Fórum de Políticas Indigenistas de Japurá/AM fomenta debate sobre violação de direitos
Encontro entre poder político e poder comunitário busca solucionar violações no âmbito da educação, saúde, território e meio ambiente, no município
Lideranças indígenas Maku Nadeb, Kanamari e Kaixana, das aldeias Jutaí, Jeremias, Nova Canaã, São Joaquim e Mapari realizaram, nos dias 17 e 18 de outubro, o Fórum de Políticas Indigenistas de Japurá, no Amazonas. O evento faz parte das atividades de Formação do projeto “Garantindo a Defesa de Direitos e a Cidadania dos Povos Indígenas do Médio Rio Solimões e Afluentes”, realizado pela Cáritas da Prelazia de Tefé e Conselho Indigenista Missionário (CIMI-Tefé), financiado pela União Europeia e CAFOD, Agência Católica para o Desenvolvimento Internacional.
O Fórum contou com a presença de vereadores de Japurá, Antônio da Silva e Edson Ventura dos Santos, do Secretário de Meio Ambiente, Mário Jorge e representantes da Coordenação de Educação Escolar Indígena, Madalena da Silva Cardoso, Josimar Manoel Ferreira e Cileia Camargo da Silva. Apesar de o convite ter sido para todos os órgãos públicos do município, esses representantes participaram e se comprometeram em encaminhar as solicitações das lideranças indígenas.
Violações de direitos acontecem em todas as políticas conquistadas
Os temas debatidos no Fórum retratam a situação de violação de direitos que os indígenas sofrem na região. Há direitos violados nas áreas de educação, saúde, território e meio ambiente, no âmbito do município. As reivindicações são possíveis de serem realizadas com empenho e compromisso dos órgãos responsáveis, bem como do poder legislativo que elabora as leis e fiscaliza a implementação das políticas públicas.
Na educação, as lideranças cobraram dos vereadores a aprovação do Projeto de Lei que cria o Núcleo de Educação Escolar Indígena de Japurá. José de Carvalho Kanamari, da aldeia Nova Canaã, questiona com forte apelo “o que está faltando para a aprovação do projeto, se ele já está na Casa pronto para ser votado?”. O vereador Antônio da Silva confirmou que “já está pronto para votação e que deverá ser apreciado depois das eleições, mas também pode ser até o dia 16 de dezembro”, e disse que “é muito importante a participação dos indígenas no dia da votação”. Os indígenas afirmaram que se manterão informados da data que o projeto será apresentado na câmara e que estarão presentes nesse dia.
A indígena Lucilene Rocha, do povo Kaixana, aldeia Mapari, denunciou que o lixo da cidade que não é coletado pela prefeitura, é levado pela chuva para o rio Mapari, em frente à aldeia. “Está se tornando uma coisa séria para nossa saúde e nosso ambiente”, direcionando o problema para a falta de responsabilidade do poder público em fazer o serviço de coleta do lixo e questionando a inexistência de fiscalização. O vereador disse que “o lixo é uma questão da Secretaria de Meio Ambiente, mas, sim, a Câmara pode cobrar”, afirmando que o fará “por meio de requerimento para que as providências sejam tomadas pelo poder executivo do Município”.
O Secretario de Meio Ambiente, Mário Jorge, explanou sobre a situação, dizendo que o problema do lixo “é um problema mundial e a solução para seus problemas é complexa, partindo de uma educação da sociedade e da necessidade de muitos recursos para o destino correto do lixo”. Confirmou que “o lixo que vai para o rio Mapari é o lixo jogado na cidade pelos moradores de Japurá e que é levado após as chuvas”, afirmando que a Secretaria vai estudar a situação para poder buscar soluções.
Outro questionamento respondido pelo secretário, afirmando compromisso, foi em relação às invasões nas áreas indígenas. Indagado sobre ações de responsabilidade do órgão na fiscalização buscando evitar que invasores assaltem as terras indígenas e explorem os recursos naturais ilegalmente, o secretário respondeu que o importante é somar esforços para evitar a irregularidade e afirmou que “a Secretaria do Meio Ambiente está à disposição para fechar parcerias com os indígenas”. Disse que é possível dar apoio e orientações para as lideranças que participam de reuniões das associações do município, “para que os indígenas possam falar de seus planos de fiscalização de seus territórios e, então, orientar como proceder quando se depararem com a entrada de pessoas estranhas nas áreas indígenas para exploração de madeira, caça e pesca”.
Mesa Redonda com a Coordenação da Educação Escolar Indígena
Um dos momentos mais importantes do Fórum foi a Mesa Redonda com a Coordenação de Educação Escolar Indígena, com a presença da própria coordenadora, Madalena da Silva. Em sua explanação, Madalena falou das dificuldades que enfrenta enquanto coordenadoria da Secretaria de Educação: “na SEMED nem tudo a gente pode resolver e não se pode passar por cima do secretário nas decisões. Nós procuramos fazer visitas nas aldeias, mas nem sempre consegue. A gente sente vontade de ir para as aldeias visitar mensalmente os professores, mas o problema é a falta de recursos”, lamentou a coordenadora.
