Apib reivindica plano de prevenção e atendimento contra coronavirus nos territórios indígenas
A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) pede a elaboração de um Plano de Ação Emergencial para evitar que povos sejam afetados por pandemia
Em nota divulgada no dia 20 de março, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) reivindica que o governo federal elabore um Plano de Ação Emergencial voltado para a prevenção e o atendimento aos territórios indígenas em meio à pandemia do coronavírus.
A Apib aponta que os povos originários são “um dos segmentos mais expostos a situação de vulnerabilidade diante da atual pandemia” e pede, por isso, providências urgentes do Estado, com o fortalecimento do subsistema de saúde indígena por meio da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), dos Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEIs) e das Casas de Saúde Indígena (Casai).
Entre as medidas para garantir o isolamento e a proteção das comunidades indígenas, a organização reivindica a retirada de invasores dos territórios indígenas, a proteção das terras tradicionais em qualquer fase do processo administrativo de demarcação e a suspensão de despejos contra acampamento e retomadas.
Em caso de “ausência de vontade política do atual governo”, a Apib reivindica que organismos internacionais como a Organização Mundial de Saúde (OMS) e a Organização Panamericana de Saúde (OPAS) disponibilizem “testes em caráter especial e de urgência para as unidades de saúde indígena”.
“Pelo bem estar dos nossos, idosos, depositários das nossa sabedoria e tradição, e das nossas crianças, as nossas gerações futuras, reivindicamos mais respeito ao tratamento específico e diferenciado, conquistado por nós na Constituição de 1988”, afirma a Apib.
Leia a nota na íntegra:
Nota pública: governo deve apresentar plano de prevenção e atendimento para evitar riscos de contaminação de coronavirus nos territórios indígenas
Sem dúvida, os povos indígenas somos um dos segmentos mais expostos a situação de vulnerabilidade diante da atual pandemia do Coronavirus – COVID-19. Ao longo da história, fomos vitimados pelos sucessivos invasores, não apenas pelo uso da violência física, das armas de fogo e o trabalho forçado, mas também pelas doenças levadas por eles, tais como a gripe, a varíola e o sarampo, inclusive no século XX, principalmente durante o regime da ditadura militar. E até hoje, sofremos de doenças vindas de fora – cardiovasculares, hipertensão, diabetes, gastrointestinais, renais, sexualmente transmissíveis e doenças respiratórias. O coronavírus é mais uma dessas ameaças, mais uma praga produzida pela acumulação capitalista, por tanto de origem política e econômica e que agora se torna crise de saúde pública. Não podemos pagar por problemas alheios ao nosso modo de vida. Pelo contrário, cabe ao Estado providenciar medidas para atenuar a sua dívida acumulada até hoje para com os nossos povos e comunidades.
Dessa forma, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil – APIB, vem de público reivindicar do atual governo um Plano de Ação Emergencial, que inclua, dentre outras, as seguintes medidas:
- Garantir a proteção dos nossos territórios, independentemente da fase de regularização em que se encontram. portanto dos nossos povos, principalmente os povos indígenas isolados e de recente contato,
- Coibir a presença de invasores nos territórios indígenas, como grileiros, posseiros, garimpeiros, madeireiros e outros tantos que praticam atividades ilícitas nesses territórios.
- Suspender quaisquer tentativas de despejo em retomadas dos territórios de ocupação tradicional dos nossos povos voltadas a garantir o seu direito originário, de posse e usufruto exclusivo.
- Fortalecer, com dotação orçamentaria adicional, o subsistema de saúde indígena, isto é, a Secretaria Especial de Saúde Indígena – SESAI, os Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEIs) e as Casas de Saúde Indígena (CASAIs), recondicionando-as aos novos tempos da pandemia do Coronavirus, uma vez que em alguns casos se tornam lugares aglomerados.
- Impedir o acesso aos territórios indígenas de pessoas não autorizadas ou vinculadas aos serviços básicos de assistência, tais como turistas e outras pessoas com propósitos diversos não autorizadas pelas nossas lideranças.
- Aprimorar o subsistema com medidas de prevenção e atendimento para evitar riscos de contaminação pelo Coronavirus nas aldeias, sobretudo naquelas próximas a centros urbanos ou em ocasiões de necessária assistência hospitalar. Quaisquer Plano de Contingenciamento deve ser amplamente discutido com as instâncias representativas dos nossos povos.
- Revogar imediatamente a Portaria n.º 419/PRES., de 17 de março de 2020, da Funai, conforme recomendado pelo Conselho Nacional de Saúde (CNS) e a 6ª. Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal / PGR. A Portaria, principalmente no seu artigo 4º. retira da Coordenação Geral de Índios Isolados a responsabilidade de proteger esses povos, repassando-a às coordenações regionais do órgão indigenista, mesmo sabendo que estas não reúnem quadro qualificado e condições estruturais para tal missão específica. Para a APIB, essa decisão que burla toda a legislação específica nacional (Constituição Federal, Estatuto do Índio, Regimento Interno da Funai, determinações do Ministério da Saúde e da SESAI) e internacional (Declaração Americana dos Direitos dos Povos Indígenas, resoluções da Comissão Interamericana de Direitos Humanos e da OMS), constitui um ato de irresponsabilidade uma vez que traz mais risco à integridade dos povos isolados e de recente contato. A decisão só pode ser justificada em razão de interesses não explicitados, já denunciados em outras oportunidades pela nossa organização.
- Por fim, na ausência de vontade política do atual governo em elaborar um Plano de Contingência para Surtos e Epidemias, considerando as especificidades dos nossos povos, o seu modo de vida comunitário, que pode facilitar a programação rápida do Coronairus, requeremos dos organismos internacionais, principalmente da Organização Mundial de Saúde (OMS) e da Organização Panamericana de Saúde (OPAS) a disponibilização de testes em caráter especial e de urgência para as unidades de saúde indígena.
Pelo bem estar dos nossos, idosos, depositários das nossa sabedoria e tradição, e das nossas crianças, as nossas gerações futuras, reivindicamos mais respeito ao tratamento específico e diferenciado, conquistado por nós na Constituição de 1988.
Sangue Indígena, nenhuma gota mais!
Articulação dos Povos Indígenas do Brasil – APIB
Brasília – DF, 20 de março de 2020.