29/09/2023

Indígenas alertam para a urgência na demarcação e proteção dos territórios no Conselho de Direitos Humanos da ONU

Representando a Aty Guasu, Inaye e Josiel participam da 54ª sessão do Conselho de Direitos Humanos da ONU, em Genebra (Suíça)

Inaye Lopes é historiadora, vereadora e representante das mulheres Guarani e Kaiowá. Foto: Equipe de Incidência Internacional do Cimi

Inaye Lopes é historiadora, vereadora e representante das mulheres Guarani e Kaiowá. Foto: Equipe de Incidência Internacional do Cimi

Por Adi Spezia, da Assessoria de Comunicação do Cimi

Na última quinta-feira (28), lideranças indígenas da Aty Guasu – a Grande Assembleia Guarani e Kaiowá – reforçaram que a demarcação e a proteção dos territórios tradicionais são medidas fundamentais para preservação da biodiversidade, combate às mudanças climáticas e garantia da soberania alimentar, social e cultural dos povos originários no Brasil.

O alerta foi realizado em Diálogo Interativo com o Relator dos Direitos dos Povos Indígenas, durante a 54ª sessão do Conselho de Direitos Humanos (CDH) da Organização das Nações Unidas (ONU), que está sendo realizado de 11 de setembro a 13 de outubro deste ano, em Genebra, na Suíça.

“A demarcação e a proteção dos territórios tradicionais são medidas fundamentais para o Bem Viver dos povos”

A historiadora, vereadora e representante das mulheres Guarani e Kaiowá, Inaye Lopes, chamou a atenção para o fato de que, todo e qualquer financiamento dos investimentos, devem levar em conta a perspectiva indígena para não serem exclusivos, assim como assegura a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), em relação à Consulta Prévia, Livre, Informada e Consentida.

“Neste contexto, estamos refletindo sobre como as comunidades Guarani e Kaiowá podem ter atividades sustentáveis. Há discriminação e preconceito contra nossos produtos indígenas. Muito pouco desta economia é convertida para as nossas comunidades”, listou Inaye, preocupada com autonomia de seu povo.

“Estamos refletindo sobre como as comunidades Guarani e Kaiowá podem ter atividades sustentáveis”

Enquanto o mundo direciona os olhares para a Amazônia, no centro do país o bioma Cerrado – considerado o berço das águas no Brasil – está sendo destruído sem que ninguém preste atenção. Portanto, a garantia dos direitos dos povos indígenas deve ser a estratégia central para um desenvolvimento justo e sustentável da humanidade. “Isto requer, primeiro, a demarcação do nosso território ancestral”, alerta Josiel Machado, liderança Guarani e Kaiowá no Mato Grosso do Sul.

O acesso a serviços políticas públicas, como água, educação, saúde e alimentação, constam na sequência da listagem de Josiel como indispensáveis. Para ele, em “terceiro lugar estão as políticas e programas de apoio à agricultura indígena e ao reflorestamento. Aos modos de viver e de produzir dos povos indígenas”. “É preciso que o mundo reverta a grande perda da biodiversidade, e recupere a natureza e sua rica biodiversidade”, reforça a liderança Guarani Kaiowá, que é sobrevivente do massacre de Guapoy, em Amambaí (MS).

“Como diz o relator, 80% da biodiversidade mundial está em território indígena”

As contribuições de Inaye e Josiel se deram no mesmo evento, com a presença do Relator Especial das Nações Unidas para os Direitos dos Povos Indígenas, José Francisco Cali Tzay, a quem Josiel fez referência ao afirmar que: “como diz o relator, 80% da biodiversidade mundial está em território indígena”.

Ao concluírem suas contribuições ao Conselho de Direitos Humanos, nesta edição, Inaye reforçou as razões pelas quais os Guarani e Kaiowá, “lutamos por nosso território tradicional, que é um espaço de Bem Viver. Nosso tekohá – lugar onde se é – é o caminho dos povos Guarani e Kaiowá, como resistência ao racismo e genocídio cotidiano. Digo isso para o mundo saiba”, completou a liderança.

Por sua vez, Josiel finalizou sua contribuição questionando os presentes na sessão: “por que não começamos protegendo esses territórios e modos de vida?”, direcionando-se aos presentes na 54CDH.

“Por que não começamos protegendo esses territórios e modos de vida?”

Incidências na Europa

Nas duas últimas semanas de setembro, entre os dias 18 e 30, Josiel Machado e Inaye Lopes, ambas lideranças Guarani e Kaiowá, do Mato Grosso do Sul (MS), estão na Europa para denunciar as violações de seus direitos.

A programação contemplou, ainda, um conjunto de incidências junto a representantes de instituições europeias, do parlamento, de comissões e serviços externos europeus. O objetivo é chamar atenção para a situação que os povos Guarani e Kaiowá enfrentam no Brasil.

Na avaliação dos indígenas, é importante falar com os formuladores de políticas europeias e com os órgãos de direitos humanos da ONU. Em especial, neste momento em que o Congresso Nacional, busca aprovar o Projeto de Lei (PL) 2903/2023 – antigo PL 490/2007 – e instituir o marco temporal de forma legislava, contrariando a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que no último dia 21 derrubou a tese por 9 votos a 2.

“É importante falar com os formuladores de políticas europeias e com os órgãos de direitos humanos da ONU”

Josiel Machado é liderança Guarani Kaiowá, e sobrevivente do massacre de Guapoy, em Amambaí (MS). Foto: Equipe de Incidência Internacional do Cimi

Josiel Machado é liderança Guarani Kaiowá, e sobrevivente do massacre de Guapoy, em Amambaí (MS). Foto: Equipe de Incidência Internacional do Cimi

Dada a gravidade da situação, nessa sexta-feira (29), organizações indígenas, de direitos humanos e socioambientais enviaram uma carta ao presidente Lula pedindo que vete o PL 2903, aprovado pelo Senado Federal nesta semana. O documento foi entregue pelas lideranças indígenas a Tovar da Silva Nunes, chefe da missão brasileira na ONU em Genebra, Suíça.

Além dos indígenas, o comitê é composto por representantes do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) e da Organização pelo Direito Humano à Alimentação e à Nutrição Adequadas (FIAN) Brasil e Internacional.

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