30/03/2020

Apib reivindica plano de prevenção e atendimento contra coronavirus nos territórios indígenas

A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) pede a elaboração de um Plano de Ação Emergencial para evitar que povos sejam afetados por pandemia

Indígenas manifestam-se durante ATL 2019. Foto: Matheus Alves/MNI

Indígenas manifestam-se durante ATL 2019. Foto: Matheus Alves/MNI

Por Assessoria de Comunicação do Cimi

Em nota divulgada no dia 20 de março, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) reivindica que o governo federal elabore um Plano de Ação Emergencial voltado para a prevenção e o atendimento aos territórios indígenas em meio à pandemia do coronavírus.

A Apib aponta que os povos originários são “um dos segmentos mais expostos a situação de vulnerabilidade diante da atual pandemia” e pede, por isso, providências urgentes do Estado, com o fortalecimento do subsistema de saúde indígena por meio da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), dos Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEIs) e das Casas de Saúde Indígena (Casai).

Entre as medidas para garantir o isolamento e a proteção das comunidades indígenas, a organização reivindica a retirada de invasores dos territórios indígenas, a proteção das terras tradicionais em qualquer fase do processo administrativo de demarcação e a suspensão de despejos contra acampamento e retomadas.

Em caso de “ausência de vontade política do atual governo”, a Apib reivindica que organismos internacionais como a Organização Mundial de Saúde (OMS) e a Organização Panamericana de Saúde (OPAS) disponibilizem “testes em caráter especial e de urgência para as unidades de saúde indígena”.

“Pelo bem estar dos nossos, idosos, depositários das nossa sabedoria e tradição, e das nossas crianças, as nossas gerações futuras, reivindicamos mais respeito ao tratamento específico e diferenciado, conquistado por nós na Constituição de 1988”, afirma a Apib.

Leia a nota na íntegra:

 

Nota pública: governo deve apresentar plano de prevenção e atendimento para evitar riscos de contaminação de coronavirus nos territórios indígenas

Sem dúvida, os povos indígenas somos um dos segmentos mais expostos a situação de vulnerabilidade diante da atual pandemia do Coronavirus – COVID-19. Ao longo da história, fomos vitimados pelos sucessivos invasores, não apenas pelo uso da violência física, das armas de fogo e o trabalho forçado, mas também pelas doenças levadas por eles, tais como a gripe, a varíola e o sarampo, inclusive no século XX, principalmente durante o regime da ditadura militar. E até hoje, sofremos de doenças vindas de fora – cardiovasculares, hipertensão, diabetes, gastrointestinais, renais, sexualmente transmissíveis e doenças respiratórias. O coronavírus é mais uma dessas ameaças, mais uma praga produzida pela acumulação capitalista, por tanto de origem política e econômica e que agora se torna crise de saúde pública. Não podemos pagar por problemas alheios ao nosso modo de vida. Pelo contrário, cabe ao Estado providenciar medidas para atenuar a sua dívida acumulada até hoje para com os nossos povos e comunidades.

Dessa forma, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil – APIB, vem de público reivindicar do atual governo um Plano de Ação Emergencial, que inclua, dentre outras, as seguintes medidas:

  1. Garantir a proteção dos nossos territórios, independentemente da fase de regularização em que se encontram. portanto dos nossos povos, principalmente os povos indígenas isolados e de recente contato,
  2. Coibir a presença de invasores nos territórios indígenas, como grileiros, posseiros, garimpeiros, madeireiros e outros tantos que praticam atividades ilícitas nesses territórios.
  3. Suspender quaisquer tentativas de despejo em retomadas dos territórios de ocupação tradicional dos nossos povos voltadas a garantir o seu direito originário, de posse e usufruto exclusivo.
  4. Fortalecer, com dotação orçamentaria adicional, o subsistema de saúde indígena, isto é, a Secretaria Especial de Saúde Indígena – SESAI, os Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEIs) e as Casas de Saúde Indígena (CASAIs), recondicionando-as aos novos tempos da pandemia do Coronavirus, uma vez que em alguns casos se tornam lugares aglomerados.
  5. Impedir o acesso aos territórios indígenas de pessoas não autorizadas ou vinculadas aos serviços básicos de assistência, tais como turistas e outras pessoas com propósitos diversos não autorizadas pelas nossas lideranças.
  6. Aprimorar o subsistema com medidas de prevenção e atendimento para evitar riscos de contaminação pelo Coronavirus nas aldeias, sobretudo naquelas próximas a centros urbanos ou em ocasiões de necessária assistência hospitalar. Quaisquer Plano de Contingenciamento deve ser amplamente discutido com as instâncias representativas dos nossos povos.
  7. Revogar imediatamente a Portaria n.º 419/PRES., de 17 de março de 2020, da Funai, conforme recomendado pelo Conselho Nacional de Saúde (CNS) e a 6ª. Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal / PGR. A Portaria, principalmente no seu artigo 4º. retira da Coordenação Geral de Índios Isolados a responsabilidade de proteger esses povos, repassando-a às coordenações regionais do órgão indigenista, mesmo sabendo que estas não reúnem quadro qualificado e condições estruturais para tal missão específica. Para a APIB, essa decisão que burla toda a legislação específica nacional (Constituição Federal, Estatuto do Índio, Regimento Interno da Funai, determinações do Ministério da Saúde e da SESAI) e internacional (Declaração Americana dos Direitos dos Povos Indígenas, resoluções da Comissão Interamericana de Direitos Humanos e da OMS), constitui um ato de irresponsabilidade uma vez que traz mais risco à integridade dos povos isolados e de recente contato. A decisão só pode ser justificada em razão de interesses não explicitados, já denunciados em outras oportunidades pela nossa organização.
  8. Por fim, na ausência de vontade política do atual governo em elaborar um Plano de Contingência para Surtos e Epidemias, considerando as especificidades dos nossos povos, o seu modo de vida comunitário, que pode facilitar a programação rápida do Coronairus, requeremos dos organismos internacionais, principalmente da Organização Mundial de Saúde (OMS) e da Organização Panamericana de Saúde (OPAS) a disponibilização de testes em caráter especial e de urgência para as unidades de saúde indígena.

Pelo bem estar dos nossos, idosos, depositários das nossa sabedoria e tradição, e das nossas crianças, as nossas gerações futuras, reivindicamos mais respeito ao tratamento específico e diferenciado, conquistado por nós na Constituição de 1988.

Sangue Indígena, nenhuma gota mais!

Articulação dos Povos Indígenas do Brasil – APIB

Brasília – DF, 20 de março de 2020.

 

Share this:
Tags: