocoy/Jacutinga no atual Ocoy em 250 hectares, como local provisório;

4 – Esperamos que essa compra não se transforme novamente em um provisório/permanente, como ocorreu com o Ocoy;

5 – A ACO 3555 não pode ser extinta, ela precisa seguir assim como as negociações para compra de mais terras e de outras medidas que precisam ser executadas;

6 – Precisamos conversar sobre a devolução de todas as terras alagadas como outras iniciativas, que ajudem a construir uma reconciliação na região, onde nossos parentes não sejam mais acusados de estrangeiros e tratados com violência e preconceito;

7 – Também precisamos discutir as medidas relativas à extinção dos lugares sagrados como o próprio rio Paraná, as Sete Quedas, bem como a apropriação e desconstrução do nome “Itaipu” pela binacional;

8 – As reparações precisam ocorrer também com nossos parentes que moram do outro lado do lago, no Paraguay. A Itaipu é Binacional e nosso povo ocupa os dois países, as duas margens, muito antes de existir Brasil e Paraguai;

9 – Por fim, lembramos que precisam iniciar as reparações pelo Incra, que roubou a terra do Tekoha Guarani em Foz do Iguaçu em 1975; que fez um programa de reassentamento denominado PIC Ocoi I e II sobre nossas aldeias, que queimou nossas casas etc; também a Funai e Parque Nacional do Iguaçu que fizeram remoções forçadas e outros crimes; e o estado do Paraná que cedeu nossas terras a empresas colonizadoras;

10 – Precisamos que sejam criadas medidas especiais de reparação às pessoas e famílias que foram violentamente removidas pelos atos da Funai, Incra e Itaipu, com fundos reparadores permanentes.

Enfim, são diversas as demandas por reparação que precisam ser tratadas no âmbito da ACO 3555, por isso as conversações não podem parar.

Tekoha Ocoy – Paraná, 23 de março de 2025.

Comissão Guarani da Verdade

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