21/02/2019

Bispos do Maranhão relatam preocupação com a conjuntura social e política do país

Religiosos manifestam apoio às comunidades indígenas e quilombolas e questionam remoção de famílias para projeto de energia eólica

Foto: Ana Mendes

Mulhares Akroá-Gamella durante encontro da Teia dos Povos e Comunidades Tradicionais do Maranhão. Foto: Ana Mendes

Por Verônica Holanda*

Como resultado do Conselho Episcopal Regional, realizado em Coroatá, no Maranhão, os bispos católicos do Regional Nordeste 5 da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) emitiram uma nota relatando os casos que mais os preocupam no cenário brasileiro. Dentre eles, a tragédia de Brumadinho e a remoção de famílias de Paulino Neves (MA) para construção de torres de energia eólica. “Não deixa de ser irônico que pobres pescadores artesanais e pobres camponeses paguem proporcionalmente uma conta maior para a produção dessa energia considerada limpa”.

Os bispos do Maranhão temem também as consequências tanto do fim do Ministério do Trabalho quanto das intimidações contra o Cimi e a Comissão Pastoral da Terra (CPT). “Tanto o Cimi como a CPT são organismos importantes na defesa dos direitos dos povos indígenas, das comunidades quilombolas e dos trabalhadores do campo, direitos esses que são reconhecidos pela Constituição Federal”.

Leia o texto na íntegra abaixo:

NOTA DOS BISPOS DO MARANHÃO SOBRE A SITUAÇÃO ATUAL

Todas as vezes que fizestes isso a um destes mínimos que
são meus irmãos, foi a mim que o fizestes! (Mt 25,40).

O Evangelho deixa bem claro que Jesus sempre teve um olhar de compaixão para com os pobres, identificando-se com eles e defendendo-lhes a dignidade (cf. Mt 25, 31-45).

Inspirados no testemunho de Jesus, nós, bispos católicos do Regional Nordeste 5 da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil-CNBB, reunidos no Conselho Episcopal Regional, de 04 a 06 de fevereiro 2019, em Coroatá-MA, analisamos a atual conjuntura social e política do País. Entre outras questões, constatamos com preocupação a extinção do Ministério do Trabalho, fato que pode ocasionar perdas de direitos dos trabalhadores. Preocupa-nos também a atribuição da demarcação de terras indígenas, anteriormente sob a responsabilidade da Fundação Nacional do Índio-FUNAI, ao Ministério da Agricultura, cujos dirigentes têm manifestado opiniões, ao nosso ver, contrárias aos direitos fundamentais dos povos indígenas.

Outra preocupação provém de pronunciamentos por parte de membros do Governo Federal, cuja intenção parece ser a de intimidar os militantes do Conselho Indigenista Missionário-CIMI e da Comissão Pastoral da Terra-CPT. Tanto o CIMI como a CPT são organismos importantes na defesa dos direitos dos povos indígenas, das comunidades quilombolas e dos trabalhadores do campo, direitos esses que são reconhecidos pela Constituição Federal.

No Maranhão, reafirmamos o nosso apoio aos povos indígenas que resistem com coragem à invasão de seus territórios. Também nos solidarizamos com as famílias atingidas pela construção de torres para produção de energia eólica em Paulino Neves, bem como com as famílias prejudicadas com a instalação do linhão para o transporte da energia ali produzida. Não deixa de ser irônico que pobres pescadores artesanais e pobres camponeses paguem proporcionalmente uma conta maior para a produção dessa energia considerada limpa.

A tragédia, acontecida em Brumadinho-MG apenas três anos após aquela outra acontecida em Mariana, nos leva a redobrar a atenção e a reflexão com vista a possíveis tomadas de decisão a respeito das consequências e impactos negativos provenientes da mineração, do transporte e do embarque de minério de ferro em nossa região. Não podemos também nos esquecer dos tanques de lama vermelha produzidos pela Alumar, e outros projetos, como a expansão do Porto de Itaqui e a criação de camarão, os quais, sem trazer ganhos sociais significativos, colocam em risco o frágil bioma da Ilha de São Luís e dos Campos de Perizes.

Reafirmamos nosso apoio à resistência das comunidades indígenas e quilombolas, à Teia das Comunidades Tradicionais, à ONG Justiça nos Trilhos, entre outras.

Colocando a vida de nosso povo sob a proteção de Nossa Senhora Aparecida e pedindo a graça para sempre imitarmos o exemplo de Jesus Cristo, subscrevemos:

Armando Martín Gutiérrez, bispo de Bacabal
Elio Rama, bispo de Pinheiro
Esmeraldo Barreto de Farias, bispo auxiliar de São Luís
Francisco Lima Soares, bispo de Carolina
José Belisário da Silva, arcebispo de São Luís
José Spiga, administrador diocesano de Viana
José Valdeci Santos Mendes, bispo de Brejo
João Kot, bispo de Zé Doca
Rubival Cabral Brito, bispo de Grajau
Sebastião Bandeira Coêlho, bispo de Coroatá
Sebastião Lima Duarte, bispo de Caxias
Vilsom Basso, bispo de Imperatriz
Xavier Gilles de Maupeou d’Ableiges, bispo emérito de Viana

 

Sugerimos que, nos dias 23 e 24 de fevereiro, ao se completar um mês da tragédia de Brumadinho e fazendo memória de suas vítimas, se faça a leitura desta nota em todas as celebrações, seja após a homilia, seja ao final da celebração, durante os avisos da comunidade.

 

* Estagiária sob supervisão de Tiago Miotto

Share this:
Tags: