Em encontro inédito, juventude indígena de povos da Bahia discute o atual cenário político
Essa é a primeira vez que a juventude indígena formada por povos das regiões Sul, Extremo Sul e Oeste da Bahia se reúne no estado; cerca de 80 jovens participaram do evento
A Aldeia Craveiro, no município de Prado (BA), sediou entre os dias 13 e 15 de agosto o Encontro da Juventude Indígena dos povos do Sul, Extremo Sul e Oeste da Bahia. Essa foi a primeira vez que a juventude indígena reuniu os povos dessas três regiões. O encontro teve como tema “Direitos Originários na Garantia da Vida dos Povos Indígenas” e contou com a participação de cerca de 80 jovens dos povos Tupinambá de Olivença, Pataxó, Pataxó Hã-Hã-Hãe, Kiriri e Tapuia.
Na última sexta-feira (13), as delegações foram recebidas pelos moradores de Craveiro com muita animação, expectativa e boas conversas ao redor da fogueira. Durante os dias do encontro, foram discutidas pautas como os retrocessos políticos, a perda dos direitos dos povos indígenas, entre outros desafios enfrentados, atualmente, pela juventude indígena.
Na manhã de sábado (14), o evento foi aberto com rituais indígenas e com a apresentação de cada povo. Em seguida, ocorreu a plenária de boas-vindas, o repasse da programação e a formação da mesa com lideranças anfitriãs.
“Agora é a hora discutir o que está em votação neste mês de agosto, o que é o marco temporal e o Projeto de Lei 490. Discutir estratégias, porque isso nos impacta muito, de forma direta, e retira o nosso direito à terra”
A advogada Lethícia Reis, assessora jurídica do Conselho Indigenista Missionário – Cimi Regional Leste, apresentou informações do atual cenário político e promoveu uma discussão, junto aos jovens, sobre o Projeto de Lei 490/2007 e sobre o marco temporal. Neste momento, a juventude debateu o que entendia sobre cada tema e também expôs o seu posicionamento.
Para Fabrício Titiah, do povo Pataxó Hã-Hã-Hãe, “foi um momento de a gente se articular, se organizar, enquanto jovem indígena, para enfrentar todos os retrocessos que estamos sofrendo nesse momento. Agora é a hora de nos articularmos sobre os nossos direitos originários e discutir a política indígena. Discutir o que está em votação neste mês de agosto, o que é o marco temporal e o Projeto de Lei 490. Discutir estratégias, porque isso nos impacta muito, de forma direta, e retira o nosso direito à terra”.
No período da tarde, aconteceu a Oficina de Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC), que contou com a participação de Alice Pataxó, influencer indígena, e de Fabrício Titiah, administrador da página “Somos Hahahai”. Nesse espaço, foi possível discutir a importância e o desafio que esses meios refletem hoje na juventude indígena, destacando cuidados necessários com os perigos que a exposição pode trazer para as comunidades. Mas, por outro lado, foi apresentada a importância de a internet ser um mecanismo democrático e necessário para a juventude indígena seguir disputando esse lugar, visibilizando o seu lado da história e garantindo as suas narrativas.
Já na manhã de domingo (15), os jovens se reuniram em grupo com seus povos para pensar os desafios internos e externos que enfrentam nesse momento, as estratégias, o papel e a contribuição da juventude indígena junto às suas comunidades.
Para Domingos Andrade, membro da coordenação colegiada do Cimi Regional Leste, “este encontro formativo com a juventude indígena das regiões do Extremo Sul, Sul e Oeste da Bahia fortalece as articulações dos povos na defesa dos seus territórios. Consciente dos seus direitos, buscam fazer valer o que lhes são assegurados nos artigos 231 e 232 da Constituição Federal de 1988”.
“As discussões políticas foram muito positivas para agregar no nosso conhecimento enquanto juventude na luta, e principalmente pensando nessa nova conjuntura política que a gente vive atualmente”
No encontro, foram entregues aos jovens a Cartilha em Quadrinhos: Os Direitos das Pessoas Indígenas em Conflito com a Lei. Essa cartilha, em formato de história em quadrinhos, é fruto do trabalho de pessoas e entidades de direitos humanos, como o Instituto das Irmãs da Santa Cruz (IISC), o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), o Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM), a Associação Juízes para a Democracia (AJD) e o Instituto Terra, Trabalho e Cidadania (ITTC), que lutam pela visibilidade e garantias de direitos das pessoas indígenas presas no Brasil.
A cartilha é uma importante ferramenta para a formação de todos e todas, mas principalmente das comunidades indígenas sobre seus direitos especiais na esfera penal e para a garantia do cumprimento desses direitos diante de situações como: abordagens policiais, prisões de parentes e outras relacionadas ao conflito com a lei.
Também foram repassados o Manual para Defender os Direitos dos Povos Indígenas e Tradicionais e o livro “Vidas em Luta: Criminalização e Violência Contra Defensoras e Defensores de Direitos Humanos no Brasil”, juntamente com o Certificado desse Encontro da Juventude Indígena.
Para Bruno, do povo Tupinambá de Olivença, “foi possível aprender muito neste encontro”. “A gente conseguiu dialogar com os outros povos que estiveram presentes. Nesse intercâmbio, conseguimos aprender sobre as lutas e as dificuldades de um modo geral desses povos que estiveram aqui e discutir mais sobre nossas leis e direitos que estão sendo roubadas com esse PL (490), e todas essas emendas que estão aí contra os povos indígenas”.
Alice Pataxó avalia como “importante” o resultado do encontro. “As discussões políticas foram muito positivas para agregar no nosso conhecimento enquanto juventude na luta, e principalmente pensando nessa nova conjuntura política que a gente vive atualmente. Esperamos ansiosamente poder compartilhar isso com outros parentes em Brasília, daqui na grande mobilização ‘Luta pela Vida’, no período de 22 a 28 de agosto”.
O Encontro da Juventude Indígena foi realizado pelo Cimi Regional Leste, que abrange os estados da Bahia, Minas Gerais e Espírito Santo, com o apoio da Cáritas Alemã e Adveniat.