28/11/2022

Cimi Regional Maranhão promove 7ª oficina de intercâmbio linguístico e cultural entre povos em retomada

A oficina foi realizada nos dias 22 a 25/11, em São Luís-MA, com a participação de 35 indígenas dos povos Akroá Gamella, Krenyê e Krikati

Sétima oficina de intercâmbio linguístico e cultural entre os povos Akroá Gamella, Krenyê e Krikati. Foto: Fábio Costa/ Cimi-MA

Sétima oficina de intercâmbio linguístico e cultural entre os povos Akroá Gamella, Krenyê e Krikati. Foto: Fábio Costa/ Cimi-MA

Por Jesica Carvalho, Ascom Cimi Regional Maranhão

Tornar-se fluente em sua língua materna é um dos objetivos dos povos originários em retomada no estado do Maranhão. O Conselho Indigenista Missionário – Cimi, Regional Maranhão, visando apoiar os povos nesse processo, promoveu, nos dias 22 a 25 de novembro, em São Luís-MA, a 7ª oficina de intercâmbio linguístico e cultural entre os povos Akroá Gamella, Krenyê e Krikati.

Meire Diniz, missionária do Cimi Regional Maranhão, explica como foram iniciadas as ações do intercâmbio. “Essa decisão de aprender a língua materna foi tomada pelo povo Akroá Gamella durante assembleia realizada em 2015, no Território Taquaritiua, da qual fez parte o povo Krenyê. Sendo uma decisão conjunta dos dois povos. Assim, entre 2016 e 2017, o Cimi, junto com esses povos, realizou a preparação do intercâmbio conseguindo, desse modo, que o povo Krikati pudesse acompanhar esse processo de ensino-aprendizagem, que é realizado pela professora Marli Krikati”, destaca.

“Decisão de aprender a língua materna foi tomada pelo povo Akroá Gamella durante assembleia realizada em 2015”

A oficina foi realizada nos dias 22 a 25 de novembro, em São Luís-MA, com a participação de 35 indígenas dos povos Akroá Gamella, Krenyê e Krikati. Foto: Cruupyhre Akroá Gamella

A oficina, nesta etapa, contou com a participação de 35 indígenas e foi realizada de forma prática, momento em que os povos Akroá Gamella e Krenyê aprenderam aspectos relacionados à escrita e à leitura na língua Krikati, tronco linguístico Macro-jê, a qual os dois povos pertencem. Devido à colonização, à violência e ao silenciamento, a língua materna desses povos foi uma das suas características identitárias perdidas, mas que eles buscam reaver em seus processos de retomada.

Marli Krikati, ministrante da oficina, aponta os desafios para a transmissão da sua língua aos demais povos. “É um desafio trabalhar com as comunidades que não têm mais a sua língua, pois é diferente das crianças que pegamos ainda pequenas e repassamos as informações. Mas, durante as oficinas, o pessoal vem cada vez mais se desenvolvendo, fazendo textos, lendo um pouco e querendo ir além”, afirma.

“É um desafio trabalhar com as comunidades que não têm mais a sua língua, mas durante as oficinas, o pessoal vem cada vez mais se desenvolvendo e querendo ir além”

O evento contou com a participação de 35 indígenas dos povos Akroá Gamella, Krenyê e Krikati. Foto: Cruupyhre Akroá Gamella

Com objetivo de facilitar a realização das atividades, a oficina lançou mão de uma metodologia de ensino-aprendizagem baseada na utilização de textos, músicas, trabalhos em grupos e jogos silábicos que auxiliou os participantes na compreensão dos sons e na representação das letras do alfabeto da língua materna do povo Krikati.

Para o cacique Cujcua Krenyê, participante da oficina, o intercâmbio linguístico e cultural fortalece os aspectos étnicos do seu povo, a partir da aprendizagem da língua materna. “O intercâmbio resgata em nós aspectos da nossa cultura que há muito tempo havíamos perdido e agora podemos entrar nesse caminho de retomada da nossa identidade”, destaca.

