Nota de repúdio à portaria da Funai que possibilita contato com povos indígenas isolados
Causa-nos perplexidade e repulsa a possibilidade de contato com povos isolados justamente quando a população é convocada a ficar em isolamento, diante da gravidade do coronavírus
O Conselho Indigenista Missionário – Cimi vem externar preocupação e repúdio em relação à Portaria nº 419/PRES, de 17 de março de 2020, que estabelece medidas temporárias de prevenção à infecção e propagação do novo coronavírus (Covid-19) no âmbito da Fundação Nacional do Índio – Funai.
A portaria concebe, no seu artigo 3º, que as “Coordenações Regionais poderão conceder autorizações em caráter excepcional mediante ato justificado para a realização de atividades essenciais às comunidades indígenas”. O artigo 4º suspende todas as atividades que “impliquem em contato com comunidades indígenas isolados”. No entanto, em seguida, o parágrafo único abre uma exceção: “caso a atividade seja essencial à sobrevivência do grupo isolado, deve ser autorizada pela CR por ato justificado”.
Causa-nos perplexidade e repulsa essa possibilidade, colocada pelo órgão indigenista oficial, de haver o contato com povos isolados justamente nesta situação em que a população mundial e nacional está sendo convocada a ficar em isolamento, diante da gravidade e letalidade da doença Covid-19. Os povos indígenas são considerados grupos vulneráveis e de risco diante de uma pandemia de proporções alarmantes. Os grupos indígenas isolados são contemplados por uma política própria dentro do órgão indigenista, e a relevância de sua proteção segue os preceitos garantidos pela Constituição Federal de 1988.
Vinculada ao Ministério da Justiça, a Funai foi criada em 5 de dezembro de 1967, através da lei 5.371, para ser a coordenadora e executora da Politica Indigenista do governo federal. Sua missão institucional é proteger e promover os direitos dos povos indígenas no Brasil. Sob o governo de Jair Bolsonaro, a atuação da Funai tem destoado totalmente da sua missão, na contramão do que é seu papel institucional como órgão indigenista, voltando-se, contraditória e criminosamente, aos interesses anti-indígenas do agronegócio, do capital predador e do fundamentalismo religioso. Distancia-se, assim, dos interesses e da proteção das populações indígenas, de suas aspirações e de seus direitos, conquistados com muita luta e muito sangue derramado.
Nesse período de profunda crise de saúde pública, não podemos permitir que outros interesses sejam facilitados para adentrar os territórios, colocando em risco de vida toda a população indígena. Portanto, nos somamos a outras instituições na recomendação e exigência da retirada de toda e qualquer possibilidade de entrada nos territórios dos povos isolados e de contato com essas populações, como concebe a portaria 419/PRES, de 17 de março de 2020, no seu artigo 4º.
Brasília, 19 de março de 2020
Conselho Indigenista Missionário