27/04/2018

Invasões levam risco a indígenas sem contato no Vale do Javari

Com recursos reduzidos em mais da metade, no ano passado, a Funai vai ficando mais debilitada diante dos inúmeros problemas que afetam as populações indígenas no Amazonas

Por Cimi Regional Norte I

Manaus (AM) – Com recursos reduzidos em mais da metade, no ano passado, a Fundação Nacional do Índio (Funai) vai ficando mais debilitada diante dos inúmeros problemas que afetam as populações indígenas no Amazonas. Na região do Vale do Javari, na fronteira com o Peru, indígenas denunciam aumento das invasões por pescadores, caçadores e madeireiros, fato confirmado por servidores da Funai e da Frente de Proteção Etnoambiental situada na confluência dos rios Ituí e Itacoaí – distante da sede municipal cerca de 400 quilômetros por via fluvial.

“Eles (os invasores) já passaram das áreas dos isolados e estão na boca do rio novo, próximo da aldeia dos Marubo, onde leva três dias para chegar de motor tipo rabeta”, denuncia o coordenador da União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (Univaja), Paulo Dollis Barbosa da Silva, do povo Marubo. “Ninguém sabe se já houve conflito, se já houve matança de isolados. Essa é a nossa preocupação”, acrescenta Paulo Marubo.

Os servidores da Frente de Proteção Etnoambiental, responsável pela proteção aos povos sem contato, já fizeram levantamento dos locais de maior ocorrência de invasões. De acordo com Gustavo Pena de Souza, coordenador interino da Frente, cada região da terra indígena Vale do Javari tem um tipo de invasão. “Na fronteira com o Peru tem presença de madeireiros, caça, pesca do filhote de aruanã – que é peixe ornamental – e pode ter tráfico (de entorpecentes) também. Na região dos rios Ituí e Itacoaí, ao norte, é mais caça e pesca. Para o lado do rio Jandiatuba é garimpo e, na área sul, próximo a calha do rio Juruá, perto do município de Eirunepé, tem ocorrência de pasto”, explica Gustavo.

Ele diz não ter conhecimento de conflito, mas concorda que aumentou a ocorrência de invasões e os invasores estão chegando mais próximo das aldeias.

Paulo Marubo destaca que  “a base (Frente de Proteção) não está fazendo seu papel de fiscalizador e não está dando conta de impedir as invasões”. Ele denuncia que alguns indígenas e funcionários da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) estão facilitando a entrada dos invasores.

“Os pescadores já chegaram com até mil quelônios, 900 kg de pirarucu e mataram 15 antas. Eles mesmos nos disseram que a entrada deles é facilitada por colabores indígenas da Frente de Proteção e servidores da Sesai”, disse o dirigente da Univaja.

O coordenador interino da Frente de Proteção afirma que não tem denúncia oficial envolvendo servidores da Sesai. Diz, porém, que muitos são da própria cidade de Atalaia do Norte e têm familiares que já moraram no interior da terra indígena antes da homologação, ocorrida em maio de 2001.

Da mesma forma pensa o Gilmar Jóia de Figueiredo Costa, coordenador da Funai em Atalaia do Norte. “Os invasores são pessoas que já moraram lá. Eles conhecem todos os canais. Eles conhecem os caminhos dos rios”, diz Gilmar.

Extinção da Coordenação Regional

O coordenador da Univaja, Paulo Marubo, que está em Brasília participando do Acampamento Terra Livre (ATL) 2018 – evento que se encerra nesta sexta, 27 -, juntamente com outras lideranças da região, levará as denúncias à Funai e ao Ministério Público Federal (MPF). Na oportunidade, ele irá reiterar ao órgão indigenista solicitação para não transferir as atribuições da Coordenação Regional (CR) do órgão de Atalaia do Norte para Tabatinga, município que fica a pouco mais de 32 quilômetros em linha reta.

Essa possibilidade foi levantada pelo ex-presidente da Funai, Franklimberg Ribeiro de Freitas, com quem Paulo Marubo esteve reunido no dia 17 de abril, dois dias antes de Franklimberg pedir exoneração do cargo.

Na conversa, ele teria dito que tem ocorrido pressões de políticos para transferir a CR de Vale do Javari para Tabatinga.

O coordenador da CR de Atalaia do Norte diz que essa possibilidade “não decola”. Segundo Gilmar Joia, que já trabalhou em Tabatinga, na região do Alto Solimões – formada por nove municípios e com uma extensão de 213.275 quilômetros quadrados – tem 75 mil indígenas para atender. “Se não tem condições de atender nem a esses, imagine numa área demarcada de oito milhões de hectares. Como é que vai transferir toda essa responsabilidade para Tabatinga?”, questiona.

Fonte: Cimi Regional Norte I
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