04/04/2024

CNBB pede que o sofrimento e a morte não sejam parte da realidade dos povos indígenas

“O cuidado com os povos indígenas é o cuidado com a casa comum”, diz CNBB, em nota

Foto: Tiago Miotto/Cimi

Por Assessoria de Comunicação do Cimi* – matéria publicada originalmente na edição 464 do jornal Porantim

Veja aqui a edição na íntegra.

O marco temporal ameaça a vida e a integridade dos povos indígenas, desestabiliza a relação entre os poderes da República, cria obstáculos à proteção dos territórios originários e viola o direito às terras que eles tradicionalmente ocupam, prerrogativa já confirmada pelo Supremo Tribunal Federal. Esse é o entendimento da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), instituição que, a exemplo dos Apóstolos, exercem funções pastorais em favor de seus fiéis e procuram realizar evangelicamente seu serviço de amor, na edificação de uma sociedade justa e fraterna.

A CNBB ressalta ainda que é preciso assegurar o mínimo dos direitos aos povos indígenas, “sendo o primeiro e primordial, a garantia de seus territórios e do Bem Viver, na forma da Constituição”. A afirmação está na nota “O cuidado com os Povos Indígenas é o cuidado com a Casa Comum”, divulgada dezembro de 2023, quando a CNBB apontou os riscos do então Projeto de Lei (PL) 2903/2023, que trata do marco temporal das terras indígenas. O projeto foi aprovado pelo Congresso Nacional e vigora como a Lei 14.701/2023 desde sua promulgação, em 28 de dezembro de 2023.

No documento, os bispos recordam um trecho da exortação Laudato Si’, do Papa Francisco, que afirma que os povos indígenas ocupam especial condição na Casa Comum, pois, “para eles, a terra não é um bem econômico, mas dom gratuito de Deus. O texto fala ainda sobre o diálogo com as instituições no sentido de “unir esforços para evitar que mais sofrimento e morte sejam parte da realidade dos povos indígenas brasileiros”, fazendo um convite a todos a repensarem sobre o papel que os povos indígenas podem desempenhar no cuidado da criação de Deus. “Precisamos de um debate que nos una, porque o desafio ambiental que vivemos, e as suas raízes humanas, dizem respeito e têm impacto sobre todos nós”, relembra o Papa Francisco.

Para a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, com o marco temporal em vigor, será um marco de continuidade de morte dos povos indígenas. Um marco que fará, “não levarmos em conta enquanto Federação nenhum dos nossos direitos”, disse o cardeal Leonardo Steiner, arcebispo de Manaus e presidente do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), que tem entre suas prioridades a defesa dos povos indígenas, uma defesa que assumiu em sua missão como cardeal da Amazonia, empenhado em preservar os direitos da Floresta e dos povos que a habitam.

O que pensa a CNBB?

A instituição, em diversas ocasiões e oportunidades, já se manifestou contra o marco temporal e a favor da causa indígena. Em abril de 2023, durante a realização da sua 60ª Assembleia Geral, a CNBB divulgou uma mensagem ao povo brasileiro reconhecendo, dentre outras coisas, a importância da resistência histórica do movimento indígena, cujo fruto se traduz na chegada de suas lideranças a diversos postos de decisão no governo federal. Na mensagem, a entidade ressalta ainda que a derrubada do marco temporal é fator decisivo para a garantia dos direitos constitucionais.

Foto: Hellen Loures/Cimi

Em março de 2022, a CNBB, juntamente com a Comissão Especial sobre a Mineração e Ecologia Integral, a Rede Eclesial Pan-Amazônica (Repam Brasil) e o Cimi, divulgaram nota conjunta manifestando “preocupação com as iniciativas econômicas ligadas à mineração”, fazendo um chamado para que todos os cristãos “protejam a vida, os povos originários e as florestas”.

Em junho de 2021, a CNBB enviou uma carta ao Congresso Nacional com sua reflexão acerca das discussões dos projetos legislativos que tratam dos direitos constitucionais dos povos da terra, das águas e das florestas. Nela, mais uma vez, a entidade demonstrou ser contra a restrição das demarcações de terras indígenas com base na tese do marco temporal.

Bispos em defesa da garantia da vida e dos territórios

O bispo de Roraima (RR) e presidente da Comissão Especial para o Enfrentamento ao Tráfico Humano, dom Evaristo Spengler, divulgou uma mensagem denunciando “um forte ataque às leis de proteção ambiental e de proteção das terras indígenas”.

Na mensagem, dom Evaristo salienta que “as terras indígenas são as áreas mais protegidas da floresta Amazônica e outros biomas”, afirmando que “a preservação da natureza é fundamental para enfrentarmos as mudanças climáticas e a poluição que causam destruição de lavouras, casas e resultam em perda econômica, fome e morte”.

Dom Luiz Ferreira Sales, bispo de Pesqueira (PE), convidou a todos “a se unirem na defesa e na garantia da vida e dos territórios, dos Povos Indígenas e da Natureza”, lhes convidando a rezar junto com ele.

O bispo de Pesqueira salientou também, em carta divulgada pela CNBB, que a tese do “marco temporal” é uma verdadeira ameaça aos direitos territoriais dos povos indígenas. “É uma proposta que ignora a posse da terra e a existência destes povos, que não estavam em seus territórios, anterior a data da Constituição Federa de 1988, e demonstra o ódio que alguns proprietários de terra e do agronegócio, patrocinadores da bancada ruralista, tem com os primeiros habitantes dessa terra”.

O arcebispo de Porto Velho (RO) e ex-presidente do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), dom Roque Paloschi, cobrou em declaração conjunta da ONU, a demarcação das terras indígenas e a superação do marco temporal. O evento fez parte do 52º período ordinário de sessões do Conselho de Direitos Humanos (CDH 52) e foi realizado em Genebra, na Suíça. “A demarcação efetiva das terras passa pela superação, definitiva, da falsa tese do marco temporal por parte da Suprema Corte brasileira e também do novo governo”, destacou dom Roque.

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*Com informações da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB)

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