25/11/2021

Em nota, organizações denunciam descaso da UNIR com estudantes indígenas, quilombolas, camponeses e LGBTQIA+

Segundo o documento, a Universidade Federal de Rondônia (UNIR) descumpriu um acordo sobre a democratização das vagas da universidade

Mobilização de organizações pró-indígenas, quilombolas, camponesas e LGBTQIA+ em frente à Universidade Federal de Rondônia (UNIR). Foto: Prof. Mario Venere

Por Assessoria de Comunicação do Cimi

Nessa terça-feira (23), organizações pró-indígenas, quilombolas, camponesas e LGBTQIA+ entregaram uma nota de repúdio à Universidade Federal de Rondônia (UNIR) após a reitoria descumprir um acordo sobre a democratização das vagas da universidade para uma parcela da população historicamente excluída da educação superior.

Segundo o documento, alguns cursos da UNIR passaram por uma crise: não estavam preenchendo integralmente suas vagas, correndo até mesmo o risco de acabar. Mas, para reverter a situação, diretores da universidade propuseram no Conselho Superior Acadêmico da UNIR propostas para ampliar as formas de ingresso de discentes.

“A conselheira designada para emitir parecer nessas propostas e organizar a minuta de uma resolução que normatizasse novas formas de ingresso na UNIR buscou mecanismos que possibilitasse democratizar as vagas da universidade para uma grande parcela da população historicamente excluída da educação superior, compondo um grupo de diálogo com os movimentos indígena, quilombola, camponês e LGBTQIA+ para a construção conjunta de uma proposta”, diz um trecho da nota.

Os movimentos, que já vivem um moroso processo de tentativas para efetivar a inclusão dessas populações na UNIR, aceitaram a proposta. Entre os indígenas essas discussões já vêm ocorrendo, desde 2016, nos fóruns locais em Porto Velho, em Rondônia, como nos municípios de Ji-Paraná, Guajará-Mirim e Cacoal.

Mas, em outubro deste ano, ao apresentar a proposta à Pró-Reitoria de Cultura, Extensão e Assuntos Estudantis (PROCEA), à Pró-Reitoria de Graduação (PROGRAD) e à Reitoria, a PROGRAD pediu “um tempo” para analisar a proposta com base na legislação.

As organizações, que ainda aguardam o retorno, alegaram ter sofrido um “golpe” nesse meio tempo com a abertura de uma Portaria da Reitoria – Portaria nº 658/2021/GR/UNIR – no dia 4 de novembro deste ano.

“Fomos golpeados com a notícia de uma Portaria da Reitoria, nomeando uma comissão para fazer justamente o que já tínhamos feito. Uma comissão, formada por pessoas que nem foram consultadas, a exemplo dos indígenas, e sem qualquer paridade. É um desrespeito aos movimentos, aos professores e apoiadores que se desdobraram para construir uma proposta de resolução que leve em consideração as reinvindicações para o ingresso daqueles excluídos e a banca de heteroidentificação que queremos”, afirma um trecho da nota.

“É um desrespeito aos movimentos, aos professores e apoiadores que se desdobraram para construir uma proposta de resolução que leve em consideração as reinvindicações para o ingresso daqueles excluídos”

Com faixas e cartazes, estudantes realizam protesto em frente à UNIR. Foto: Prof. Mário Venere

As organizações reforçaram, ainda, que os estudantes querem ingressar “não no que restar de vagas não preenchidas, não para fazer o favor de ocupar assentos para os cursos não fecharem”. “Queremos uma banca formada por membros indicados pelos movimentos, pelas lideranças constituídas historicamente nas lutas concretas e não por oportunistas da academia que se dizem defensores de nossas causas”, alegam.

O documento diz também que a Reitoria da UNIR desconsiderou todo o histórico de luta por parte dos “estudantes indígenas, professores, lideranças indígenas, movimento indígena, Associação das Mulheres Indígenas, DCE, pessoas trans, quilombolas, camponeses, que lutam para democratização das vagas nos cursos de graduação”.

“As vagas devem ser preenchidas por quem de fato e de Direito tenham pertencimento aos grupos acima mencionadas e não indivíduos que se apropriam de uma identidade somente para ocupar a vaga de um curso superior. Nós indígenas, pretos, quilombolas, pessoas trans, camponeses, somos portadores de Direitos garantidos em Lei. Não queremos favor da Universidade Federal de Rondônia”.

 

Veja a nota na íntegra:

Em 2021, ciente de que alguns de seus cursos não estavam preenchendo integralmente suas vagas e entendendo que esses corriam o risco, até mesmo de fechar, diretores dos campi propuseram no Conselho Superior Acadêmico da UNIR propostas para ampliar as formas de ingresso de discentes. A conselheira designada para emitir parecer nessas propostas e organizar a minuta de uma resolução que normatizasse novas formas de ingresso na UNIR, buscou mecanismos que possibilitasse democratizar as vagas da universidade para uma grande parcela da população historicamente excluída da educação superior, compondo um grupo de diálogo com os movimentos indígena, quilombola, camponês e LGBTQIA+ para a construção conjunta de uma proposta.

Os movimentos, que há anos reivindicam a inclusão efetiva dessas populações na UNIR, aceitaram prontamente. Também há anos denunciam a usurpação das cotas destinadas a pretos e indígenas em virtude da falta de bancas de heteroidentificação. Entre os indígenas essas discussões já vêm ocorrendo nos fóruns locais em Porto Velho, Ji-Paraná, Guajará- Mirim e Cacoal nos anos de 2016 a 2019 e em 2020 e 2021, de forma on-line.

