Intercâmbio entre juventudes indígenas de Tefé e Roraima promove seguridade de direitos e defesa dos territórios indígenas
Mais de 80 jovens indígenas dos povos Kambeba, Kaixana, Kokama e Tikuna de Tefé (AM), se reúnem com jovens do CIR; o encontro busca fortalecer a luta pela manutenção da vida e do bem viver dos povos indígenas
“Fortalecendo as lutas, protagonismo para a seguridade de direitos” foi o tema do II Encontro da Juventude Indígena de Tefé, estado do Amazonas, região do médio rio Solimões, realizado entre os dias 24 e 26 de novembro, na aldeia Projeto Mapi, da Terra Indígena de mesmo nome. O encontro buscou proporcionar à juventude indígena do município de Tefé um espaço de socialização, protagonismo, interação, intercâmbio, diálogo, articulação com as lideranças indígenas, com o movimento e organizações dos povos e com instituições públicas e aliados.
O evento também promoveu a troca de experiências e vivências acerca de suas lutas por seguridade de direitos, organização, participação social e política nas aldeias.O Encontro da Juventude Indígena de Tefé faz parte das atividades do projeto “Povos indígenas do Médio Solimões e Afluentes: protagonismo, conhecimento, resistência e existência na defesa da vida, dos territórios e de seus direitos individuais e coletivos”. O projeto, idealizado pelo Conselho Indigenista Missionário (Cimi) Regional Norte I, equipe da Prelazia de Tefé, é financiado pela Agência Católica para o Desenvolvimento Ultramarino (CAFOD).
O encontro buscou proporcionar à juventude indígena do município de Tefé um espaço de socialização, protagonismo, interação, intercâmbio e diálogo
O encontro reuniu mais de 80 participantes dos povos indígenas Kambeba, Kaixana, Kokama e Tikuna, de 10 aldeias das Terras Indígenas de Tefé Boará-Boarazinho/Ilha do Panamim, Porto Praia, Igarapé do Patauá, Mapi e Barreira da Missão. Os convidados foram saudados com apresentações culturais, danças, cantos e diálogos sobre a estrutura organizacional e a representatividade do movimento indígena regional em demais instâncias locais e nacionais. O intuito era animar os jovens a desenvolver seu protagonismo na dinâmica de seus territórios, na participação efetiva no movimento indígena e em espaços de lutas coletivas para a seguridade de direitos dentro e fora de suas aldeias.
Também participaram do evento o Departamento de Assuntos Indígenas de Tefé, União dos Povos Indígenas de Tefé (UNIPI-MAS), Associação de Mulheres Indígenas de Tefé (AMIMSA), Fórum Municipal de Educação Escolar indígena de Tefé (FOMEEIT), Conselho Distrital de Saúde Indígena (CONDISI Médio Rio Solidões e Afluentes), Centro Vocacional Tecnológico do Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá (CVT/IDSM), Pastoral da Juventude da Prelazia de Tefé, Coordenação de Pastoral da Prelazia de Tefé e Juventude Indígena do Conselho Indígena de Roraima (CIR).
O encontro reuniu mais de 80 participantes dos povos indígenas Kambeba, Kaixana, Kokama e Tikuna
Durante o encontro, foram abordados temas como movimento e organização indígena, organização da juventude, terra e território, cultura, drogas e alcoolismo. Os debates se mostraram de suma importância para o fortalecimento individual e organização coletiva da juventude indígena.
Lorrana da Silva Kokama, da aldeia Vasques, TI Boara Borazinho/Ilha do Panamim, falou da importância do encontro e de espaços para os jovens se expressarem e adquirirem mais conhecimentos. “Vou levar para a comunidade a união, para que a gente possa se fortalecer, se reunir mais. Como jovens podemos ser o futuro do nosso povo. A partir deste encontro eu aprendi que eu devo seguir uma carreira e ajudar o meu povo. Por isso vamos à luta com resistência e força”, afirmou Lorrana animada e animando os participantes.
“Vou levar para a comunidade a união, para que a gente possa se fortalecer, se reunir mais”
A jovem indígena do povo Ticuna, Janiele Boaventura, da aldeia Barreira da Missão do Meio, TI Barreira da Missão, menciona o aprendizado adquirido sobre o movimento indígena e os conhecimentos sobre as leis que defendem os direitos indígenas. “Eles [aprendizados] nos ajudarão a lutar, cada um com seu povo em suas aldeias. Quero aprender sobre as leis, as lutas que os povos indígenas estão passando, como podemos nos organizar cada vez mais em nossas aldeias e levarmos estes aprendizados para a comunidade, repassar para os outros jovens que não puderem participar”, desafiou a si e a todos.
Sobre drogas e bebidas alcoólicas, muitos jovens evidenciaram sua preocupação com os efeitos maléficos que decorrem deles para a saúde e para a organização social das aldeias. Railson Cavalcante Kokama, jovem indígena da aldeia Porto Praia de Baixo, ressaltou os motivos que vulnerabilizam a juventude. “A falta de oportunidades, de atividades e ações voltadas aos jovens deixam eles vulneráveis ao caminho das drogas, do alcoolismo. O caminho das drogas é ruim para o desempenho na educação, na vivência da aldeia e com a família”, ressaltou.
