Povo Kaingang conquista importante vitória no STF
Longa batalha por território Toldo Imbú chega ao fim com unanimidade na Suprema Corte
A tradicionalidade da Terra Indígena (TI) Toldo Imbú foi reconhecida em 2007 pelo Ministério da Justiça. No entanto, até hoje o povo Kaingang não pôde celebrar esta conquista. Por todos estes anos, fazendeiros se recusaram a deixar o território – uma área de aproximadamente 1.965 hectares, situada em Abelardo Luz (SC) – e empreenderam uma batalha judicial em todas as instâncias. Nesta segunda-feira (17), a luta indígena avançou com importante vitória no Supremo Tribunal Federal (STF): a primeira turma da Corte foi unânime ao manter decisão favorável à comunidade.
A partir da determinação do STF, a expectativa entre os Kaingang é de que o governo federal viabilize a retomada das terras – garantindo a indenização e retirada pacífica dos fazendeiros, além da fiscalização do território indígena. De acordo com Zauri dos Santos Kaingang, é preciso realocar os invasores o mais breve possível. “Nós sabemos que eles têm que receber pelas benfeitorias que fizeram. Mas tem uns 600 hectares sem benfeitoria nenhuma e esta parte da terra nós queremos ocupar imediatamente. A gente espera que as autoridades maiores cumpram o seu dever e garantam nossos direitos”, sustenta.
“A gente entende que é um processo que está 90% concluído. Nós começamos esta peleia bem jovens e já estamos ficando grisalhos. Nosso propósito é claro: antes de partir deste plano, queremos voltar pro nosso lugar original”
Zauri conta que atualmente a aldeia ocupa apenas 120 hectares do território. “Hoje nós vivemos amontoados. São 100 hectares pra lavoura e o restante é onde estão as casas das nossas 73 famílias”. Na avaliação do indígena, a deliberação do STF representa um passo fundamental. “A gente entende que é um processo que está 90% concluído. Nós começamos esta peleia bem jovens e já estamos ficando grisalhos. Nosso propósito é claro: antes de partir deste plano, queremos voltar pro nosso lugar original”.
Omissão e violência
Para Roberto Liebgott, coordenador do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) na Região Sul, o caso de Toldo Imbú exemplifica a omissão do poder público no reconhecimento dos direitos territoriais dos povos indígenas no Brasil. “A área é ocupada tradicionalmente pelo povo Kaingang há muitas e muitas décadas e passou por todo o procedimento demarcatório. No entanto, apesar dos longos anos de estudo, a comunidade Kaingang segue vivendo às margens do seu território originário. Nunca tiveram acesso à terra”, salienta Roberto, lembrando que nas ocasiões em que os indígenas tentaram ingressar nas terras que são suas por direito, foram expulsos violentamente.
Zauri lamenta o histórico de negligências por parte do Estado e espera que as coisas avancem daqui pra frente. “Foram muitas conversas buscando o entendimentos das autoridades sobre nossos direitos. Nós já fomos presos, levamos processos e enfrentamos muita maldade estatal contra as demarcações. Pessoas já tentaram nos enganar, nos fazendo assinar documentos que eram contra nós”, lamenta.
O indígena afirma que o povo Kaingang está emocionado com a decisão do STF. “Foi muito preconceito que nós tivemos que enfrentar aqui na nossa região, já fomos maltratados e perseguidos. Agora queremos usar o tempo que resta para realizar nossos sonhos e plantar um futuro nesta terra”.
“É necessário que o Estado atue de forma contundente no sentido de garantir que os povos indígenas tenham direito à terra e que nelas eles possam então viver com dignidade, afastando-se da vulnerabilidade das rodovias e assentamentos improvisados”
Próximos passos
Com a definição do STF, caberá ao poder público dar as garantias necessárias para que o povo Kaingang possa usufruir de Toldo Imbú. O Cimi seguirá ao lado dos Kaingang até que todo o processo seja finalizado. “É necessário que o Estado atue de forma contundente no sentido de garantir que os povos indígenas tenham direito à terra e que nelas eles possam então viver com dignidade, afastando-se da vulnerabilidade das rodovias e assentamentos improvisados”, pontua Roberto.
Zauri conta que a ideia da comunidade é investir na agricultura sustentável. “Eu já ouvi um deputado dizer numa audiência pública que os índios lutam pela terra para depois deixar criar mato. Nós queremos quebrar paradigmas: nossa intenção é plantar milho, feijão, mandioca e outras coisas, tudo sem veneno. Mas também cabe dizer que nós somos defensores da mata, nós vamos sim proteger a mata porque ela não é só boa só pra nós, ela é de toda a sociedade”, sustenta.
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