As organizações das diversas categorias, continuamente excluídas, passaram a coordenar esse processo de discussão sobre as novas formas de ingresso na UNIR e sobre o estabelecimento de bancas de heteroindentificação. Foram vários encontros virtuais com lideranças do Movimento Indígena, quilombola, camponês, pessoas trans, professores da Universidade, DCE, etc. para construir, coletivamente uma proposta de resolução. Ao final, no dia 21 de outubro foi apresentada a proposta à PROCEA, PROGRAD e Reitoria. A PROGRAD pediu tempo para analisar a proposta à luz da legislação e há dois meses aguardamos a resposta para prosseguimos na finalização do texto da legislação.

Durante essa longa enrolação da PROGRAD fomos golpeados com a notícia de uma Portaria da Reitora (Portaria nº 658/2021/GR/UNIR, de 04 de novembro de 2021, publicada no Boletim de Serviço nº 86, de 04/11/2021) nomeando uma comissão para fazer justamente o que já tínhamos feito. Uma comissão, formada por pessoas que nem foram consultadas, a exemplo dos indígenas, e sem qualquer paridade. É um desrespeito aos movimentos, aos professores e apoiadores que se desdobraram para construir uma proposta de resolução que leve em consideração as reivindicações para o ingresso daqueles excluídos e a banca de heteroindentificação que queremos.

Queremos ingressar não no que restar de vagas não preenchidas, não para fazer o favor de ocupar assentos para os cursos não fecharem; queremos uma banca formada por membros indicados pelos movimentos, pelas lideranças constituídas historicamente nas lutas concretas e não por oportunistas da academia que se dizem defensores de nossas causas.

A Reitoria da UNIR atacou nossos Direitos e nossa dignidade ao publicar, na calada da noite, a PORTARIA Nº.632/2021/GR/UNIR, de 21 de outubro de 2021, não levando em consideração todo um histórico de luta por parte dos estudantes indígenas, professores, lideranças indígenas, movimento indígena, Associação das Mulheres Indígenas, DCE, pessoas trans, quilombolas, camponeses, que lutam para democratização das vagas nos cursos de graduação. As vagas devem ser preenchidas por quem de fato e de Direito tenham pertencimento aos grupos acima mencionados e não indivíduos que se apropriam de uma identidade somente para ocupar a vaga de um curso superior.

Nós indígenas, pretos, quilombolas, pessoas trans, camponeses, somos portadores de Direitos garantidos em Lei. Não queremos favor da Universidade Federal de Rondônia!

Exigimos respeito com nossas organizações e representações, conforme a Constituição Federal em seu art. 232 nos garante e a Universidade Federal de Rondônia não está respeitando, ao tomar medidas contra uma proposta de Resolução construída coletivamente.

Queremos mudança! Queremos uma nova forma de ingresso que inclua e não que exclua os povos indígenas, quilombolas, trans e camponeses, que tanto lutaram para sentar em um banco de uma universidade e hoje estão brutalmente ignorados.

Manifestamos nossa indignação e solicitamos desta Reitoria providências urgentes! No que diz respeito à proposta de Resolução que encaminhamos, não queremos comissão para criar uma nova Resolução, queremos sim que seja aprovada a Resolução construída coletivamente pelos povos Indígenas, Quilombolas, Pessoas Trans e camponeses, que já contém nossa proposta de banca de heteroidentificação, encaminhada para ser analisada pela PROGRAD e, posteriormente, aos Conselhos Superiores.

Os movimentos organizados entendem que, se para salvaguardar seus interesses, isto é, não extinguir seus cursos, demitir seus professores, etc., a UNIR pode criar novas resoluções quando bem entender, ela deve, então, olhar para os interesses da sociedade. Afinal, a UNIR não existe para ela própria, mas, ela é da sociedade e é a sociedade, que somos nós, que ela deve servir. Portanto, antes de cuidar de seus próprios interesses, a UNIR deve garantir os interesses da sociedade que lhe confere a oportunidade de existir.

A UNIR É NOSSA! QUE ELA ABRA AS PORTAS PARA OS POVOS INDÍGENAS, PRETOS, QUILOMBOLAS, PESSOAS TRANS E CAMPONESES!
POR UMA UNIVERSIDADE INCLUSIVA E DEMOCRÁTICA!
PELA APROVAÇÃO DA MINUTA DE RESOLUÇÃO CONSTRUÍDA COLETIVAMENTE PELOS MOVIMENTOS!

Porto Velho/RO, 23 de novembro de 2021

Organização dos Povos Indígenas de Rondônia, Noroeste do Mato Grosso e Sul do Amazonas – OPIROMA
Movimento dos Estudantes Indígenas de Rondônia – MEIRO
Diretório Central dos Estudantes – DCE/UNIR
Centro Acadêmico Indígena Intercultural – CAII/UNIR-Ji-Paraná
Organização dos Professores Indígenas de Rondônia e Noroeste do Mato Grosso– OPIRON
Associação das Guerreiras Indígenas de Rondônia – AGIR
Associação do Povo Indígena Karitiana AKOT PYTIM Adnipa – APK
Associação do Povo Indígena Karipuna
Coletivo Mura de Porto Velho
Associacao Indigena Karo Paygap
Associação do Povo Indígena Amondawa
Núcleo de Diversidade e Inclusão
SOMAR
Executiva Rondoniense de Estudantes de Pedagogia – ExROEPe
Comunidade Cidadão Livre – COMCIL
Grupo Apoio e Diversidade – GAD/Porto Velho
Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior – ANDES-SR (Regional Norte I)
Conselho Indigenista Missionário – CIMI/RO
Pastoral Indigenista da Arquidiocese de Porto velho-RO

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