16/02/2023

“Ainda estamos de pé”: juventude Terena retoma assembleia anual após intervalo de três anos

Afetados pela pandemia, jovens indígenas de várias aldeias do Mato Grosso do Sul voltam a se reunir presencialmente na Assembleia da Juventude Terena, realizada entre os dias 9 e 12 de fevereiro

Jovens Terena voltam a se reunir em Assembleia, espaço de organização tradicional desse povo, depois de intervalo de três anos. Foto: Marília Terena

Por Maiara Dourado, da Assessoria de Comunicação do Cimi

Após um hiato de três anos, a Assembleia da Juventude Terena voltou a se reunir esse ano, entre os dias 9 e 12 de fevereiro. A Assembleia ocorre anualmente, mas dada as restrições e os cuidados sanitários exigidos pela pandemia de Covid-19, não pôde ser realizada no período de 2020 a 2022.

O povo Terena foi fortemente acometido pela pandemia, o que lhes exigiu uma maior cautela na retomada das atividades da Assembleia. “Houveram muitas mortes” relata Edna Marques, de 25 anos, ex-coordenadora da Assembleia e uma das organizadoras do evento, que está em sua sexta edição.

Segundo dados de um levantamento feito pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), 65 pessoas do povo Terena morreram por Covid -19, o segundo grupo indígena mais afetado depois dos Xavante.

Apesar das inúmeras perdas, o povo Terena não esmoreceu. “Com nossas forças ancestrais, no passo da ema e com gritos de guerra”, a juventude Terena voltou a se reunir. “Já são seis anos que fazemos essa Assembleia, e esperamos continuar participando e fortalecendo nosso movimento”, explica a jovem representante indígena, que encerrou nesta edição a sua gestão como coordenadora da Assembleia. 

“Já são seis anos que fazemos essa Assembleia, e esperamos continuar participando e fortalecendo nosso movimento”

A preservação e a expressão cultural, como a da dança da Ema, tem sido uma pauta importante para juventude Terena. Foto: Yana Faria/ Conselho Terena

Segundo Edna, o objetivo da Assembleia da Juventude Terena é “despertar o espírito de liderança que há em nossa juventude, porque daqui para frente vão surgir novos líderes, novos caciques, novas lideranças”. A Assembleia, nesse sentido, se revela um espaço de formação para esses jovens, onde eles se fortalecem politicamente, “indo lá na frente, conversando, expressando o que estão sentindo”, explica a liderança.

A Assembleia da Juventude faz parte da Assembleia Terena, um espaço de organização tradicional desse povo. Sem ela, “não tem como fortalecermos nossas bases, que são as nossas aldeias, fortalecer os jovens, as mulheres, os anciões”, informa Edna.

A maioria das questões que envolvem o movimento indígena são discutidas no âmbito da Assembleia, que “é uma ferramenta e é também uma organização nossa enquanto povo Terena”, define.

“A Assembleia é uma ferramenta e também uma organização nossa enquanto povo Terena”

Novo Mandato

A Assembleia reuniu cerca de 200 jovens de mais de sete aldeias do estado do Mato Grosso do Sul que se mobilizaram para discutir temas caros a suas comunidades e para eleger um novo representante de sua juventude. Guilherme Figueredo, de 22 anos, da aldeia Tereré, foi eleito primeiro representante, e Laren Rodrigues, da aldeia Lalima, como segunda, além de sete representantes dos territórios, que irão apoiar a articulação da juventude Terena.

Foram eleitos representantes de vários territórios participantes da Assembleia. Dentre elas as Terras Indígenas de Limão Verde, Nioaque, Buriti, Lalima, Taunay-Ipegue, Cachoeirinha e a aldeia Tereré, que é de contexto urbano.

Para Guilherme, ocupar esse espaço de liderança é uma forma de honrar a memória do avô, João Figueredo Filho, “o capitão santo”, como é conhecido na Terra Indígena Buriti, no município de Dois Irmãos e Sidrolândia, no Mato Grosso do Sul. “Ele foi um grande líder e sempre lutou para o bem do nosso povo. Durante 80 anos ele ajudou a construir as outras aldeias ao redor do nosso território”, lembra o neto e atual coordenador da juventude Terena.

A Assembleia reuniu cerca de 200 jovens de mais de sete aldeias do estado do Mato Grosso do Sul

A presença e o engajamento dos jovens Terena nas discussões da Assembleia denotam a força do movimento da juventude indígena Foto: Yana Faria/ Conselho Terena

Carta

Durante o encontro, foram organizados quatro Grupos de Trabalho (GT) para discutir temas como política, educação, meio ambiente e gestão territorial. A importância dos GTs, segundo Edna, é a interação que se promove entre os jovens das diferentes aldeias, pois é nesse espaço de discussão que “a gente mostra a realidade de cada território”, explica.

A presença da juventude e o engajamento nas discussões também foram destacados pelo Frei Klenner, missionário do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) do Regional Mato Grosso do Sul. Para o missionário, “a articulação da juventude apontando pautas e firmando compromisso com a questão ambiental, territorial e com a questão da educação” evidenciam a força do movimento da juventude Terena.

Nos GTs “a gente mostra a realidade de cada território”

Como resultado da Assembleia Terena foi elaborada uma Assembleia da Juventude Terena – carta final (1), a fim de organizar as discussões no encontro e as demandas que dele decorreram. No documento, a educação e a demarcação e proteção territorial foram evidenciadas como elementos chave para o fortalecimento da juventude indígena. “Nossos territórios estão cercados de desmatamento, assoreamento de nossos rios e plantação de monocultura. Exigimos a proteção do cerrado e do pantanal, nossa casa, que é parte de nós e nós parte deles. A nossa cultura depende da terra e de todos os seres para sobreviver”, diz o documento.

 “A carta vai ser uma das ferramentas que a juventude indígena vai levar para uma reunião específica anual e que podemos usar e mostrar que o nosso movimento como juventude ainda está de pé”, explica Edna. A carta foi encaminhada para a Defensoria Pública da União (DPU) e deve ser enviada para outros órgãos estaduais e federais.

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