“O intercâmbio resgata em nós aspectos da nossa cultura que há muito tempo havíamos perdido e agora podemos entrar nesse caminho de retomada da nossa identidade”

Devido à colonização, à violência e ao silenciamento, a língua materna desses povos foi uma das suas características identitárias perdidas. Foto: Cruupyhre Akroá Gamella

O processo de aprendizagem no intercâmbio linguístico e cultural é realizado em dois momentos principais: o primeiro ocorre com a vivência dos rituais de cada povo em seus territórios, que envolve a participação, também, de outros povos. O segundo acontece durante as oficinas, as quais repassam conhecimentos voltados à escrita e à leitura da língua materna. “Esse processo assumido pelo Cimi completa o seu 3º ano e, ao longo desse tempo, temos construído um jeito de fazer que envolve os povos nesses dois momentos”, enfatiza Meire Diniz.

“O intercâmbio tem nos dado muita força para a nossa organização e, também, a garantia de participação nos rituais com o aprendizado da nossa língua que é muito importante para o nosso povo e isso contribui para aumentar a autoestima do nosso povo, porque antes não tínhamos essa experiência”, define Cawcre Akroá Gamella sobre as contribuições do intercâmbio para o seu povo.

“O intercâmbio tem nos dado muita força para a nossa organização e, também, a garantia de participação nos rituais com o aprendizado da nossa língua que é muito importante para o nosso povo”

Para facilitar a realização das atividades, a oficina lançou mão de uma metodologia de ensino-aprendizagem. Foto: Fábio Costa/ Cimi-MA

Durante as ações do intercâmbio, foi construído um livro didático com o alfabeto ilustrado da língua materna do povo Krikati, a partir dos textos dos educandos, que será publicado posteriormente pelo Cimi Regional Maranhão e servirá de subsídio para a educação nas escolas dos povos Akroá Gamella e Krenyê.

O professor e linguista, Francisco Albuquerque, da Universidade Federal do Norte de Tocantins (UFT), que estuda o tronco linguístico Macro-jê, e é membro da equipe de formação junto com o Cimi Regional Maranhão, ressalta a importância da ferramenta para o processo de ensino-aprendizagem nessas comunidades. “Até então, os materiais que existem nas escolas dos territórios desses povos é um material que não reflete os seus aspectos socioculturais e linguísticos, visto que é o mesmo material utilizado nas escolas não indígenas, com a elaboração do material didático, por esse intercâmbio, teremos o primeiro passo para uma educação bilingue desses povos.”, finaliza o professor.

“Até então, os materiais que existem nas escolas dos territórios desses povos é um material que não reflete os seus aspectos socioculturais e linguísticos, demos o primeiro passo para uma educação bilingue desses povos”

No Maranhão, os povos indígenas vivem em processo de retomada de sua identidade étnica e cultural e buscam o reconhecimento por parte do Estado. Foto: Cruupyhre Akroá Gamella

Retomada indígena

No Maranhão, os povos indígenas Akroá Gamella, Anapuru Muypurá, Tremembé de Raposa e de Engenho, Krenyê e Kari’u Kariri vivem em processo de retomada de sua identidade étnica e cultural e buscam o reconhecimento por parte do Estado. Nessa ação, esses povos destacam que muitas são as dificuldades enfrentadas por eles devido à falta de acesso aos seus direitos e à violência e ao preconceito da sociedade. Os povos em retomada acrescentam, ainda, que há dificuldade de serem aceitos e inseridos na pauta das organizações indígenas do estado.

Dentre as carências vivenciadas pelos povos em retomada, está a falta de territórios demarcados. Com o julgamento de repercussão geral, em tramitação no Supremo Tribunal Federal (STF), os povos originários lutam contra a tese ruralista do marco temporal, que é inconstitucional e busca limitar o direito à demarcação das terras indígenas, vinculando essa garantia à presença física desses povos no território reivindicado até 5 de outubro de 1988, data em que foi promulgada a Constituição brasileira.

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