14/05/2020

Amazônia: assolada pela Covid 19 e o descaso do Estado Brasileiro

“A Amazônia Brasileira vive mais um dramático momento de sua história”. Em artigo, Laura Vicuña Pereira Manso analisa a conjuntura amazônida e a resistência dos povos frente ao coronavírus.

Retirada de madeira ilegal na Terra Indígena Karipuna, registrada em 2019. Foto: Chico Bata/Todos os Olhos na Amazônia

Retirada de madeira ilegal na Terra Indígena Karipuna, registrada em 2019. Foto: Chico Bata/Todos os Olhos na Amazônia

Por Laura Vicuña Pereira Manso*, publicado na revista italiana Nigrizia 

A Amazônia Brasileira vive mais um dramático momento de sua história. Inúmeros massacres e atrocidades foram cometidos contra os povos indígenas na região. Agora, em novo ataque, sofrem pelas faltas de políticas públicas para os povos amazônicos: ribeirinhos, seringueiros, quilombolas e os muitos migrantes que povoaram esta terra. A Amazônia sempre foi uma fronteira econômica para os grupos, que ávidos de dinheiro e poder, exploravam e continuam explorando a região, sem considerar o povo que habita estas terras e suas reais necessidades.

A pandemia provocada pela Covid 19 visibiliza para o resto do mundo o caos na saúde e demais políticas públicas de atenção aos povos amazônicos, agravando mais ainda para as inúmeras comunidades indígenas de toda a região da Amazônia. São populações que no passado tiveram sua história, seus projetos de vida interrompidos pelas epidemias que reduziram muito povos, chegando a exterminar alguns. Desta forma os territórios ficavam livres para as frentes econômicas e colonizadoras, que sem escrúpulos promoviam uma guerra biológica contra estes povos, com a propagação do sarampo, gripes e outras doenças que foram letal para os povos indígenas.

O cenário que temos atualmente no Brasil não é nada consolador quando vemos o aumento dos casos de contaminação e mortes pela Covid 19. Passam de 13 mil as mortes confirmadas e se vive um  aumento assustador de mortes por problemas respiratórios, muito acima do que foram registrados no mesmo período do ano passado. A situação de caos existente no sistema de saúde agravou, colapsando todo o sistema de saúde do país.

Na Amazônia a situação se agravou mais ainda pela falta de atenção na saúde, nas unidades de média e alta complexidade regional.

A situação de pandemia pela Covid 19 revelou a fragilidade na atenção às comunidades mais longínquas da Amazônia e nos centros urbanos, como as periferias carentes de políticas públicas. Com relação aos povos indígenas a situação só agrava, com as inúmeras ameaças cometidas contra os povos, lideranças e comunidades indígenas. Dados comprovam o aumento das violências e violações de direitos. Infelizmente, as ameaças aos direitos indígenas são sistêmicas e ocorrem sistematicamente.

Somado a situação de pandemia pela Covid 19, temos no Brasil um governo que desestabiliza a nação.

Pior ainda: com a retórica do atual Governo se fomenta o preconceito e a discriminação, o desrespeito à Constituição Federal e a democracia. Como resultado dessa política nefasta e genocida, querem entregar os  territórios indígenas e as unidades de conservação ambiental  para o capital econômico internacional, sobretudo com a Medida Provisória 910/19, enviada por Jair Bolsonaro ao Congresso Nacional. Esta medida, que será transformada em Projeto de Lei segundo acordo ocorrido na última terça-feira, legaliza a grilagem de terras, o desmatamento e os empreendimentos econômicos, e consequentemente a invasão e devastação das Terras Indígenas e dos territórios tradicionais.

A situação na Amazônia como um todo é muito preocupante com esta situação de pandemia provocada pela Covid 19. A maioria das cidades da Amazônia Brasileira tem um mínimo de infra estrutura, faltando serviços básicos essenciais como: saneamento básico, Unidades Públicas de Saúde e quase nada dos serviços de saúde de média e alta complexidade para atender a população dos estados, que na região amazônica possui apenas 10% desses serviços, comparado ao restante do país.

O caos que se instalou nos estados do Amazonas, Amapá e Pará, principalmente nas capitais, é uma amostra do que pode ocorrer nos demais estados da Amazônia Brasileira e países pan amazônicos, onde a pobreza, a falta de políticas públicas e a omissão dos governos se assemelham. Diante de tamanha omissão e desassistência, os sessenta e sete bispos da Amazônia brasileira divulgaram uma nota pública em defesa da vida dos povos indígenas e amazônicos, como uma aliados de suas causas. Na Amazônia brasileira, os dados e o aumento de mortes e contaminação pela Covid 19 são alarmantes, considerando o número de habitantes por cidades. Os bispos declaram na nota pública que “os povos tradicionais, que exigem um maior cuidado e tratamento diferenciado, e também as populações urbanas, especialmente as que vivem nas periferias das grandes cidades”. Alertam: “o coronavirus que nos assola agora e a crise socio ambiental, já fazem vislumbrar a imensa tragédia humanitária causada por um colapso estrutural”.

Com as invasões, os povos indígenas são os mais vulneráveis a pandemia pela Covid 19

Infelizmente os invasores dos territórios indígenas, quilombolas, Reservas Extrativistas e Unidades de Conservação Ambiental, não fazem quarentena e com mais voracidade estão desmatando a floresta Amazônica e contaminando as águas e a terra, com os inúmeros garimpos ilegais na Amazônia. O mais grave desta situação de invasão e desmatamento é a falta de fiscalização e proteção destas terras indígenas e unidades de conservação, bem como, a ineficácia do estado brasileiro em coibir esta ação do crime organizado na região. Com estas invasões os povos indígenas são os mais vulneráveis a pandemia da Covid 19. É preciso unir esforços pra garantir a integridade física e cultural dos povos indígenas e, sobretudo dos povos isolados.  É  urgente dispensar esforços, recursos e medidas de proteção e fiscalização permanente dos territórios, coibindo qualquer ação ilícita dos invasores.

*Laura Vicuña Pereira Manso é missionária do Cimi no Regional Rondônia

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