13/03/2019

MPF recorre de extinção de processo contra delegados e agente da PF em MS

Delegado foi flagrado em ligação telefônica com foragido mas conversa foi omitida de relatório oficial por ser considerada “sem relevância”

Indígenas reunidos no local onde foi morto Clodiodi, logo após o massacre de Caarapó. Foto: Ruy Sposati/Cimi

Indígenas reunidos no local onde foi morto Clodiodi, logo após o massacre de Caarapó. Foto: Ruy Sposati/Cimi

Por MPF

O Ministério Público Federal (MPF) em Mato Grosso do Sul (MS) recorreu ao Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) contra a extinção de processo, sem julgamento, em que acusa três delegados e um agente da Polícia Federal de Dourados de diversos ilícitos relacionados à investigação dos crimes cometidos contra a Comunidade da Terra Indígena Dourados-Amambaipeguá I, em 14 de junho de 2016. A acusação não foi aceita na Justiça Federal de Dourados sob o argumento de que não há justa causa e os fatos não são típicos de uma ação penal.

Os crimes tiveram início com a gravação de ligação telefônica entre um delegado da PF e o foragido da Justiça Dionei Guedin, em 22 de agosto de 2016, em que o produtor rural, acusado pelo MPF de crimes contra indígenas, afirma que iria se entregar. De fato, ele já possuía ordem de prisão expedida pela Justiça Federal. Durante a conversa, o delegado informa ao foragido que a PF não possui qualquer inquérito contra ele. “Isso foi o MPF, não foi a gente não(…)inclusive a nossa relação com o MPF f*** de vez. Agora, vocês fazendeiros tem que se unir e bater no MPF(…) Eu vou dar a fórmula para vocês conseguirem reverter. É bater na imprensa, chamar a mídia e bater neles, que eles gostam de estar bem com a população”.

Esta conversa entre um delegado da PF e um foragido da Justiça não foi informada ao MPF, que tem o papel constitucional de fiscalizar as atividades policiais. Pelo contrário, a PF informou que o diálogo não tinha qualquer relevância para a investigação e ele foi omitido da documentação oficial.

Os denunciados foram além. Entre 22 de agosto e 8 de setembro de 2016, os acusados, valendo-se da estrutura da Delegacia de Polícia Federal de Dourados, excluíram informações corretas e inseriram dados e legendas falsos no Sistema Guardião, utilizado para escutas judicialmente autorizadas; também omitiram declaração que deveria ser repassada ao MPF, colocando em seu lugar uma outra, ideologicamente falsa, que alterou a verdade sobre fato juridicamente relevante; por fim, o procedimento disciplinar interno da PF, que investigava o caso, foi arquivado, sob o argumento de que “o fato não configura evidente infração disciplinar ou ilícito penal”.

Para o MPF, “os denunciados valeram-se da estrutura policial para ocultar a prática de crimes por um de seus servidores. O fato do diálogo omitido nos relatórios de interceptação não conter, em si, caráter criminoso, não significa que sua omissão seria penalmente irrelevante”.

Em seu parecer, a Procuradoria Regional da República da 3ª Região, que oficia junto ao TRF3, afirma que o juízo federal de Dourados “adentrou no mérito das condutas dos acusados, o que não deve ocorrer na decisão de admissibilidade da acusação. A confirmação dos fatos, com a necessária individualização das condutas e eventual responsabilização penal, fica reservada para a fase do contraditório e ampla defesa”. Em outras palavras, a Justiça Federal de Dourados, ao analisar a admissibilidade da denúncia do MPF, praticamente julgou os acusados, isentando-os de qualquer culpa, e extinguindo a ação penal.

Referência processual na Justiça Federal de Dourados: 0002539-57.2017.4.03.6002

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