“Quero aprender sobre as leis, as lutas que os povos indígenas estão passando, como podemos nos organizar cada vez mais em nossas aldeias”
Ronelly Nascimento do povo Kokama, aldeia Porto Praia de Baixo, destaca que os debates e conhecimentos mudaram o pensamento dos jovens. “Participando desse encontro, cada jovem sai com novos pensamentos. Que nós como jovens indígenas possamos enxergar a vida e saber como valorizar. Sabemos que as drogas é um vício muito perigoso, mas tem como a gente pensar na vida e combater isso”, frisou.
Juventude fala com juventude
Na perspectiva de falar a linguagem da juventude para motivá-la ao engajamento na luta por dignidade e direitos, o encontro oportunizou um importante intercâmbio entre os jovens de Tefé e representantes dos jovens indígenas que compõem o Departamento de Juventude Indígena do Conselho Indígena de Roraima (DJI/CIR).
Messias Pereira Macuxi, vice-coordenador do departamento e o jovem Cirilo Roberto de Souza Macuxi, partilharam suas experiências e aprendizados que obtiveram no movimento indígena e relataram o processo de organização da juventude indígena em Roraima. Ambos apresentaram a organização social, ações e projetos desenvolvidos pelo Núcleo de Juventude Indígena do CIR, as bandeiras de lutas e a participação das juventudes nos espaços e lutas do movimento indígena daquele estado. A rica partilha dos jovens indígenas de Roraima contribuiu para o fortalecimento da juventude de Tefé que também visa se organizar, criando um espaço próprio dentro das organizações indígenas locais, regionais e nacional.
O encontro oportunizou um importante intercâmbio entre os jovens de Tefé e representantes dos jovens indígenas que compõem o DJI/CIR
“Viemos com o objetivo de fortalecer a juventude deste município, esse intercâmbio juntamente com esses jovens é uma experiência que nós estamos vivenciando. Estamos passando nossa experiência de como, em Roraima, o movimento indígena é organizado. Saímos daqui fortalecidos assim como deixamos essa juventude fortalecida, com um olhar diferente, com um pensamento diferente [sobre a vida e a organização indígena], e espero voltar novamente e ver essa juventude mostrando o que de fato aprenderam neste encontro”, comenta Cirilo.
O jovem indígena Kambeba, Devid Ramos Medeiros, da aldeia Betel, TI Barreira da Missão, comenta os avanços e benefícios que o intercâmbio promoveu aos jovens. “As trocas que as juventudes indígenas de Tefé e de Roraima fizeram foram muito importantes porque trouxeram informações que ajudam os jovens a participar do movimento indígena com mais conhecimento das lutas, organizações indígenas e direitos. A juventude precisa participar mais, aproveitar os espaços para questionar, tirar suas dúvidas, pois são nestes espaços que perdem a timidez, adquirem conhecimentos sobre os direitos e sobre as lutas do movimento indígena”.
“Saímos daqui fortalecidos assim como deixamos essa juventude fortalecida”
A certeza do conhecimento adquirido
As falas, depoimentos e posicionamentos dos jovens no decorrer do encontro evidenciaram os conhecimentos que iam sendo adquiridos e apreendidos. Durante as exposições e debates puderam fazer questionamentos, tirar dúvidas e opinar sobre as temáticas.
Nesse processo, evidencia-se também o quanto é importante para os jovens a sua participação e organização, conhecendo as instâncias de representatividade dos povos indígenas, instituições que desenvolvem as políticas públicas específicas e diferenciadas para os povos indígenas, especialmente para a juventude indígena. A partir da criação desses espaços de representatividade, os jovens indígenas puderam estabelecer um elo de aproximação e diálogo com as bases e organizações indígenas, compreender a importância da realização de incidências políticas junto aos órgãos públicos para que os jovens tenham maior participação nos encontros, reuniões e tomadas de decisão nas aldeias e em espaços de promoção do protagonismo juvenil na dinâmica de seus territórios.
O encontro evidencia o quanto é importante para os jovens a sua participação e organização, conhecendo as instâncias de representatividade dos povos indígenas
O encontro se encerrou com propostas e encaminhamentos feitos pela juventude que, ao final, formou uma comissão organizadora para articular e mobilizar a realização do próximo encontro, desta vez, protagonizado pela própria juventude indígena. A proposta é que se reencontrem em abril de 2024, já com a criação do Grupo de Juventudes Indígenas de Tefé.
As fotos, filmagens e gravações de áudio do encontro foram registradas pelos jovens comunicadores indígenas de Tefé. Depois da realização da Oficina de Comunicação Indígena em novembro deste ano, na aldeia Betel, TI Barreira da Missão, em Tefé, eles vêm aperfeiçoando suas capacidades de processos comunicativos.
A proposta é que se reencontrem em abril de 2024, já com a criação do Grupo de Juventudes Indígenas de Tefé
Para a equipe do Cimi, organizadora do encontro, as partilhas, cantos e danças vão permitir que as juventudes indígenas de Tefé retornem as suas bases mais fortalecidas pelos conhecimentos adquiridos e espiritualidade vivenciada. Esses jovens voltam às suas aldeias para protagonizar sua organização local e contribuir nas lutas coletivas com o movimento indígena e aliados, para a seguridade de seus direitos e defesa de seus territórios sagrados, que são a manutenção da vida e do bem viver dos povos indígenas.