13/12/2017

Veneno está na torneira: Liminar suspende atividade agrícola em fazenda que põe em risco bacias hidrográficas na região de Palmas (TO)

Uma liminar expedida na última segunda-feira, 11, exige que sejam suspendidas as atividades agrícolas e pecuárias na fazenda Maanain, região de Palmas (TO)

Fazenda Maanain com desmatamento sem licença ambiental de aproximadamente 25 mil hectares do Cerrado brasileiro. Foto: Divulgação

Por Guilherme Cavalli, da Ascom/Cimi

Uma liminar expedida na última segunda-feira, 11, pelo juiz Edimar de Paula, da 5ª Vara Cível, Comarca de Palmas, TO, exige que sejam suspendidas as atividades agrícolas e pecuárias na fazenda Maanain. A determinação paraliza os plantios por acusar a propriedade de infringir leis ambientais, com inúmeros autos de infração. Os requeridos da liminar são Amarildo Martins da Silva e Matheus Otonni, proprietário e arrendatário, respectivamente, da área destinada ao plantio de soja. Metade do faturamento líquido de vendas de agrotóxicos no Brasil é voltado para a produção de soja, segundo Anvisa. No caso da fazenda Maanain, é veneno que escorre para as nascentes dos rios e chega as torneiras dos palmenses, no Tocantins. 

Os responsáveis pela propriedade, mesmo ciente das denúncias encaminhadas ao poder público, continuaram o plantio em área de desmatamento ilegal. No último sábado, 9, máquinas agrícolas deram sequência ao plantio de grãos e a pulverização da região com agrotóxicos. Sem licença ambiental para retirada de vegetação nativa, aproximadamente 25 mil hectares de vegetação do Cerrado brasileiro, em área de Reserva Legal, foram desmatados próximo a nascentes do rio Taquaruçu Grande. O local devastado para o plantio de soja integra a Área de Proteção Ambiental do Parque Estadual do Lajeado. 

Ainda, conforme a manifestação judicial, as áreas de contaminação fazem parte das bacias hidrográficas dos córregos Macacão e Taguaruçu Grande. O envenenamento do Taguaruçu Grande coloca em risco a potabilidade da água consumida por 70% da população de Palmas, capital do Tocantins.  

Organizações da sociedade civil uniram-se para denunciar os danos ambientais que colocam em cheque a vida do Cerrado e das águas que correm nele. No dia 4 de julho de 2014, um conjunto de seis entidades protocolaram documentações na Fundação do Meio Ambiente, Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis, Instituto Natureza do Tocantins, Ministério Público Estadual e Federal. Em Ação Cível Pública protocolizada no dia 16 de novembro, entidades cobraram novamente. “O plantio de soja na referida fazenda posta a sua localização causará efetivos danos ao meio ambiente, posto o uso de agrotóxicos nocivos à saúde humana exigidos por esta cultura agrícola, que pela tipologia do terreno, com certeza contaminará os mananciais de água lá existentes”, expressa o documento. 

Quando se desmata o Cerrado, comprometem-se os recursos hídricos, que são fonte de água para cerca de 25 milhões de pessoas que vivem no bioma. Hoje, relatórios do Projeto TerraClass mostram que aproximadamente 30% do Cerrado brasileiro é devastado para pastagem e 16 milhões de hectares do principal bioma responsável pela água do país está comprometido pela produção de soja, segundo o relatório “Análise Geoespacial da Dinâmica das Culturas Anuais no Bioma Cerrado: 2000 a 2014” da Agrosatélite.

Crimes ambientais recorrentes

Há alguns anos, Palmas (TO) tem sofrido com a drástica diminuição da capacidade hídrica do córrego Taquaruçu Grande, principal responsável pela água na região. O desmatamento para produção agropecuária e agrícola é a principal causa de destruição dos afluentes. Soma-se o risco de envenenamento das nascentes pelas propostas de transformar o cerrado em uma grande região de plantio de soja.

Áreas de contaminação da Fazenda Maanain fazem parte das bacias hidrográficas dos córregos Macacão e Taguaruçu Grande. Foto: Divulgação

Em agosto de 2015, Amarildo Martins da Silva, proprietário da fazenda Maanain, foi multado por ter cortado 573 arvores imunes ao corte, de espécies protegidas. A multa de R$ 286.500,00 não foi paga e a área, mesmo com decisão judicial que obriga o proprietário a recuperar, hoje consome-se pela soja. O plantio do grão impossibilita permanentemente a recuperação e regeneração do bioma destruído. Especialistas da Anvisa afirmam que em quatro anos o o uso de agrotóxicos específicos das plantações de soja, como o glifosato, cresceu 162%.

Na liminar de segunda-feira, o juíz determinou a Amarildo Martins da Silva e a Matheus Otonni que suspendam imediatamente toda atividade agrícola na fazenda sobre pena de incorrer em multia diária de R$ 10.000.00 e responsabilidade penal por crime de desobediência.

Matopiba é projeto de morte 

O estado do Tocantins integra o projeto Matopiba, plano de desenvolvimento agropecuário que avança como a “última fronteira agrícola” para o Cerrado, bioma com 50% de sua vegetação já exterminada.  Ao invés de progresso, o Matopiba causa graves impactos sociais e acentua ainda mais a destruição do Cerrado, causando o agravamento da pobreza e o abandono forçado dos territórios.

Os povos indígenas e as comunidades tradicionais têm uma relação de profundo respeito pela natureza, da qual dependem para a própria sobrevivência. O atual modelo de “desenvolvimento” fundamentado na exploração ilimitada dos bens comuns evidencia que estamos nos condenando à destruição. Para os representantes do agronegócio, no entanto, os povos tradicionais significam obstáculos a este “desenvolvimento”. Por isso, para eles, estas populações precisam ser expulsas ou eliminadas.

Ação Popular

A liminar que suspende atividade agrícola na fazenda Maanain é resultante de uma Ação Civil Pública encaminhada pelo Centro dos Direitos Humanos de Palmas, Instituto Quemdiria, Associação Água Doce – Movimento de Proteção ao Taquaruçu Grande, Associação Estadual de Cooperação Agrícola, Conselho Indigenista Missionário, Associação Alternativa para Pequena Agricultura, Associação de Desenvolvimento e Preservação dos Rios Araguaia e Tocantins.

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