27/11/2024

Justiça Federal define prazo para Funai concluir demarcação de TI assombrada por Usina Nuclear

Justiça Federal determinou que Funai e União têm até 180 dias para publicar RCID da TI do povo Pankará de Itacuruba. Funai contesta decisão

Cacique Lucélia Pankará de Itacuruba no V Encontro Popular da Bacia do Rio São Francisco. Foto por Manoel Freitas

Cacique Lucélia Pankará de Itacuruba no V Encontro Popular da Bacia do Rio São Francisco. Foto: Manoel Freitas

Por Assessoria de Comunicação – Cimi Regional Nordeste

A Justiça Federal determinou no último dia 19 que a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) e a União concluam em 180 dias o Relatório Circunstanciado de Identificação e Delimitação (RCID) da Terra Indígena Serrote dos Campos, do povo Pankará, localizada no município de Itacuruba, sertão de Pernambuco, que segue assombrada pela construção de uma Usina Nuclear (leia mais abaixo).

Só com a publicação do RCID é que a demarcação propriamente dita tem início. A decisão, fruto de uma ação ingressada pelo Ministério Público Federal (MPF), determina ainda a conclusão da demarcação em até 360 dias. Entendendo que há danos morais coletivos pelo atraso no procedimento administrativo, desde pelo menos 2009, a Justiça Federal estipulou indenização à comunidade no valor de R$1 milhão.

Nesta quarta-feira (27), a Procuradoria Especializada da Funai recorreu da decisão, que tramita na 38a Vara Federal de Pernambuco, ao Tribunal Regional Federal da 5a Região (TRF-5), com sede em Recife. O órgão indigenista afirma, entre outros argumentos, que a etapa de identificação e delimitação “dura em média 04 anos (SIC)” e que o Poder Judiciário não pode interferir “nos atos discricionários da Administração Pública”.

A cacique Lucélia Pankará recebeu a notícia da decisão enquanto estava no 35o Encontrão da Comissão de Professores e Professoras Indígenas de Pernambuco (Copipe), que ocorreu durante a semana passada. Mesmo feliz por “uma batalha vencida”, a cacique parecia antecipar o que nesta quarta se concretizou: a Funai seguirá sem cumprir com a obrigação de fazer o procedimento administrativo avançar.

Conforme a cacique, a preocupação quanto ao cumprimento da decisão surge em face de um histórico recente. Uma liminar favorável à regularização do território já havia sido emitida em 2018, quando Michel Temer era o presidente, e não foi cumprida por nenhum dos órgãos responsáveis desde então.

Funai e União alegaram na ação que tomaram providências com relação à demanda. No entanto, para o MPF, “há evidente e injustificável demora na conclusão do procedimento de identificação e delimitação de território em favor dos índios Pankará (SIC) acampados na Aldeia Serrote dos Campos, em Itacuruba/PE, o que traz severos prejuízos àquele comunidade”.

Desde 2009 a Funai tinha conhecimento das reivindicações dos Pankará de Itacuruba. Ocorre que apenas em 2015 registrou o processo de reivindicação fundiária para o povo. No Plano Plurianual de 2016-2019, o procedimento administrativo da  Terra Indígena não estava listado. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconhece “evidente omissão e falta de conclusão de procedimento demarcatório de Terra Indígena” quando não finalizado em um prazo de dois anos.

“Com certeza a Usina Nuclear, esse projeto que o governo pretende, dificulta muito o trabalho de demarcação da nossa terra”, diz Jorge Pankará

Usina Nuclear

Localizada às margens do lago da Usina Hidrelétrica de Itaparica e na fronteira com o município de Rodelas, na Bahia, o território indígena segue cobiçado para a construção de uma Usina Nuclear. Nos últimos anos, a discussão sobre a instalação da usina diminuiu em face da situação econômica e política do país, e pelo fato de que este modo de obtenção de energia caiu em desuso.

No entanto, com a demanda pela redução do uso de combustíveis fósseis, a energia nuclear voltou a ser tratada como prioridade pela comunidade internacional, ao lado dos minérios críticos, caso do lítio, e o Brasil voltou a direcionar investimentos para grandes projetos de infraestrutura. Em Pernambuco, políticos fazem lobby pela usina.

Os Pankará não aceitam uma Usina Nuclear no território. “Com certeza a Usina Nuclear, esse projeto que o governo pretende, dificulta muito o trabalho de demarcação da nossa terra. Teve um episódio que ocorreu relatado por um coordenador da Funai. Ele foi chamado pelo Ministério da Justiça para ser orientado a não tratar da demarcação do nosso território porque havia o interesse na área para a Usina Nuclear. Prefeituras foram convocadas, os políticos em Recife tratam do assunto. Aqui não chega nada da Funai, assistência alguma. Imaginamos que seja por isso, por conta da construção dessa usina”, declara Jorge Pankará.

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