25/10/2024

Em carta, indígenas Avá-Guarani do Tekoha Y’hovy manifestam preocupação por suas vidas

Ruralistas convocaram o movimento regional para manifestação em Guaíra neste sábado (26), em meio a contexto de ataques contra indígenas; povo teme novas agressões

Ataque Yvyju Avary, em 23 de outubro de 2024. Foto: reprodução/povo Avá-Guarani

Ataque Yvyju Avary, em 23 de outubro de 2024. Foto: reprodução/povo Avá-Guarani

Por Assessoria de Comunicação do Cimi

Em carta destinada a diversos órgãos públicos e a organizações indígenas, os Avá-Guarani do Tekoha Y’Hovy, na Terra Indígena (TI) Tekoha Guasu Guavirá, no oeste do Paraná, manifestam preocupação por suas vidas e solicitam proteção da Força Nacional (FN) frente ao risco de novos ataques nos próximos dias. Desde julho, os Avá-Guarani têm vivido sob tensão e sofrido intimidações, ameaças e uma série de violentos ataques.

A carta é endereçada ao Ministério do Povos Indígenas (MPI), ao Ministério Público Federal (MPF), à Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) e a Coordenação Técnica Local (CTL) do órgão em Guaíra, além da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e da Comissão Guarani Yvyrupa (CGY).

“A solicitação deriva da manifestação convocada por ruralistas e prevista para este sábado (26), em Guaíra, um dos municípios que abrangem a TI”

A solicitação deriva da manifestação convocada por ruralistas e prevista para este sábado (26), em Guaíra, um dos municípios que abrangem a TI. Um chamado foi realizado pelo presidente do Sindicato Rural de Palotina, Paraná, ao longo da semana, para uma “grande manifestação pacífica”, previsto para este sábado no município.

“Nós que vivemos aqui no município conhecemos muito bem o quão perigoso é para nós, pois esses tipos de atitude dos não indígenas só contribuem para o aumento do ódio contra a população indígena”, afirma a carta dos Avá-Guarani.

Em menos de uma semana, a retomada tekoha Yvyju Avary, também no município de Guaíra, sofreu dois ataques. Um na quinta-feira (17), quando homens armados empoleirados na caçamba de um caminhão adaptado e em quatro tratores, atiraram contra os indígenas da aldeia Avá-Guarani, os criminosos pulverizaram agrotóxicos sobre a comunidade.

“Conhecemos muito bem o quão perigoso é para nós, pois esses tipos de atitude dos não indígenas só contribuem para o aumento do ódio contra os indígenas”

O tekoha sofreu uma nova investida na manhã da última quarta-feira (23), quando tratores da fazenda sobreposta ao território tradicional Avá-Guarani pulverizou veneno sobre a retomada. Neste último ataque o bando contou com escolta da Polícia Militar.

Há duas semanas, no dia 13 de outubro, a comunidade da aldeia Y’Hovy viveu momentos de terror, quando pessoas não identificadas realizaram disparos de arma de fogo sobre um campo onde jovens e crianças jogavam futebol, na direção da casa de uma das lideranças da comunidade, mas não deixaram ninguém ferido.

Confira a carta na íntegra:

 

Ao MPI, Funai – Brasília, CTL – local de Guaíra, MPF, Apib, CGY e etc

A comunidade Guarani (Tehoa Y’Hovy), localizada no bairro Eletrosul, município de Guaíra, vem através deste documento manifestar a nossa preocupação com a nossa segurança física e a preocupação com a proteção do nosso território no dia 26/10/24 (sábado) quando em Guaíra estará sendo realizado uma manifestação “pacífica” de iniciativa do Sindicato Rural de Mato Grosso do Sul e Paraná, com início marcado para às 8:00 da manhã com “Invasão”. O organizador é o tal do Bom Mardelli (MS).

Nós que vivemos aqui no município conhecemos muito bem o quão perigoso é para nós, pois esses tipos de atitude dos não indígenas só contribuem para o aumento do ódio contra a população indígena.

O município de Guaíra vem fazendo coisas que vão contra os nossos direitos. Já não basta os vereadores(as) nos massacrar através de leis e requerimentos absurdos que por eles são aprovados, como por exemplo, esse último requerimento solicitando informações à Funai sobre as documentações (RANI), qual o critério usado pela Funai para emitir essas certidões de nascimento e se a Funai saberia identificar quem é índio e quem não são índios que vivem nas “invasões”?

Por isso, nós da Aldeia Y’Hovy, decidimos na mesma data, dia (26/10/24) das 8 horas da manhã até as 11 horas, realizaremos um ato em frente à nossa ampliação Almirante, na rotatória da Rua Roland, com faixas, danças, cantos e rezas.

Nós da Y’Hovy não iremos mais ficar de braços cruzados nem calados, só acompanhando o que eles falam ou o que deixam de falar.

Mostraremos que neste município sempre teve os dois lados da história, porém um lado da história somente com a nossa coragem ela será mostrada.

Até quando Guaíra insistirá em negar sua própria história?

Cadê o reconhecimento ancestral para os “queridos bugrinhos” que o prefeito Heraldo Trento admitiu ter conhecido em Guaíra?

Guairenses dizem ter medo das invasões que podem vir a acontecer no futuro próximo?

Até quando Guaíra vai adiando essa solução fundiária?

Esse ato é para exigir que as autoridades competentes façam com que os “invasores não indígenas” sejam retirados (pessoas, casas e pertences) do nosso território imediatamente. Pois sabemos de onde e até aonde pertence para a nossa comunidade. A Aldeia Y’Hovy só quer os 200 hectares, que é o que está dentro das áreas que já ocupamos.

E também pedimos para as autoridades que estejam lendo isso, que ajude a Aldeia Y’Hovy, para ter o direito a uma Escola Estadual Indígena dentro da nossa Aldeia Y’Hovy. Porque percebemos que mesmo a nossa aldeia tendo o dobro da quantidade de alunos das aldeias que já possuem Escola Estadual Indígena, até hoje nós não ganhamos uma construção de uma escola para nossas crianças, sendo que atualmente temos 200 alunos que estudam na cidade.

Mas que não tem sido fácil para eles, depois de tudo o que aconteceu e diante de como estamos sendo vistos e tratados pelos não indígenas. Porque é uma forma para que as mães indígenas não sofram tanto emocionalmente quando o filho sai de casa e tem a sensação de que não ver o filho (a) nunca mais.

A comunidade acredita que temos esse direito de ter uma Escola Indígena, ou será que não?

Pedimos que a FN nos acompanhe durante o ato dos Guarani “ÓDIO E BALA NÃO COMBINAM COM ORDEM E PROGRESSO”.

Cobramos da Itaipu, uma celeridade maior em adquirir terras, mas também para dizer à Guaíra que pare de nos odiar, que a perseguição não é a solução.

Viva a resistência do povo Avá-Guarani!

Guaíra (PR), 25 de outubro de 2024.

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