09/06/2020

MPF identifica quase 10 mil registros de proprietários privados no Cadastro Ambiental Rural em áreas destinadas a povos indígenas

Levantamento a pedido da Câmara de Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais subsidiará MPF no combate à grilagem de terras indígenas

Campos de soja abertos por fazendeiros no território Munduruku do Planalto, no Pará. Foto: Arthur Massuda/Cimi

Campos de soja abertos por fazendeiros no território Munduruku do Planalto, no Pará. Foto: Arthur Massuda/Cimi

Quase dez mil propriedades inscritas no Cadastro Ambiental Rural (CAR) – registro público eletrônico de âmbito nacional, obrigatório para todos os imóveis rurais – estão sobrepostas a terras indígenas em diferentes fases de regularização ou a áreas com restrição de uso. É o que aponta levantamento divulgado nesta terça-feira (9) pela Câmara de Populações Indígenas e Comunidade Tradicionais do Ministério Público Federal (6CCR/MPF). O estudo foi encaminhado a procuradores da República em todo o país a fim de subsidiar a atuação no combate à grilagem e aos crimes ambientais em terras indígenas, bem como às violações dos direitos humanos desses povos.

A pesquisa foi feita pela Secretaria de Perícia, Pesquisa e Análise da Procuradoria-Geral da República, a pedido da 6CCR, e considerou dados extraídos do Sistema do Cadastro Ambiental Rural, vinculado ao Serviço Florestal Brasileiro, no período de 21 a 31 de maio de 2020. Ao todo, foram identificados 9.901 registros de propriedades no CAR cujos limites coincidem com territórios indígenas ou com restrição de uso, ou seja, áreas interditadas pela Funai para proteção de povos indígenas isolados, com o estabelecimento de restrição de ingresso e trânsito de terceiros.

Segundo a investigação, o estado com o maior número de imóveis rurais localizados em terras destinadas a povos indígenas é o Pará, com 2.325 registros. Desse total, 1.290 propriedades estão situadas dentro de terras indígenas em processo de regularização e 1.035 em áreas com restrição de uso. Em seguida, aparece o estado de Rondônia, onde foram identificados 1.385 registros de imóveis rurais sobrepostos a áreas indígenas, sendo 1.345 referentes a terras indígenas e 40 a áreas com restrição de uso. No Amazonas, são 1.163 propriedades irregulares registradas no CAR, uma vez que 524 estão dentro de terras indígenas e outras 639 em áreas interditadas para proteção de povos isolados.

Para o coordenador da 6CCR, subprocurador-geral da República Antônio Bigonha, o número expressivo de imóveis rurais com registro no CAR sobrepostos a áreas destinadas a povos indígenas revela a forte pressão que essas terras estão sofrendo, tanto do ponto de vista ambiental quanto fundiário. “O Estado brasileiro tem que tomar providências para que esse instrumento (o CAR), criado para o planejamento ambiental e econômico, e o combate ao desmatamento, não seja usado para se cometer crimes ambientais e grilar as terras dos índios”, alertou.

O MPF solicitou providências a diversos órgãos federais, como o Serviço Florestal Brasileiro, o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) e o Banco Central. Entre as medidas requeridas estão o cancelamento do registro desses cadastros, a anulação de licenças ambientais concedidas e a suspensão de financiamentos bancários, entre outras.

CAR – Criado pela Lei nº 12.651/2012 e regulamentado pela Instrução Normativa MMA nº 2, de 5 de maio de 2014, o Cadastro Ambiental Rural é um registro eletrônico que reúne informações ambientais das propriedades e posses rurais. A inscrição no CAR é o primeiro passo para obtenção da regularidade ambiental do imóvel. O cadastro contém, entre outros, dados do proprietário, documentos de comprovação de propriedade ou posse, e informações georreferenciadas do perímetro do imóvel, das áreas de interesse social e das áreas de utilidade pública.

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