Do Curso Básico à Missão: a continuidade do processo de formação para o Bem Viver
O Cimi Regional Leste reafirma o compromisso com o ser missionário e a defesa dos direitos originários dos povos indígenas
Motivados pela mística, memória e resistência dos 50 anos do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), os aspirantes a missionários e missionárias do Cimi Regional Leste se reuniram em Bom Jesus da Lapa, às margens do rio São Francisco no Oeste da Bahia, entre os dias 18 e 19 de maio de 2023 para um momento formativo em preparação ao Curso de Formação Básica II.
A formação, que foi acompanhada pelo coordenador Haroldo Heleno, Nilton Seixas e o assessor metodológico Franklim Drumond, contou com a presença dos aspirantes Janaína Nunes, Maria Rosária, Marta Mamédio e Rory Weslley. Esse encontro teve como objetivo refletir as perspectivas pessoais e coletivas dos futuros missionários frente aos desafios da construção dos próximos 50 anos do Cimi, orientados pela memória e história dos anos vividos em missão até aqui.
“O encontro teve como objetivo refletir as perspectivas pessoais e coletivas dos futuros missionários frente aos desafios da construção dos próximos 50 anos do Cimi”
Para Haroldo Heleno, coordenador regional do Cimi Leste, esse momento “foi muito importante para os aspirantes a missionários, como também para o conjunto do regional, pois foi um espaço onde compartilhamos os desejos, os sonhos, as expectativas e os desafios que são apresentados para os novos aspirantes”.
Desta forma, os aspirantes a missionários pontuaram os principais desafios encontrados na atual conjuntura da causa indígena e indigenista. Momento importante para propor e pensar coletivamente novos horizontes institucionais e políticos da entidade, assim como reafirmar o compromisso com os povos indígenas, o fortalecimento da luta e da defesa dos direitos originários.
Franklim Drumond destaca que “entre suas prioridades, o Cimi compreende que a Formação é ‘uma atividade constitutiva de seu trabalho (Plano Pastoral, nº35)’, desse modo, atividades como o encontro do Regional Leste fazem parte da prática desse organismo vinculado à CNBB”.
“Momento importante para propor e pensar coletivamente novos horizontes institucionais e políticos da entidade, assim como reafirmar o compromisso com os povos indígenas”
O assessor do Cimi ainda complementa que na formação também foram realizadas reflexões sobre ser missionários e o papel do Cimi como um Conselho para a igreja e para os povos originários numa realidade complexa do nosso tempo e os riscos que a missão impõe aos missionários e à instituição. “Esses riscos fazem parte da caminhada, que une o projeto de vida pessoal ao projeto de Bem Viver dos povos indígenas e do Cimi, e a compreensão de pertencer a este longo e inovador caminho vivenciado há mais de 50 anos. É um dom para igreja e fidelidade aos princípios evangélicos de uma igreja em saída e do Cimi, comprometidos com a construção do projeto de Bem viver dos Povos Indígenas”, reforça Franklim.
Ao final do encontro, os futuros missionários inspirados pela mística e resistência das estratégias de sobrevivências dos povos indígenas nesses 523 anos e dos 50 anos do Cimi no compromisso de ser Igreja em Saída, na sua ação evangelizadora e de presença missionária juntos aos pobres, marginalizados e excluídos decidem construir um documento de compromissos aos moldes da “Nota à Opinião Pública” construída pelos missionários reunidos a partir de uma assembleia de Pastoral Indigenista, em Vitória, no Espírito Santo, no ano de 1978.
“Inspirados pela mística e resistência das estratégias de sobrevivências dos povos indígenas nesses 523 anos e dos 50 anos do Cimi, listou-se os compromissos”
No documento, que foi publicado há 45 anos, os missionários listam ter constatado, com pesar, o desaparecimento de vários grupos indígenas da região e a situação de violências em que se encontravam. Assim, os aspirantes do Regional Leste em 2023, elaboraram uma carta aberta listando alguns compromissos, entre eles, com a ação missionária e profética de uma Igreja em Saída, uma igreja que se coloca ao lado dos pobres, marginalizados e oprimidos. “Entendemos como nosso dever, e tarefa de todo cristão, denunciar as violações de direitos, promover a justiça e solidariedade, sendo a voz profética na luta, ao lado das comunidades, pelo Bem Viver dos povos indígenas e do cuidado com a Casa Comum”, destaca a Carta.
O documento destina-se aos integrantes do Curso Básico em Indigenismo, que estão na segunda etapa, e a todo o Conselho Indigenista Missionário demarcando o desejo em fazer parte dessa entidade, colocando suas vidas em missão pela defesa e garantia dos direitos dos povos indígenas e seus territórios, na construção de um Novo Reino e do projeto de vida do Bem Viver, rumo a uma Terra Sem Males!