Sobre o Programa Pirayauara, que é oferecido pela Secretaria de Estado de Educação do Amazonas (SEDUC) para formação de professores indígenas e subsídios didáticos, Madalena informou que “a licitação para seu funcionamento em Japurá está com o processo de licitação vencido”. Disse que o que tem feito é “questionar junto à SEDUC sobre a possibilidade de oferecimento dos cursos” e que aguarda retorno. Sobre o Programa Saberes Indígenas, disse que “a data agendada para seu início é dia 03 de novembro”.
Osvaldo Lopes Maku Nadeb, da aldeia Jeremias, denunciou à coordenadora que “a merenda escolar entregue na aldeia vem vencida” que questionou: “queremos saber se a coordenadoria está acompanhando essa situação, porque tá difícil de resolver”. Madalena respondeu que a coordenação não acompanha as questões da merenda escolar, mas orientou “a merenda vencida deve ser trazida ao município para realizar a troca por uma merenda dentro do prazo de validade”.
Madalena chamou a atenção das lideranças indígenas para a importância da participação indígena no Conselho Municipal de Educação. Disse que “tais problemas podem ser levados ao Conselho” e que as aldeias devem garantir um assento. “Não há representantes indígenas no Conselho Municipal de Educação e nem no Conselho da Merenda Escolar. Isso é possível de garantir e eu, como coordenação, vou buscar uma vaga para representantes indígenas nesses conselhos”.
Políticas indigenistas
Políticas indigenistas são iniciativas formuladas pelas diferentes esferas do Estado brasileiro que tratam das necessidades dos povos indígenas, que buscam o amparo e a proteção legal destas populações. Elas foram conquistadas na década de 80, com a promulgação da Constituição Federal do Brasil. De lá pra cá, muito avanços se obteve, tanto na demarcação de territórios, como na implementação de políticas públicas específicas. No entanto, nos últimos anos, tais políticas vêm, gradativamente, sendo ameaçadas pelo descaso dos governantes e sucateamento das instâncias federais, estaduais e municipais. Com o novo governo federal, eleito em 28 de outubro, tudo indica que a tendência é piorar. O próprio presidente eleito afirmou que “índio não terá mais um centímetro de terra”.
Isso significa que dias terríveis estão por vir e que a resistência terá que estar mais fortalecida. É preciso que em cada aldeia, em cada território, em cada coração indígena, a força e a sabedoria indígena estejam presentes. Se unir, debater, denunciar violações de direitos, realizar incidências políticas, formar uma rede de proteção e exigir que sua existência e seus modos de vida sejam respeitados são as metas para os próximos anos.
Rumo ao Fórum Regional de Políticas Indigenistas
Em dezembro será realizado o Fórum Regional de Políticas Indigenistas, em Tefé. Um momento para reunir os povos indígenas da região do médio rio Solimões e afluentes para refletir sobre suas vidas e unir a luta contra a violação de direitos que todos sofrem.
O Fórum Local de Japurá reuniu suas denúncias e reivindicações e as lideranças estão prontas para compartilhar com os “parentes” de outros municípios. A lista não está pequena.
Assuntos a serem levados ao Fórum de Tefé.
Aldeia Mapari:
– O lixo e esgoto do município jogado no rio Mapari;
– Construção de um poço artesiano na comunidade;
– O transporte para levar pessoas para tratamento de saúde à cidade;
– Invasão na área do Mapari para pesca, caça e madeira ilegal, bem como a presença de dragas para garimpo de ouro.
Aldeia Nova Canaã:
– Invasão para pesca ilegal no lago Tinuca com ameaças de morte aos indígenas;
– Reforçar o documento elaborado no Mutirão de Direitos para cobrança da construção da escola na aldeia Nova Canaã. Há um impasse colocado pela prefeitura, que diz que não tem recurso para construir a escola. Segundo as lideranças que conversaram com a prefeita, ela ironiza, dizendo que “a escola só seria feita se ela parasse de pagar os professores da aldeia”;
– Precisam de apoio na criação do Projeto Político Pedagógico da escola.
Aldeia Jeremias:
– Segundo as lideranças, no período das eleições houve ameaças do poder executivo, na tentativa de coagir funcionários. É preciso visibilizar essa situação;
– A escola está deteriorada e precisa de reforma ou um novo prédio;
– Faltam materiais de construção para a conclusão do prédio do Posto de Saúde;
– Necessidade de água potável;
– Sofrem ameaças de pescadores da cidade que querem entrar na área indígena. Já ouviram explicitamente: “Eu vou pescar no seu Cristóvão e se me impedirem vai levar bala”;
– Motor novo para transporte de pacientes, pois o da aldeia está quebrado.
Aldeia Jutaí:
– Há relatos de ameaças do poder executivo durante as eleições;
– A escola está precária, necessitando de reformas ou de uma nova;
– Energia com problemas de fiação em toda a aldeia;
– Reivindicam uma Casa de Apoio em Japurá e sugerem parceria entre SESAI e prefeitura).
Aldeia São Joaquim:
– Escola nova, pois cresce o número de estudantes;
– Precisam de apoio para o Programa de Gestão Territorial e Ambiental (PGTA) da aldeia;
– A Associação da comunidade também precisa de apoio;
– Construção de um poço artesiano;
– Instalação de Postos de Vigilância na localidade Valência, com apoio da FUNAI e do Exército.