Indígenas e quilombolas participam de curso da ONU sobre o sistema de proteção universal de direitos humanos
Realizado em duas etapas, uma no Brasil e a outra em Genebra, a execução do curso está sendo realizada com apoio do ACNUDH, em parceria com a UnB e o Cimi
A garantia dos direitos dos povos indígenas e quilombolas passa pelo domínio das convenções, declarações, leis, normas e práticas jurídicas e institucionais que se articulam com políticas públicas e ações governamentais voltadas a esses povos. Com o objetivo de contribuir para a formação de lideranças indígenas e quilombolas, o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH), em parceria com o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) e a Universidade de Brasília (UnB), realizam o “I Curso preparatório para bolsistas indígenas e quilombolas das Nações Unidas sobre o sistema de proteção universal de direitos humanos”.
Realizado pela primeira vez em português – mas valorizando em todos os seus momentos os conhecimentos, saberes e experiências indígenas e quilombolas sobre suas próprias sociedades, culturas e realidades -, o curso está sendo realizado em duas etapas: uma ocorre no Brasil – no Centro de Formação Vicente Cañas do Cimi, em Luziânia (GO), e nas dependências da UnB -, e a outra na sede das Nações Unidas, em Genebra, Suíça.
“A garantia dos direitos dos povos indígenas e quilombolas passa pelo domínio das convenções, declarações, leis, normas e práticas jurídicas e institucionais voltadas a esses povos”
Para a etapa no Brasil, de quinze dias, foram selecionadas 20 lideranças quilombolas e indígenas das cinco regiões do país. Dessas, dez seguem para a segunda etapa, de 30 dias em Genebra, onde contarão com intérpretes para a realização das atividades. Os candidatos foram selecionados, previamente, pelo Programa de Bolsas do ACNUDH.
O curso busca qualificar lideranças indígenas e quilombolas para que possam conhecer e incidir de melhor forma nas convenções e declarações internacionais, dos mecanismos de proteção de direitos das minorias étnicas das Nações Unidas. O curso visa, ainda, relacionar, de forma prática, essas informações com a Constituição e demais leis brasileiras a fim de assegurar os direitos dos povos indígenas e quilombolas no Brasil, América Latina e no mundo.
“O curso busca qualificar lideranças indígenas e quilombolas para que possam incidir nas convenções e declarações internacionais, dos mecanismos de proteção de direitos humanos das Nações Unidas”
Razões pelas quais também “serão apresentadas informações sobre o funcionamento do Sistema Universal de Direitos Humanos, além das normas e mecanismos das Nações Unidas para a proteção dos povos indígenas e quilombolas, e de casos e situações emblemáticos de violação de direitos étnicos já examinados pelos órgãos das Nações Unidas”, conta Joanderson Gomes de Almeida, indígena do povo Pankararu e integrante do ACNUDH no Brasil. Joanderson foi bolsista das Nações Unidas em edições anteriores da formação.
Juliene Pereira dos Santos, quilombola do Quilombo de Cachoeira Porteira, município de Oriximiná, Pará, destaca a importância do curso. “Esse curso é muito importante, não só para nós quilombolas que estamos no curso, mas para toda a coletividade de quilombos no Brasil, porque na história do curso é a primeira vez que nós quilombolas somos inseridos nesse curso no âmbito da ONU para estudar os mecanismos de direitos humanos existentes no âmbito internacional e sobretudo os mecanismos da ONU”, avalia a cursista quilombola.
“Esse curso é muito importante, não só para nós quilombolas que estamos no curso, mas para toda a coletividade de quilombos no Brasil”
“Cotidianamente nós, quilombolas, sofremos uma série de violações de nossos direitos fundamentais, que são, sobretudo, nosso direito à vida. Quando falamos de vida, estamos falando do nosso território, da nossa ancestralidade que me representa, da nossa existência, da nossa resistência. Então, estar participando de um curso como esse, é estar lutando pela nossa existência e resistindo ao mesmo tempo”, reforça a cursista quilombola.
Indígena da região do Alto Solimões, no Amazonas, Oziel Ticuna reforça a importância de ofertar a formação em Direitos Humanos aos povos originários. “Para minha comunidade é muito importante, também para todos nós estudantes indígenas e quilombos. A expectativa é muito grande em poder fazer essa formação em direitos humanos, pois vai ajudar na proteção das nossas comunidades, das crianças e jovens, tanto na cultura, nas tradições, na língua e, além de denunciar as violações contra os povos indígenas em geral. É uma oportunidade que irá beneficiar os povos indígenas no Brasil”, avalia Oziel.
“Fazer essa formação em direitos humanos vai ajudar na proteção das comunidades, crianças e jovens, tanto na cultura, nas tradições, na língua e denunciar as violações contra os povos”
Com perspectivas multidisciplinares, interculturais, colaborativas e com equidade de gênero, o curso promove o diálogo teórico e prático com pesquisadores, profissionais e especialistas em direitos humanos, ex-bolsistas indígenas das Nações Unidas, organizações dos povos indígenas e da sociedade civil, e também com representantes do Estado.
O Cimi, desde sua fundação, em 1972, apoia a incidência internacional dos povos indígenas, então somar nesse programa de bolsas é dar continuidade a esse processo histórico de apoio incondicional aos interesses dos povos indígenas, a luta dos povos indígenas em todos os lugares.
“Somar no programa de bolsas é dar continuidade a esse processo histórico do Cimi de apoio incondicional aos interesses dos povos indígenas, a luta dos povos indígenas em todos os lugares”
“Inclusive nesse espaço internacional, que parece ser tão distante, mas que diz tanto aos povos indígenas, porque é nele em que os principais direitos hoje conquistados estão garantidos. É a partir de lá que nós devemos voltar e exigir eles aqui dentro do país sendo como principal executor dessas políticas de direito dos povos indígenas”, destaca Flávio Machado, missionário do Cimi e integrante da equipe de incidência internacional da entidade.
“Para a UnB, é uma honra receber um curso de formação que prepara cursistas indígenas e quilombolas para uma formação mais ampla em nível internacional sobre o sistema de proteção Universal Direitos Humanos das Nações Unidas, mobilizar a universidade em diferentes setores da Faculdade de Direito, do Instituto de Ciências Sociais, do Instituto de Letras, da Faculdade de Saúde para que, numa abordagem multidisciplinar, a gente consiga trabalhar a amplitude com que os direitos humanos devem ser pensados e tratados no momento atual na contemporaneidade”, destaca o professor da Universidade de Brasília, Cristhian Teófilo da Silva.
“O curso busca preparar indígenas e quilombolas para uma formação mais ampla em nível internacional sobre o sistema de proteção Universal Direitos Humanos das Nações Unidas”
Nesta construção coletiva, também se somaram aos esforços: o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF); ONU Mulheres; Fundação Ford; Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB); Articulação Nacional das Mulheres Indígenas Guerreiras da Ancestralidade (ANMIGA); Coordenação Nacional de Articulação de Quilombos (CONAQ); Ordem dos Advogados do Brasil – Conselho Federal (OAB); Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai); Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH); Ministério Público Federal 6ª CCR (MPF); Defensoria Pública da União (DPU); Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) Mato Grosso do Sul; Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD); Universidade Federal da Integração Latino-Americana (UNILA).
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