10/03/2022

“Tememos ser assassinados dentro de nossa própria aldeia”, alerta Adriano Karipuna ao Conselho de Direitos Humanos da ONU

A denúncia foi realizada durante a 49º sessão do Conselho de Direitos Humanos; caso nada seja feito, liderança de Rondônia afirma que “restará ao povo pedir asilo político”

Por Assessoria de Comunicação do Cimi

Do coração da Amazônia, na voz do povo Karipuna, surge um apelo ao Conselho de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU), reunidos em sua 49ª sessão. “Meu povo está desesperado. Tememos ser assassinados dentro de nossa própria aldeia”, afirmou Adriano Karipuna em depoimento ao “Diálogo Interativo” sobre as obrigações de direitos humanos relacionadas ao gozo de um ambiente seguro, limpo, saudável e sustentável, que ocorreu nesta quinta-feira (10). O relator especial sobre Direitos Humanos e Meio Ambiente do Alto Comissariado de Direitos Humanos da ONU, David Boyd, participou do debate.

Novamente, os Karipuna retornam ao Conselho para denunciar a grave situação que vivenciam em seu território, localizado em Rondônia. “Caso não sejam tomadas providências imediatas, a única alternativa que nos restará para nos mantermos vivos será pedirmos asilo político”, alerta Adriano Karipuna.

“Estamos cercados pelos invasores do nosso território. Estamos sob risco intenso de deixarmos de existir enquanto povo”, denunciou a liderança do povo Karipuna ao Conselho da ONU. O temor tem raízes históricas. Na década 1970, o povo Karipuna foi praticamente dizimado após contato desastroso promovido pelo Estado brasileiro.

O monitoramento feito pelos indígenas, Greenpeace Brasil e o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) na Terra Indígena (TI) Karipuna identificou uma nova frente de desmatamento naquela região. Numa incursão a campo, realizada no segundo semestre de 2021, foram encontrados novos 850 hectares de desmatamento ilegal no interior da TI, revelando um aumento de 44% em relação ao ano anterior.

“A nossa Terra Indígena Karipuna está entre as treze mais desmatadas do Brasil”, conta Adriano. A pecuária, com a produção de carne, e o agronegócio, com avanço da soja, são apontados como os principais responsáveis pela pressão sobre as florestas e os povos que vivem nela e dela.

“A pecuária cresceu 87% no município de Porto Velho nos últimos nove anos e o território voltado à produção de soja em Rondônia triplicou na última década, passando de 111 mil hectares para 400 mil hectares em 2020”, apontam dados levantados pelo Greenpeace e pelo Cimi.

Em maio de 2021, os Karipuna processaram a União, Funai e estado de Rondônia por invasões e pela devastação da terra indígena. Em dezembro, a situação continuou a se repetir: novos episódios de invasão de madeireiros e pecuaristas, roubo de madeira e grilagem de terra na TI Karipuna, já demarcada, foram denunciados pelos indígenas ao Ministério Público Federal (MPF) e à Policia Federal (PF).

As invasões, a grilagem de terras e a destruição da floresta no interior da TI Karipuna têm sido constantemente denunciado aos órgãos de fiscalização no Brasil e para a própria ONU. Apesar disso, “continuamos sendo atacados”, lamenta Adriano.

“O governo brasileiro facilita a invasão e a devastação dos territórios indígenas. O presidente Bolsonaro, com seus discursos de ódio e atos contrários aos nossos direitos, põe em sério perigo a nossa integridade territorial, cultural e física”, denuncia a liderança.

O cenário relatado por Adriano se intensifica com projetos e medidas administrativas e que buscam liberar a exploração econômica dos territórios indígenas, como as Instruções Normativas (IN) 09/2020, da Funai, 01/2021, publicada conjuntamente entre Funai e Ibama, e o Projeto de Lei (PL) 191/2020, de autoria do governo Bolsonaro.

Na noite desta quarta (9), a Câmara dos Deputados aprovou, por 279 votos a 180, o requerimento que estabelece o regime de urgência para a tramitação deste projeto. Ou seja, o PL 191/2020 não passará pelas comissões que têm por objetivo debater o tema, indo direto ao plenário da Casa para votação – o que está previsto para ocorrer em abril.

Por falta de tempo, a fala de Adriano não pôde ser veiculada durante o evento programado, mas irá compor os anais da 49ª sessão do Conselho de Direitos Humanos da ONU.

Confira o discurso do Adriano Karipuna, na íntegra:

Meu nome é Adriano Karipuna. Sou do povo Karipuna, de Rondônia, região amazônica do Brasil. Senhor relator, meu povo está desesperado. Por isso, apelamos a este Conselho mais uma vez.

Estamos cercados pelos invasores do nosso território. Tememos ser assassinados dentro de nossa própria aldeia. Estamos sob risco intenso de deixarmos de existir enquanto povo.

Já denunciamos a situação aos órgãos de fiscalização no Brasil, aqui neste Conselho e no Fórum Especial Para Povos Indígenas da ONU, mas continuamos sendo atacados.

A nossa Terra Indígena Karipuna está entre as treze mais desmatadas do Brasil.

O governo brasileiro facilita a invasão e a devastação dos territórios indígenas. O presidente Bolsonaro, com seus discursos de ódio e atos contrários aos nossos direitos, põe em sério perigo a nossa integridade territorial, cultural e física.

Caso não sejam tomadas providências imediatas, a única alternativa que nos restará para nos mantermos vivos será pedirmos asilo político.

Muito obrigado.

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