Confira a carta na íntegra:
Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Regional Leste
Curso de Formação Básico II – edição de 2023
Prezados, prezadas
Nós, aspirantes a missionários e missionárias do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), provocados pelo processo de formação, comprometidos em seguir a Luz de Cristo, que ressuscitou em cada indígena, negro e quilombola, que tombou na luta pela garantia do direito à vida e ao território de seu povo. Provocados e comprometidos também com a ação missionária e profética de uma Igreja em Saída, uma igreja que se coloca ao lado dos pobres, marginalizados e oprimidos. Entendemos como nosso dever, e tarefa de todo cristão, denunciar as violações de direitos, promover a justiça e solidariedade, sendo a voz profética na luta, ao lado das comunidades, pelo Bem Viver dos povos indígenas e do cuidado com a Casa Comum, assim como anuncia o Papa Francisco, e como tem sido feito pelo Cimi ao longo dos 50 anos.
Ao longo do tempo, testemunhamos a resistência incansável dos povos originários na defesa de seus territórios, culturas e modos de vida. Eles têm sido protagonistas de importantes vitórias, como a demarcação de terras, o reconhecimento de seus direitos constitucionais e a valorização de sua diversidade cultural.
No entanto, os povos indígenas continuam enfrentando desafios cada vez maiores, como a imposição da tese do marco temporal, que busca restringir os direitos territoriais dos povos, ignorando sua história ancestral e a relação intrínseca com as terras que habitam há séculos. Essa tese representa uma grave ameaça à sobrevivência dessas comunidades e à preservação de seus modos de vida tradicionais, o aumento da violência, o assassinato das lideranças e criminalização da luta pela demarcação de seus territórios. O garimpo ilegal que se alastra pelas Terras Indígenas da Amazônia, as mineradoras que se alastram sobre os territórios, o crime da Vale, o agronegócio que cada dia mais avança contra terras indígenas no Cerrado e no Pantanal, entre outros ataques que há 50 anos são denunciados pelo Cimi.
Nós, aspirantes a missionários e missionárias do Cimi, conscientes de que a missão evangelizadora de uma Igreja em Saída requer incondicionalmente um mundo de justiça e garantia dos direitos dos povos indígenas aos seus territórios sagrados, apoiamos e fortalecemos a luta dos povos indígenas, dando voz e fazendo ecoar a todo planeta as suas demandas. Denunciando as violações de direitos e promovendo a conscientização em relação às questões que afetam essas comunidades.
Reiteramos nosso compromisso de trabalhar em parceria com organizações indígenas e indigenistas, lideranças e defensores dos direitos humanos, buscando construir pontes de diálogo e solidariedade.
Reafirmamos, junto aos povos indígenas, que antes desse chão que nós pisamos, ser chamado de Brasil, já era terra de Pindorama. Em contraponto à tese do marco temporal, nos unimos aos povos indígenas para que se faça ecoar local, nacional e internacionalmente a defesa da tese do Indigenato, que reconhece o direito originário dos povos indígenas do Brasil à terra.
Diante da atual conjuntura violenta em que os povos originários e indigenistas se encontram, trazemos a memórias inspiradoras das vidas à serviço dos pobres e oprimidos como da Irmã Cleusa Rody, Vicente Cañas, Dom Phillips e Bruno Pereira, entre tantos outros mártires que doaram suas vidas pela causa indígena, para prestar solidariedade a todos os missionários e missionário do Cimi e lideranças indígenas que estão sob ameaças e tentativas de criminalizações por defenderem a construção do Reino de Deus.
Frente a isso, desejamos colaborar para o fortalecimento de uma igreja profética, comprometida com a vida a partir do testemunho do Cristo ressuscitado e encarnado nos oprimidos, que reafirma e reconhece através da ação de seus organismos, que os povos indígenas estejam sobre a posse de seus territórios com direito de nele viver e gerenciar a construção do Bem Viver.
Bom Jesus da Lapa – Bahia, 19 de maio de 2023
Diga aos Povos que avancem: Avançaremos!
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*Integram a turma de Formação Básica do Cimi, cursando a segunda e última etapa da formação. Os quatro fazem parte do Cimi Regional Leste, compreende os estados de Minas Gerais; Espírito Santo e extremo sul da Bahia;
** Está produção faz parte da atividade prática, realizada pelos integrantes do Curso de Formação Básica do Cimi, etapa 2, desenvolvida a partir do módulo Política de Comunicação do Cimi ministrado pela Assessoria de Comunicação da entidade.