O governo Bolsonaro faz avançar os programas neoliberais que restringem direitos individuais e coletivos
Nunca se investiu tanto em convencer a população a abrir mão de direitos fundamentais
Não há como negar os “bons” serviços prestados pelos que governam o Brasil aos grandes grupos econômicos, em especial ao sistema financeiro. Nunca antes na história deste país se investiu tanto em convencer a população a abrir mão dos direitos fundamentais ao emprego, regulamentado por leis trabalhistas, à aposentadoria e à renda digna. Há um conluio entre as grandes corporações financeiras internacionais e o poder político com o intuito de retirar dos mais pobres as poucas garantias e seguridades sociais previstas na Lei Maior do país. Cada centavo dos benefícios sociais e trabalhistas dos pobres, hoje, é pleiteado pelos donos dos bancos e pelos especuladores transnacionais.
E é por isso, não pelo acaso, que grande parte das mídias televisivas, radiofônicas e redes de internet se unem em torno da propaganda contra as garantias constitucionais inscritas na Constituição Federal de 1988. Os donos dos veículos de comunicação agem para desqualificar os direitos e tentar convencer os cidadãos de que estes direitos são privilégios e comprometem o futuro de todos os brasileiros. Ou seja, culpabilizam os pobres pela má gerência dos recursos públicos.
“Bolsonaro é o porta-voz daquilo que seria censurável, mas que, saindo da boca do presidente, torna-se aceitável. No contexto de crise do neoliberalismo, ele é importante para convencer os pobres a aceitarem cortes de direitos”
O governo Bolsonaro, neste contexto econômico, caiu como uma luva, haja vista sua conhecida imbecilidade e crueldade. Ele, através de medidas populistas e com discursos mal formulados, ridículos, preconceituosos e debochados, age com o intuito de atingir o pensamento médio do povo, porque fala daquilo que é comum e do cotidiano das pessoas. Ele representa aquele tipo de sujeito frustrado que gostaria de sair esbravejando palavrões, destilando ódios e preconceitos. O presidente invade a vida das pessoas, se comunicando como se estivesse entre comparsas, tratando todos como inimigos a serem destruídos.
Bolsonaro tenta se passar como um cara comum e como tal tenta convencer de que está se sacrificando pelo país e chama a todos a fazerem a mesma coisa. Quer que todos pensem que são iguais a ele: vulgar, ignorante, cheio de ódio. Ele é o porta-voz daquilo que seria censurável, mas que, saindo da boca e dos gestos do presidente, se torna aceitável. E, nesse contexto de crise do neoliberalismo, ele se torna importante para o convencimento dos pobres a aceitarem as medidas restritivas de seus direitos. E o mais grave, acaba por autorizar e validar o machismo, o racismo, a homofobia e a violência contra os grupos que vivem em situação de vulnerabilidade.
“O rearranjo do capital quer retirar do Estado migalhas que antes eram destinadas aos pobres. Ou seja, agora se lucra com mais voracidade com a miséria”
O sistema capitalista parece mudar uma perspectiva de décadas, em que se fazia a gestão das desigualdades e se mantinha certo equilíbrio nas relações sociais. Agora, ao contrário, se pretende lucrar com aqueles benefícios que eram destinados a essa gestão e a partir dos quais se mantinha uma certa convivência entre ricos e pobres. O rearranjo do capital quer retirar do Estado migalhas que antes eram destinadas aos pobres. Ou seja, agora se lucra com mais voracidade com a miséria.
No que isso vai dar logo adiante não se sabe, mas é fato que o sistema precisa, nos momentos de crise, se alimentar das sobras que antes eram deixadas para regular as relações de trabalho e de consumo entre os empobrecidos.
O grave, no caso do Brasil (embora pareça oportuno para o sistema ter um governo composto por alguns gestores parvos e lunáticos), é o fato de estarmos no caminho do totalitarismo e da tirania. E, lamentavelmente, essa parece ser uma tendência, pois o governo Bolsonaro vem atuando muito drasticamente na “baixa política”, coibindo liberdades, propagando como alternativa, para a segurança pública, a necessidade de investimentos nas milícias e no armamento das pessoas. Ele, em sua insana perseguição ideológica, combate a educação pública e demoniza os servidores concursados como se fossem todos comunistas, “vermelhos” e antipatriotas. Ele imprime marcas ideológicas em tudo e abre a boca cheia de ódio para os setores que agem em defesa das instituições, que ele deveria administrar e fazer funcionar.
Bolsonaro ataca direitos sociais e culturais, ao mesmo tempo em que propaga a exploração indiscriminada da terra – minérios, madeiras e águas – com o argumento de que na natureza os lucros são fartos e fáceis. Ele, na sua mediocridade, lança afrontas quase diárias às minorias, propaga o ódio e a discriminação. Ele, em sua usual grosseria, faz pouco caso das mulheres vítimas de feminicídio, da violência contra os jovens negros nas cidades, contra os presos nas penitenciárias, contra o sem-terra no campo, contra os povos e comunidades tradicionais. Ele despreza indígenas e seus direitos, ataca quilombolas e suas histórias. Ele legitima privilégios de parentes e amigos, vendendo-se ao séquito de seguidores fanáticos como alternativa à política do compadrio, do fisiologismo e do nepotismo. Ele, nesta baixa política, afronta o Poder Judiciário e escancara a opção pela manutenção dos interesses econômicos em relação a todos os direitos dos indivíduos e das coletividades.
“O presidente tornou-se uma boa distração no momento em que o sistema econômico de dominação precisa se rearranjar e explorar ainda mais a pobreza”
Bolsonaro chega a preocupar os liberais, porque faz com que haja uma certa desconexão do aparente bom convívio entre ricos e pobres nos ambientes das desigualdades, além de atrapalhar os interesses do mercado no Congresso Nacional. O governo, em sua bestialidade, compromete até aqueles que lhe garantem a governabilidade. Cresce, por conta disso, entre as elites do país, a perspectiva de consolidação de uma força aglutinadora de interesses políticos, jurídicos e econômicos, através do denominado de Centrão, dentro do Parlamento. Este deve avalizar o capital e suas reformas abrangentes. Mas, de qualquer modo, fará vista grossa às políticas de guerra de baixa intensidade de Bolsonaro, porque elas distraem, servem como nuvens de fumaça, já que tiram o foco, desconectam as pessoas dos temas e pautas que lhes dizem respeito, acerca de seus direitos, da política e da economia. Uma arapuca muito bem engendrada.
O entendimento das pessoas acerca desse contexto social, político e econômico será explicitado, num primeiro momento, nas eleições municipais de 2020, onde poderão, através do voto, avalizar ou rejeitar os políticos e seus partidos. Depois disso, estarão expostas e talvez delineadas as perspectivas quanto ao futuro do governo Bolsonaro, se de rompimento ou de sua manutenção provisória. De todo modo, em qualquer dos cenários políticos, aqueles que sofrerão os impactos mais profundos serão os mais pobres, as comunidades indígenas, quilombolas e todos os seres que vivem e dependem do meio ambiente.
Com sua arrogância e imbecilidade, Bolsonaro tornou-se uma boa distração no momento em que o sistema econômico de dominação precisa se rearranjar e explorar ainda mais a pobreza. E nada melhor, para os especuladores do sistema, do que ter no comando do país governantes que se portam como caricaturas, que fazem rir, causam estranheza, até chocam, irritam, geram medo, mas servem bem aos propósitos atuais do capital. Quando o bufão não servir mais, será descartado e atirado à lixeira da história. Até lá, o estrago para o país será imenso.